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CAPÍTULO 2 CARACTERIZANDO OS SUJEITOS DA PESQUISA

2.2 O perfil das professoras: Formação e a relação com a Matemática

Neste item da dissertação analisaremos a formação das professoras envolvidas na pesquisa. O objetivo é buscar compreender se a formação inicial e a graduação que elas tiveram, na perspectiva das mesmas, deu conta para atuarem nos Anos Iniciais. Em seguida aprofundaremos esta discussão em relação ao currículo da matemática, focando novamente a questão da formação relacionando-a neste momento com a matemática e as especificidades que esta exige enquanto disciplina integrante do currículo dos Anos Iniciais e com o que vem a ser proposto nos PCNs (Brasil, 1997).

Para tanto, observaremos o quadro a seguir construído a partir das informa nas entrevistas realizadas de forma individual com cada professora onde temos a possibilidade de analisar a formação inicial que as professoras tiveram e após, a formação na sua graduação.

QUADRO 4: Formação das professoras PROFESSORA PRÉ PROFESSORA A1 PROFESSORA A2 PROFESSORA A3 PROFESSORA A4 Magistério Pedagogia Magistério Letras Magistério Pedagogia Estudos Sociais Magistério Pedagogia Magistério Filosofia (FRIEDERICH, 2008)

O quadro acima sintetiza as informações obtidas no questionário e nos possibilita identificar que todas as professoras possuem como formação inicial, para atuação docente nos Anos Iniciais, o curso de Magistério. Sabemos que mesmo o Magistério habilitando para o trabalho com os Anos Iniciais, a nova constituição LDB 9.394/96 já questiona trazendo à tona desafios para a formação tecendo algumas considerações acerca da formação de professores:

A formação de docente para atuar na Educação Básica, far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida como formação mínima para o exercício do magistério e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio na modalidade normal. (LDB 9394, 1996, s/p).

Nesse contexto abrem-se muitas possibilidades de acesso à formação superior onde os professores podem buscar a especificidade de um curso universitário13, como no caso do grupo de professoras em questão.

Condizendo com a formação inicial Magistério, as professoras pesquisadas estão habilitadas para o trabalho com os Anos Iniciais. Segundo MEC (2000), o curso de formação14 além de habilitar as professoras para estudar as disciplinas e conteúdos que abrangem os Anos Iniciais, dá abertura para ter o conhecimento da cultura e vivência da prática em sala de aula. Busca, em conjunto com as professoras titulares e auxiliares, momentos de reflexão sobre e com essa prática.

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Leia-se Licenciatura ou Curso Normal Superior. 14

Com a formação inicial obtida por todas as professoras no curso de Magistério e estando aptas a iniciarem o trabalho com os Anos Iniciais, todas elas continuaram seus estudos partindo para uma graduação identificando uma área de interesse.

É notório que na questão de formação em um curso superior, cada profissional opta pelo curso que de alguma forma lhe chamou atenção ou dá sequência a sua profissão, no caso das professoras com a formação que dê sequência ao trabalho voltado à sala de aula. Assim, para podermos analisar a relação desta formação com o trabalho nos Anos Iniciais e sua relação com a matemática, tentamos identificar a posição das professoras em relação à seguinte questão: “Vocês entendem que o curso de formação adquirido na formação inicial e na graduação conseguiu instrumentalizar e capacitar para ensinar a matemática nos Anos Iniciais?”

Professora Pré: Para trabalhar com a Educação Infantil, acho que meus cursos de formação deram conta em certas partes, não em tudo, mas aprendi muita coisa. No Magistério eu tive mais contato com as disciplinas em si e aprendi como deveria ensinar cada uma delas. Tive contato direto com os conteúdos dos Anos Iniciais. No Curso de Educação Infantil, que era mais específico para trabalhar com os “pequenos”, acho que aprendi mais do que no curso de Pedagogia, pois nesse curso aprendemos a envolver, integrar as disciplinas de forma simples, mas em tudo que fizermos em sala de aula, então tento envolver a matemática em tudo que posso, afinal, eles precisam, desde pequenos, ter essa noção de separar, medir, tamanho maior e menor, altura, quantidades,...enfim, o básico é trabalhado sim. (Entrevista, 2008)

Professora A1: O Magistério que eu fiz (1990), todo curso que a gente faz, a gente não está pronta, não dá conta de tudo, mesmo porque tu vai aprendendo na prática. É no dia-a-dia que a gente vai aprendendo, vai tendo aquela prática e vai descobrindo novas situações e novos caminhos. É uma necessidade a busca hoje em dia, a busca para conseguir, principalmente através de jogos que naquela época era muito difícil de conseguir jogos, a gente fazia, praticava, mas na sala de aula é outra realidade. Hoje em dia, o Magistério é diferente, tem muito mais práticas. Naquele tempo não, só tinha o mini-estágio e algumas observações. Então, eu acho muito importante. Minha formação não deu conta de tudo. Eu fui buscando no decorrer dos anos através do que é mais importante ainda. A troca de experiências entre professores, o prático, eu fiz isso, fulano aquilo, a troca é muito importante, aí me aperfeiçoo através de cursos também, ou seja, tudo que é a prática. (Entrevista, 2008)

Professora A2: Não. O que me possibilitou foi depois que eu comecei a fazer o estágio, porque nem no curso de Magistério me deu esta construção nem o curso de Pedagogia. O que realmente me deu esta construção foi quando comecei a lecionar em Tucunduva que a secretaria de lá tinha um Projeto de aulas integradas, um projeto integrado com a Unijuí, que o pessoal da Unijuí vinha e dava cursos de formação tanto na parte da matemática, quanto português, estudos sociais e ciências. Foi neste momento que eu tive maior especialização para trabalhar em sala de aula. Foi na prática do curso. O Magistério me deu uma base, mas na época, assim por si, o Magistério não era o curso que a gente tem hoje. Realmente os alunos hoje saem com uma boa formação. Era uma época bem diferente, há 31 anos atrás. Por isso, onde realmente aprendi e me deu esta formação foi nos cursos da Unijuí que eram 3 vezes por ano (início, metade e no final, onde era feita avaliação). Foi uma experiência que valeu por todo curso que eu fiz. (Entrevista, 2008)

Percebemos em tais relatos, que as professoras do PRÉ e A1, não respondem de forma clara a pergunta. Porém, cabe destacar que na sua fala, a professora do PRÉ, diz em certo momento que o curso de Magistério possibilitou um maior contato com as disciplinas em si. Já a professora A2 compara o curso de Magistério “antigo” e o “atual”, enfocando que o Magistério de hoje habilita de forma mais abrangente, tem mais práticas do que no tempo em que esta o cursou.

Cabe destacar ainda, que mesmo após ter concluído seu curso de formação, a professora A2 não se sentia totalmente segura com o trabalho em sala de aula. Para ela, os cursos de formação continuada oferecidos pela Unijuí15 trouxeram subsídios mais consistentes para o seu trabalho em sala de aula do que o curso de formação. O material didático construído é ainda utilizado em sala de aula. As reflexões sobre o ensino feitas entre os professores e participantes daquele curso fizeram-na crescer pessoal e profissionalmente. Garante que desde então sente-se muito mais segura com o trabalho em sala de aula. Havia uma limitação entre os cursos de formação desta professora e a prática em sala de aula. A oportunidade de suprir estas limitações mediante a possibilidade de ter na prática um curso de formação deu suporte consistente para o trabalho com a matemática nos Anos Iniciais.

A profissão de professor requer esta constante busca. Estas parcerias que proporcionam este tipo de formação da qual a professora participou tem muito a acrescentar na profissão. Este tipo de apoio dá suporte a uma melhor preparação e possibilitam maior desenvolvimento pessoal e profissional, incluindo um preparo mais aprofundado às questões específicas do ensino e da aprendizagem em sala de aula. Podemos perceber isto na conversa (entrevista) estabelecida com duas professoras:

Professora A3: Com certeza deu conta. Psq.: Como?

Professora A3: Na formação básica – inicial que no meu caso é o Magistério. Na minha base estrutural até como pessoa eu acho que ela deu formação.

Psq.: Ela deu conta ou você teve que procurar mais depois de sua formação? Professora A3: Ela deu a base, agora para mim crescer, eu tive que ir em busca. Porque a escola te dá o caminho, te abre as portas, agora quem tem que ir em busca é você. (Entrevista, 2008)

Professora A4: Para a Matemática especificadamente não. Porque filosofia te ensina a pensar, tu vê as coisas com mais clareza agora especificadamente matemática nas séries iniciais meu curso não me deu formação.

Psq.:E aí, como você consegue conciliar?

Professora A4: A gente tem a clareza e através da leitura e vendo como a gente vai resolver as coisas. Porque na quarta série eu não vejo dificuldade por ser uma turma inicial, aí não vejo grandes dificuldades. (Entrevista, 2008)

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Percebemos na fala da professora A1 e no diálogo da professora A3 que a formação inicial abriu de forma mais abrangente e desafiadora as portas para o conhecimento dos conteúdos relacionados ao trabalho com os Anos Iniciais, porém até o momento não trazem relação específica com a matemática.

Ao observarmos a fala da professora A4, esta não enfocou a formação inicial do Magistério. Discussões acerca da formação do professor têm sido amplamente difundidas nas últimas décadas. Principalmente porque se tem observado que a deficiência nesse processo de construção da perspectiva educacional do profissional na sua formação sendo inicial, magistério ou graduação, é também um fator determinante dos resultados considerados não suficientes que se tem obtido com o trabalho referente a conteúdos específicos, como a matemática nos Anos Iniciais.

As limitações se fazem presentes de forma constante entre as professoras. O que percebemos, pela interação com as professoras, é que esta deficiência é apontada na formação inicial e que deixou a desejar quando se trata de questões referentes aos conteúdos dos Anos Iniciais como, por exemplo, a matemática. Sendo assim, muitos professores supervalorizam o trabalho com alguns conteúdos específicos ou de certa forma “fogem” de algum justamente pela própria dificuldade ou limitação em tal objeto. As limitações e as dificuldades que não foram supridas em nenhum momento na formação, se fazem presentes de forma inevitável.

Neste sentido, observa-se que são poucas as alternativas metodológicas apresentadas aos professores em seus cursos de formação e não há um trabalho relacionado às especificidades das disciplinas que são extremamente necessárias para o trabalho com os Anos Iniciais. Com isso, os professores nem sempre conseguem dar conta de suas próprias limitações muito menos criar condições facilitadoras para desenvolver um processo dinâmico de ensino que garanta a aprendizagem. Esta é uma possível causa para a não inovação de suas práticas, das limitações no ensino e da busca constante pela formação paralela a prática de muitos professores.

Sabemos que sem dominar com um elevado grau de competência o conteúdo que é proposto a ensinar, o professor não exerce de modo adequado a sua função. O mais difícil, porém, é definir quais são os conhecimentos e as competências no campo da matemática que um professor dos Anos Iniciais necessita. Em relação à matemática, o cenário se torna bem amplo, pois não há somente a necessidade de dominar os procedimentos utilizados nas operações, mas também compreender os processos, os conceitos e a natureza deles.

Para Serrazina (2001) o conhecimento necessário para ensinar matemática nos Anos Iniciais inclui a compreensão de ideias fundamentais da matemática e seu papel no mundo atual por parte dos professores. Ela destaca que,

(...) a formação de professores não deve consistir no treino de receitas e métodos que são diretamente aplicáveis na sala de aula, mas deve, em primeiro lugar e acima de tudo, ajudar os futuros professores a desenvolver autonomia. [...] Isso implica apóiá-los no sentido de aumentarem o seu conhecimento sobre a Matemática sobre o aprender e ensinar Matemática – como as crianças aprendem Matemática, sobre a qualidade dos materiais de ensino. (apud CURI, 2000, p. 414).

Para Monteiro (2001), o conhecimento matemático necessário para ensinar precisa proporcionar condições ao professor de tratar corretamente, de modo flexível, os assuntos matemáticos com as crianças, compreendendo seus conceitos e relacioná-los aos diferentes saberes matemáticos, a fim de torná-los capazes de resolver uma determinada situação. Além disso, o conhecimento matemático não pode ser separado de outros temas. Segundo essa autora, é desejável que os professores percebam a importância da matemática e do papel dessa disciplina, tanto no desenvolvimento do pensamento e da orientação espacial como na organização de informações.

Conforme Tardif (2007), a formação inicial visa habituar os alunos – futuros professores – à prática profissional da profissão e a fazer deles, práticos reflexivos. Neste sentido, para o mesmo autor, apenas uma formação inicial não basta para a amplitude que o trabalho de um professor em sala de aula envolve. Portanto, para Tardif (2007);

O professor e o ensino constituem objetos de saber para as ciências humanas e para as ciências da educação. Ora, essas ciências, ou pelo menos algumas dentre elas, não se limitam a produzir conhecimentos, mas procuram também incorporá-los à prática do professor. No plano institucional, a articulação entre essas ciências e a prática docente se estabelece concretamente através da formação inicial ou contínua dos professores. (p. 36-37)

Segundo tal autor, a prática em sala de aula envolve muito mais do que essa simples formação, que é claro, não pode deixar de existir. O autor coloca que ao longo de sua carreira, os professores precisam apropriar-se de diversos saberes que compõem em conjunto com os saberes universitários o corpo docente. No caso desta pesquisa, estamos nos referindo a saberes mobilizados na formação continuada, a qual possibilita a reflexão, a busca pelo novo, a discussão; uma possibilidade de ressignificação da prática docente. Auxiliando-nos em tal perspectiva, Tardif (2007, p. 53) complementa:

[...] nesse sentido, a prática cotidiana pode ser vista como um processo de aprendizagem através do qual os professores retraduzem sua formação e adaptam à profissão, eliminando o que lhes parece inutilmente abstrato ou em relação com a realidade vivida e conservando o que lhes servir de uma maneira ou de outra.

São momentos de avaliar, julgar, rever a prática, de trabalhar socializando no coletivo a prática, as dificuldades e buscar em conjunto soluções para os problemas e dificuldades encontradas na prática docente.

A formação continuada vem a ser um momento de auxílio aos professores que não tiveram, em sua formação, sendo ela inicial ou graduação, uma habilitação adequada para o seu trabalho. Este processo contínuo no qual os professores têm a possibilidade de rever sua prática como objeto de sua própria investigação e reflexão e no qual os aportes teóricos “[...] não são oferecidos aos professores, mas buscados à medida que forem necessários para contribuir na compreensão e construção coletiva de alternativas de solução dos problemas da prática docente das escolas”. (FIORENTINI E NACARATO, 2005, p. 9).

Concordamos com Bisewski (2008) quando este afirma que é imprescindível destacar que o conceito de “continuada” da formação já não pode ser pensado nos moldes da modernidade, sobretudo, do conceito de tempo como lógico e matemático. Não se trata de pensar uma simples continuação da formação como se fosse possível acontecer de forma linear e ascendente. Nesse sentido, para nosso interesse, algo de específico vem a ser apresentado, em que o continuado da formação é o essencial da formação no sentido de retomar, refletir, de ressignificar a prática docente.

Neste sentido, propomos através de momentos de formação, elementos que permitam uma aproximação com os conceitos matemáticos, visto que a formação inicial das professoras, envolvidas na pesquisa, não consegue dar conta de forma satisfatória a sua ação nos Anos Iniciais.