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CAPÍTULO 3 – O ESCRAVISMO NO BRASIL

3.5. O fim da escravidão

Todo o processo de escravidão no Brasil durou cerca de quatro séculos. Neste período devido a uma série de motivos que procurarei descrever abaixo, este processo teve fim. Longe de ter sido um ato isolado, de benevolência da Regente, como ainda consta no imaginário das pessoas, a abolição foi fruto de um processo de reivindicações e lutas tanto de negros como de brancos, assim como uma luta por parte dos senhores pela manutenção de um sistema de produção onde a mão de obra escrava ainda era considerada por eles como a melhor, dada a

posse que detinham sobre o escravo, mas que não coadunava com o contexto internacional e com a s relações de trabalho que estavam postas.

Segundo Valente (1994, p. 28), “no século XIX, o mundo passava por grandes transformações. Com a Revolução Industrial, novas técnicas de produção surgiram e novas formas de aumentar os lucros passaram a ser utilizadas”.

A Inglaterra havia abolido a escravidão em suas terras desde 1833. Tornou um país capitalista e para sucesso de seus interesses econômicos eram necessários mercados consumidores mais amplos.

Neste período, o Brasil passou a ser alvo das estratégias inglesas contra a escravidão. Com a proclamação da Independência e a necessidade de apoio internacional para o reconhecimento desta nova situação nacional, o apoio inglês era de grande importância.

Somente em 1850 o Brasil sanciona a lei que proíbe o Tráfico Negreiro no Brasil. Mesmo assim, havia um tráfico interno de escravos sendo deslocados de uma região para outra, na qual a perversidade continuava a ser a marca deste período. (Nestes deslocamentos, inclusive famílias eram separadas).

Embora havendo o tráfico interno, a escassez de mão de obra começava a aparecer. A vida útil de um escravo era de 7 a 10 anos, devido aos maus tratos (PINSKY, 2000); não havia mais como repor a mão de obra, também as fugas para os quilombos eram uma constante.

Quando houve a Guerra do Paraguai em 1865-70, muitos escravos foram enviados para defender o país, com a promessa de que seriam alforriados se voltassem vivos. Segundo Valente (1994, p.29), houve um grande extermínio de negros nesta guerra: “estima-se que a população do Império antes dessa guerra era constituída por 45% de negros e que, após o confronto, esse contingente tenha diminuído para 15%".

Estes fatos, aliados a outros, foram desmoralizando o sistema escravocrata. Mas, devido à persistência dos senhores em manterem suas propriedades e mercadorias, a Abolição foi sendo concedida gradualmente.

Em 1869, a Câmara dos Deputados apresentou vários projetos, visando à melhoria das condições de vida dos escravos que propunham a abolição dos castigos físicos, a emancipação dos filhos de mãe escrava, a concessão aos escravos do direito de comprar sua

alforria, emancipação dos escravos pertencentes ao governo, proibição do trabalho nas cidades, dentre outros, porém nem todos foram aprovados.

[...] aprovou-se em agosto um projeto originário do Senado, proibindo a separação de casais e de filhos menores de 15 anos. Proibiram-se também, os leilões públicos de escravo, salvo exceções, estabeleceu-se o direito do escravo comprar sua alforria após a morte do seu senhor, mas somente se não houvesse oposição por parte dos herdeiros (COSTA, 1982, p. 42).

A lei do Ventre Livre de 1871 tornou livres os filhos de escravos nascidos após esta data. Era uma lei um tanto contraditória como uma criança nascida livre o seria se a mãe continuaria cativa? Ou seja, a criança permaneceria escrava, sob a tutela dos senhores até completarem oito anos. Segundo Costa (1982, p. 47), “(...)chegando a criança a esta idade, o proprietário poderia optar ou por entregar a criança ao estado recebendo indenização equivalente a 600$000, ou por mantê-la até a idade de vinte e um anos” e, neste caso, deveria prestar serviços gratuitos ao senhor em retribuição aos anos de tutela até completar os vinte e um anos. Nesta perspectiva, esta lei era um engodo frente às lutas por liberdade que eram travadas por escravos cativos e homens livres.

Depois de sancionada e aprovada a lei do Ventre Livre, há um crescente no movimento para a libertação total dos escravos. O movimento abolicionista ganha adeptos e força após esta primeira vitória.

O abolicionismo era, além do mais, uma causa generosa e cristã e falava aos sentimentos filantrópicos que a sociedade cultivava. Ser a favor da emancipação dos escravos era ser a favor do progresso e da civilização, pois a escravidão fora condenada em nome do progresso e da civilização nos países mais desenvolvidos (COSTA, 1982, p. 63).

Na mesma proporção que este movimento abolicionista atraía jovens e profissionais mais experientes, crescia o embate com os senhores de escravos e os políticos que defendiam a manutenção do sistema escravocrata, com constantes petições ao Parlamento para que colocasse fim a estas manifestações, sob os argumentos de que “o abolicionismo era um movimento artificial, promovido por desordeiros e irresponsáveis que ameaçavam o futuro da Nação” (COSTA, 1982, p. 64).

Por outro lado, também crescia a violência dos escravos para com seus senhores e dos senhores para com os escravos, a ponto de que sob o argumento de que haveria qualquer manifestação, os senhores convocassem a polícia e seus capangas.

A situação estava ficando fora de controle, a sociedade polarizada, o que para os escravistas era crime, para os abolicionistas era ato de defesa e vice-versa. Da mesma forma que a opinião pública era manipulada por ambos os grupos quando os crimes praticados pelos escravos chegavam às manchetes, os escravistas acusavam os abolicionistas de serem os responsáveis pela desordem, e os abolicionistas denunciavam a violência cometida pelos proprietários, argumentando que somente a abolição poderia pôr fim a essa situação.

Foi neste contexto que o projeto de emancipação dos sexagenários foi apresentado a Câmara pelo Ministério Souza Dantas.

Apesar de dar a liberdade apenas para os escravos com sessenta anos ou mais, esta lei não deixou de causar polêmica, pois o que estava em jogo era a posse, a justificativa de indenização por parte do governo, uma vez que estavam tirando dos mesmos a posse sobre sua propriedade escrava.

Mais uma vez, houve a agitação e mobilização da opinião pública, o que contribuiu para acelerar as reivindicações dos abolicionistas, enquanto provocava reações violentas por parte dos escravistas (COSTA, 1982). Entretanto, os abolicionistas tiveram êxito e, em 1885, foi sancionada a Lei dos Sexagenários.

A abolição total da escravidão seria uma questão de tempo, pois havia se tornado uma causa popular contando com o apoio da população e também da classe média, e de alguns representantes da elite. Possuía, também, o apoio da Princesa e do Imperador.

A solicitação dos militares requerendo à Princesa dispensa para a captura de negros fugidos foi um golpe de derrota para os proprietários de escravos.

Segundo Costa (1986, p. 71),

“O golpe final da escravidão seria dado pelos escravos que, auxiliados pelos abolicionistas e contando com o apoio e a simpatia da maioria da população, começaram a abandonar as fazendas, desorganizando o trabalho e tornando a situação insustentável”.

Então, em 13 de maio de 1888, a então Princesa Regente Isabel assinou a lei que poria fim à escravidão no Brasil:

Lei nº 3.353 de 13 de maio de 1888, que declara extinta a escravidão no Brasil. A princesa Imperial, Regente em nome de sua majestade o Imperador Senhor D. Pedro II, faz saber a todos os súditos do Império que a Assembleia Geral decretou e Ela sancionou a Lei seguinte:

Artigo 1º. E declarada extinta desde a data desta Lei a escravidão no Brasil. Artigo 2º. Revogam-se as disposições em contrário.

Manda, portanto, a todas as autoridades a quem o conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a cumpram e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nela se contém.