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2 O GÊNERO RELATÓRIO COMO OBJETO EM FOCO:

2.2 O gênero relatório em foco

2.2.2 O Relatório em contexto de avaliação

A avaliação nas séries iniciais é componente básico na proposta pedagógica institucional de qualquer escola, seja pública ou privada. Em relação às concepções, essas variam de acordo com a acepção de cada instituição escolar e dependem de vários princípios – de criança, educação, aprendizagem, currículo, sociedade etc. –, contudo, primordialmente, devem oferecer subsídios para o conhecimento da aprendizagem do aluno, suas necessidades e, acima de tudo, oportunizar a reflexão para o (re)direcionamento do trabalho pedagógico (HOFFMANN, 1996).

Segundo Hoffmann (1996, p. 16), o acompanhamento do desenvolvimento de uma criança exige um olhar teórico-reflexivo, um respeito à sua individualidade. Para a autora, o ato avaliativo é permeado de interpretações e representações: “[...] é a própria mediação entre a criança, sua realidade e o espaço institucional, onde está inserido o educador com suas impressões de mundo, suas concepções a respeito das crianças [...]”. Nesta afirmação, percebemos como as visões de aluno podem refletir também nas concepções de avaliação, que se traduzem nas diversas nuanças.

Em relação ao processo avaliativo da educação infantil nas escolas públicas municipais de Fortaleza, o Conselho Municipal de Educação de Fortaleza – CME23, ressalta em seu artigo 16, que a avaliação deverá ter como objetivo “acompanhar e promover a

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Fixa normas para o Ato de Criação, Credenciamento e Autorização de Funcionamento de Instituições Públicas e Privadas de Educação Infantil no âmbito do Sistema Municipal de Ensino de Fortaleza. Resolução 001/2010. Disponível em: <http://www.sme.fortaleza.ce.gov.br/cme>. Acesso em: 08 set. 2010.

aprendizagem, o crescimento e o bem-estar das crianças, devendo ser feita por meio da observação e do registro de suas aprendizagens, em variadas situações individuais e grupais”, contemplando, sobretudo, os aspectos apontados na Proposta Pedagógica de Educação Infantil (físico, social, cognitivo etc.). Salienta, por sinal, que deve conter elementos para a reflexão pedagógica e oferecer subsídios para facilitar o acompanhamento do processo educativo pela família. Em conformidade com as considerações anteriores, fica evidente que a avaliação não tem o caráter de promoção, por conseguinte, o desempenho das crianças não constitui pré- requisito para o acesso ao ensino fundamental, sendo vedada a utilização de menções por notas ou conceitos.

Portanto, de acordo com a proposta de avaliação da educação infantil da SME – Fortaleza, o processo avaliativo deve contemplar os aspectos das ações indissociáveis de educar e cuidar, envolvendo todos que atuam com a criança na educação infantil e no 1º ano do ensino fundamental. Outro documento básico é o Referencial Curricular Nacional Para a Educação Infantil – RCN (1998), norteador das práticas educativas no que diz respeito ao processo de ensino e aprendizagem na educação infantil. Ao discorrer sobre a avaliação, traz como fundamento principal a avaliação do desenvolvimento da criança como conjunto de ações que auxiliam o professor a refletir sobre sua prática e sobre a aprendizagem do aluno, cuja função é acompanhar, orientar e redirecionar esse processo como um todo.

Na mesma perspectiva, segundo as orientações contidas no Diário Escolar do ano de 201024 da SME – Fortaleza, a avaliação do desempenho da criança é considerada como um processo contínuo e sistemático que antecede e acompanha a construção da sua aprendizagem e do seu desenvolvimento. Tem como finalidade básica intervir na tomada de decisões educativas e no (re)planejamento das atividades, nas situações e relações (quando se fizerem necessárias), modificando e melhorando a prática pedagógica e a aprendizagem da criança.

Dando prosseguimento às orientações direcionadas ao professor, no que diz respeito à avaliação do aluno, bem como à elaboração do relatório correspondente, encontramos algumas questões norteadoras para essa produção25:

1- Em que nível de desenvolvimento a criança se encontra?

24 Diário Escolar do ano de 2010 referente à Educação Infantil e ao 1º ano do Ensino Fundamental.

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2- Em que áreas do conhecimento/desenvolvimento a criança apresentou avanços/conquistas?

3- Quais os fatos que levam o(a) professor(a) a contextualizar tais avanços (comentários, temas de interesse, brincadeiras, participação em jogos, atitudes) ?

4- Quais caminhos percorreu para atingir tais conquistas? 5- Quais suas perguntas, dúvidas, comentários?

6- Apresenta alguma área a ser melhor trabalhada? 7- Como pode o(a) professor(a) intervir nesse sentido?

8- Como as crianças se referem quanto aos próprios avanços e aos trabalhos que desenvolvem? 9- Como reagiu diante de conflitos emocionais ou cognitivos?

10- Qual a contribuição possível da família?

11- Como os pais se referem ao desenvolvimento das crianças e ao trabalho da instituição?

As questões apontadas sugerem uma reflexão, principalmente em relação ao nível em que a criança se encontra, quais avanços e conquistas o aluno obteve ao longo do processo de aprendizagem, quais caminhos percorreu até esses avanços. Essas questões procuram oferecer um parâmetro sobre os pontos que o professor deve enfatizar na avaliação do aluno. Ao finalizar as orientações para a elaboração do relatório, verificamos, ainda, que é oportunizado ao professor a liberdade para se manifestar em relação aos pontos que considera pertinentes sobre o desenvolvimento do aluno, fundamentados nos aspectos observados ao longo do semestre.

Vimos que a avaliação na educação infantil abrange uma série de orientações, tanto em nível federal, como municipal. No mesmo âmbito, no que diz respeito à avaliação do ensino fundamental, a legislação26 vigente é a do Conselho Nacional de Educação – CNE, que fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 09 (nove) anos. Vejamos, especialmente, uma parte significativa do artigo 32:

Art. 32 A avaliação dos alunos, a ser realizada pelos professores e pela escola como parte integrante da proposta curricular e da implementação do currículo, é redimensionadora da ação pedagógica e deve:

I – assumir um caráter processual, formativo e participativo, ser contínua, cumulativa diagnóstica, com vistas a:

a) identificar potencialidades e dificuldades de aprendizagem e detectar problemas de ensino;

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b) subsidiar decisões sobre a utilização de estratégias e abordagens de acordo com as necessidades dos alunos, criar condições de intervir de modo imediato e a mais longo prazo para sanar dificuldades e redirecionar o trabalho docente;

c) manter a família informada sobre o desempenho dos alunos;

d) reconhecer o direito do aluno e da família de discutir os resultados da avaliação, inclusive em instâncias superiores à escola, revendo procedimentos sempre que as reivindicações forem procedentes.

Em razão do exposto, salientamos que não é nosso objetivo, neste trabalho, realizar

discussões teóricas quanto às concepções de avaliação das escolas públicas municipais de Fortaleza. Apesar de ser parte do relatório, procuramos brevemente explicitar as concepções basilares que norteiam o fazer avaliativo nesses espaços – segundo suas diretrizes curriculares. Porém, convém destacar que vários fatores – sociais, econômicos, políticos etc. – colaboram para uma diversidade de práticas avaliativas nas instituições de ensino, visto que cada ambiente educativo possui peculiaridades inerentes ao seu contexto. Observamos, ainda, que muitos desses documentos oficiais, de natureza injuntiva, prescrevem o trabalho do professor, mas não mencionam as suas múltiplas dimensões: sociológicas, materiais, afetivas, disciplinares etc., consideradas centrais no desenvolvimento da profissão de professor (BRONCKART, 2006, p. 227). Por conseguinte, torna-se inviável, portanto, uma generalização no sentido de afirmar que os documentos, as resoluções e as diretrizes são amplamente adotadas/implementadas (ou não) nas escolas.

Ressaltamos, enfim, que nossa pesquisa apresenta-se como uma amostra retratada pelo discurso do professor em relatórios de avaliação, que refletem de certa maneira concepções de avaliação e ensino. Nessa perspectiva, o relatório como objeto de análise é concebido como um texto que faz parte do trabalho do professor, produzido em situação de avaliação. É a partir dessa visão que procuramos desenvolver a seção seguinte.