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4.1 Análise dos dados das observações

4.1.2 O projeto político pedagógico e o plano curricular

A escola, ao orientar suas práticas para o fortalecimento de sua própria autonomia, pode construir o seu conceito de qualidade de ensino e adequar melhor a sua função às necessidades da comunidade. Para tanto, procura elaborar de forma participativa, o seu Projeto Político-Pedagógico, com a finalidade de apontar a direção e o caminho que vai percorrer para realizar da melhor maneira possível, sua função educativa. O PPP serve de instrumento teórico-metodológico, tomando como base as condições atuais e a realidade local.

Em relação a isso, Veiga, I. (1997) enfatiza que

a principal possibilidade de construção do Projeto Político-Pedagógico passa pela relativa autonomia da escola, de sua capacidade de delinear sua própria identidade. Isso significa resgatar a escola como espaço público, lugar de debate, do diálogo, fundado na reflexão coletiva (VEIGA, I. 1997, p.14).

O Projeto Político Pedagógico é uma cobrança da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96). Em seu artigo 12, inciso I, prevê que "os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, têm a incumbência de elaborar e executar sua proposta pedagógica", deixando explícita a idéia de que a escola não pode prescindir da reflexão sobre sua intencionalidade educativa.

Veiga, M. (2001) salienta também a importância da instituição escolar ter um plano pedagógico para nortear a equipe docente para o uso do computador como ferramenta no processo ensino e aprendizagem, no qual deverão estar traçados os objetivos, metas, aplicativos e softwares a serem utilizados. Desse modo, as diretrizes do uso do computador na escola, devem estar descritas no Projeto Político Pedagógico de cada escola de acordo com a sua realidade.

Com a implantação da escola plural instituiu-se o “tempo pedagógico” ou “reunião pedagógica” considerado como um importante espaço para a discussão e construção coletiva do projeto pedagógico das escolas da rede. Esse tempo correspondia a duas horas e ocorria semanalmente com a dispensa dos alunos, até então justificada pelo fato de o recreio ser

considerado tempo efetivo de atividade pedagógica. Esse espaço, fruto também da demanda dos trabalhadores, ganhou destaque nos dois Congressos Político-Pedagógicos realizados pela SMED/PBH, e se confirmou com uma das resoluções atendidas e incorporadas à rede. Nesse sentido, houve um fortalecimento e a legitimação desse tempo para que as escolas discutissem e construíssem o seu PPP. Entretanto, a partir de 2003 esse tempo foi considerado pela SMED como lesivo à carga horária do aluno e a reunião pedagógica passou de encontros semanais para reuniões coletivas aos sábados totalizando quatro encontros por semestre.

No PPP das três escolas observadas aparece de forma explícita que o projeto é fruto da discussão coletiva da escola, entretanto na prática percebe-se uma participação mais efetiva de uma equipe pedagógica dinâmica e de alguns professores e pais mais atuantes no sentido de mantê-lo atualizado, principalmente nas escolas Vega e Antares. Já o PPP da Escola Polaris encontra-se desatualizado e a justificativa apresentada pela coordenação da escola foi exatamente a falta de tempo para a discussão coletiva advinda com o fim da reunião pedagógica semanal. Como alternativa à falta de um PPP que os oriente, os docentes da Escola Polaris seguem fazendo projetos anuais específicos por ciclo, mas sem estabelecer objetivos de longo prazo nem diretrizes eficazes.

Em relação ao uso da tecnologia, o PPP das três escolas pesquisadas apenas apontam a necessidade de integrar o seu uso a prática pedagógica, mas de forma superficial, reconhecendo a sua importância no processo ensino-aprendizagem, sem contudo delinear uma proposta como objetivos concretos e ações eficazes. Nas escolas Vega e Antares, esse processo de discussão do uso pedagógico do laboratório encontra-se numa fase inicial, mas na Escola Polaris esse momento ainda não aconteceu, pois os professores parecem não considerar o espaço da sala de informática como um espaço integrado à escola.

Haveria a necessidade, conforme salienta Sancho (2006), de se promover uma cultura de mudança pedagógica e tecnológica nas escolas, oferecendo alternativas para superar as limitações que dificultam a assimilação desses ambientes tecnológicos às práticas pedagógicas dos docentes. Dessa forma, poderia se romper essa separação entre o espaço da sala de aula e o espaço da sala de informática integrando-os como espaço real para prática do processo ensino-aprendizagem.

Em relação ao Plano Curricular das escolas pesquisadas, tanto no ensino fundamental como na modalidade EJA, a Base Nacional Comum é composta dos conteúdos mínimos para o ensino, de maneira a assegurar uma formação básica comum, de acordo com os pressupostos dos PCNs e da Escola Plural. Já a parte diversificada, conforme explicitado no

capítulo três, as escolas trabalham diferentes conteúdos, de acordo com o contexto de cada uma, privilegiando questões como meio ambiente e cidadania, assim como a literatura e artes, e ainda, no caso das escolas Vega e Antares, a informática aparece também.

O plano curricular não só é o ponto de apoio como também a ponte entre a proposta pedagógica da escola e a práxis do corpo docente. O uso do termo “currículo” na educação esteve inicialmente ligado às concepções de “unidade, ordem e seqüência dos elementos de um curso, e a elas subjacentes as aspirações de se imprimir maior rigor à organização do ensino” (SAVIANI, N. 1994, p.43). E enquanto seleção de elementos da cultura, a definição dos contornos de um currículo é sempre uma, dentre muitas escolhas possíveis.

Tardif e Lessard (2005) também destacam essa autonomia na execução do trabalho que os docentes possuem, mesmo estando assim submetidos a um conjunto de controles e regras institucionalizadas e burocratizadas podem definir os meios educacionais e os processos de trabalho dentro na sala de aula. Os professores fazem a triagem e escolhem as finalidades que devem privilegiar na ação concreta em função dos recursos disponíveis, das necessidades dos alunos, de suas crenças, valores etc.

ao mesmo tempo em que segue padrões gerais o professor precisa considerar as diferenças individuais. Como agente da organização escolar ele deve agir de modo personalizado com os alunos. Integrando num quadro burocrático de trabalho, ele

deve comportar, ao mesmo tempo como um profissional autônomo (TARDIF E

LESSARD, 2005, p.109).

Sendo assim, a elaboração e a implementação do currículo hoje resultam de processos conflituosos, nos quais as decisões são sempre negociadas. Negociação, aqui diz respeito a relações políticas, de poder, de persuasão, de pressão, envolvendo conflitos e acordos, sejam eles explícitos ou tácitos, entre partes que proclamam e defendem interesses diversos, às vezes até antagônicos. Dessa forma, a principal negociação é a que ocorre na relação pedagógica propriamente dita, quando os professores redefinem a programação. Isso ocorre segundo as peculiaridades de cada turma, nas condições (possibilidades e limites, seus e dos alunos) para desenvolvê-la, bem como o número de turmas por etapa do ciclo que a escola vai ter a cada ano, no caso da rede municipal de Belo Horizonte, e vão freqüentemente alterando-a, a partir do modo como os alunos a ela respondem e a escola assim se organiza (SAVIANI, N. 1994).

No caso das escolas pesquisadas pode-se perceber que o fato da organização da grade curricular está diretamente relacionada à demanda de vagas a serem preenchidas anualmente. Ocorre também uma negociação em torno dos projetos que serão viabilizados e priorizados a

cada ano na escola. Por exemplo, se num dado ano o número de horas de projetos a que a escola possui permite que um professor fique responsável pela sala de informática, no ano seguinte isso pode não ocorrer. Isso é conseqüência do cálculo de 1.5 professores por turmas. O fator 1.5 é a base de cálculo para determinar o número de professores de cada escola da rede municipal. De acordo com esse parâmetro, a escola conta com o coeficiente de um professor e meio para cada turma existente na escola, ou seja, uma jornada e meia de professor para cada turma com vinte horas semanais de efetivo trabalho escolar.

Assim, simulando o cálculo de horas para uma escola como a Vega com 25 turmas e multiplicando esse número pelo fator 1.5 obtêm-se o total de 37,5 cargos de professores que a escola pode ter. Cada professor trabalha um total de 20 horas semanais (16 h regência + 04 h projeto de cada cargo) isso representa (multiplicando-se 37, 5 cargos por 20 horas de trabalho semanal) um total de 750 horas da escola que serão distribuídas para professores, alunos, coordenadores e projetos especiais. E aqui entra a negociação no qual o coletivo vai decidir se privilegia horas para coordenação, ou horas para projetos especiais como informática, arte educação, alfabetização e letramento etc.

Das 750 horas da escola, 500 horas (25 turmas vezes 20 horas de aula semanal) são para carga horária geral do aluno, sobram então 250 horas das quais se retiram 125 horas de projeto para os professores (4 horas para cada professor). Dessa forma às 125 horas restantes podem ser distribuídas, no caso específico da Escola Vega nesse ano, para uma coordenação pedagógica (20 horas) no turno da manhã (a outra coordenadora como é TSE não entra no 1.5); 40 horas para a coordenação da tarde e 20 horas para a coordenação da noite. A escola ainda fica com 45 horas de projetos para ser distribuídas entre os projetos especiais, no caso a informática, intervenção pedagógica, arte e educação.

Assim sendo, se no ano seguinte o número de turmas for alterado todas essas distribuições são refeitas e renegociadas, considerando-se então a demanda do projeto geral da escola e os projetos prioritários para os quais esse tempo pode ser deslocado. Ou seja, não se tem assegurada a continuidade de um projeto na escola esteja ele dando certo ou não, o que às vezes pode representar uma perda, quando o projeto é seguramente eficaz e produz bons resultados para os alunos, ou caso contrário, abre a oportunidade para que novos saberes ou aspectos do currículos sejam priorizados e assim trabalhados.

Como o uso da sala de informática não está institucionalizado nas escolas, previsto no PPP, delineado com princípios norteadores claros e com todas as ações que possibilitem a sua implementação e o seu desenvolvimento como ferramenta de ensino, acaba ficando a mercê

da negociação e do desejo de um professor ou grupo de professores, que o defenda e garanta a sua implementação. Dessa forma, não tem garantida a sua continuidade, pois quando o professor ou o grupo de professores desiste ou é transferido de escola o projeto perde força e a sala de informática fica subutilizada, como é o caso da Escola Antares e da Escola Polaris. Podendo o mesmo vir a acontecer futuramente com a Escola Vega.

Segundo Sancho (2006), para que o uso das tecnologias signifique uma transformação educativa é necessário que a mudança não fique apenas a cargo dos docentes, que terão mesmo que redesenhar seu papel e sua responsabilidade na escola atual. Para a autora as mudanças devem passar também pela esfera da direção da escola, da administração do sistema de ensino e da própria sociedade no sentido de promover a sua efetivação como um projeto da instituição e não somente um projeto de pessoas. Isso porque as pessoas passam, mas a instituição permanece.