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O Desenvolvimento Nacional Sustentável Como Finalidade da Contratação Púbica

No Brasil, decorrente da alteração introduzida pela Lei nº 12.349/2010 no texto do artigo 3º da Lei nº 8.666/1993, passou-se a referir à promoção do desenvolvimento nacional sustentável como uma das finalidades da licitação.409 Merece destaque a constatação de Marçal Justen Filho, no sentido de que “(...) a promoção do desenvolvimento nacional sustentável não é uma finalidade da licitação, mas da contratação administrativa”.410 Isso

408 LICITAÇÕES SUNTENTÁVEIS. Juliana Bonacorsi de Palma e Nelson Novaes Pedroso Junior (coord.) In: Brasil. Ministério da Justiça. Secretaria de Assuntos Legislativos Mecanismos jurídicos para a modernização e transparência da gestão pública. Ministério da Justiça, Secretaria de Assuntos Legislativos. v.

2.Brasília: Ministério da Justiça, 2013, p.176.

409 Nesse sentido, o que se busca é “[...] reconhecer outro potencial ou compulsória finalidade para o certame e que não se confunde com a satisfação da necessidade próxima, premente – de certa parcela da coletividade ou da própria Administração Pública, reprise-se – a ser obtida mediante regular execução do objeto contratado.

Melhor dizendo, busca-se constatar a admissão pelo Direito em vigor de adicional fim para ela – remoto:

singular ou plúrimo (conforme o caso) –, de modo que não se possibilite a satisfação de apenas um interesse público com sua exitosa realização, encapsulado como primário (de uma particularizada coletividade) ou secundário (do aparato administrativo), porém vários interesses públicos, num viés primário-primário (coletivo-coletivo) ou secundário-primário (administrativo-coletivo). Como exemplo assuma-se, desde logo, uma licitação que estipule, por força de lei, um critério ficto de empate entre propostas com vistas a incentivar a formalização da atividade microempresária e facilitar seu acesso às contratações públicas. Ou, ainda, a delimitação do objeto da licitação, por força de decreto hierárquico, a bens e serviços ambientalmente sustentáveis. E nisso reside a cogitada ‘função social da licitação pública’ apresentar-se, sempre que possível e cumulativamente, como um instrumento para a concretização dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, bem como dos demais valores, anseios e direitos nela encartados, sem prejuízo de outros, assim reconhecidos por lei ou até mesmo por uma política de governo.” FERREIRA, Daniel. Função Social da licitação pública: o desenvolvimento nacional sustentável (no e do Brasil, antes e depois da MP 495/2010). Fórum de contratação e gestão pública – FCGP. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 52-53.

410 Marçal Justen Filho alude que a promoção do desenvolvimento nacional sustentável como um dos fins da licitação e não das contratações públicas “(...) configura um equívoco lógico, ainda que não se trate de um vício

porque, como a licitação deve ser compreendida como um “(...) mero procedimento seletivos de propostas”,411 ela, per se, não seria hábil a promover ou a deixar e promover o desenvolvimento nacional sustentável, que será buscando por meio do contrato que formalizará a relação jurídica entre a Administração e o contratado.

Ademais disso, importa ressaltar que a finalidade precípua dos procedimentos de seleção na contratação pública (as licitações) reside na preferência pela proposta mais vantajosa, desde que observados os deveres de isonomia e transparência, de modo que a salvaguarda do desenvolvimento nacional sustentável não tem o condão de derrogar a seleção da proposta mais vantajosa para o poder público. A questão fulcral aqui reside na delimitação do que pode ser considerada a proposta mais vantajosa, que não se circunscreve exclusivamente ao menor preço, mas que alberga outras considerações destinadas à implementação do desenvolvimento nacional sustentável.

Nesse sentido, é possível afirmar que a mudança legislativa permitiu uma compreensão da contratação pública no Brasil como um instrumento de intervenção estatal destinada a produzir resultados mais amplos do que o aprovisionamento de bens e serviços necessários à satisfação das necessidades dos entes estatais. Dito de outra forma, com a promoção do desenvolvimento nacional sustentável a partir da licitação, mas não se limitando a ela, passou-se a vislumbrar no Brasil a re-funcionalização da contratação pública, com a visualização dos contratos públicos para além de sua primeira e de sua segunda geração, respectivamente, de fornecimento e de concessão.

Não resta dúvida de que se trata de um avanço considerável em direção à concretização dos objetivos constitucionais fundamentais. Nas palavras de Paulo Bonavides

“(...) ontem, falar em desenvolvimento era subversão; hoje, é direito”.412 Ainda que proferidas pelo destacado jurista em outro contexto, são plenamente aplicáveis às recentes alterações ora analisadas em sede de contratação pública.

A partir da Lei nº 12.349/2010 a contratação pública deve funcionar também como um instrumento de prossecução direta do desenvolvimento nacional sustentável, importando

de invalidade”. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos.

16ª ed., São Paulo: RT, 2014, p. 68.

411 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 16ª ed., São Paulo: RT, 2014, p. 73.

412 BONAVIDES, Paulo. A Constituição Aberta: temas políticos e constitucionais da atualidade, com ênfase no federalismo das regiões. 3ª ed., São Paulo: Editora Malheiros, 2004, p. 349.

em uma relação de causa e efeito entre o contrato e os objetivos pertinentes ao desenvolvimento nacional.

O termo sustentabilidade é derivado do conceito de “desenvolvimento sustentável”, elaborado a partir dos esforços internacionais iniciados nas décadas de 1960 e 1970 em resposta ao aumento da preocupação mundial com o crescimento populacional e o consequente desequilíbrio dos processos ecológicos e ocorrência de desastres ambientais.

Dois grandes acontecimentos, ambos em 1972, ilustram esse cenário de articulação e tomada de consciência a respeito da conservação ambiental como imperativo para a continuidade da existência humana. O primeiro foi o lançamento do Relatório “Os Limites do Crescimento”, que representou os esforços do Clube de Roma em abordar o rápido crescimento da população mundial frente a um planeta com recursos naturais limitados. O segundo foi a realização da primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, na qual se celebrou a Declaração de Estocolmo, contendo princípios para a promoção da conservação ambiental e da melhoria da qualidade de vida.

Foi em 1987, no entanto, que o termo “desenvolvimento sustentável” enfatizou o elemento humano e ganhou ampla repercussão, por meio da publicação do Relatório Brundtland (também chamado de “Nosso Futuro Comum”). Nele, ao lado das preocupações ambientais que já se faziam sentir em 1972, foram acrescentadas as questões econômicas e sociais como indissociáveis enquanto medida de desenvolvimento. Isso se deu a partir da proposta do próprio relatório de conciliar a conservação ambiental com a necessidade de desenvolvimento econômico e social, na medida em que se passou a entender o desenvolvimento enquanto proposta que atenda às necessidades do presente sem comprometer a habilidade das gerações futuras de atender suas próprias necessidades.

Acima de tudo, trata-se de um processo de mudança direcionado à melhoria das condições de vida (refletido nos âmbitos ambiental, social e econômico), envolvendo, de maneira harmônica, setores como exploração de recursos, direcionamento de investimentos, desenvolvimento tecnológico e estruturas institucionais. Foram inúmeras as iniciativas internacionais e domésticas, públicas e privadas, focadas na consolidação do desenvolvimento sustentável como meta para frear a degradação ambiental, promover o desenvolvimento das nações com garantia de qualidade de vida e do uso sustentável dos recursos naturais em consonância com a conservação da biodiversidade.

Focado principalmente no ser humano, a virada promovida pelo conceito de desenvolvimento sustentável assumiu o direito ao desenvolvimento equitativo (tanto na

perspectiva de classes e de nações quanto de gerações) enquanto umas das metas a serem atingidas, as quais apenas seriam possíveis por meio do fortalecimento dos pilares da sustentabilidade – proteção ambiental, desenvolvimento econômico e social –, que são interdependentes e que se reforçam mutuamente.413

A ideia de sustentabilidade, portanto, pressupõe a integração entre políticas ambientais e estratégias econômicas. Tal integração visa à perpetuidade dos processos sociais, econômicos e ambientais que garantam a qualidade de vida não apenas da geração presente, mas também das futuras. O que se espera, assim, é que se possa atender às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades.

O conceito de sustentabilidade, portanto, é inequivocamente sistêmico e relaciona-se com a continuidade dos aspectos econômicos, sociais, culturais e ambientais da sociedade humana, e se pode alcançar por meio do planejamento detalhado e de ações capazes de atingir e de manter esses mesmos ideais em longo prazo. Além desse aspecto transgeracional, o conceito de sustentabilidade também incorpora a redução da pobreza e das desigualdades como um dos seus ideais, na medida em que se propõe a realização das necessidades humanas e a promoção da melhoria da qualidade de vida. Em suma, a adjetivação do conceito de sustentabilidade assumido nesse estudo é baseada nos três pilares – ambiental, social e econômico – e deve ser desdobrada em socialmente inclusivo, ambientalmente sustentável e economicamente sustentado no tempo.414

A partir do Relatório Brundtland, passa-se a compreender a proteção ecológica como parte indissociável do processo de desenvolvimento, o que restou explicitado Princípio nº 4, da Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992, no sentido de que “a fim de alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção do ambiente deverá constituir-se como parte integrante do processo de desenvolvimento e não poderá ser considerada de forma isolada”.

413 LICITAÇÕES SUNTENTÁVEIS. Juliana Bonacorsi de Palma e Nelson Novaes Pedroso Junior (coord.) In: Brasil. Ministério da Justiça. Secretaria de Assuntos Legislativos Mecanismos jurídicos para a modernização e transparência da gestão pública. Ministério da Justiça, Secretaria de Assuntos Legislativos. v.

2.Brasília: Ministério da Justiça, 2013, p.175

414 LICITAÇÕES SUNTENTÁVEIS. Juliana Bonacorsi de Palma e Nelson Novaes Pedroso Junior (coord.) In: Brasil. Ministério da Justiça. Secretaria de Assuntos Legislativos Mecanismos jurídicos para a modernização e transparência da gestão pública. Ministério da Justiça, Secretaria de Assuntos Legislativos. v.

2.Brasília: Ministério da Justiça, 2013, p.175

A partir destes marcos normativos internacional, a literatura passou a dar significado a cada um dos signos atinentes ao desenvolvimento sustentável.

De acordo com Ignacy Sachs, são cinco os pilares do desenvolvimento sustentável:

(a) Social, fundamental por motivos tanto intrínsecos quanto instrumentais, por causa da perspectiva de disrupção social que paira de forma ameaçadora sobre muitos lugares problemáticos do nosso planeta; (b) Ambiental, com as suas duas dimensões (os sistemas de sustentação da vida como provedores de recursos e como ‘recipientes’ para a disposição de resíduos); (c) Territorial, relacionado à distribuição espacial de recursos, das populações e das atividades; (d) Econômico, sendo a viabilidade econômica a conditio sine qua non para que as coisas aconteçam; e (e) Político, a governança democrática é um valor fundador e um instrumento necessário para fazer as coisas acontecerem; a liberdade faz toda a diferença.415

No âmbito normativo brasileiro, a noção de sustentabilidade se encontra presente na legislação pretérita à própria constitucionalização da matéria ambiental, em 1988. A lei 6.938/1980, que consagrou a Política Nacional do Meio Ambiente, estabelece em seu artigo 4º, inciso I, a “compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico”, bem como o inciso VI estatui a necessidade da “preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente, concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico propício à vida.”

Em 1998, foi editado o Decreto 2.783, cujo art. 1º dispõe sobre o uso do poder de compra estatal nos seguintes termos: Art. 1º É vedada a aquisição, pelos órgãos e pelas entidades da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, de produtos ou equipamentos que contenham ou façam uso das Substâncias que Destroem a Camada de Ozônio - SDO, discriminadas no Anexo deste Decreto.416

Mais recente, o novo Código Florestal, em seu 1º artigo, consagrou o desenvolvimento sustentável como escopo central do regime jurídico de proteção florestal.

415 SACHS, Ignacy. Desenvolvimento: includente, sustentável, sustentado. Rio de Janeiro: Garamond, 2004, p. 25 e seguintes.

416 LICITAÇÕES SUNTENTÁVEIS. Juliana Bonacorsi de Palma e Nelson Novaes Pedroso Junior (coord.) In: Brasil. Ministério da Justiça. Secretaria de Assuntos Legislativos Mecanismos jurídicos para a modernização e transparência da gestão pública. Ministério da Justiça, Secretaria de Assuntos Legislativos. v.

2.Brasília: Ministério da Justiça, 2013, p.175

O plexo normativo que disciplina o tema torna-se a cada dia mais vasto. A lei nº 12.462/2011 que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações – RDC, estabeleceu no seu artigo 1º, parágrafo 1º, inciso III, que o RDC tem por objetivo incentivar a inovação tecnológica. No artigo 3º, aduz que todas as contratações por ele regidas deverão observar o princípio do desenvolvimento sustentável e, como diretriz, em seu artigo 4º, inciso III, estatui que a “busca da maior vantagem para a administração pública, considerando custos e benefícios, diretos e indiretos, de natureza econômica, social ou ambiental, inclusive os relativos à manutenção, ao desfazimento de bens e resíduos, ao índice de depreciação econômica e a outros fatores de igual relevância”.

O Regime Diferenciado de Contratações, portanto, disciplina que as contratações a ela submetidas terão como objetivo buscar a maior vantagem levando em conta inclusive os custos indiretos, considerados na forma do artigo 19, § 1º, da mesma lei, inclusive de índole social e ambiental, em clara superação de uma visão de uma vantagem exclusivamente em termos de eficiência econômica.

Ademais, o mesmo diploma estabelece em seu artigo 10 que, “(...) na contratação das obras e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e no contrato” e no artigo 14, parágrafo único, inciso II que “(...) poderão ser exigidos requisitos de sustentabilidade ambiental, na forma da legislação aplicável”.

A partir de todo esse complexo normativo, a compatibilização entre a proteção ambiental e o desenvolvimento socioeconômico deve ocorrer a partir de uma concepção integrada que impõe uma síntese dialética entre eles, à luz dos valores constitucionais que vão conformar um modelo próprio ou nacional de desenvolvimento sustentável. No caso brasileiro, esse modelo não pode se desvincular dos objetivos fundamentais da República previstos no artigo 3 e dos princípios que norteiam a atividade econômica estabelecidos no artigo 170, da CF/88.

No Brasil, esse modelo (recente) de desenvolvimento nacional sustentável, de acordo com Ingo Wolfgang Sarlet, expressa uma opção passível de ser designada como paradigma de um “capitalismo ambiental ou socioambiental que almeja compatibilizar a livre-iniciativa, a autonomia e a propriedade privada com a proteção ambiental e a justiça social (e também a justiça ambiental), tendo como norte normativo ‘nada menos’ do que a proteção e a

promoção de uma vida humana digna e saudável para todos os membros da comunidade estatal”.417

Assim sendo, o desenvolvimento sustentável explicita-se como um “conceito composto, de natureza complexa, relacional, dependente de uma compreensão contextualizada”, que demanda um aproveitamento abrangente tanto pelo legislador, quanto pelo administrador, em especial, no que toca aos planos da organização e do procedimento.418

Por conseguinte, a previsão legal estabelecida pela lei 12.349/2010, que permitiu a inclusão do desenvolvimento nacional sustentável como escopo das contratações governamentais não pode ser compreendida, senão, sob esse enfoque. Como o desenvolvimento sustentável é multidimensional (social, ambiental, econômico, ético e jurídico), todas essas dimensões são entrelaçadas indissociavelmente, cominando que a proposta mais vantajosa para o poder público aquela que “(...) se apresentar a mais apta a gerar, direta e indiretamente, o menor impacto negativo e, simultaneamente, os maiores benefícios econômicos, sociais e ambientais”.419

Com isso, na contratação pública, passa-se obrigatoriamente a levar em conta dos custos indiretos, assim como estimar os dispêndios futuros a serem efetuados em razão dos efeitos sistêmicos decorrentes das decisões administrativas. Antes da contratação, portanto, não podem ser ignorados os custos ambientais, sociais e econômicos, bem como suas implicações colaterais.420

Ademais disso, ainda que voltada explicitamente aos contratos de fornecimento ou de primeira geração,421 o estabelecimento do desenvolvimento nacional sustentável como pressuposto para a contratação pública demonstra a crescente preocupação do poder público

417SARLET, Ingo Wolfgang. Prefácio. In: BOSSELMANN, Klaus. O princípio da sustentabilidade:

Transformando direito e governança. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p.13.

418SARLET, Ingo Wolfgang. Prefácio. In: BOSSELMANN, Klaus. O princípio da sustentabilidade:

Transformando direito e governança. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p.13.

419 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: Direito ao futuro. 2ª Ed., Belo Horizonte: Editora Fórum, 2012, p.

238.

420 TONIN, Mayara Gasparoto. O Desenvolvimento Nacional Sustentável nas Contratações Administrativas. In: Revista de Direito Administrativo Contemporâneo – ReDAC. Ano 01, Vol. 0, mai./jun.

São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 143.

421 Não se pode olvidar, contudo, do papel relevante dos contratos de concessão de serviços públicos no desenvolvimento nacional sustentável, consoante aludido no início deste mesmo capítulo.

em dar vazão aos efeitos do poder de compra estatal para estimular a produção doméstica de bens e serviços.

Diante do seu extraordinário poder de contratação, passa a ser dever do Estado influenciar positivamente toda a matriz produtiva nacional, de modo que os fornecedores, em geral, passem a tomar em conta o ciclo de vida dos produtos e serviços, desde a obtenção das matérias primas e insumos, passando pelo processo produtivo e consumo até a disposição final.422 Destaca-se que vem à tona, nesse ponto, a responsabilidade partilhada pela destinação final dos resíduos e, quando for o caso, pela logística reversa.

Busca-se, nesse passo, que a contratação pública sustentável também seja indutora de uma cultura sustentável no setor empresarial. Gradativamente, as empresas à luz da atuação estatal passariam a criar suas linhas verdes ou mesmo atender a padrões de sustentabilidade no âmbito de sua atividade de gestão de negócios.

Para minimizar os custos que eventualmente as compras públicas sustentáveis possam apresentar, o Governo Federal estimula as compras conjuntas, por meio das quais são adquiridas grandes quantidades de um mesmo bem para variados órgãos administrativos.423 Potencialmente, a compra conjunta barateia os valores envolvidos na licitação. Ademais, a compra conjunta (em escala) é um sinalizador mais efetivo da oportunidade de negócios com o Poder Público, envolvendo quantidades maiores que as compras públicas sustentáveis em geral. Outro elemento a ser considerado neste particular é a padronização dos bens sustentáveis: com clareza, o mercado reconhece o tipo de bem que deve produzir, de acordo com os critérios de sustentabilidade considerados nos editais padronizados. Em suma, o volume torna a contratação pública sustentável mais atraente.

A realização do desenvolvimento nacional sustentável não constitui mais uma faculdade do administrador. Não está no âmbito da margem de liberdade do administrador.

Nos casos acima, o desenvolvimento sustentável vincula.424 A partir da sua previsão normativa expressa, toda discricionariedade administrativa encontra-se plenamente vinculada à sustentabilidade.

422 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: Direito ao futuro. 2ª Ed., Belo Horizonte: Editora Fórum, 2012, p.

238.

423 SILVA, Ângelo Henrique Lopes da. Economia de escala nas compras governamentais. In: In: Revista de Direito Público da Economia – RDPE. Belo Horizonte, ano 08, nº 30, abr. / jun. 2010, p. 09 e seguintes.

424 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade..., p. 241.

Nesse sentido, o reuso de águas, a utilização de automóveis movidos por combustíveis renováveis, a poupança de energia e a exigência de planos de gerenciamento de resíduos sólidos não representam simples opções dos gestores, a depender de sua boa vontade. Antes disso, eles provêm deontologicamente da Constituição e das múltiplas previsões legais expressas no sentido de salvaguardar o desenvolvimento sustentável.

Reitera-se: a contratação pública sustentável não representa mais uma simples faculdade, mas de obrigação constitucional e legal. Nesse passo, o dever de efetuar contratações públicas sustentáveis requer uma transformação de atitude administrativa, de modo que a partir do imperativo da sustentabilidade, o administrador deve, em todas as relações administrativas, promover o bem-estar das gerações futuras. A Administração, assim, tem de ser diligente quanto ao direito ao futuro.

Para alcançar este escopo, o controle dos atos, processos e contratos públicos deve ser levado a efeito à luz do princípio da eficácia, expresso no artigo 74, da Constituição Federal, para além dos princípios da legalidade e da eficiência, previstos no artigo 34, caput.

Em diversos casos, “a eficiência, em situações paradoxais, pode até produzir mais velozmente o insustentável”.425 Em razão disso, a eficácia, compreendida como o alcance de resultados e processos compatíveis com os objetivos constitucionais fundamentais e não apenas como aptidão para produzir efeitos jurídicas, é cânone a servir de parâmetro para se medir a sustentabilidade.

Trata-se, portanto, a própria busca do desenvolvimento nacional sustentável, inequivocamente, de uma política pública abrangente e multimodal.

Para além de uma política pública de fundamento constitucional e de largo espectro, com múltiplos instrumentos de prossecução, a inserção do desenvolvimento nacional

Para além de uma política pública de fundamento constitucional e de largo espectro, com múltiplos instrumentos de prossecução, a inserção do desenvolvimento nacional