• Nenhum resultado encontrado

O que revelam as dissertações sobre o tema “intérprete educacional”

2 REFERENCIAL TEÓRICO

4 O ESTADO DO CONHECIMENTO DA PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE A EDUCAÇÃO DE SURDOS

4.5 Os principais resultados e considerações das dissertações e teses

4.5.3 O que revelam as dissertações sobre o tema “intérprete educacional”

a) Atuação no contexto educacional e formação do intérprete:

Observamos que os principais resultados e considerações sobre os temas secundários “atuação no contexto educacional” e “formação” se complementam nas dissertações analisadas, portanto, não realizamos, nesse momento, uma distinção entre os respectivos temas.

As dissertações revelam que a peculiaridade do trabalho do intérprete no contexto educacional tem suscitado um conflito de saberes e atribuições, o papel do IE se confunde, muitas vezes, com o de professor do aluno surdo. Assim, em muitos casos, os professores, e até mesmo a equipe escolar e as famílias, atribuem ao IE a responsabilidade pelo ensino do

aluno surdo e seu sucesso escolar. O próprio IE tem assumido, em diversos momentos, essa função.

Suzana (2014), em sua dissertação, assinala que quando o aluno surdo ingressa na escola com pouco ou nenhum domínio da Libras, o IE tende a apoiar esse aluno no processo de aquisição de sua primeira língua, bem como, ao interpretar um conteúdo ministrado pelo professor e perceber que o aluno surdo não compreendeu, o IE sente-se no compromisso de buscar novos exemplos, outras formas de explicar aquele conteúdo, que possibilitem ao aluno surdo aprender.

No caso do professor interlocutor, que apresenta uma formação docente como condição para sua atuação, a falta de clareza sobre as funções que deve desempenhar e a incerteza acerca das atribuições dos diferentes profissionais presentes em sala de aula - professor regente e professor interlocutor - em relação ao processo educacional do aluno surdo foram ainda maiores. Por essa razão, as dissertações demonstram que a sua atuação se constitui, muitas vezes, pelo improviso, conforme as demandas apresentadas. Ainda, o seu fazer tem enfatizado muito mais uma ação docente do que práticas interpretativas.

E em virtude das singularidades da atuação do intérprete no contexto educacional, as investigações evidenciam a necessidade de uma formação que contemple os conhecimentos relativos aos processos interpretativos e às línguas envolvidas nesse processo, mas que também considere o caráter mediador que o âmbito educacional impõe a sua prática.

As condições de trabalho do intérprete que atua no ambiente educacional foram, também, assinaladas nas dissertações analisadas, sobretudo no que concerne ao estabelecimento de contratos temporários, ausência de planejamento em conjunto com os professores e de contatos prévios com os conteúdos a serem trabalhados em sala de aula, e locação em diversas turmas em um mesmo período - devido a carência de profissionais perante as demandas atuais -, inviabilizando uma atuação efetiva.

As produções exprimem, ainda, fragilidades nos processos de interpretação, assim como profissionais com um domínio precário da Libras, cuja interpretação se distancia do conteúdo ministrado pelo professor, ou que omitem e/ou selecionam somente informações que consideram úteis ao aluno surdo, sinalizando uma formação deficitária.

A esse respeito, Jordão (2013) aponta que no universo por ele pesquisado, a maior parte dos IEs não apresentava uma formação adequada, muitos frequentaram cursos cujo ensino pautava-se, basicamente, no pareamento imagem/sinal, em frases e diálogos descontextualizados e foco na repetição lexical.

Nesse sentido, as investigações sinalizam a precariedade da formação de intérpretes de Libras em nosso país, bem como, de regulamentações quanto a sua atuação no contexto educacional. Desse modo, evidenciam a necessidade de se investir na formação inicial e, sobretudo, na formação continuada e em serviço dos profissionais que já atuam no contexto educacional. A esse respeito, Araújo (2011) enfatizou a necessidade de uma política pública de formação pensada e executada, principalmente, para os intérpretes que já atuam no espaço escolar, que permita apoiar a sua prática de modo a superar os problemas existentes.

Quanto ao trabalho do IE no ensino superior, especialmente na pós-graduação lato sensu, Santiago (2013) assinala que sua tarefa é complexa, pois envolve conhecimentos técnicos, conceituais, socioacadêmicos, de mundo, relativos à área do curso, além dos conhecimentos linguísticos. A autora observa que o intérprete utiliza diferentes estratégias no processo interpretativo, apoia-se em informações visuais e não visuais, explícitas e implícitas, faz referência a outros momentos da aula e utiliza a datilologia de forma não canônica. Para Santiago (2013), a relação dialógica entre o aluno surdo e o IE contribui de modo significativo para a construção de conceitos e, portanto, é oportuno considerar o papel do aluno surdo no fazer do IE. A autora também indica a necessidade de o IE ter contato prévio com os conceitos-chave do discurso a ser interpretado, de acompanhar o curso de modo a estar inserido nessa cadeia enunciativo-discursiva e de possuir uma formação em nível superior, ou mesmo estar cursando uma graduação, pois conhecer a cultura e a linguagem acadêmica colabora para um trabalho mais eficaz.

b) Sentidos e significados atribuídos ao intérprete:

Por fim, quanto aos sentidos e significados atribuídos ao intérprete, Schubert (2012) demonstra que o seu papel está muitas vezes associado a um caráter assistencialista, filantrópico, construído historicamente, concebido enquanto um instrumento de acessibilidade, um recurso e, portanto, neutro. Segundo a autora, os surdos reclamam uma educação verdadeiramente bilíngue, mas reconhecem que a presença do IE no ensino superior sinaliza um avanço. Por outro lado, afirmam ter autonomia em relação ao IE, bem como, identificam fragilidades na atuação de alguns profissionais. Conforme Schubert (2012, p. 152), falta ao IE “[...] uma identidade profissional, o reconhecimento social, atribuições específicas que a legislação necessita regulamentar e modificações no código de ética - que não lhe exija neutralidade, a qual nunca poderá garantir na totalidade no ambiente educacional.”.