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CAPÍTULO 1: CONTEXTUALIZANDO A PESQUISA

1.5 PROBLEMÁTICA DE INVESTIGAÇÃO

1.5.1 O problema

Os estudos apreendidos acerca da EIC (BARBOSA et al., 2012) têm nos acenado uma configuração que revela as desigualdades e a realidade em que vivem as crianças do campo brasileiro. Quando comparadas com a cidade em termos de estrutura, acesso a bens básicos como saúde e educação, a realidade do campo tem se mostrado bem inferior, evidenciando assim “[...] que a riqueza material e simbólica produzida pelos brasileiros é desigualmente distribuída entre os diferentes segmentos sociais” (ARTES; ROSEMBERG, 2012, p. 16).

Essas disparidades nos movem a pesquisar, estudar a realidade com a qual as crianças do campo, em específico em área de assentamento de Reforma Agrária, têm sido atendidas e visibilizadas no cenário social, no que concerne ao direito à EI. Tendo, pois, o entendimento da novidade em torno desse debate de propor a discussão acerca da EI em interface com a EC, na perspectiva de vislumbrar políticas públicas, e as possibilidades em torno dessa discussão, principalmente no que se refere à formação dos educadores que atuam com estas crianças.

Portanto, as lutas em torno da EI, sua inserção e reconhecimento como primeira etapa da Educação Básica (BRASIL, 1996, 2010) acena o reconhecimento da criança, demarcando seus direitos à educação. Todavia, tal reconhecimento não têm sido de fato apreendidos, uma vez que “ [...] as crianças mais pobres, de área rural [...] tendem, via de regra, a freqüentar instituições de educação infantil de pior qualidade que as crianças não pobres e de área urbana” (ARTES; ROSEMBERG, 2012, p. 19).

Nesse sentido, de acordo com o Censo Escolar 2010, quando observados os dados em torno das matrículas relacionadas ao rural brasileiro (compreendendo terras indígenas, quilombolas e assentamentos de Reforma Agrária), num total de 108.844 matrículas de crianças de 0 a 6 anos, 48,3% dessas matrículas estão localizadas em assentamentos rurais; dessas, apenas 6,2% compreende o atendimento a crianças de 0 a 3 anos e 51,4% a crianças de 4 a 5 anos (ARTES; ROSEMBERG, 2012). Essa realidade de pouco atendimento e acesso das crianças do campo às instituições de EI também acena uma precariedade diante desse atendimento, pois, nessas localizações, quesitos básicos como água, energia elétrica, esgoto, coleta de lixo, dentre outros têm se evidenciado como os de piores condições, quando comparados aos mesmos quesitos em instituições localizadas em área urbana (ARTES; ROSEMBERG, 2012).

Outra questão importante que configura nossa intencionalidade de pesquisa e acena nesse cenário da EIC se refere à formação do educador que atua nessa etapa da educação básica. Artes e Rosemberg (2012, p. 63) apresentam os dados do Censo Escolar 2010 que têm evidenciado que 56,1% dos profissionais que atuam na EI em área rural no Brasil possuem o normal magistério e 26,5% possuem curso superior, sendo que as regiões Sudeste e Sul dispõem de um número maior de profissionais com ensino superior. Tal questão não está dissociada das responsabilidades do município para com a formação dos profissionais e para com a EIC. Sendo, pois, o município o responsável pela política de EI, evidenciaremos os dizeres e as questões respectivas ao atendimento, ao acesso, à qualidade desse atendimento às crianças oriundas de assentamento.

Nessa direção, as políticas de educação para essa população precisam, ainda, promover ações para melhor conhecimento dessa realidade, além de investir na formulação e implementação de projetos pedagógicos, levando em consideração a diversidade do campo brasileiro (SILVA; LUZ, 2012, p. 213).

No bojo dessa discussão, as legislações referentes à educação para as crianças demarcam um campo de conquistas e alicerce para as políticas públicas no que se refere às condições de acesso, aos parâmetros de qualidade, respeitando as especificidades do campo e o atendimento com qualidade (BRASIL, 2006, 2008, 2009, 2010).

Em meio a essas conquistas, fruto da luta dos movimentos sociais para com a efetivação do direito das crianças, aventamos uma interface da EI com a EC no reconhecimento da EIC como direito das crianças (CÔCO, 2011) que habitam o campo brasileiro. Nas dialogias (BAKHTIN, 2011) com o contexto de vida dos sujeitos do campo, buscamos o encontro com os educadores, com os sujeitos do Setor de Educação do MST, bem como com os responsáveis no âmbito municipal pela política de EIC. Portanto, a imersão em área de assentamento surge com o intuito de compreender como se efetiva a formação continuada dos educadores da EI que atuam em assentamentos. Nos insere num contexto em que interagem diversas e múltiplas vozes (BAKHTIN, 2011, 2014).

Nesse intento e com base em nosso referencial teórico-metodológico, temos a compreensão de que nossa palavra, bem como as palavras dos outros estão carregadas de sentido, fazem parte de uma gama de palavras outras que no nosso viver, no nosso estar no mundo com o outro vão sendo construídas, nas diversas possibilidades em torno do que o outro diz, entende, compreende, seja no falar, na escuta, no gesto. Nosso corpo é movido por estas diversas enunciações, que hoje pertencem a nós, amanhã, a tantos outros, e assim vamos construindo nossas andanças pelo mundo, através dos dizeres, das enunciações, das gestualidades. A composição desses enunciados diante da polifonia de vozes ouvidas, construídas e alicerçadas nesta pesquisa nos possibilitou ir compondo junto aos sujeitos do campo, na compreensão em torno do nosso inacabamento, de nossa incompletude, da nossa possibilidade, numa perspectiva bakhtiniana de que estamos sempre aprendendo (BAKTHIN, 2011) visto que a formação é algo inacabado e, portanto, sempre passível de transformações, que nos transformam, afligem, tensionam, motivando o interesse da pesquisa diante à problemática vivenciada.

Nesse sentido, seguimos desenvolvendo a arquitetura deste texto, passando para o próximo tópico, no qual apresentamos algumas indagações que se delineiam a partir da problemática, o objetivo geral e os objetivos específicos concernentes a nossa pesquisa.