• Nenhum resultado encontrado

3. Avaliação: a importância de repensar as práticas e políticas de hoje

3.1. O desenvolvimento da prática

Guba e Lincoln (1989, p.21-49) criaram diferentes marcos temporais que definiram o evoluir das práticas avaliativas até a atualidade. Apesar destes marcos temporais serem passivos de questionamento, uma vez que são apenas convencionais, os autores elencam o evoluir desta prática e, grosso modo, permitem um entendimento genérico sobre a avaliação.

Guba e Lincoln (1989, p.26) limitaram a primeira geração da avaliação até 1930. O conceito de avaliação está, neste contexto, intimamente relacionado com a importância da medida, ou seja, como sinónimo de teste em que posteriormente é atribuído um valor ou uma classificação. Os investigadores, que se debruçaram sobre as práticas avaliativas da altura, privilegiaram sobretudo as competências individuais e não o contexto em que os indivíduos se inseriam.

O primeiro trabalho de avaliação em museus insere-se no âmbito da primeira geração e foi realizado em 1916, discute a fadiga em museus e é da autoria de Benjamin Gilman. Através do registo fotográfico, Gilman (1916) tentou relacionar o comportamento dos visitantes com a fadiga, argumentando que esta estaria relacionada com a pobreza do desenho da exposição.

Os Estados Unidos da América foram pioneiros no estudo de visitantes em contexto museológico. Fortemente influenciados pela psicologia experimental, os estudos incidiram essencialmente sobre o comportamento dos visitantes. Nas décadas de 20 e 30 (do século XX) os psicólogos Edward Robinson (1928, 1930) e Arthur Melton (1933,1935) desenvolveram trabalhos marcantes que analisam como é que os visitantes se relacionavam com as exposições e com o tempo da visita, tendo em conta o contexto

34

dos museus. O pioneirismo e a relevância dos temas explorados tornaram indiscutível a importância dos seus trabalhos. Ainda assim, não deixa de ser clara a influência experimental que os estudos tiveram. O objeto de estudo dos investigadores incidiu sobre a análise de variáveis quantitativas: a percentagem de paragens e o tempo utilizado para visualização (Agencia Estatal de Evaluación de las Políticas Públicas y la Calidad de los Servicios, 2007; Bitgood, 2013, p.37).

A avaliação em museus apenas intensificou-se na segunda metade do século XX, numa altura em que, na área da educação e da psicologia, já firmava um percurso. Por este motivo, a maior parte dos trabalhos de avaliação desenvolvidos até então nos museus sofreram uma clara influência da psicologia e da educação. É de destacar o trabalho de Ralph Tyler (1942) que, na década de 40, alargou aplicação do conceito de avaliação abrangendo, pela primeira vez, não só questões comportamentais, mas também relativas à preponderância das qualidades dos programas educativos. O trabalho de Tyler marca aquela que é designada por Guba e Lincoln (1989, p.27) como 2ª geração ou geração da descrição, que é também conhecida como idade Tyleriana (Madaus, Scriven, Stufflebeam, 1993, p.8).

Apesar da pertinência destes primeiros estudos de visitantes, as preocupações com a avaliação em espaços museológicos só voltaram a despertar interesse na segunda metade do século XX, espaço temporal a que corresponde a 3ª e 4ª geração de avaliação. Só nas décadas de 70, 80 e 90 nos Estados Unidos da América, é que os estudos de avaliação dos museus, em torno de questões como a educação e a aprendizagem, se consolidaram. Observa-se, tanto nos E.U.A., quanto na Europa, uma crescente institucionalização das práticas de avaliação em museus, não só no que toca ao estudo de visitantes, mas também de outras competências. Alcançou-se aquilo a que Madaus, Scriven e Stufflebeam (1993, p.15) designaram por idade da profissionalização.

Na Europa, os trabalhos de avaliação museológica e de estudos de públicos começaram a dar os primeiros passos com o trabalho pioneiro de Bourdieu e Darbel no ano de 1969: l’amour de l'art – les musées d'art européens et leur public. O estudo caracterizou o perfil dos visitantes de alguns museus europeus mostrando que o acesso ao capital cultural dependia fortemente do perfil socioeconómico dos visitantes. A crítica de Bourdieu e Darbel despertou os museus para a reflexão sobre o seu papel

35

social e democratizante. É, por isso, um dos trabalhos de referência nos estudos de visitantes.

Nos anos 90, os investigadores procuraram trabalhar a área da educação e da aprendizagem através de uma abordagem interdisciplinar, abandonando cada vez mais os trabalhos experimentais levados a cabo nas décadas anteriores. (Verma e Mallick, 2005, p.64) O pós-modernismo fez sentir a sua influência nos trabalhos publicados na década, surgindo novos questionamentos sobre a natureza dos museus na década do final do século XX, destacando-se os autores americanos John Falk, Lynn Dierking e George Hein.

No Reino Unido, os trabalhos de Eilean Hooper-Greenhill, juntamente com outros investigadores da Universidade de Leicester, representa uma das principais referências da investigação museológica anglo-saxónica no que toca à avaliação.

O trabalho desenvolvido por Eilean Hooper-Greenhill (2007, p.189) demonstra a influência do paradigma pós-moderno não só na forma como são perspetivados os conceitos de educação e aprendizagem mas também na metodologia de avaliação destes elementos. Os seus últimos trabalhos de investigação partem de um enquadramento metodológico conhecido como os cinco impactos genéricos da aprendizagem, já referidos anteriormente, um tipo de avaliação que igualmente é conhecida como

avaliação baseada nos resultados adequada à produção de ferramentas de análise e

interpretação das práticas de ensino-aprendizagem.

Em termos de ferramentas, têm sido utilizados dados quantitativos e qualitativos como questionários, grupos focais e entrevistas. Compreende-se que há uma clara necessidade de conciliar aspetos de natureza quantitativa e qualitativa, de forma a obter uma perspetiva holística das dinâmicas de um museu. É através da conjugação das diferentes naturezas dos instrumentos de análise que se poderão alcançar resultados que possam cobrir todas as vertentes que os novos pressupostos construtivistas representam. Em Espanha, os trabalhos de avaliação têm vindo a ganhar expressão desde o final dos anos 80 do século passado. O trabalho de avaliação tem-se consolidado, ao longo destas últimas décadas, a partir das parcerias estabelecidas entre as universidades e os museus. A maior parte dos trabalhos de avaliação incidem sobre o perfil dos visitantes e sobre as atividades e programas educativos. Ainda no caso espanhol, é de salientar as iniciativas estatais, no que toca aos estudos de avaliação como é o caso da Agencia de Evaluación y Calidad (2007) um organismo público que, desde 2006, tem

36

vindo a desenvolver avaliações, não só em contexto museológico, que têm contribuído para a consolidação do funcionamento das instituições públicas espanholas.

A avaliação da experiência museológica permite aos profissionais dos museus conhecerem o impacto das suas práticas, isto é, permite-lhes obter uma apreciação do sucesso do seu trabalho para que depois possam refletir criticamente sobre a sua missão, objetivos e repensar, se for o caso, novas estratégias de ação. Os instrumentos de avaliação variam e devem ser adequados aos seus objetivos, podendo ter como finalidade conhecer o perfil dos visitantes, os seus desejos e motivações, o museu e o seu funcionamento e até mesmo outras questões relacionadas com a aprendizagem.

A sistematização da avaliação em museus representa a aplicação prática dos valores que surgiram com a vaga pós-moderna. Através da avaliação, o museu objetiva conhecer os impactos provocados nos seus visitantes e, em maior escala, na comunidade que o rodeia. Avaliar é, portanto, essencial para um museu que tem por missão ser uma instituição democrática, autorreflexiva e parte integrante do espaço público.

Apesar de a avaliação ser tida como algo muito importante para as instituições, a sua implementação não é tão comum quanto isso. Em Portugal, começam a dar-se os primeiros passos na sistematização da avaliação. Alguns trabalhos relativos às práticas avaliativas são essencialmente produzidos no âmbito académico, esporadicamente realizados, referindo-se a estudos de caso (Beites, 2011; Guapo, 2009, Vieira, 2009). Recentemente começaram a surgir estudos de avaliação da responsabilidade de organismos da tutela e que, pela sua dimensão, poderão fornecer dados mais sistemáticos sobre os museus portugueses.