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CAPÍTULO 3: MOBILIZAÇÃO SOCIAL PELAS REDES

3.4 O Facebook

Até aqui foram tratados os impactos das redes sociais no cotidiano dos indivíduos, nas formas de comunicação entre eles e nas suas interações – fundamentais para se compreender a dinâmica desta ambiência. Entretanto, o corpus de análise deste presente trabalho são as postagens de MSF para a campanha #TodosContraTB, que ocorreram entre os dias 11 e 16 de novembro de 2017, no Facebook. É importante, portanto, que se observe e se analise de forma mais aprofundada a história e as características da rede social de Zuckerberg e como os usuários interagem nela.

Apesar de sua data oficial de fundação ser considerada o dia 4 de fevereiro de 2004, quando Zuckerberg lança o Thefacebook, ainda apenas para a utilização dos alunos da Universidade de Harvard (em Boston, no Estados Unidos), a história da plataforma começa um pouco antes. Em outubro de 2003 o então universitário Mark Zuckerberg colocou no ar - com o apoio de seus colegas Andrew McCollum, Chris Hugles e Dustin Moskovitz - o site Facemash. Após acessar, sem autorização, os sistemas da Havard e

coletar as fotografias de estudantes da instituição que estavam disponíveis no cadastro da universidade, os alunos montaram e lançaram um site onde a foto de colegas estariam lado a lado e, caberia ao usuário, "votar" na mais atraente. Nas primeiras quatro horas online o Facemash recebeu 450 visitantes, com um total de 20.000 visualizações de fotografias. O site permaneceu apenas alguns dias no ar até que a direção da universidade solicitou sua exclusão, acusando Zuckerberg de ter violado as regras de segurança cibernética. (CORREIA; MOREIRA; 2014) Muitos consideram o Facemash como um primeiro rascunho da plataforma.

Em janeiro do ano seguinte, Zuckerberg inicia a programação e o desenvolvimento de uma nova plataforma, o Thefacebook, que, agora seguindo os padrões de segurança da informação exigidos por Harvard, seria lançado no mês seguinte. A nova plataforma, que permitia que usuários se conectassem, publicassem conteúdo e interagissem dentro dela estava no ar em fevereiro de 2004 e, em apenas um mês, já possuía metade dos estudantes de Harvard inscritos. (idem, ibdem)

A história da criação do Facebook foi conturbada desde sua origem. O Facemash rendeu a Zuckerberg um processo institucional na universidade que poderia tê-lo expulsado da universidade. Os alunos Cameron Winklevoss, Tyler Winklevoss e Divya Narendra acusaram Mark de utilizá-las durante o processo de programação do Thefacebook dizendo que estavam trabalhando para o desenvolvimento de uma outra plataforma, o "havardconnection.com". A acusação perdurou por anos entre as partes e terminou com um acordo judicial. (idem, ibdem)

Na página oficial do Facebook, a empresa se posiciona como um produto ou serviço que tem como missão “oferecer às pessoas o poder da partilha, tornando o mundo mais aberto e interligado” (Facebook, 2013) entretanto, do ponto de vista prático, pode- se defini-lo da seguinte forma:

O Facebook pode ser definido como um website, que interliga páginas de perfil dos seus utilizadores. Tipicamente, é nestas páginas que os utilizadores publicam as mais diversas informações sobre eles próprios, e são também os utilizadores que ligam os seus perfis aos perfis de outros utilizadores. No essencial, a experiência do Facebook permite que os utilizadores se envolvam em três tipos de atividades: publicar informação pessoal relevante numa página individual com o seu perfil, ligar- -se a outros utilizadores e criar listas de amigos, e interagir com outros utilizadores. (CORREIA; MOREIRA; 2014. p. 1)

A ascensão da companhia aconteceu de forma rápida. Ainda no verão de 2004 a empresa passou a ter sede em Palo Alto, na Califórnia. Em 2005, aconteceu a mudança do nome para apenas Facebook, quando foi realizada a compra do domínio www.facebook.com. Ao fim do mesmo ano a plataforma já estava disponível para 800 redes universitárias. Em 2006, o número subiu para 22.000 organizações (agora incluindo não apenas universidades) com direito a utilizar o site e, ainda no mesmo ano, o acesso foi aberto para qualquer usuário conectado, acima de 13 anos e com um e-mail válido. Daí em diante iniciou-se um aumento exponencial no número de usuários, como pode ser verificado no gráfico abaixo, que compara o crescimento de indivíduos inscritos na plataforma entre 2004 e 2012. (idem, ibdem)

Figura 3: Número de utilizadores do Facebook (CORREIA; MOREIRA. 2014)

O Facebook, ao longo dos anos, foi somando números robustos de acessos, usuários cadastrados, tempo de permanência na plataforma e conteúdos compartilhados em seu interior. Com a popularização dos smartphones e o desenvolvimento do aplicativo, o Facebook passou a acompanhar os usuários em toda a sua rotina (e a coletar dados inerentes a elas).

Apesar de americana, a plataforma possui 89% de seus utilizadores fora dos Estados Unidos, estando disponível em mais de 70 idiomas, o que reforça a capacidade da ferramenta de conectar pessoas distantes independente da sua localização geográfica. Embora a companhia tenha divulgado que os algoritmos priorizem o compartilhamento de conteúdo produzido por conexões e evita sugerir que os usuários se conectem com

perfis de outros países. Mesmo que o país com maior número de usuários na plataforma seja a Índia, aproximadamente 24 milhões de usuários em 2017, é pouco provável que um brasileiro já tenha recebido sugestões de conexão com um indiano, por exemplo.

Em junho de 2017, o Facebook anunciou em forma comemorativa que havia alcançado um total de 2 bilhões de usuários. Ou seja, duas em cada sete pessoas no mundo estão cadastrados na plataforma. E o Brasil é o terceiro país com o maior número de usuários cadastrados, que totalizavam os 139 milhões de usuários em 2017, o que significa 6% do total de membros cadastrados na plataforma.

Do ponto de vista de marca, segundo a revista Forbes, em 2016 a companhia possuía a décima quinta marca mais valiosa do mundo, com um valor de mercado estimado em mais de 32 bilhões de dólares. A captação de dados dos usuários e a conversão das informações em segmentação para anúncios, fez da plataforma uma boa oportunidade para marcas que desejavam anunciar com um custo relativamente baixo em relação as demais mídias, e com um nível de segmentação e mensuração que foi sendo otimizado com o passar dos anos. O que rendeu, em 2013, uma receita anual de 7.87 bilhões de dólares60 para a companhia.

A principal fonte de receita do Facebook vem dos anúncios publicitários inseridos na plataforma que escolhem a plataforma, dentre os demais motivos, pelo nível de assertividade da segmentação oferecida. É possível, por exemplo, que uma ação de MSF tenha suas publicações direcionadas para o público de uma região, gênero, faixa etária e/ou com interesses específicos, o que leva a refletir sobre as questões relacionada à privacidade dos dados dos usuários.

As políticas de privacidade e os termos de uso que os usuários assinalam que leram e concordam com seu conteúdo antes de entrar na plataforma são poucos convidativos e claros, com sua linguagem técnico-jurídica, letras miúdas e um grande número de páginas. Com base em Fuchs (2014), que traz em seu livro "Social Media: a

critical introduction" críticas consistentes às redes sociais (em especial ao Facebook) e

uma análise detalhada das complicações relacionadas à privacidade dos usuários na plataforma. O autor toma como partida a definição de controle da privacidade pelos

60 Disponível em https://investor.fb.com/secfiling.cfm?filingID=1326801-14-7&CIK=1326801. Acessado

indivíduos de Westin (1967): “Privacidade é a reivindicação de indivíduos, grupos ou

instituições para determinar quando, como e até que ponto as informações sobre eles são comunicadas aos outros.61” (WESTIN apud FUCHS; 2014. p. 156, tradução nossa).

O Facebook não oferece um nível detalhado de transparência sobre seus algoritmos e a utilização e análise dos dados, o que faz com que se questione quais informações são processadas, como e quem tem acesso a eles. O escândalo da Cambridge

Analytica, já abordado no subcapítulo 3.2, expõe indícios de que os dados dos usuários

podem ser utilizados para fins pouco republicanos e, embora Zuckerberg tenha prometido tomar medidas de proteção e mitigação de riscos em plena corte americana, a complexidade do tema e a falta de transparência da companhia não permite que se tenha certeza se os avanços, análises e medidas de fato ocorreram.

A questão é até que ponto o controle dos dados dos usuários no Facebook é uma forma de controle das instituições e grupos hegemônicos. Ferramentas de monitoramento permitem que o Estado, empresas e grupos acompanhem em tempo real a organização de mobilizações, por exemplo, e tomem medidas para inibi-los ou contê-los. Ter ciência do monitoramento constante da rede e das utilizações de seus dados pelos grupos hegemônicos é fundamental para que se planeje e se execute as ações contra- hegemônicas.

61 Tradução: “Privacy is the claim of individuals, groups or institutions to determine for themselves when, how, and to what extent information about them is communicated to others.” (WESTIN apud FUCHS;