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3 UNIVERSIDADE E DIREITOS HUMANOS

3.2 A UNIVERSIDADE BRASILEIRA

3.2.2 O Ensino Superior na Paraíba e a Universidade

O ensino superior na Paraíba começou junto aos colégios jesuítas e conventos, a exemplo do Colégio Nossa Senhora das Neves, dos conventos de Santo Antonio, do Carmo e do Mosteriro de São Bento, em João Pessoa. Depois da expulsão dos jesuitas, em 1759, esta função ficou com os Carmelitas. Em 1836, foi então criado o Lyceu e, em 1894, Seminário Diocesano (INEP, 2006).

Em 1934, a criação da Escola de Agronomia do Nordeste, José Américo de Almeida, primeira escola isolada de nível superior, foi parte do projeto de modernização do país, face à crise do modelo agro-exportador e implantação do modelo desenvolvimentista. Segundo

Coelho (2006), a escola foi pioneira em ações extensionistas (centros artesanais rurais, cursos abertos de economia rural e semanas ruralistas). Enquanto espaço de formação de tecnólogos, o Patronato Agrícola Vidal de Negreiros, em Bananeiras, criado em 1924, passou em 1931 à categoria de Instituto; mais tarde, em 1947, a Escola Agrotécnica; em 1964, a Colégio; em 1978, a Centro de Formação de Tecnólogos, sendo incorporado à UFPB em 1968 (TRAVASSOS, 2006).

Apesar da acentuada demanda para os cursos tradicionais (Medicina, Direito e Formação Religiosa), a Escola de Agronomia foi resultado dos anseios regionalistas defendidos por José Américo junto ao Ministro da Agricultura, Juarez Távora (LIMEIRA E FORMIGA, 2006).

Segundo Branco (2005, p.149 – 150), esta escola foi idealizada por José Américo de Almeida considerando o clima da região propício à agricultura, embora a elite da cidade de Areia idealizasse os cursos tradicionais como Medicina e Direito. A Escola de Agronomia só recebeu autorização de funcionamento em 1936, em face de dificuldades de recrutamento de professores, dificuldades financeiras, concorrência com as carreiras tradicionais e a sua localização. Os intelectuais, nos anos 1920 e 1930 no Brasil, no dizer de Limeira e Formiga (2006, p. 25) “se colocaram como portadores pensantes de um novo ideário cultural, postando-se assim explicitamente contra o antigo ideário oligárquico-agrário”. No entanto, esclarecem as autoras, o coronelismo agro-exportador imprimiu marcas profundas no início do ensino superior no estado. Os cursos técnicos vieram antes dos cursos humanísticos, assim como a criação de faculdades no Estado da Paraíba enfrentaram disputas com as forças dos estados de Pernambuco, Ceará e Bahia, onde se concentravam o ensino superior e a formação cultural do Nordeste, na época. Setores da classe média, assimilizadores de ideologias sociais das camadas superiores, inquietavam-se no sentido de galgar status: “Ao coronel de terras, sucedeu o coronel de anelão, o bacharel”, definem Limeira e Formiga (2006, p. 26).

Em 1947, foi criada a Faculdade de Ciências Econômicas, de âmbito particular, reconhecida pelo Decreto Federal nº. 30.236/1951 (BRANCO, 2005). Esta inauguração significou, segundo Limeira e Formiga (2006, p. 27), a superação da fase do ensino secundário para a do ensino superior na área comercial, até então, restrita ao ensino médio, instalando-se cursos de Ciências Econômicas, Ciências Contábeis e Administração Pública. Em Campina Grande, a Escola Politécnica, criada na década de 1950, surgiu como resultado do desenvolvimento técnico-industrial e do pólo de exportação de minérios naquela cidade.

A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, incluida na Constituição estadual de 1947, foi criada pelo Decreto Estadual nº. 146/1949, começando seu funcionamento no prédio ao lado do Lyceu Paraibano, envolvendo os cursos de Pedagogia, Geografia, História e Letras Neolatinas. O quadro docente foi, inicialmente, constituído por professores de faculdades de Pernambuco e de seminários católicos (BRANCO, 2005). Ainda em 1951, foi criada a Escola de Serviço Social, a partir de demandas de instituições religiosas e áreas oficiais pelo trabalho de assistência social. Em 1963, o perfil estudantil da FAFI alterou-se com a entrada de setores de renda média baixa, influenciando na participação ativa frente ao regime instaurado em 1964. Em 1968, a FAFI foi transformada em Instituto de Filosofia e Ciências Humanas e, em 1976, no Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes.

A Faculdade de Direito foi criada pela Lei Estadual nº. 69/1951, a partir das demandas formativas do próprio Estado e das famílias dos setores médios, recebendo doações de empresários e famílias tradicionais. A Faculdade de Medicina, Odontologia e Farmácia, aprovada pelo Decreto Federal nº.30.212/1951, só teve o curso de Medicina reconhecido em 1955. Tratava-se de uma demanda local não só das elites tradicionais, como dos serviços de saúde do setor público. A Faculdade de Odontologia foi resultado da luta empreendida pela Associação Paraibana de Cirurgiões-Dentistas. A Escola de Enfermagem da Paraíba surgiu em 1955 (BRANCO, 2005).

A Escola Superior de Engenharia da Paraíba redundou de um processo de mobilização do Clube de Engenharia, sendo criada em 1952. Além destas citadas, outras faculdades isoladas foram criadas na Paraíba, segundo a pesquisa realizada por Branco (2005), tais como: a Faculdade Católica de Filosofia de Campina Grande (1954) e a Faculdade de Ciências Econômicas de Campina Grande (1955).

O Centro de Ciências Jurídicas e Sociais, localizado em Sousa, foi criado como Fundação Padre Ibiapina pela Lei Municipal nº 704/1971. Em 1979, passou a ser a Fundação de Ensino Superior de Sousa, vinculada à UFPB, passando, em 2002, a integrar a Universidade Federal de Campina Grande – UFCG, desmembrada da UFPB.

Para Limeira e Formiga (2006), as dificuldades para criação e manutenção das faculdades, em um estado como a Paraíba, expressavam a tensão presente entre a crise de hegemonia dos setores agro-exportadores frente às novas elites urbano-industriais, diante da perspectiva desenvolvimentista que os países periféricos assumiam frente aos países capitalistas centrais; assim como tensões entre estados brasileiros na disputa da hegemonia pelo ensino superior. Segundo as mesmas autoras, as razões que moveram a criação da

Universidade da Paraíba, nos anos cinquenta, foram: a necessidade de enfrentar as dificuldades de fontes de financiamento das escolas superiores; a dependência em relação aos parlamentares; a ampliação do contigente de estudantes dos segmentos médios, ampliando a demanda de cursos; as dificuldades de infraestrutura das faculdades isoladas; as disputas locais e regionais entre os setores hegemônicos (latifundiários, burguesia comercial e industrial) por espaço no modelo industrial e desenvolvimentista; a ampliação do aparelho estatal, demandando a formação dos filhos das elites e setores médios da sociedade.

A criação da Universidade da Paraíba, pelo governador José Américo de Almeida (UDN), deu-se pela Lei 1.366, de 12 de dezembro de 1955. Neste ato, Almeida procurou, segundo Branco (2005, p. 170), articular a perpetuação das tradições articuladas às perspectivas modernas de desenvolvimento, pautadas pelo modelo industrial-exportador, tendo que obter o apoio de Juscelino Kubitscheck e Nereu Ramos (Ministro da Educação), uma vez que a medida implicava no desafogo financeiro e no desenvolvimento do estado da Paraíba.

Neste processo de criação foram incorporadas à Universidade de Paraíba as faculdades de Filosofia e Odontologia, as Escolas Politécnica e de Enfermagem, bem como foram agregadas as Faculdades de Direito, Medicina, Ciências Econômicas, Escola de Engenharia e Serviço Social (FERREIRA; FERNANDES, 2006). O campus universitário, antiga Fazenda São Rafael, foi doado à Universidade através da Lei nº 1.871, de 17 de novembro de 1958, pelo Governador Pedro Moerno Gondim (FERREIRA; FERNANDES, 2006).

A federalização da Universidade da Paraíba ocorreu pela Lei nº 3.835, de 13 de dezembro de 1960, quando foi transformada em Universidade Federal da Paraíba, envolvendo as faculdades e escolas de Areia, João Pessoa e Campina Grande. Foi no período de 1950 – 1961 que, segundo Melo, ocorreu um número elevado de federalizações de escolas isoladas no Brasil. Na palavra de Melo (2006), o estado da Paraíba, no Governo de José Américo, tinha condições objetivas para conquistar a federalização de suas escolas superiores.

A idéia de federalização surgiu como uma flor a liberação do Estado do pesado encargo de manter a instituição, embora precariamente. Para os professores e a funcionários, apresentava-se como uma perspectiva de melhoria salarial e para o alunado significava o ensino gratuito, ampliando dessa forma as oportunidades de acesso das camadas menos favorecidas da sociedade ao ensino superior (MELO, 2006, p. 39).

Segundo a autora, a solicitação de Abelardo Jurema ao presidente Juscelino Kubtscheck, neste sentido, foi parte de todo um processo de mobilização envolvendo não só interesses das elites locais, como de setores estudantis, que viam na federalização a possibilidade de expansão do acesso ao ensino superior, de enfrentamento das desigualdades regionais e de ampliação das possibilidades de ascensão social e formação profissional.

Os estudantes tiveram uma atuação marcante nesse processo. Participaram do movimento através dos diretórios acadêmicos, principalmente das Faculdades de Medicina, Engenharia e Direito, os mais destacados da época, e da UEEP (União Estadual de Estudantes da Paraíba) (MELO, 2006, p. 41).

Em 1950, havia também por parte da UNE, uma mobilização junto às suas bases estudantis pela defesa da escola pública e a federalização das faculdades isoladas. Na Paraíba, o processo de federalização da Universidade começou com mobilizações dos estudantes das faculdades de Direito, Engenharia e Medicina, no plano local, e com a participação de lideranças junto à Câmara Federal. Para Humberto Carneiro da Cunha Nóbrega, vice-reitor da UFPB em 1960, o processo de federalização foi iniciativa do deputado Abelardo Jurema junto ao presidente Juscelino Kubitscheck, cujo Plano de Metas previa o investimento do Estado para subsidiar a estrutura necessária para o processo de industrialização e desenvolvimento econômico (FERREIRA; FERNANDES, 2006). O Programa priorizou como metas energia e transporte, sendo na meta energia a ênfase dada à energia elétrica, energia nuclear, carvão mineral e petróleo; no setor de transporte, o ferroviário, o rodoviário, os serviços portuários e dragagem, a marinha mercante e o trasnporte aeroviário. No tocante ao ensino superior (BRASIL, 1958, p. 103), o Programa de Metas teve como prioridade “as escolas de engenharias, a instalação de 14 institutos de especialização de pessoal técnico e pesquisa, além de auxílio às instituições científicas existentes”.

Com a federalização, a Universidade da Paraíba conseguiu se estruturar como instituição de ensino superior. Com recursos obtidos, foi possível organizar o quadro docente e de funcionários. O ensino superior gratuito implantado teve reflexos na comunidade, permitindo o acesso das camadas menos favorecidas à Universidade (MELO, 2006, p.42).

Se, no início de criação da Universidade da Paraíba, seu Estatuto definia como finalidade a formação das elites dirigentes, o processo de federalização ampliou seu âmbito de ação, inserindo as demandas dos setores médios com as do próprio Estado. Tal processo,

segundo Melo (2006), foi parte do modelo industrial desenvolvimentista, que deslocou a economia do modelo agroexportador para o modelo industrial, assim como o locus da economia do campo para a cidade, movimentando e estendendo o espaço urbano e as possibilidades de mercado de trabalho para a mão de obra livre.

Novas formas de ascensão social foram apontadas à sociedade [...] Para ocupar os mais altos cargos burocráticos públicos ou privados, fazia-se necessário um elevado grau de escolarização. É ai que a universidade surge com a possibilidade de ascensão desse segmento. A demanda social pela educação, por sua vez, exerceu pressão na expansão não somente do ensino superior, mas em todos os níveis de escolaridade (MELO, 2006, p.40).

Para Gomes (2006, p. 51), o processo de federalização não resultou, como se esperava, na resolução dos problemas financeiros e de pessoal, presentes nas faculdades isoladas. Segundo a autora, o reitorado de Mário Moacir Porto, de 1960 – 1964, para obter verbas em Brasília, viajava às suas própias custas, e não havia, ainda, a infraestrutura necessária. Já a política autoritária, segundo Gomes, contrapunha à fase anterior, um processo de expansão e modernização conservadora, com a reforma universitária (1966), que tinha o modelo privatista norte-americano como parâmetro a ser seguido. Segundo a pesquisadora, a UFPB foi pioneira na implantação do processo de reforma, servindo de modelo para as demais universidades brasileiras. Em 1973, realizou a Reforma Cêntrica, quando extinguiu as faculdades, agrupando-as em centros.

Após 52 anos de federalização (1955 – 2002), a UFPB, pela Lei nº. 10.419, de 9 de abril de 2002, teve um processo de desmembramento, com a criação da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG, ficando esta com os campi de Campina Grande, Patos, Souza e Cajazeiras e a UFPB, com os campi de João Pessoa, Areia, Bananeiras. Posteriormente, foram criados na UFPB os campi de Rio Tinto e Mamanguape (FERREIRA; FERNANDES, 2006, p. 146).