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7. LEVANTAMENTO PRELIMINAR – condições de ensino nas escolas de Ituiutaba Nossa investigação, embora ambicione discutir questões abrangentes sobre o ensino de

7.2. As Supervisoras pedagógicas

7.2.2. O professor e a formação continuada em ciências

Neste item, destacamos trechos das entrevistas que mencionam o envolvimento do professor com seu próprio desenvolvimento profissional, seja pela participação em cursos, seja pelas atitudes manifestadas em razão de novas propostas de trabalho. Pois, ainda que existam orientações que direcionem o trabalho do professor para atividades mais integradas, parece que há certa resistência à incorporação de novas práticas, conforme relato abaixo:

(O objetivo é desenvolver) (...) conhecimentos conceituais e isso sem falar nos aspectos cognitivos, afetivos, éticos, morais, sociais (...) na verdade, tem muitos objetivos para essa fase, não é nada fácil pensar em como organizar isso (...) o maior problema são os professores que não querem, eles não se preocupam em melhorar não, é um custo, a gente tem que dar tudo mastigadinho para eles. (supervisora – escola E)

A supervisora da escola E reconhece a dificuldade de emparelhar tantos objetivos em um mesmo planejamento visto que, além de muitos, são bem distintos e abrangentes. No entanto, transfere a responsabilidade do sucesso deste empreendimento exclusivamente para os professores que, segundo sua experiência, somente aderem a novas propostas se encontrarem determinadas facilidades. Percebemos neste trecho um traço interessante do discurso que acaba atribuindo a culpa por todo um sistema não funcionar como o esperado ao desinteresse dos professores. Com isso, não há o que possa ser feito para melhorar a situação,

da mesma maneira que se defendem alguns professores pelo não aprendizado de seus alunos apoiados exclusivamente na desculpa de que não há interesse.

Já a supervisora da escola I pondera sobre a crescente sobrecarga de trabalho do professor, entendendo que a falta de tempo é um obstáculo que impede o professor de procurar por novas oportunidades de aprendizagem e de atualização. Entretanto, nos mostra que, por imposições do próprio sistema de trabalho do município, os professores acabam procurando por cursos de formação continuada.

Bom, quando dá a gente elabora algum projeto para ser executado, mas de ciências faz tempo que a gente não faz (...). Curso? Tem sim, a Secretaria sempre tem alguma coisa, o duro é os professores terem tempo para fazer, porque o professor, hoje em dia, tem que trabalhar muito para poder sobreviver, então nem sempre sobra tempo para fazer um curso, mas mesmo assim os professores correm atrás porque isso conta para avaliação (...) mas de ciências, específico, eu não sei te informar. (supervisora – escola I) 

Entretanto, cursos nas áreas específicas não parecem tão abundantes quanto os dedicados à alfabetização, pois:

(...) especificamente sobre ciências não tem, pelo menos que eu tenha visto, porque o foco é outro (...) E tem mais, como os alunos recebem os livros, fica mais tranquilo esse negócio com as matérias, eu acho que os professores conseguem se virar (...) a preocupação é alfabetizar esses meninos, aí tem bastante cursos, projetos (...) Os professores, em vez de aproveitar para aprender coisa nova, sei lá, aproveitar o tempo para estudar, até para descansar, porque chega final de ano, professor está muito cansado (...) Tem que ficar fazendo trabalho burocrático, é sempre assim, cada ano aparece uma coisa. (supervisora – escola A)

A supervisora da escola A também justifica o fato de seus professores não procurarem meios para aprender mais, porém, nesse caso, por entender que os professores desperdiçam tempo ao realizar tarefas excessivamente burocráticas. No entanto, entende que o fato de não serem ofertados, com frequência, cursos das disciplinas específicas, pode ser atenuado pelo suporte do livro didático, revelando uma concepção de educação baseada na transmissão das informações nele contidas.

Somada a pouca relevância atribuída ao ensino de ciências nas séries iniciais, muitos dos profissionais envolvidos também não têm uma formação mínima na área, dificultando o estabelecimento de práticas alternativas em sala de aula, direcionando os esforços para a alfabetização.

Nós temos acesso a todo material que vem da Secretaria e do Estado, então as orientações que nós seguimos são essas, mas são mais específicas para a alfabetização (...) Sobre ciências a ideia é atender a matriz de referência... (supervisora – escola J)

Como eu não sou especialista em ciências, fica difícil para mim, para inventar coisas na área (...) Minha área é linguística, aí sim, eu elaboro algumas coisas e passo para os professores, mas nas outras matérias eu espero mesmo o que vem da Secretaria. Desde que eu assumi a supervisão, não teve curso de ciências não, teve de letramento, de alfabetização, de racismo... (supervisora – escola H)

Os trechos destacados ratificam que, embora as escolas tenham autonomia para elaborar seu projeto político-pedagógico, devem seguir as orientações de órgãos superiores, como é o caso da matriz curricular, documento estadual que define conteúdos e capacidades a serem desenvolvidos a cada ano, por disciplina. E, nesse caso, a importância atribuída à alfabetização parece também se refletir no comportamento dos professores que acabam não procurando novas formações em outros campos do conhecimento, conforme observamos, igualmente, na declaração a seguir:

Mas, ciências, vou te confessar que eu também não sei muita coisa, então aí já fica mais complicado. E também ninguém quer fazer capacitação de ciências aqui na escola, eu sempre passo uma lista para saber o que cada professor gostaria de fazer, porque daí quando tem alguma vaga, eu já procuro encaixar alguém que está interessado (...) E de ciências não tem ninguém. (supervisora – escola B)

Por outro lado, a supervisora da escola E pontua a necessidade de existirem cursos que tragam reflexos para a prática do professor, superando a ideia de uma teoria desvinculada da realidade, uma vez que:

a Superintendência oferece, às vezes, alguma oficina (...) mas nesses últimos anos, fora o pró-ciências eu não lembro de ter outro na área da ciência não, tem pro- letramento, tem de matemática, de alfabetização, mas, de ciência, que eu lembro foi só esse mesmo (...) mas, nem todo mundo está a fim de fazer porque dá trabalho (...) E tem muita coisa que não interessa para a gente (...) Eu acho que a gente precisa da coisa prática, que vai resolver o problema aqui (...) Esse negócio de só ficar na teoria, eu não gosto. (supervisora – escola E)

Como vemos, além do escasso tempo disponível, nem sempre há oferta de cursos de formação continuada que atendam aos interesses e preocupações dos professores. Assim, a argumentação de que o professor é acomodado e não busca o aperfeiçoamento de sua prática

pode ser decorrente de uma visão restrita sobre a realidade da situação vivenciada pelo magistério no país, conforme nos alerta Freitas (1988) em sua dissertação de mestrado.