• Nenhum resultado encontrado

A Segunda Guerra Mundial e o fim do domínio da Companhia Industrial Amazonense S/A

Fig nº 16 Formas de uso da terra, da água e da floresta na várzea de Manacapuru-AM

4.3. A cultura da juta

4.3.2. A Segunda Guerra Mundial e o fim do domínio da Companhia Industrial Amazonense S/A

Com o início da Segunda Guerra Mundial, em setembro de 1939, o mercado mundial de juta foi afetado de forma significativa. Países produtores dessa matéria-prima, como a Índia, por exemplo, o maior produtor e exportador de juta do mundo, têm um forte impacto na sua economia por causa do bloqueio às suas exportações durante o conflito95.

Para as indústrias brasileiras de fiação e tecelagem, a maioria localizada em São Paulo, o bloqueio imposto pela guerra às exportações de juta, vai trazer muitas dificuldades, devido à dependência da importação dessa matéria-prima do oriente. A alternativa foi recorrer à juta produzida no país. Isso impulsionou o aumento da produção dessa fibra na várzea amazônica. Nesse período, verificou- se um aumento significativo das áreas plantadas e a expansão de novas áreas para o cultivo da juta.

A entrada do Japão no conflito, principalmente a partir do ataque à base americana de Pearl Harbour, em dezembro de 1941, vai alterar significativamente o mercado regional de juta. Em janeiro de 1942, são rompidas as relações diplomáticas e comerciais com a Alemanha, Itália e Japão. Em seguida, uma série de ataques dos submarinos alemães aos navios brasileiros, motivou a promulgação do decreto-lei 4.166 de 10 de março de 1942 que estabelece o confisco de bens dos cidadãos alemães, italianos e japoneses em território brasileiro. Na Amazônia, inúmeros confiscos ocorrem, dentre dos quais os bens da

Companhia Industrial Amazonense S/A, que foram postos em leilões, sendo arrematados pela firma J.G. Araújo96.

Encerrava-se, assim, o monopólio dessa agroindústria japonesa no processo de beneficiamento e comercialização da juta na Amazônia. Em seu lugar assume a Companhia Brasileira de Fibras, subsidiária da Companhia de Juta de Taubaté que vai implantar um controle oligopsônico do mercado, no qual um pequeno número de compradores vai adquirir toda produção dos camponeses- ribeirinhos. Segundo Pinto (1982), “a partir desse momento o mercado se amplia em função da competição entre os intermediários pela compra da matéria- prima”97.

Ao término da guerra, em 1945, os fornecimentos de juta para o mercado mundial são restabelecidos pelos países do oriente. A grande oferta dessa matéria-prima, ocasionada pelo bloqueio durante o conflito, afetou os preços da juta na várzea amazônica. Tem-se, assim, a primeira crise no sistema de produção de juta na região. Por outro lado, as indústrias do sudeste vão se aproveitar da disponibilidade de juta no mercado internacional a preço baixo para atender sua demanda de matéria-prima, assim como para a formação de estoques. Com isso, ocorrem uma diminuição da produção na várzea e o agravamento da crise da agricultura da juta. Os mais prejudicados são os camponeses-ribeirinhos que vêem suas dívidas aumentarem nesse período, dificultando sua reprodução enquanto agricultores familiares.

Essa pauperização dos juticultores amazônicos nas áreas de várzea faz com que o Governo Federal tome uma atitude mais severa, em 1946/1947, proibindo a importação de juta da Índia. Essa medida vai favorecer os industriais de São Paulo e Belém, pois os mesmos são autorizados a efetuar a classificação dessa fibra, rompendo, assim, com a exclusividade na comercialização/exportação da juta pela Companhia Brasileira de Fibras na Amazônia. Nesse sentido, os industriais que são proprietários de fábricas de prensagem em fardos de 200 quilos vão assumir o processo de comercialização/exportação de juta, sendo beneficiado por lei para tal atitude. Assim, nesse período, toda produção do estado do Amazonas é direcionada para as seis fábricas de prensagem instaladas em Manaus, as cinco em Parintins e as duas em Itacoatiara.

A década de 1950 é marcada por profundas transformações no sistema de produção de juta. Nesse período, é implantado um moderno parque industrial de fiação e tecelagem na região. Em 1954, é instalada, na cidade de Manaus, a primeira unidade fabril de juta no estado do Amazonas. Vários fatores contribuíram para que fosse viabilizada a produção de manufaturados de juta e malva na Amazônia: em primeiro lugar e, talvez, o mais importante seja a política adotada pelo estado (federal e estadual) para facilitar, por meio de isenções de impostos e outras vantagens, o deslocamento das unidades fabris para próximo do centro de produção de fibras.

Outro fator apontado é a grande quantidade de mão-de-obra disponível na várzea amazônica, a custo baixíssimo, para produzir os fardos de juta. Na realidade, as indústrias de fiação e tecelagem, instaladas na região, não investiram capital para a produção da juta/malva a estratégia foi deixar essa função para os camponeses-ribeirinhos executá-la, pois o mais importante para esses capitalistas é adquirir a matéria-prima em condições de ser beneficiada, não importando, portanto, quais são as formas de produzi-lo. Dessa forma, esses capitalistas deixaram de imobilizar uma parte do seu capital que deveria ser utilizado na aquisição de terras e na contratação de força de trabalho para o processo de produção dessas fibras. Por outro lado, esses capitalistas passaram a receber parte do fruto do trabalho dos camponeses-ribeirinhos, representado pelos fardos de juta/malva produzida. Estes são transformados em mercadoria – sacaria principalmente, que ao ser vendida é transformada em dinheiro. Nota-se, portanto, um processo de monopolização do território pelo capital na várzea da Amazônia, na qual, este não expropria os camponeses-ribeirinhos de suas terras, mas apenas o subordina e se apropria da renda da terra dos mesmos. Esse processo é contraditório, pois para a produção do capital é necessário manter relações de produção não capitalista, como é o caso dessa relação de produção existente na várzea amazônica.

Outro aspecto que impulsionou a instalação das indústrias têxteis na região foi a disponibilidade de mão-de-obra, a baixo custo, para trabalhar no setor fabril. Acrescenta-se, ainda que essa mão-de-obra é utilizada somente uma parte do ano, devido à produção da juta/malva ser sazonal. Portanto, com a entrada em

funcionamento de um moderno parque de fiação e tecelagem, a partir da década de 1950, a região passa a exportar manufaturados de juta e malva, principalmente sacaria, em substituição à exportação de matéria-prima efetuada por setores mercantis. Segundo Noda (1985), esse fator requer alteração na oferta de fibras exigida pelo setor fabril, tanto no que diz respeito à qualidade como à quantidade do produto98.

A partir da década de 1960, os grandes comerciantes, dominantes na fase de expansão do cultivo da juta na região, como foi visto, começam a ter dificuldades em adquirir empréstimos bancários para o cultivo de grandes áreas.

A partir da década de 60, o capital industrial induz o sistema de crédito a limitar as áreas de cultivo, tomando como modulo a produção familiar. O crédito de custeio da pequena produção vai assim se sobrepondo ao crédito manipulado por intermediários que apoiavam seu controle sobre um determinado número de produtores diretos na utilização de financiamento bancário99.

4.3.3. Oscilações e crise no sistema de produção de juta/malva na várzea