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O papel do educador co-construtor de conhecimentos

Capítulo I – Experiências-Chave em Educação Pré-Escolar

1. Currículo Emergente

1.5. O papel do educador co-construtor de conhecimentos

De acordo com Woodhead (2010), apesar da participação ativa das crianças na construção do currículo, esta não diminui o papel e as responsabilidades dos adultos, pelo contrário, aumenta-lhes os desafios (Tal, 2014), uma vez que a identidade profissional do educador, segundo Rinaldi (2006), deve ser encarada em termos contextuais, ou seja, conforme as circunstâncias também o seu papel deve ser reavaliado (Edwards, Gandini, & Forman, 2016). Existem, no entanto, papéis e desafios transversais ao adulto, consoante as visões que demarcam o currículo emergente de outros.

De um modo geral, o adulto deve escutar as crianças utilizando não apenas a observação mas também a documentação, de modo a conseguir percecionar as aprendizagens das criançase assim provocar ocasiões de descoberta inspiradas na estimulação do diálogo, da coação e coconstrução do conhecimento das crianças, ajudando-as a descobrir os próprios problemas, problematizando-se a aprendizagem (op. cit.). Tendo em consideração que “cada projeto está baseado na atenção dos educadores àquilo que as crianças dizem e fazem, bem como no que elas não dizem nem fazem. Os adultos devem dar tempo suficiente para o desenvolvimento dos pensamentos e das ações das crianças” (Edwards, Gandini, & Forman, 1999, p. 119), investindo assim na escuta atenta das mesmas, desta forma enquanto ouvinte e observador, o adulto pode ir direcionando esta escuta para as estratégias utilizadas pelas crianças, em situações de aprendizagem (op. cit.). Mas, acima de tudo, o educador deve ser sensível na relação com a criança, procurando conhecê-la, perceber o que pensa, quais os seus interesses, criando relacionamentos que amenizarão o desafio que é para o adulto, “estar presente sem ser um intruso, a fim de manter melhor a dinâmica cognitiva e social enquanto está em progresso” (op.

cit.: 117). Para além desta escuta, o educador deve estar envolvido com o procedimento de exploração da criança, de modo a que consiga entender o que é ser organizador e provocador de oportunidades e co-autor de descobertas, possibilitando assim à criançaum ambiente, materiais e equipamentos estimulantes (Edwards, Gandini, & Forman, 1999). O educador deve, no entanto, evitar o comprometimentodos padrões mínimos de segurança, pois caso os mesmos se encontremem risco, o educador tem o dever de aumentar a supervisão das tarefas em curso (Riley & Roach, 2006). Ainda no que diz respeito à escuta, segundo Filippini (1990), o educador deve agarrar o momento, perceber as ideias da criança e de uma forma provocatóriadevolvê-las em questões, garantindo a continuidade do interesse da criança, como o autor refere saber “agarrar a bola”, permitindo-lhe captar as ideias da criança e lançá-las de volta (Edwards, Gandini, & Forman, 2016, p. 156). Num jogode conhecimentos, no qual a criança é o protagonista e o educador assume o papel de adversário, com o objetivo de desenvolver o pensamento crítico e consequentemente conceitos em causa (Ferrell, 2004). Tudo isto porque, a criança é capaz de autonomamente atribuir significados às suas experiências diárias, através de atos mentais, no entanto, os significados nunca são estáticos, unívocos ou finais, ao invés disso, os significados geram outros significados. Portanto, o adulto deve ativar nas crianças, de modo indireto, competências de criação de significado como a base para toda a aprendizagem (Edwards, Gandini, & Forman, 2016, p. 71). E, assim, de uma perspetiva sócio-construtivista, o currículo emergente permite ao adulto facilitar o discurso da criança, mediando-o entre o mundo e a mesma, (Tal, 2014, p. 143), sendo desafiado a perceber quais as oportunidades para ampliar, andaimar e desafiar os conhecimentos da criança (QKLG, 2014, p. 3).

Para além dos papéis desempenhados enquanto coconstrutor de conhecimentos, acima referidos, o educador tem ainda a responsabilidade de cooperar com a restante equipa educativa, envolver os pais e restante comunidade no desenvolvimento do currículo. Quanto à equipa educativa, cada membro é visto “tanto como aprendiz quanto como professor e todos se sentem à vontade para fazer sugestões sobre o trabalho dos outros” (Edwards, Gandini, & Forman, 2016, p. 266). Os educadores têm assim a oportunidade de, nas reuniões de equipa, partilhar o seu trabalho e, consoante a análise da documentação, tomar decisões acerca da organização do

ambiente educativo. Isto de maneira a garantir elementos da equipa na facilitação de atividades em grupos pequenos e outros na monitorização de atividades para as restantes crianças, alocando tempo e combinando estratégias para documentar observações contínuas da aprendizagem. Por outro lado, estas reuniões de equipa resultam em tempos de reflexão, nomeadamente a reflexão das experiências a proporcionar a cada criança, assegurando o seu interesse e envolvimento no projeto (op. cit.). Em suma, a comunicação e o planeamento colaborativo deve ser uma constante entre a equipa educativa, permitindo aos adultos agir de forma flexível e eficaz naquele que para Piaget (1974) e Malaguzzi é o propósito da educação, a oferta de condições de aprendizagem (Edwards, Gandini, & Forman, 1999).

Da representação de todos os papéis mencionados anteriormente surgem dificuldades, desde a própria organização do co-ensino, uma vez que os adultos têm a necessidade de se adaptar constantemente no desenrolar do trabalho com os outros, nomeadamente com os seus protagonistas, as crianças (Edwards, Gandini, & Forman, 1999). Facto que, no entanto, poderá ser minimizado pela disposição de assumir riscos, tornando-se recetiva na planificação conjunta do currículo (Stacey, 2009). Outra das dificuldades deve-se à capacidade de distinguir o momento de passagem daquele que se pode tornar um esforço a longo prazo (Stacey, 2009), ou seja, de ajudar as crianças a encontrarem problemas suficientemente grandes e difíceis para envolver a energia e o pensamento destas ao longo do tempo(Edwards, Gandini, & Forman, 1999), principalmente, “saber como e quando interferir, pois isso depende de uma análise de momento a momento do pensamento das crianças”; (Edwards, Gandini, & Forman, 1999, p. 165). Quando realizada essa intervenção, surge a dificuldade de conseguir realizar questões abertas ou de moldar o tom de voz, facilitando a suspensão do diálogo e assim “segurar o tempo, ou dar valor a um tempo que permanece aberto para dar às crianças a oportunidade de formular perguntas que podem ser geradas pelo seu raciocínio” (Edwards, Gandini, & Forman, 2016, p. 178). Segundo Biesta (2006), existe uma outra dificuldade para o educador, quando situado neste espaço de emergência, a garantia de que um final desejado é alcançado com obstáculos, deixando o caminho aberto. Torna-se assim num espaço difícil, provocante e muitas vezes desconfortável onde existe uma certa “violência”, tanto pelo confronto com desafios que carregam consigo mudanças imprevistas,

quanto pela forma como naquele espaço se é obrigado a tomar uma posição, a colocar-se em risco pois não se sabe o que vai acontecer, apenas que algo vai acontecer (Osberg & Biesta, 2008, p. 325). E toda esta complexidade mantém as pessoas na fronteira do caos, o que é importante, pois é aí que a criatividade reside, mas também a anarquia e por isso uma vez mais, exige ao educador que se torne um líder eficaz, tolerando a ambiguidade suficiente para se manter criativo,contudo, coerente, porque numa cultura de mudança, o desequilíbrio pode tornar-se comum, mas valioso (Fullan, 2001, p. 6).