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4.2 Análises das entrevistas

4.2.2 O docente, as tecnologias e a prática pedagógica

Quando perguntados sobre como aprenderam a usar a tecnologia cinco docentes alegam que já tinham habilidades para lidar com elas e por isso na escola foram indicados pelos colegas para trabalhar com as TIC, exatamente os mesmos cinco que no item anterior demonstraram uma imagem idealizada da tecnologia, colocando-se como partidários ao seu uso no âmbito escolar. Para esses cinco os primeiros contatos com a TIC ocorreu de forma tranqüila.

Paulo Vega aprendeu sozinho por curiosidade e por iniciativa própria. Continua sempre buscando aprimorar seus conhecimentos. Tem facilidade para lidar com a tecnologia e a usa para preparar material didático para suas aulas

aprendi sozinho, sou curioso mexedor, não fiz curso. Eu monto meu vídeo, né (sic), então é outra coisa. Naquele blog, por exemplo, que eu estou fazendo agora de geografia, no caso. Lá já tem as atividades que eu monto em casa para os alunos. Eu pego as imagens que eu acho interessante, eu monto um texto, um banco de dados conforme o nível que eu sei que eles vão entender. Até onde eles podem chegar os exercícios já vão estar lá prontos também. É uma coisa assim, você sabe o que está fazendo. Você produz seu material (Paulo – professor da EJA da Escola Vega).

Para César Antares a aprendizagem e o uso da tecnologia decorrem da sua experiência profissional, na qual teve a oportunidade de fazer cursos para lidar com software e aplicativos no escritório onde trabalhou, mas se percebe que sua visão da tecnologia é bastante tecnicista, tendo já ministrado aulas de mecanografia também

eu nunca tive um curso específico na área de linguagem, mas a gente teve profissionalmente aqueles cursos que eles deram de internet, sistema operacional, excel, word, internet explorer, foram essas ferramentas e aplicativos que a gente fez cursos mesmo com programadores e analistas de sistemas para utilização de software. Então quer dizer, aqui na escola, pelos nível dos alunos a gente consegue repassar isso para eles. Mas você perceber que eles conseguem interagir ter o conhecimento do processo técnico (César – professor da EJA da Escola Antares).

Por sua vez Dora Polaris aprendeu a usar da tecnologia em casa com parentes e filhos e na escola trabalha mais com pesquisa e é a responsável por zelar pelos computadores da escola, como administradora de ambiente, sem contudo ter muito conhecimento técnico. A função do administrador de ambiente na escola é abrir chamado para consertar algum defeito nos computadores da escola, providenciar login para os professores e alunos. Enfim ser um elo de ligação da escola com a PRODABEL e a GPLI

foi mais conhecimento meu mesmo que fui adquirindo em casa, com parentes, filhos. É editor de texto, navegar na internet também, pesquisas, e-mails, planilhas. Na biblioteca é mais para pesquisa. Quando o aluno procura, a gente orienta como pesquisar. Aqui sou também administradora de ambiente nessa área de informática, apesar de não ter tanto conhecimento, assim não sou expert (Dora – professora do EF da Escola Polaris).

Para Ana Vega a aprendizagem foi em casa com o marido, mas como tinha medo de estragar o computador procurou ajuda em um curso básico de informática

no princípio eu tinha assim acho que uma certa resistência à máquina eu tinha medo até de mexer e errar. Fiz um curso, só que eu tinha um computador em casa que era o que meu esposo usava para trabalhar, então eu só mexia quando ele tinha um tempinho para me ajudar, então não fazia muito uso não. Mas depois do curso da prefeitura que eu comecei a utilizar para fazer as matrizes, usar a Internet para pesquisas, para notícias, e-mails dos amigos, o MSN que eu utilizo muito (Ana – professora do EF da Escola Vega).

Conclui-se pela análise dessas falas que os sujeitos entrevistados aprenderam a lidar com as TIC utilizando como estratégias: a aprendizagem autodidata por iniciativa própria, no próprio local de trabalho, ou no ambiente familiar, ou ainda em cursos oferecidos pela GPLI/SMED. Isso demonstra que esses docentes não se acomodaram e vêm mobilizando esforços para melhor compreender o significado e as conseqüências do uso da tecnologia, buscando sempre a melhor maneira de integrá-la ao seu trabalho, mesmo que lhes falte ainda maiores habilidades e competências para isso, visto que a formação do docente nesse sentido ainda tem muito que avançar.

Em relação às estratégias utilizadas pelos docentes para lidar com a tecnologia no âmbito escolar essa investigação demonstrou o que Sancho (2006) e também Miranda (2007), preconizaram em suas pesquisas. Acrescentar a tecnologia às atividades já existentes na escola e nas salas de aulas, sem contudo nada alterar nas práticas de ensino não produz resultados condizentes com a potencialidade presente nas TIC.

É preciso construir novas formas de organização do espaço e do tempo nas escolas para que se integrem, de fato, as tecnologias ao processo educacional. Tratando-as não apenas como um apêndice menos importante que as outras disciplinas curriculares ou um prêmio para os alunos bem comportados que poderão utilizá-las, mas considerando o seu uso no desenvolvimento dos componentes curriculares, apoiando todos os demais conteúdos do currículo e com espaço, tempo e objetivos institucionalizados pelo projeto político pedagógico. E dessa forma não ser apenas mais um modismo passageiro.

Isso pode ser confirmado pela fala dos docentes entrevistados que ainda não apresentaram clareza para distinguir o uso pedagógico do computador do uso do computador para ensinar informática. Muitas vezes o objetivo ao usar o computador refere-se ao ato de aprender a usá-lo para digitar um texto, navegar na internet ou jogar um jogo educativo. O uso pedagógico para trabalhar os conteúdos curriculares aparece na fala, mas se perde na prática. Isso aparece de forma significativa na fala do professor Paulo Vega

aqui basicamente é iniciação a informática mesmo, a gente começa com esses joguinhos iniciais de manejo de mouse e depois o que a gente enfoca mesmo aqui é o editor de texto e Internet. Aqui, tem as duas coisas, a proposta básica seria a iniciação mesmo da informática e dentro dessa iniciação a informática também a proposta pedagógica (Paulo – professor da EJA da Escola Vega).

Foi possível constatar que, ao invés de aprender a utilizar este novo aparato tecnológico em prol de aprendizagem significativa e do acesso universal ao conhecimento, os alunos estão sendo apenas capacitados tecnicamente no uso da tecnologia computacional, em aulas descontextualizadas, sem nenhum vínculo com as demais disciplinas e sem nenhuma concepção pedagógica.

Já no caso do professor César Antares percebe-se que quando os alunos já dominam as tecnologias executam trabalho de pesquisa e digitação rapidamente para sobrar mais tempos para navegar mais livremente na internet

o interessante é que os outros alunos que são das turmas mais avançadas, já trabalhei com eles o ano passado com pesquisa aqui. Eles já têm domínio, já sabem o que é

orkut, tem seus próprios e-mails então assim a pesquisa com eles foi excelente, mas esse trabalho didático a gente não consegue trabalhar com eles mais. Eles já dominam a tecnologia da informação. Eles fazem a pesquisa, mas uns ficam pedindo para ler seus e-mails, ver resumo de novela, então o aproveitamento com eles já não é o mesmo. Porque eles já têm acesso ou em casa ou no trabalho (César – professor da EJA da Escola Antares).

Percebe-se que, ao mesmo tempo em que serve para aprender informática, o computador pode tornar-se também objeto de possibilidades lúdicas para os alunos. Ainda é a falta de um projeto pertinente que os oriente, elaborado interdisciplinarmente com foco na aprendizagem, que impede o melhor aproveitamento da tecnologia pelos alunos e professores.

Na fala da professora Ana Vega nota-se uma preocupação em não deixar que os alunos transformem a sala de informática em LAN house43

quando eu vim para cá o laboratório funcionou mais como brincadeira. As outras professoras que trabalharam no laboratório antes de mim, os meninos só sabiam brincar, entendeu. Então a escola criou, até os meninos criaram essa mentalidade de que vêm para o laboratório para brincar. Depois que eu entrei é que eu comecei a colocar outras coisas. Os meninos não faziam pesquisas não faziam esse tipo de trabalho, claro que tem muitos jogos que são educativos só que a maioria dos jogos que eles brincavam era jogo mesmo tipo vídeo game, não tinha nada de educativo (Ana – professora do EF da Escola Vega).

A professora Ana Vega, por desconhecer as possibilidades educativas dos jogos eletrônicos preocupa-se em não transformar sua aula em uma atividade apenas lúdica, sem uma concepção educativa permeando os processos de ensino-aprendizagem. Os jogos do ponto de vista da criança constituem a maneira mais divertida de aprender. Concordando com as crianças, Valente (1993) defende que, nos jogos educacionais, a abordagem pedagógica utilizada é a exploração livre e o lúdico ao invés da instrução explícita e direta. Porém esses softwares podem ser incrementados com características de inteligência capazes de identificar os erros mais freqüentes e ajudar os alunos a superá-los, ou ainda auxiliar a resolução de problemas específicos. Existe ainda uma enorme variedade de jogos educacionais para ensinar conceitos que podem ser difíceis de serem assimilados pelas crianças (VALENTE, 1993).

No Libertas, sistema operacional usados nos computadores das escolas municipais, há uma grande variedade deles. Há a possibilidade de se trabalhar desde a aprendizagem da

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O termo LAN foi extraído das letras iniciais de "Local Area Network", que quer dizer "rede local", traduzindo assim uma loja ou local de entretenimento caracterizado por ter diversos computadores de última geração conectados em rede de modo a permitir a interação de dezenas de jogadores. O conceito de LAN House foi inicialmente introduzido e difundido na Coréia em 1996, chegando ao Brasil em 1998. A tradução para o português poderia ser "casa de jogos para computador". Cf. PIACENTINI, M.T.Q. Disponível em < http://kplus.cosmo.com.br/materia.asp?co=201&rv=Gramatica> Acesso 16 jun 2008

digitação até conceitos matemáticos, testes de química e aplicação de leis físicas. Entretanto, o grande problema com os jogos é que a competição pode desviar a atenção da criança do conceito envolvido no jogo. Na prática, o objetivo passa a ser unicamente vencer o jogo e o lado pedagógico fica em segundo plano (VALENTE, 1993).

Além disto, há jogos educativos disponíveis em sites educacionais. Mesmo que a maioria deles explore apenas conceitos extremamente triviais e não tenha a capacidade de diagnóstico das falhas do jogador, há uma maneira de se contornar estes problemas. Basta fazer com que o aluno, após uma jogada que não deu certo, reflita sobre a causa do erro e tome consciência do erro conceitual envolvido na jogada errada. É desejável e, até possível, que os docentes usem os jogos dessa maneira. Porém o obstáculo reside na formação recebida pelo docente para usar a tecnologia no processo ensino-aprendizagem, falta capacitação específica para aplicação de jogos educativos ao processo de aprendizagem (VALENTE, 1993).