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O Mago Bon-Po, seus atributos e seus Poderes.

No documento Tradição Bon Po (páginas 70-83)

O Tibet, mais do que qualquer outra parte do mundo, sofreu uma onda de deturpações, distorções e deslavadas invenções na literatura ocidental quase sem paralelo em qualquer época. Ao ler as supostas viagens de escritores que nunca saíram da cadeira, as estranhas lendas de magia, mistério e maravilhas espirituais que se supõe formarem a vida tibetana, a gente se lembra dos caprichosos mapas, dos antigos geógrafos. Quando não estavam seguros dos contornos de um ou outro lugar eles enchiam o espaço com lendas tais como "aqui vivem dragões".

Na verdade, o Tibet é um dos últimos países onde floresceu o budismo sem muita interferência de estrangeiros. Sua história budista, entretanto, demonstra que em desenvolvimento cultural ele está bastante atrasado em relação a lugares como Bamiyan no Afeganistão, onde, antes que o islamismo o substituísse, muito do desenvolvimento extra-indiano da arte e teologia budista teve lugar. E também o Tibet certamente não é impenetrável. É muito mais fácil entrar e ganhar a confiança dos lamas do que entrar em Meca ou tirar fotografias do túmulo de Mahdi no Sudão.

O segundo ponto a se lembrar a respeito do Tibet é seu tamanho. Os ocidentais que lá estiveram, em quase todos os casos, passaram a maior parte de seu tempo em Lhasa ou na parte que os tibetanos chamariam de "acessível". Vieram da Índia, Nepal e China. Alguns chegaram pela rota de Kashmir. Muito poucos, talvez nenhum, foram às áreas leste e nordeste, ao Turquestão Oriental e Mongólia. No entanto, são nessas partes que prevalecem os aspectos mais importantes do lamaísmo e bonismo.

O budismo é uma importação relativamente recente no Tibet. Existem, na verdade, mosteiros grandes e ricamente dotados, milhões de devotos. Nas partes ocidentais do país, diz-se que uma de cada oito pessoas é monge, freira ou acólito da jóia do Iótus. Essa parte da população foi profundamente afetada pelas idéias religiosas através da propaganda budista durante os mil e quinhentos e poucos anos da chegada da religião da Índia e desde então seu número cresceu com a migração de monges afegãos durante e depois da conquista muçulmana do Afeganistão.

Todavia, apesar de o Tibet ser chamado de "o país mais religioso do mundo", isso é também um exagero. Duma posição meramente antropológica o país está longe de ser urna unidade. Em primeiro lugar, existe a luta constante entre três elementos da parte budista: os budistas puros, que constituem o sacerdotado estabelecido, o público leigo e os tantras, que têm ganhado poder nos últimos 30 anos.

A Igreja budista estabelecida, tanto aqui como em todos os países que professam essa fé, não tem tempo para a taumaturgia mágicka e sobrenatural. A vida é dedicada à contemplação e ao aperfeiçoamento da alma como pré-requisito para a reencarnação. Não há atalhos para o Nirvana e as ambições deste mundo não são para o devoto budista ortodoxo. Por que então deveria ele se permitir a magia? Pelo contrário, a magia em todas as suas formas não só é mal vista entre o clero estabelecido do Tibete, como também claramente proibida. E o verdadeiro budista leva muito a sério sua religião. É por isso que se deve descontar resolutamente todas as alegadas histórias de maravilhas dos lamas de fé budista do Tibete.

O laicado, por outro lado, ainda está permeado até certo ponto de crenças derivadas em parte do animismo pré-budista do país (bonismo) e em parte da forma tantra de lamaísmo, afluente do rito ortodoxo.

Os lamas, de qualquer tendência, se inclinam a olhar com superioridade os não-iniciados, deixando-os seguir as práticas mágickas contidas nos poucos livros disponíveis. O acesso a livros de aprendizado mais eleva do e significado mais esotérico é, restrito não apenas por sua escassez, mas pelo obtuso de seu sentido.

Provavelmente, a maior parte do país está dominada grandemente pelo ministério "espiritual" do Iamaísmo não-ortodoxo e particularmente do bonismo. Pode-se dizer que o bonismo, se parece intimamente com a religião taoísta e xamanísticas que foi tratada neste livro. Acreditando na possibilidade de atrair demônios, nos poderes das trevas e no bem, na importância das palavras mágickas e nos poderes sobrenaturais de seus sacerdotes, o bonismo é talvez o culto mágicko mais bem organizado do mundo. Iguais aos budistas, contra os quais se empenham numa guerra física e psicológica, os bonistas têm seus próprios grandes lamas, seus exércitos e seus templos.

Muitos de seus lugares santos, seus mosteiros e palácios são embelezados com um luxo que faria até o próprio palácio do dalai lama parecer comum. Ao contrário dos budistas, eles repetem o credo (Om Mani padme hum) de trás para a frente: Muh-em-padmi-mo! E também diferentes de seus vizinhos eles acreditam na invocação da alma e desde tempos imemoriais praticaram isso e o sacrifício humano em seus ritos propiciatórios. Seu sacerdotado emite talismãs contra a doença e demônios, e até mesmo para fazer a colheita aumentar ou minguar, para provocar ou anular o amor, para tornar o portador invencível e rico. Estes,

como com os outros povos selvagens da Alta Ásia, são quase sempre pedaços consagrados de ossos, cabelo, dente e metais comuns. A adivinhação e augúrio são amplamente praticados, tanto pelos iniciados como pelos leigos. Há uma estranha semelhança entre seus ritos de propiciação ao espírito do Hades (Yama) e culto do dragão com os ritos da missa negra da bruxaria européia.

Num ritual típico dos sacerdotes Bön, o chefe se senta numa clareira solitária, cercado de seus associados menores. No centro do local, cercado de pequenas vasilhas de incenso queimando, levanta-se o altar, oferecendo-se carne, lã e pele de iaque ao espírito que se quer invocar. A corneta de osso é tocada três vezes. A congregação canta a invocação ao demônio e seus companheiros, chefiada por seu alto sacerdote: Yamantaka! - repetida três vezes e depois mais tres. Todos devem se concentrar na imagem da divindade que pode geralmente ser vista em estátuas enormes e assustadoras nos templos bön: um monstro com cabeça de touro, presas e chifres, pisando corpos humanos, com ornatos de crânios e cabeças humanas, cercado de línguas de fogo.

Acreditam os bonistas que a divindade aparecerá e partilhará do alimento, o que é sinal de que aceitou sua homenagem. O chefe então dirige uma prece ao espírito, contando-lhe os desejos de sua gente, e esses serão realizados. Aqueles que não dão o máximo de si para contribuir com sua parte individual de força espiritual para a reunião, sofrerão dores terríveis e poderão até mesmo perder a visão ou alguma outra faculdade.

O bonismo, assim como o lamaísmo e o budismo, em geral não procura converter. Se alguém não é dos iniciados, não importa a mínima. Existe um interessante relato de uma reunião bön original do século 6 da era cristã, que é típico daqueles ritos negros:

primeiro quebrando suas pernas e depois os matando... Tendo sido convocados feiticeiros eles invocam os deuses do Céu e da Terra, rios e montanhas, o Sol, a Lua, as estrelas e planetas...

Com a enorme pressão desse tipo de propiciação ao diabo, corrente por quase todo o país, o budismo comum, devoto, do tipo de Lhasa, está cercado pelos ritos tântrícos e mágickos. Tem havido várias tentativas de combater essa ameaça, que começou, segundo se diz, com Asanga, durante o século 6 e está condensada num livro muito lido, Yogachara Bhumi Sastra. Diabos e deuses menores dos céus inferiores são invocados e adaptados do budismo ortodoxo para servir como gênios dos tantras. A reencarnação, conforme entendida pelo devoto e inculto leigo do Tibete budista, está quase sempre muito longe do ideal de seus seguidores ocidentais. Encontra-se freqüentemente com alguma pessoa em vias de agir hostilmente (e, portanto contra a lei) contra a outra, baseada em sua crença de que não teria tido esse pensamento pouco caridoso se o outro indivíduo não o tivesse ofendido de alguma maneira na vida anterior.

A contribuição do budismo ortodoxo à magia oriental na medida em que afeta nosso estudo é bastante mais filosófica do que os ritos familiares de pensamento mágico de outras partes do Oriente - com exceção do sufismo. Já de início, a dedicação é tida tanto pelos budistas tibetanos quanto pelos ocultistas como essencial para se conseguir a concentração mental que todos desejam. Como outros pensadores sobrenaturais os tibetanos enfatizam a higiene mental.

O buscador deve sempre se purificar antes de assumir qualquer operação mágica. Algumas vezes ele tem de se assegurar de que esse passo seja dado até mesmo por seus empregados. Às vezes é por nove dias que inclui o tabu de contato com mulheres e a abstinência de peixe e veado.

A mente deve ser sempre purificada até que possa receber as impressões que lhe permitirão tornar-se cada vez mais própria para a eventual absorção ao Nirvana ou absorção pelo espírito do Todo. De onde vem esse poder? Parte vem de dentro, daquela enjaulada pecinha de força psíquica da misteriosa "estação sem fios" de alguma montanha distante, à qual devem retornar todos os espíritos e da qual eles estão destinados a reencarnar, na forma de seres encarnados, até que o processo de purificação se complete e então o Nirvana perpétuo é a recompensa.

Essas vibrações que devem guiar o anacoreta são perceptíveis em todo o mundo. Elas guiam o iniciado, deixando o ignorante em sua ignorância. Não é realmente papel do homem dedicado espalhar essa doutrina ou mesmo reforçá-la, a menos que sua posição na vida seja tal que assim o exija.

Os que atingem a quase-perfeição recebem dos lamas um anel de alta graduação - doutores do budismo. Eles não devem pensar, no entanto que atingirão a perfeição em apenas uma vida: isso só aconteceu no caso do próprio Gautama. Nesse ponto é possível solicitar dispensa da vida monástica a fim de se desenvolver para conquistar o mérito que contrabalança o pecado.

Geralmente ele é avisado antes de deixar o mosteiro que certamente retornará triste e alquebrado, para reaprender muito do que perdeu no contato com os simples mortais. Aqui a filosofia esotérica do lamaísmo difere radicalmente do sufismo apesar de orientalistas superficiais se deliciarem em afirmar a íntima identidade entre os dois sistemas.

Quando ele "retorna da vida de perfeição para a vida de imperfeição" são retiradas duas Pedras de seu anel pelo mentor. A primeira significa a perda que ele sofrerá, conforme já relatado, a segunda

lamastério. Quando a lição foi aprendida e o monge retorna, as pedras são recolocadas e depois nunca mais são tiradas do dedo - "mesmo no fogo da cremação".

Se, no entanto, o lama chega a tal perfeição que é embalsamado e preservado, colocado por trás de uma veneziana para todo o sempre, o anel é colocado acima dele. E então "todos os que olham os gloriosos restos mortais e principalmente o anel, têm de piedosamente baixar a cabeça diante de tal poder e tal grandeza e dizer uma prece que gira a roda da oração para que a alma possa continuar tendo aquilo que conseguiu tão penosa e lentamente no mais cruel de todos os mundos, comparados ao qual os primeiros 12 anos de estudo monástico foram leves como uma pena".

Existe mais do que uma mera insinuação da idéia de um sacerdotado secreto mundial na explicação do caminho dos grandes mestres que foi transcrito por Morag Murray Abdullah de um original tibetano que se encontra num convento visitado por ela e que cito aqui:

“Os mestres de poderes místicos que escolhem viver afastados do mundo podem ajudar, através da contemplação, os negócios de outros povos distantes. Enquanto que aqueles que retornaram como missionários e falharam, por qualquer razão, e retornaram assim à fonte de todo conhecimento terreno, são quase sempre impedidos de continuar auxiliando o mundo. Para eles só existe o ouvido. E eles se contentam, devem se contentar com as inconsistências do mundo. Tendo trilhado

com sucesso o caminhe do esquecimento, que pode levar muitos anos, o viajante pode ver todo o mundo colocado à sua frente. Ele poderá enxergar aquilo que se desenvolverão em terremotos, guerras, fomes e pode começar adiantadamente a mitigar com seus pensamentos os sofrimentos humanos assim engendrados ...

Parte do treinamento para esse tipo de diagnóstico espiritual dos males do paciente consiste em ficar ao relento na encosta de uma montanha, dia e noite, durante uma semana - exposto na montanha, durante o inverno. Três vezes ao dia o aprendiz é obrigado a mergulhar um lençol em água gelada e envolver-se nele. Até que ele seque pelo "calor interno gerado por suas concentrações". Se o lençol não seca ou o lama sente frio, é porque sua concentração foi falha e o processo tem de ser repetido. Os rigores desse treinamento não são do tipo que atrairia nossos impacientes magos ou mesmo filósofos de cultos mais ocidentalizados. Nos lugares onde reina essa paciência e rigidez, por seu lado, não há espaço para os rituais mais breves que se destinam a produzir o poder rapidamente, o treinamento tem como resultado urna criatura doce e muito diferente do feroz feiticeiro que pode estar escondido a algumas milhas de distância.”

"Os verdadeiros lamas do Tibete contam entre eles com alguns dos últimos seguidores reais dós ensinamentos de seu mestre." Seria de se esperar que eles não aceitassem estrangeiros e se encerrassem nas suas reclusas montanhas, insensíveis a gestos cordiais. Ao contrário, eu os achei semelhantes a crianças amigáveis, crédulos e desejosos de ouvir o que eu tinha a dizer sobre o mundo de além. A princípio, originário do Ocidente, onde a diplomacia não se confina apenas ao serviço diplomático, duvida-se de sua sinceridade; eles parecem ao mesmo tempo confiantes demais, como se a polidez superficial escondesse alguma coisa menos recomendável por baixo. Isso, evidentemente, era uma opinião pessoal, até que descobri que no íntimo assim como no exterior eles pareciam não ter nenhum pensamento desairoso a respeito

ouvirem falar das maravilhas de nosso mundo, que nunca verão, não demonstram sinais de inveja, ou mesmo descrença: apesar de terem, como vim a saber, idéias muito definitivas a respeito do Ocidente. Em minha experiência pessoal eles nunca pensariam em quebrar uma promessa ou em serem pouco hospitaleiros - atitude que é mantida quase como uma religião, como entre os afegãos e árabes.”

"Os lamas tibetanos acreditam que podem, pelo simples poder da oração, afastar uma invasão, seja espiritual ou material: é o poder das palavras mágicas Om Mani Padme Hum." Quando lhes falei de guerra eles disseram que só os espíritos infelizes vão para a guerra e que, portanto eles a merecem e é algo que lhes está destinado sofrer: "Se nós que temos tão pouco conseguimos o pouco que conseguimos, vocês, povos de além-mar, que têm todas as coisas materiais, como você diz, sem dúvida podem criar a beleza".

Uma das coisas mais absorventes das maravilhas tibetanas, do ponto de vista mágicko, é sem dúvida o rito de caminhar sobre o fogo. A aparente habilidade de caminhar sobre carvões em brasa é demonstrada na Índia, Polinésia e outras partes do Extremo Oriente. Mas desde que minha experiência pessoal se limita ao ocultismo em geral, e não só aos tibetanos comentarei apenas. Tanto o sacerdotado bonista quanto o lamaísta encaram o caminhar sobre fogo como importante parte de seus ritos. - Porque essa atividade figura nos círculos budistas onde a magia não é encorajada? Porque ela tenta demonstrar as alturas de autodisciplina que os iniciados podem atingir. Já disseram que caminhar sobre brasas deixa espaços de ar, bolhas de ar, tal como, se passássemos a mão na vela. Entretanto, se você mantém a mão no fogo queima, e se você para em meio às brasas queimaria também. Um homem capaz de superar suas limitações naturais a ponto de pisar carvões em brasa comprova claramente que conseguiu estabelecer o domínio da mente sobre a matéria. A teoria - senão a prática - bonista é muito diferente. Em primeiro lugar e antes de mais nada, caminhar sobre o fogo é uma cerimônia propiciatória. É feita porque o deus do fogo exige

homenagem em troca da qual ele concede o poder de suportar o calor para aqueles que acreditam nele.

Em ambos os casos é provável que algum tipo de dissociação mental afim com a hipnose seja induzida, apesar de parecer a mim que há algum outro fator em questão. Uma pessoa hipnotizada da maneira convencional poderia, talvez, suportar a dor do fogo, independente do ferimento físico real. Nenhum sacerdote lama ou bonista que caminhou sobre o fogo sob minhas vistas pareceu sofrer qualquer dor ou ferimento. Isso só deixa a possibilidade de hipnose de massa, da qual muito se ouve falar, mas pouco se prova - como no caso do truque da corda, na índia.

Num ritual bonista, além dos sacerdotes passarem por entre as chamas, vários candidatos às "ordens sagradas" foram levados através do fogo sem qualquer dano físico. Evidentemente, pode haver algum truque pelo qual se consiga isso. Comum aos ritos paralelos de outros lugares isso significa um teste aos candidatos à ordenação: uma forma de tese de exame.

Outro pequeno fato que pode ser de interesse aqui é que se contam inúmeros casos de que quem caminha sobre o fogo fica com as mãos, rosto e cabelos chamuscados - más sem nenhuma marca nas solas dos pés. Um outro caso da mesma pessoa que citei acima:

“O experimento a que eu assisti foi realizado numa grande clareira, com uma vala de três pés de profundidade por 30 pés de comprimento e cerca de dez de largura, Pedras redondas e lisas foram colocadas ali e depois grande quantidade de madeira e galhos empilhada em cima, acesa e queimada por cerca de seis horas. Depois o carvão foi amontoado e a superfície varrida e alisada. Havia uma multidão de cerca de duzentas pessoas assistindo à demonstração. Um sacerdote bonista, seco, cheio de amuletos pendurados e caracterizado principalmente pelos trapos que usava e a aparente sujeira de seu rosto, mãos e capa de pele de ovelha,

amarrada na cintura e entre as pernas. Na mão levava um bastão, uma vara de cerca de 15 centímetros, que terminava num tufo de penas pequenas. Ele caminhou em volta do fogo, primeiro três vezes no sentido horário, depois cinco vezes na direção oposta, enquanto levantava e baixava as mãos sobre as brasas que ainda estavam muito quentes. Resmungando preces ou encantamentos ele começou a golpear as pernas, primeiro uma, depois a outra, com o bastão. Ao sinal de uma buzina de osso, dez homens avançaram lentamente por entre a multidão e se alinharam em frente do mago. À medida que cada um se curvava era tocado, primeiro num ombro, depois no outro, com a varinha. Não se ouviu um ruído. Parecia quase haver algo de sobrenatural no ar. O calar da fogueira e do sol era destruidor. Várias pessoas da platéia, vencidas pelo calor ou pela emoção, caíam ao chão. Ninguém dava maior atenção a isso e todos os olhos estavam presos na sinistra figura do sacerdote. Em fila simples, enquanto o feiticeiro entoava um agudo canto nasal, os homens cruzaram a brilhante massa ardente, pisando no outro lado numa pequena bacia de água ao terminar sua marcha. Depois o feiticeiro continuou e efetuou uma dança no centro da vala. Depois chamou pessoas, não iniciadas, que quisessem participar do rito, enumerando os vários e numerosos grandes poderes que eram conferidos pelo deus Sol a esse ato de devoção. Apenas três homens e duas mulheres aceitaram o desafio, sendo um de cada sexo de feições bem mais claramente indianas que mongólicas. A mesma cerimônia de correr em torno do fogo, as mesmas saudações e gestos de mãos, os encantamentos e dessa vez os primeiros dez homens juntavam sua voz à do feiticeiro. Liderados pelas duas mulheres, que foram quase empurradas pelo feiticeiro, os cinco cruzaram o fogo sem danos. Notei que seus rostos estavam cobertos de suor e que pareciam mortalmente amedrontados. Ao saírem da trilha examinei seus pés: não havia como não fazê-lo, pois eles os mostravam a todos e tal era seu alívio que chegava a ser tocante. Não havia sinais de

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