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O fluxo dos Barcos de linha no município de Manacapuru-AM

PARTE I – TRANSFORMAÇÕES NA AMAZÔNIA NO INÍCIO DO SÉCULO

CAPÍTULO 3 – MANACAPURU E AS MUDANÇAS NAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS, NACIONAIS E REGIONAIS

3.4. O fluxo dos Barcos de linha no município de Manacapuru-AM

Por causa da sua localização geográfica, a cidade de Manacapuru tornou- se, nas últimas décadas, um importante entreposto comercial e ponto de conexão entre as rotas fluviais dos rios Solimões, Manacapuru, Purus e dos inúmeros cursos de navegação, tais como lagos, paranás, furos e igarapés69.

Esse fato ocasionou o desenvolvimento de um intenso transporte fluvial de passageiros e cargas, denominado regionalmente de “motor de linha” ou simplesmente “recreio”, considerado, para as dimensões da Amazônia, como de pequena e média distância, ou seja, entre uma hora e meia e oito horas de viagem. Assim, a cidade de Manacapuru recebe barcos de linha procedentes tanto de outros municípios como Caapiranga, Anamã, Beruri e Manaquiri, como das mais diversas localidades do município, nas quais residem os camponeses- ribeirinhos. (Quadro II e Fig. nº. 15).

Desse modo, inúmeras comunidades ribeirinhas das diferentes localidades do município de Manacapuru são servidas diariamente por essa modalidade de transporte fluvial, que além de transportar passageiros e cargas, tem a função de levar correspondências, como se fossem correios, além de recados e encomendas como remédios e outros.

Nogueira (1999) enfatiza que esse tipo de transporte fluvial de pequena e média distância surgiu:

....basicamente da necessidade de locomoção dos habitantes dos lagos, paranás e igarapés, e de sua pequena produção agrícola e extrativa, ou ainda para o abastecimento de um pequeno comércio flutuante (uma mercearia sobre toras de madeiras), os proprietários de barco, que hoje cumprem uma linha regular, passaram a aliar o transporte próprio com a prestação de serviços de locomoção de seus vizinhos de igarapés ou lagos, em troca de um pagamento que cobrisse ao menos o custo do combustível”70.

É importante ressaltar que antes da intensificação dos barcos de linha os camponeses-ribeirinhos transportavam sua produção agrícola e extrativa por meio da utilização das canoas e batelões. Estes últimos eram embarcações grandes,

semelhantes aos barcos atuais, porém, sem a presença de motores e geralmente com cobertura de palha. Em ambas as situações os camponeses-ribeirinhos empregavam, para esse tipo de transporte, o uso do remo. Em viagens mais longas, tendo por destino Manaus, por exemplo, utilizavam, quando possível, o reboque executado por lanchas com motores de centro.

A partir da década 60 do século XX, com o surgimento dos barcos de linha ou motores de linha, o uso do remo e do reboque na várzea de Manacapuru foi paulatinamente sendo abandonado como meio de transporte. Os camponeses- ribeirinhos, assim como a sua produção passou a ser transportado por esse novo segmento de transporte fluvial. Com a consolidação desse tipo de transporte nas décadas seguintes, muitos camponeses-ribeirinhos na várzea de Manacapuru começaram progressivamente a abandonar sua produção e passaram a entregar a mesma para os donos ou encarregados dessas embarcações que começaram a executar regularmente linhas para as diferentes localidades do município71. Estes assumiram uma nova função a de negociar, na cidade, os produtos enviados pelos camponeses-ribeirinhos, no qual não é estabelecido nenhum preço prévio entre esses atores sociais. Muitas das vezes, os produtores somente tomam conhecimento do preço pago pelo seu produto, quando os barcos de recreio retornam da viagem72.

A maioria dos proprietários ou encarregados dos barcos de linha são oriundos das próprias comunidades rurais, em geral, possuem outras atividades como agricultura, criação de gado bovino e/ou uma casa de comércio, seja em terra ou flutuante. Os estabelecimentos comerciais localizados nas diferentes comunidades rurais do município, que antes eram abastecidos pelas viagens das canoas e batelões com o uso do remo e/ou do reboque, passaram a sê-los pelos barcos de linha, os quais mantêm atualmente uma linha regular.

70 NOGUEIRA, Ricardo José Batista, op. cit., p. 112.

71 CRUZ, M. J. M., op. cit., p. 67. 72 Idem, p. 68.

Quadro 02 – Linhas dos barcos no município de Manacapuru-AM

Localidade

Rio Solimões Nome do Barco Horas Nº. de viagens

na semana Costa do Marrecão Costa do Paroá Costa do Canuboca Paraná do Jacaré Vila do Jacaré Jesus me deu e Comandante Sales 01:30 02:00 03:00 03:30 03:30 Diário Costa do Paratari Ilha do Paratari Costa do Ajaratuba Comandante Alcimar 04:00 04:30 05:30 Diário

Ajaratubinha Silas Moisés 05:00 Diário

Paraná do Paratarizinho Nizinho e Isaias 05:00 Diário

Paraná Mundurucus Almirante Luz 05:00 Diário

Costa do Supiá Ilha do Supiá Isaías 03:00 03:00 Diário

Paraná do Barroso Rei Davi 03:00 Diário

Ressaca do Pesqueiro Sena Filho 04:00 Diário

Tuié

Repartimento do Tuié Siduzinho I

06:00 07:00

Duas vezes

Vila Pupunha SiduzinhoII 07:00 Duas vezes

Vila Caviana Nª. Sª. do Carmo 08:00 Quatro vezes

Localidade

Rio Manacapuru Nome do Barco Horas Nº. de viagens

na semana

Vila Sacambu Gérson Caio 03:00 Duas vezes

Vila Campina Comandante Audilene 05:00 Duas vezes

Vila Araras - - Duas vezes

Ena

Vila Membeca

Comandante Gomes 05:30

06:00

Duas vezes

Paraná do Piriquito Rei Davi I 04:00 Duas vezes

Jaitéu de baixo Jaitéu do meio Jaitéu de cima Odanias Filho 01:30 01:50 02:30 Diário

Localidade Outros Municípios

Nome do Barco Horas Nº. de viagens na semana

Anamã (rio Solimões) Expresso Regional I Maria Luiza

04:00 08:00

Diário

Manaquiri (rio Solimões) Santa Maria 04:00 Diário

Beruri (rio Purus) Expresso Regional II 06:00 Diário

Caapiranga (rio Manacapuru) Maria Vitória 03:00 Diário

Fonte: Trabalho de campo/2006.

Org.: Manuel de Jesus Masulo da Cruz/2006.

Apesar da difusão dos barcos de linha, inúmeras localidades do município, nas quais estão incluídas diversas comunidades rurais, não são servidas por esse tipo de transporte. Nesses casos, o transporte é realizado por barcos e/ou canoas motorizadas, principalmente com motor “rabeta” da própria comunidade73. Essas

comunidades, comparadas com aquelas que são servidas regularmente por barcos de linha, enfrentam muitas dificuldades tanto no que diz respeito ao abastecimento dos estabelecimentos comerciais como no escoamento da produção para o mercado de Manacapuru e/ou Manaus. São localidades que apresentam um certo grau de isolamento. Das localidades definidas para essa pesquisa, somente o lago São Lourenço, que apesar de estar localizado próximo à sede do município, não é servido por barcos de recreio.

A frota que atua no município de Manacapuru é composta por barcos que medem em torno de 25 a 30 m, com capacidade, estipulada pela capitânia dos portos, para 50 passageiros. Essa frota “nunca sofreu nenhuma regulamentação do poder público no que concerne à concessão de linhas, tarifas, ou mesmo a construção de um porto público para embarque/desembarque” 74. No entanto, tem funcionado com certa regularidade, desempenhando um importante papel nas relações de interdependência entre as comunidades rurais e a cidade de Manacapuru75.

73 PINTO, Ernesto Renan Freitas, op. cit., p. 33. 74 NOGUEIRA, Ricardo José Batista., op. cit., p. 111. 75 PINTO, Ernesto Renan Freitas, op. cit., p. 25.

LEGENDA

Rio Solimões

Jesus me deu e Comte. Sales Comte. Alcimar Silas Moisés Nizinho e Isaías Almte. Luz Isaías Siduzinho I Siduzinho II Nossa Senhora do Carmo Sena Filho Rei Davi Rio Manacapuru Gérson Caio Comte. Audilene Comte. Audilene II Comte. Gomes Comte. Gomes II Odanias Filho Outros Municípios

Expresso Regional I e Maria Luiza Santa Maria Expresso Regional II Maria Vitória P/ Beruri P/ Anamã P/ Manaquiri P/ Caapiranga 0 10 20 30Km ESCALA

Fonte: imagem de Satélite Landsat/Piatam Apoio Técnico: Marcos Castro/2007 Org.: Manuel de Jesus Masulo da Cruz/2007