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O contexto do sistema tradicional de publicação de revistas científicas

CAPÍTULO 4 ACESSO ABERTO Á INFORMAÇÃO CIENTÍFICA

4.1 O contexto do sistema tradicional de publicação de revistas científicas

O compartilhamento do conhecimento tem sido a base da inovação e da produção de novos conhecimentos (MACHADO, 2005). No campo científico, em especial, a informação científica é tanto insumo como produto cada vez mais importante para o desenvolvimento das Ciências e, consequentemente, para o desenvolvimento econômico e social de uma nação. Subentende-se, então, que o fato de restringir o acesso aos resultados científicos tende a provocar danos imensuráveis à sociedade como um todo. Apesar do descrito, o que se tem verificado é justamente a imposição de uma série de barreiras ao pesquisador ao acessar a informação científica.

É de se saber sobre a importância que os periódicos têm adquirido no que diz respeito à disseminação dos trabalhos científicos em diversas disciplinas. Todavia, a aquisição dessas publicações tem se tornado algo cada vez mais difícil. Dentre os

empecilhos, merecem destacar dois deles: as barreiras legais de permissão e as barreiras de preço.

As primeiras têm suas origens provenientes de leis de copyrights e acordos de licenças (estatutos e contratos). Nota-se que é hábito os autores cederem os direitos de seus trabalhos às editoras. Essas, por sua vez, tendo em vista a lucratividade, impõem restrições quanto à forma de uso de trabalhos por elas publicados. Sendo assim, sob determinadas licenças não se é possível, por exemplo, fazer cópias de artigos, distribui-los, armazená-los, imprimi-los, dentre outras coisas. Como afirma Ferreira et al. (2004), esse fato impede os autores de promoverem maior disseminação dos resultados alcançados na própria pesquisa, ao torná-los dependentes dos editores.

Já em relação às barreiras de preço, ressalta-se que se trata de um problema exclusivamente de cunho financeiro. É preciso dizer que o valor para a aquisição das revistas científicas tem-se tornado exorbitante. De acordo com Mayor (2004), os preços das assinaturas de periódicos aumentaram mais de 200% na última década.

Entende-se que as editoras se colocam como intermediárias no processo de comunicação entre autores e leitores, já que elas vendem ao público a produção dos pesquisadores. Há que se destacar que nessa relação, os pesquisadores não são beneficiados remuneradamente pela entrega de seus trabalhos às editoras. Essa doação, vale dizer, não é um fato recente. Como afirmam Suber e Arunachalam (2005), desde o surgimento dos periódicos científicos, em 1665, os cientistas têm publicado seus artigos sem receberem pagamentos. A expectativa é, na verdade, que essa entrega proporcione benefícios intangíveis ao pesquisador, tais como a certificação do trabalho, o prestígio, a citação e o impacto. De uma forma geral, tudo isso possibilita o avanço de suas carreiras. Nesse contexto, portanto, pesquisas que custaram dezenas ou centenas de milhares de dólares, quase sempre financiadas com dinheiro público, podem ter seus direitos entregues de forma praticamente gratuita a uma editora (MACHADO, 2005). Vale dizer ainda que para adquirir tais trabalhos científicos, é necessário que os governos desembolsem mais recursos financeiros com a assinatura de revistas por meio das bibliotecas.

Esse funcionamento, na prática, tem se mostrado insustentável. Dado o baixo orçamento que dispõem frente aos elevados custos das assinaturas, as bibliotecas têm apresentado dificuldades em obter e manter suas coleções de periódicos. A essa realidade tem que se acrescentar o fato de que o número de títulos de revistas cresce exponencialmente (PRICE, 1976b). Logo, as bibliotecas universitárias e de centros de pesquisa, principais redutos de pesquisadores, mostram-se incapazes de atender as

necessidades informacionais de seus usuários. Salienta-se que mesmo as grandes bibliotecas dos países desenvolvidos se encontram nessa situação. De acordo com Willinsky (2003, p. 263):

O impacto desses elevados preços tem afetado o acesso a literatura científica em universidades de todos os países. A associação de bibliotecas de centros de pesquisa, representando as 122 bibliotecas norte-americanas, relatou que seus membros têm sido forçados a cortar 6% de suas assinaturas desde o final da década de 80.

Certamente, o problema se torna mais crítico em países em desenvolvimento. Suber e Arunachalam (2005) explicam que em tais nações, há menos recursos tanto para fomentar ou publicar pesquisas quanto para comprar pesquisas publicadas em outros países. Citam o caso das bibliotecas localizadas na África subsaariana, as quais não assinam qualquer periódico por anos.

Enfim, diante desse contexto, fica nítido que a falta de acesso à informação científica se caracteriza como um problema de nível internacional. Seja em um país desenvolvido ou em desenvolvimento, muitos cientistas se veem impossibilitados de ter acesso ao conhecimento científico produzido em suas áreas, incapacitando-os, consequentemente, de contribuírem na edificação dos saberes. Reconhecendo tal fato, organizações nacionais e internacionais, entidades públicas e privadas, cientistas e bibliotecas têm fomentado discussões a fim de promover mudanças nesse cenário. Tais mudanças estariam direcionadas no sentido de tornar o conhecimento científico amplamente acessível e disponível a todos a quem dele se interessar. A fim de reforçar tal pretensão, servem-se de um forte argumento, qual seja a Ciência é um bem público. Isso pode ser verificado nas palavras de Stiglitz (1999, p. 312) ao dizer que a Ciência é crescentemente considerada como um “bem global”, e, portanto, vista como parte do patrimônio comum da humanidade.

Nesse sentido, a campanha de convencimento e estímulo ao amplo acesso às publiçações científicas tem sido feita pelo movimento social de acesso aberto (Open Access)1. Seu estudo será dado a seguir, a começar pela definição de seu princípio maior.

1Segundo Suber (2007), a filosofia de acesso aberto pode ser aplicada também ao conteúdo não-científico, como

filmes, músicas e livros de ficção. Contudo, esse não têm sido o foco principal da maioria dos ativistas do movimento. Nessa pesquisa, a fim de atingir os objetivos propostos, a iniciativa será estudada, especificamente, no que se refere à literatura científica.