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O Mosaico na percepção dos moradores

No documento Download/Open (páginas 79-82)

Referente aos moradores de entorno das UCs do MCF, os seguintes pontos foram considerados chave para a avaliação a que a pesquisa se propõe:

a) Inclusão

Com relação ao entendimento e nível de participação, considerou-se que o nível de conhecimento a respeito da UC mais próxima à moradia do entrevistado é um indicador do seu acesso às informações sobre a mesma e a política ambiental. Por isso, pode ser um fator que indica inclusão no processo de implantação da UC. A grande maioria não acessa o conhecimento legal, confundindo as nomenclaturas e funções determinadas pela legislação ambiental. No entanto, todos tem a visão de áreas delimitadas e protegidas, com regras a se cumprir. Os moradores utilizam termos como “área de reserva” para definir a UC próxima a sua residência; “reserva ecológica” e “área de controle biológico com várias restrições”. Uma entrevistada usa o seguinte discurso: morar no entorno significa “cuidar do ambiente e não fazer certas coisas”. Uma moradora diz, ao mesmo tempo, que é uma “área intocável” e que “podemos visitar”, enfatizando apenas o caráter contemplativo. Todos entendem que se encontram no entorno da UC, sendo que aqueles que já sofreram fiscalização ou algum tipo de ameaça, o afirmam com mais veemência, e apenas um entrevistado apresenta uma resposta precisa a respeito da situação fundiária de sua propriedade. Um morador de entorno imediato deixa claro seu olhar positivo sobre a criação da UC, achando “louvável” a “proteção do manancial” e a “estabilização das encostas” através do incremento em cobertura florestal, o qual percebe nesses 22 anos de moradia. Uma entrevistada menciona a falta de conhecimento sobre a UC por vários membros da sua comunidade. A maioria apresenta vontade de participar dos espaços de decisão, alguns mencionando o desejo de conhecer mais e ajudar a melhorar a região onde moram. Apenas dois entrevistados não aparentam entusiasmo em participar da gestão das UCs. Três dos entrevistados configuram personalidades-liderança – são membros de associações -, sendo que apenas um costuma participar das reuniões de conselho das UCs, e ninguém participa do Conselho do MCF.

Sobre a questão da qualidade da relação entre gestores e populações de entorno, a maioria relata ser ruim ou frágil, sendo que um afirma ser “excelente”, e outra que é “legal”. Estes dois entrevistados sofreram com o mesmo processo de ameaça de desapropriação quando da instalação de um Parque, o qual a população de agricultores terminou por ganhar o processo, em termos – porque eles conseguiram desafetar o Parque de suas áreas, mas em troca precisam cumprir algumas regras com as quais não se mostram satisfeitos. Por isso, aquela que afirma ser “legal” a relação com o Parque, diz que esta melhorou muito ao longo dos anos, e que no início foram ameaçados. Usa as seguintes expressões para caracterizar a relação inicial do Parque com sua comunidade:

80 “deixava a gente acuada”, “o povo precisa viver, trabalhar”, “é uma pressão desnecessária”.

Relata que tinham “medo”, e que por isso começaram a conservar a terra, preservar algumas florestas nativas, a fim de eliminar os argumentos para os desapropriarem. Dois entrevistados falam ser autoritária a relação da equipe do Parque com a população, falando da excessiva pessoalidade da atuação da chefia:

“abusa do poder para beneficiar aqueles que são próximos ou são de seu interesse”; e achando “arcaica” a forma de atuação da equipe gestora, muito “intromissiva”, usando

previamente uma ação ameaçadora como a “notificação de incêndio”47. Uma entrevistada afirma ser boa a atuação da equipe da UC em termos de fiscalização, a qual considera importante, mas ruim em termos de educação, dizendo:

“temos que conhecer para preservar”;

esta, por ter acompanhado a criação da Reserva próxima, lamenta o fato de terem proibido a comunidade de acessar uma área que sempre freqüentavam para colher frutas das árvores em conjunto, hábito este que foi abandonado após a implantação da UC, além de terem expulsado uma comunidade que vivia dentro de tal área, nos arredores da qual foi construído um condomínio de luxo.Moradoras verbalizam que a população enxerga a equipe das UCs com medo e que por isso, e por causa das notícias da TV, “tomaram consciência sobre a preservação”.Relatam a falta de diálogo:

“a viatura somente passa, mas nunca param pra conversar com a população”; “não há qualquer relação”; “pouca relação inclusive com o turismo local e pouca movimentação tanto da população quanto do Parque para melhorar o diálogo”. Uma entrevistada considera:

“a chefia é boa porque gosta da natureza, das plantas e dos animais, gosta do que faz, fiscaliza mesmo!”.

E outro afirma sobre a relação com o gestor:

“é de excelente nível, apesar dos diferentes interesses”.

Com relação ao poder de decisão dos entrevistados sobre a gestão do território, este fator fica associado à sua inserção em grupos organizados (ONGs, associações etc.), refletindo no tipo de relação estabelecida com os gestores das UCs, também ligado a seu nível de acesso ao poder político. As organizações, no entanto, tem acessos diferenciados às decisões sobre a gestão das UCs, sendo que normalmente aquelas que já estão inseridas no contexto da elaboração e execução de projetos dentro do MCF, detêm maior interferência dentro dos espaços decisórios. As entrevistas revelam o desejo de participar, como

47 O proprietário é notificado pessoalmente em sua propriedade sobre a criminalização do uso do fogo, ou seja,

pressupõe-se, assim, que ele já obteve conhecimento e então não poderá alegar que não o tinha, no caso de uma acusação contra ele referente a um incêndio.

81 demonstra a fala de uma das membras de associação de agricultores, que demonstra grande interesse em

“trabalhar com a natureza, com as pessoas, saber das coisas e ajudar a decidir”. Percebeu-se que, independente da classe social, nível de escolaridade, gênero ou idade, os

entrevistados apresentam interessantes sugestões que poderiam aumentar a inclusão social relacionada aos recursos naturais, associando a atuação das UCs junto a outros programas relacionados às atividades prevalecentes nas áreas de entorno:

“o Parque tinha que atuar mais, com atividades concretas, junto à EMATER.” E outros também mencionam a necessidade de “incentivos” por meio de parceria do Mosaico

com outros órgãos e programas ligados às atividades locais. Alguns afirmam não ter conhecimento sobre o Conselho Gestor da UC próxima, e reivindicam uma melhoria na comunicação com as comunidades, de forma a que todos possam participar.

“Deviam divulgar as datas das reuniões para toda a população”.

“Nunca ouvi falar no programa das rádios comunitárias” (morador da localidade onde o programa está sendo implantado, no entorno de um Parque).

“Sou membro da associação de moradores e produtores e tenho cadeira no CC da unidade, mas nunca fui no CC do MCF”.

“Muita gente gostaria de aderir a este tipo de atividade”. “O posto de saúde podia fazer um projeto para a 3ª idade”. “Talvez participar de uma (reunião) para ver como funciona”. “Eles tem que fazer reunião com o povo”.

“É bom trabalhar em conjunto”.

São algumas falas que denotam as dificuldades de inserção, pelos responsáveis pelo projeto Mosaico, das populações de entorno das UCs nos seus processos de gestão do território ecossistêmico.

b) Conservação da natureza

Quase a totalidade dos entrevistados apresenta uma visão antropocêntrica de natureza, cada qual retratando suas experiências pessoais. Pelas falas, pode-se identificar a visão preponderante de natureza como algo externo ao humano, como se este não fizesse parte da mesma e como se a “natureza” existe apenas para nos servir. Aqueles que vivem da terra, como agricultores, falam de que “dependemos dela”, e aqueles que usam as áreas verdes para lazer ou atividades esportivas, se referem a um valor contemplativo. Apenas um entrevistado demonstra uma visão mais holística de natureza, afirmando sua unidade com os seres humanos quando diz que “fazemos parte dela”. Uma entrevistada associa a problemática da conservação à questão da poluição, principalmente lixo, enquanto outra menciona componentes das áreas verdes, como árvores, pássaros, água. E afirma:

“O parque trouxe essa preocupação com a conservação, hoje temos três áreas de mata no sítio”.

82 Outro associa natureza à “qualidade do ar, do solo e da água”. E uma entrevistada diz que “a natureza é importante para o futuro do ser humano”, que se alinha com a ideia de outro morador: “a natureza é importante para preservar nossa vida”.

Referente ao entendimento de mosaico de áreas protegidas, dois dos entrevistados afirmam já ter ouvido falar dos mosaicos, mas não saber o que é, sendo que uma dessas diz ter ouvido através da televisão. Apenas um fala precisamente que é o conjunto de UCs de uma determinada região. Com relação à sensação de pertencimento ao território do Mosaico Central Fluminense, pode-se dizer que é praticamente nula, pois somente um entrevistado afirma saber que mora dentro do MCF.

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