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O que revelam as dissertações sobre o tema “inclusão”

2 REFERENCIAL TEÓRICO

4 O ESTADO DO CONHECIMENTO DA PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE A EDUCAÇÃO DE SURDOS

4.5 Os principais resultados e considerações das dissertações e teses

4.5.1 O que revelam as dissertações sobre o tema “inclusão”

a) Prática pedagógica em contexto educacional inclusivo:

As dissertações que examinaram a prática pedagógica em escolas regulares inclusivas revelam fragilidades no processo de inclusão de alunos surdos. As investigações focalizaram a prática pedagógica em sala de aula, ou ainda, a concepção de professores sobre a sua prática.

Os resultados demonstram que muitos professores não têm informações a respeito da surdez e suas implicações no processo educacional, ou ainda, apresentam uma visão fortemente associada à patologia, concebendo o surdo como menos capaz, e esses fatores podem interferir em sua prática pedagógica e na busca de estratégias que favoreçam o processo de ensino e aprendizagem.

As barreiras comunicacionais são enfatizadas nas dissertações analisadas, a maior parte dos professores desconhece a Libras, além disso, observa-se, em alguns contextos, carência de intérpretes, ou mesmo, intérpretes com um domínio precário da Libras e/ou de estratégias de interpretação.

E no que tange à presença do intérprete em sala de aula, as investigações pontuam dificuldades de relação entre professor e intérprete educacional e incertezas quanto aos papeis de cada profissional no processo educacional de alunos surdos. Também, muitas vezes, os professores delegam ao intérprete educacional as responsabilidades para com o ensino de alunos surdos e seu sucesso escolar.

As dissertações assinalam, também, que a prática pedagógica não tem sofrido adaptações e/ou adequações em virtude das especificidades linguísticas, cognitivas e culturais dos surdos. Assim como exprime Fonseca (2012), em uma sala de aula formada por alunos surdos e ouvintes, há o problema de ajuste da prática pedagógica, que, em muitos momentos, não atinge as demandas dos dois grupos, e como os alunos ouvintes normalmente são maioria, eles tendem a ser mais bem assistidos.

E em razão das dificuldades encontradas na inclusão de alunos surdos em escolas regulares e da carência de formações - continuada e em serviço - aos profissionais envolvidos nesse processo, os trabalhos evidenciam a necessidade de se fomentar cursos de formação continuada e em serviço voltados aos professores e demais profissionais da equipe escolar, que contemplem, articulados aos saberes teóricos relativos à educação inclusiva e à educação de surdos, os desafios vivenciados no cotidiano escolar, na prática pedagógica, de modo a

superar um modelo de formação alheio às reais demandas de professores, intérpretes, alunos surdos e ouvintes, gestores, entre outros.

Em especial, no que tange ao processo de letramento de uma criança surda, Albuquerque (2012) demonstra que uma prática pedagógica fundada em interações comunicativas - em Libras e em língua portuguesa -, em práticas dialógicas significativas, na valorização do visual e na dramatização favoreceu a aprendizagem e o letramento de uma criança surda e demais alunos ouvintes. A autora assinala, ainda, que apesar de muitos estudos apontarem os equívocos inerentes ao papel do IE e que somente a sua presença em sala de aula não garante aos alunos surdos melhores condições de aprendizagem, a sua ausência acarretou inúmeras dificuldades no contexto por ela investigado.

Por sua vez, Lima (2011) revela que para muitos professores, familiares e mesmo estudantes surdos, o processo de ensino/aprendizagem de língua inglesa de alunos surdos é uma tarefa inviável. Há a ideia de um surdo ideal para o aprendizado de uma língua estrangeira - o surdo bilíngue e com reais perspectivas acadêmicas, profissionais e/ou culturais. E essa crença restringe as chances de um surdo não ideal interessar-se em aprender a língua inglesa. Para a autora, contudo, é preciso que professores estabeleçam objetivos práticos para o ensino dessa língua e considerem as motivações e interesses de seus alunos surdos, suscitando neles o desejo de aprenderem a língua inglesa.

Por fim, Mello (2013) exprime que devido à carência de orientações que subsidiem o trabalho do professor com alunos surdos, muitos professores desenvolvem estratégias a partir de sua prática profissional, a fim de viabilizar o ensino e a aprendizagem de seus alunos surdos. No entanto, no contexto observado, os professores de surdos apresentavam dificuldades em se constituírem como um coletivo de trabalho, em outras palavras, observou- se um “estilhaçamento” de normas, os professores agiam de maneiras diferentes diante de uma mesma situação. Além disso, ao definir suas próprias normas para a execução de uma determinada tarefa, os professores conferiam um valor inferior a essas normas (de caráter ascendente), quando comparadas a normas oficiais (descendentes), observando-se uma desvalorização dos saberes advindos da experiência.

b) Inclusão no ensino superior:

Quanto à inclusão no ensino superior, as dissertações revelam que as políticas linguísticas, educacionais e de acessibilidade vigentes têm suscitado alguns avanços no tocante ao ingresso de alunos surdos no ensino superior, especialmente em instituições

privadas. Não obstante, assinalam que ainda são muitos os desafios encontrados por esses estudantes para a sua efetiva inclusão nesse nível de ensino. E dentre os principais entraves, destacam as barreiras linguísticas. A prioridade da língua portuguesa nos processos de seleção e no processo educativo, e o não reconhecimento da Libras como a primeira língua do surdo, constituem os principais obstáculos para o acesso e permanência de alunos surdos no ensino superior, conforme as produções analisadas.

Nos processos de seleção, os alunos surdos contam com o apoio de intérpretes, no entanto, as atribuições desses profissionais nesse momento não são claramente definidas. As exigências das provas recaem, basicamente, no desempenho na língua portuguesa escrita, segunda língua do surdo.

No processo educativo, muitos professores desconhecem a Libras e as especificidades da surdez, portanto, a presença do intérprete educacional mostra-se indispensável, ao mediar o acesso aos conteúdos ministrados e a relação entre professor ouvinte e alunos surdos. Todavia, muitos professores questionam se as interpretações realizadas são condizentes com os conteúdos ministrados nesse nível de ensino, dada a sua maior complexidade. Lima (2012) aponta, ainda, que muitos professores relatam dificuldades na produção e compreensão textual de alunos surdos usuários da Libras, e que essas dificuldades não são observadas em alunos surdos oralizados. Para esses professores, são necessários apoios outros para a efetiva inclusão de alunos surdos no ensino superior, especialmente em relação à qualificação na expressão escrita.

Assim, as dissertações demonstram que muitas IES não apresentam uma política clara para a inclusão de alunos surdos no ensino superior, de modo que atenda às suas reais demandas de acesso e permanência.

Nesse perspectiva, Moreira (2012) assinala que na concepção de professores surdos que atuam no ensino superior, a promulgação da Lei n. 10.436 de 2002 (BRASIL, 2002) ampliou as possibilidades de acesso e permanência de surdos, como professores ou estudantes, nesse nível de ensino. No entanto, as IES não têm oferecido condições de acessibilidade adequadas, principalmente quanto à diferença linguística, seja no processo de contratação, com condições equitativas para que os surdos possam concorrer às vagas disponíveis, seja no ambiente profissional ou no processo educacional como um todo. Contudo, o autor aponta que os professores surdos, participantes de sua pesquisa, pouco têm cobrado das IES um espaço acessível e sensível às diferenças linguísticas, bem como, a sua participação em movimentos que reivindicam direitos educacionais para surdos é ainda inconsistente.

Particularmente em relação à acessibilidade em ambientes virtuais de aprendizagem de um curso superior a distância, Colacique (2013) demonstra que apesar de serem disponibilizadas vagas reservadas a alunos com deficiência, assim como alunos surdos, os ambientes virtuais não eram acessíveis, com vídeos sem legenda ou instrução em Libras ou textos com um tamanho de fonte muito reduzido, no caso de alunos com baixa visão. As práticas inclusivas eram pontuais, com pouca ou nenhuma articulação entre os profissionais envolvidos no processo de formação. Segundo a autora, dada a garantia legal, os cursos de formação a distância devem propiciar conteúdos acessíveis, instrução em Libras aos surdos usuários da língua de sinais, avaliação diferenciada que considere as especificidades linguísticas dos surdos, formação permanente de tutores e coordenadores, a fim de instrumentalizá-los para a promoção da acessibilidade, entre outros.

c) Atendimento educacional especializado (AEE):

As investigações sobre o AEE apresentam considerações divergentes acerca de suas implicações para a inclusão escolar de estudantes surdos.

De um lado, Sperb (2012), autora surda, assinala que as orientações do MEC voltadas ao AEE para o ensino de língua portuguesa para alunos surdos mostram-se equivocadas e incoerentes, os métodos de ensino de segunda língua não são claros ou mesmo condizentes com as principais pesquisas no campo. A autora questiona a orientação presente nos materiais do MEC de que o ensino de língua portuguesa não pode fundamentar-se na Libras sob a justificativa de serem línguas distintas, com gramática e normas próprias. Para Sperb (2012), a Libras deve fundamentar todo o processo de ensino e aprendizagem de alunos surdos. A autora constata, no entanto, que nos dizeres de alunos surdos o AEE constitui um momento significativo para o aprendizado da língua portuguesa escrita, pois permite preencher algumas lacunas vivenciadas no contexto da sala de aula comum. Apesar disso, a autora reivindica escolas bilíngues para surdos, que considerem as suas particularidades linguísticas e culturais no processo educacional.

De outro, Soares (2013), ao descrever o AEE de surdos do ensino médio em uma escola regular inclusiva, e Ramos, E. S. (2013), ao rememorar o AEE realizado com um estudante surdo em uma IES privada, exprimem a importância desse atendimento para a inclusão de alunos surdos. De acordo com os autores, nas situações investigadas, o AEE proporcionou recursos e estratégias para que o ensino ministrado fosse acessível aos alunos surdos. Assim, para Soares (2013) e Ramos, E. S. (2013), ao repensar e redimensionar as suas

práticas, a escola regular constitui o lugar mais apropriado para a escolarização de todos os alunos, inclusive os surdos.

d) Implementação da proposta de inclusão escolar:

As dissertações que examinaram a implementação da proposta de inclusão escolar de surdos revelam, também, realidades distintas.

Conceição Filho (2011) mostra que nos dizeres dos participantes de sua pesquisa a implementação do programa de inclusão investigado foi bem sucedida, os alunos surdos foram bem acolhidos pelos professores e colegas ouvintes, os professores contaram com o apoio dos gestores e de intérpretes educacionais, foram realizados cursos de Libras, além de encontros mensais para acompanhamento pedagógico, em que as experiências vivenciadas, os desafios e as angústias eram compartilhados entre os professores e amparados por conhecimentos teóricos relativos à surdez e ao atendimento educacional voltado aos alunos surdos.

Por sua vez, Lourenço (2013) evidencia limitações na aplicabilidade da proposta de inclusão escolar de um aluno surdo. Segundo a autora, no contexto observado, a prática pedagógica e os processos avaliativos não eram adequados às especificidades e necessidades do estudante surdo. Esse aluno, que cursava o ensino médio, não era ainda alfabetizado, ficava muitas vezes isolado, abandonado no interior da escola, e mostrava-se dependente de professores, intérpretes educacionais e colegas ouvintes.

E Santos (2011), ao examinar os fatores que influenciam a permanência ou a ausência de alunos surdos em escolas regulares em Salvador, constata que a maior parte dos alunos surdos usuários da Libras encontra-se em escolas ou classes específicas para surdos, enquanto que os alunos surdos oralizados estão, em sua maioria, em escolas regulares. De acordo com a autora, isso deve-se, especialmente, à qualidade das interações comunicativas estabelecidas em cada ambiente pedagógico. Entre os fatores que podem influenciar a permanência de alunos surdos usuários da Libras em escolas regulares, Santos (2011) pontua: o desejo da família de ver seu filho surdo estudando com alunos ouvintes; a crença de que o ambiente da escola de surdos pode impossibilitar o aprendizado da língua oral; e a proximidade das escolas comuns das residências dos alunos surdos. E entre os fatores que podem influenciar a ausência desses estudantes nas escolas regulares, destaca: a língua comum (língua de sinais) entre o aluno surdo, o professor e seus colegas na escola de surdos; o desconhecimento da escola regular acerca das particularidades educacionais do aluno surdo; e a recusa de

matrícula em escolas regulares. Conforme Santos (2012), é na escola de surdos que os alunos têm encontrado um ambiente propício para a aquisição da linguagem, no entanto, a atual política de educação inclusiva tem proposto o fechamento dessas escolas. A autora evidencia, ainda, a necessidade de conhecer o perfil dos alunos surdos presentes nas escolas regulares, pois não é apenas o aluno surdo usuário da Libras que pode estar sendo negligenciado nesse contexto, mas também os alunos surdos oralizados, que por apresentarem uma língua “comum” podem ter camufladas as suas necessidades.

e) Educação de jovens e adultos (EJA) e sua interface com a educação inclusiva:

As dissertações analisadas sinalizam as marcas do fracasso escolar na trajetória dos estudantes surdos da EJA, no entanto, revelam contextos muito desiguais.

Por um lado, Bregonci (2012) exprime os esforços empreendidos no IFES para atender às demandas dos estudantes surdos matriculados no Proeja. Foram contratados intérpretes educacionais; realizadas monitorias; oferecidos cursos de Libras ao professores, aos demais profissionais do instituto e aos alunos surdos e ouvintes; e cursos de formação em serviço aos professores. Os professores passaram a buscar novas estratégias de ensino, que favoreceram não apenas os alunos surdos, mas também os demais alunos, e a estabelecer uma relação de pareceria com os intérpretes educacionais.

Por outro lado, Rocha (2012) desvela a complexidade da materialização da política de educação bilíngue nas turmas comuns da EJA. Na escola observada não havia intérpretes educacionais ou professores bilíngues, e a responsabilidade pelo ensino dos alunos surdos foi delegada aos instrutores surdos nas salas de recursos multifuncionais, inviabilizando o acesso ao currículo comum da escola. Segundo esse autor, os jovens e adultos com deficiência têm sido invisibilizados nas políticas educacionais e no interior das escolas.

f) Interação afetiva entre professor e aluno surdo em salas de aula inclusivas:

Ao analisar a interação afetiva entre professores e alunos surdos em salas de aula inclusivas, Franco (2013) demonstra que os professores desconhecem a Libras e não estabelecem interações comunicativas com seus alunos surdos, no entanto, o afeto tem contribuído para minimizar essa barreira e viabilizar uma interação afetiva entre professores e alunos surdos, promovendo a sua autoestima e motivando-os no processo de aprendizagem. A autora indica, ainda, que os professores sentem-se despreparados para atuar com os alunos

surdos e que não contam com cursos de formação continuada sobre a educação de surdos, ou mesmo, com cursos de Libras.

g) Clima criativo em sala de aula regular inclusiva:

Alves (2013) examinou a promoção de um clima criativo em uma sala de aula formada por estudantes surdos e ouvintes e verificou que tanto a professora como a intérprete educacional (IE) contribuíram nesse processo, porém, no caso dos alunos surdos, o papel da IE foi preponderante ou mesmo substitutivo ao da professora, o que, segundo a autora, pode dever-se ao pouco preparo da professora para atuar com estudantes surdos, ou ainda, ao conflito entre as atribuições que cada profissional - professor e IE - deve assumir no processo educacional de alunos surdos.