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Origens, existências passadas e presentes

2. Património: origens, existências passadas e presentes

2.3. O interior do antigo mosteiro

2.3.3. O restante espaço

Deste piso acede-se ao piso superior por uma escadaria com dois lances, em pedra. Os acessos são feitos por arcos de volta perfeita ou abatidos, de cantaria. Nos patamares principais, duas janelas com bancos adossados, voltadas a Oeste, garantem a luminosidade.

Nas escadarias e em algumas pequenas salas do 1º piso, encontrámos azulejos de figura (Figs.159-164) avulsa, inícios do séc. XVIII, envoltos por uma cercadura 2×2 de camélia ao centro, com quatro volutas, que envolvem, cada uma, uma pequena flor; os motivos que se encontram representados são múltiplos, na sua maioria, infelizmente, já desaparecidos. As representações de flores, pássaros e barcos são dominantes, no entanto, motivos mais raros como representações humanas e um curioso Cupido (Fig.162), e aquilo que parecem ser curiosas representações infantis da mitologia romana, como seja um Baco, também se encontram presentes apesar de em número diminuto.

No corredor de acesso ao 1º piso, para além do motivo da Cruz de Malta (Figs.165,166), são visíveis outros motivos, nomeadamente um friso de albarradas com a ramagem desenvolvida verticalmente, ladeada por golfinhos, com elementos complementares verticais; como elementos intermédios de ligação surgem os designados palmitos, jarras de flores, e querubins (cabeças de anjo aladas) que participam dos motivos principais e de ligação, proporcionando uma continuidade decorativa proporcionada pela simetria e equilíbrio da decoração. Estes painéis de albarradas são envolvidos por uma cercadura igual à encontrada nas escadarias.

Nos corredores também é possível encontrar um outro painel policromo (com padrão 2×2) emoldurado por barra ondulada, azul e branca, com pequenas flores. Este painel tem um padrão constituído por uma quadrícula originada pelas uniões de folhas de acanto brancas delineadas e com o centro a azul, que combinam com conjuntos de quatro folhas sobre um quadrado de fundo amarelo; os motivos e as cores (nomeadamente com os subtis delineamentos e centros a ocre) produzem um efeito quadriculado e diagonal desenvolvido pelo centro dos dois elementos (Fig.167).

77 Num dos corredores, a suprir umas lacunas do padrão Cruz de Malta, são visíveis uns curisosos azulejos de figura avulsa, policromos, já do séc. XX (Fig.168). São representações militares, mais concretamente de soldados de diversos tempos e proveniências, vestidos com as respectivas fardas. Teresa Saporiti faz referência a eles na obra Azulejos de Lisboa do Século XX204

No pavimento superior (Figs.169,170) estariam primeiramente instaladas as celas das freiras e, como refere o Auto a que já aludimos, casas de ante-coro; pelo desnivelamento do terreno, é também por este piso que existe acesso à torre “uma escada de pedra em

caracol semdo toda de pedra com courenta degraus”

, revelando que eles se encontravam na Messe do Quartel de Sacavém, à qual não tivemos acesso. Segundo esta autora, serão da Fábrica Viúva Lamego e da Fábrica Sant’Anna. Sabemos da existência do mesmo tipo de azulejos na Escola de Sargentos do Exército das Caldas da Rainha e nas Termas do Vimeiro (aí com este e outro tipo de representações populares).

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, e tal como pelo inferior por aqui se fazia e faz acesso aos terrenos circundantes, então “dois terrenos murados

distribuídos em dois socalcos e todos murados que se denominavam as cercas de dentro, sendo os ditos terrenos de limitada cultura com algumas oliveiras parreiras arvores de fruta com um tanque de cantaria e varias capellinhas mas em estado de ruína”206.

Também neste piso, no mesmo lado em que, no piso inferior, se encontra a Sala do Capítulo, encontra-se um medalhão oval (Figs.171,172), em mármore, com um baixo- relevo de São João Evangelista, representado com a iconografia habitual – o Livro, símbolo genérico de evangelista, e a Águia, símbolo da elevada espiritualidade dos seus textos, inspiração e do Espírito Santo. A águia encontra-se à sua direita, a seus pés; o braço esquerdo, ampara o livro, fechado, o direito eleva-se e o seu dedo indicador aponta a cabeça. O ondulado da figuração, habilmente se adapta à dimensão do medalhão, produzindo simultaneamente uma curvatura, proporcionada pela flexão de um joelho e pela cabeça inclinada, um movimento que associado a alguma expressividade da figura e à forma como o tecido é trabalhado, através dos pregueamentos, produz uma imagem harmoniosa. Desconhece-se a sua origem.

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SAPORITI, Teresa, Azulejos de Lisboa do Século XX, Porto, Edições Afrontamento, 1992, p.200

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Vide inventário 1877

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2.4. A igreja

A igreja (Fig.79), iniciada em 1596 enquadra-se dentro de um maneirismo, já com características chãs, em que o racionalismo e a austeridade deste estilo estão nitidamente presentes; surge-nos internamente um volume unitário e amplo rodeado por paredes espessas. Pertence a um dos tipos de igrejas então definidos em Portugal, que teve origem nas igrejas monásticas femininas e que aqui, como não poderia deixar de ser, encontrou justificação, visto também esta tratar-se de uma igreja destinada a uma comunidade monástica feminina – as igrejas em que (no passado) um profundo coro de freiras se situava frente ao altar e em que, geralmente, a entrada do público se fazia não pela parede fundeira, oposta ao altar, mas por uma das paredes laterais207

Sabemos que Miguel de Moura terá morrido no final de Dezembro de 1599, com a igreja ainda por concluir; alguns meses antes, em 2 de Setembro, documentos relacionados com a construção da Eça

, neste caso pela parede Sul (Fig.175). Tal como acontece em algumas igrejas, principalmente estas em que o acesso é feito lateralmente, acaba por ser o alçado Este que apresenta maior dignidade, neste caso, quase uma composição cénica, bem pensada, em função do rio e do destaque que a morfologia do terreno lhe concede.

Não existem documentos que nos apontem quem foi o seu arquitecto; no entanto, algumas pistas colocam certos nomes em Sacavém e em Unhos em 1599, que podem traduzir alguma relação mais ou menos directa com o projecto de edificação da igreja: Nicolau de Frias, mestre das igrejas do Arcebispado de Lisboa e Gonçalo Pires Carvalho, Provedor das Obras del-Rei.

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KUBLER, George, CORREIA, José Eduardo Horta, pref. SILVA, Jorge Henriques Pais da, trad., A Arquitectura Portugues Chã, Lisboa, Veja, D.L., 1988, p.174

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ANTT, Corpo Cronológico, Parte I, mç114, nºs 34 e 35.

, monumento para as exéquias de Filipe I, são passados em Sacavém e em Unhos, por Gonçalo Pires de Carvalho e Nicolau de Frias, respectivamente. Por que razão estariam nestes locais? Obras, sem dúvida. Apesar de Miguel de Moura se encontrar doente, e uma visita ser normal, dada a sua posição na Corte, sabemos que as obras da igreja de Sacavém estavam em curso. O acesso a Unhos era feito, exclusivamente, por Sacavém, significando passagem obrigatória pela zona onde então se estava a edificar a igreja; a presença de Nicolau de Frias em Unhos deve, muito provavelmente, estar relacionada com a construção da igreja desta localidade, datada do início do séc. XVII. Não tendo, obrigatoriamente, de significar a intervenção

79 de Nicolau de Frias na obra da igreja do mosteiro, o facto do seu cargo no Arcebispado de Lisboa coloca-o numa posição privilegiada para desempenhar esse papel… Falecido em 1610, este arquitecto do Cardeal D. Henrique, “nasceu” nos círculos de marcenaria e escultura do seu pai, Pero de Frias, tendo sido posteriormente educado em Itália (provavelmente em Roma) num estágio ocorrido antes de 1575; autor de “programas efémeros” de entre os quais se destaca a já referida Eça, executada na igreja do Mosteiro dos Jerónimos, Frias dedicou-se igualmente à concepção e traças de uma série de igrejas paroquiais (como a Igreja de Santa Engrácia), renovação de capelas-mores, concepção de palacetes, capelas aristocráticas, riscos de peças de culto, entre outras obras de luxo cortesão.209

No que se refere, particularmente, a Gonçalo Pires de Carvalho, alguns anos mais tarde o seu nome aparece relacionado com obras do convento; como já vimos anteriormente, um Mandado Régio datado de 1626 cita o seu nome, inferindo, pelo atraso no início das obras a sua presença no convento antes de 1621 (no reinado de Filipe II) – então o monarca “lhes fez merçe por esmolla, de mandar a Gonçalo Pirez Carualho prouedor

das obras de Vossa Magestade se fizesse por Conta de sua Real Fazenda, hũa enfermaria, e se acodisse aos telhados e mais officinas danificadas, pera que o dito prouedor com os architectos de Vossa Magestade entrou, no dito conuento e fizeraõ traças e orsamentos.”

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Neste documento refere-se ainda que então, “Vossa

Magestade mandou fazer obras no Mosteiro da Madre de Deus, e no das Religiosas framengas por sua grandeza (…)”211

Estruturalmente a igreja apresenta uma planta longitudinal composta pela justaposição de dois rectângulos, correspondentes à nave e à capela-mor; a sua volumetria é

– de facto, sabe-se, e as freiras estavam bem informadas, que em 1626 deram-se obras de remodelação da igreja das Flamengas por Teodósio de Frias, com a destruição da igreja primitiva traçada por Nicolau de Frias.

A sua inserção no terreno, assim como as soluções arquitectónicas adaptadas, apesar de “simples” são reveladoras de uma “visão estratégica”. De facto, esta igreja apresenta-se estrategicamente colocada; coincidência de alinhamentos, ou não, existiu a clara noção da importância que o Alçado Nascente iria ter em todo o conjunto. O efeito cénico produzido é, ainda hoje, bastante forte, dando conta, da capacidade do autor da traça, que, servindo-se de uma arquitectura “austera” conseguiu transmitir imponência.

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SERRÃO, Vítor, 2001, p.215

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AHU Reino, Cx.5-A, Pasta 20

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escalonada, com uma abertura diferenciada efectuada por telhados de duas águas e corochéu.

O alçado principal (Figs.173,176,177), em reboco pintado, é coincidente com o alçado lateral (N), composto pelos dois corpos correspondentes às entidades espaciais que definem o interior (nave e capela-mor); na zona correspondente à nave, o corpo da igreja apresenta externamente um pano de muro ritmado por pilastras duplas de cantaria, assinaladas superiormente por pináculos piramidais (introduzidos pelas obras dos anos 50, não faziam parte da igreja, não sendo visíveis quer nas fotografias dos anos 20, quer nas gravuras dos finais do séc. XIX), definindo três módulos, animados no extremo Norte, por um portal de acesso à igreja (Figs.174,175) com verga recta, encimado por entablamento suportado por pilastras animadas por consolas nervuradas, três centrais e duas laterais (estas assentes em lacrimais), e sobrepujado por frontão triangular, assente em friso almofadado constituído por elementos geométricos em mármore rosa e negro. O portal é ladeado por pináculos, interrompido ao centro por uma cruz; é encimado, ao nível do remate da fachada, por uma janela iluminante com capialço acentuado para o lado exterior, igual a mais duas que se repetem nos restantes módulos.

Recuado em relação a este, o corpo correspondente à capela-mor, é delimitado por pilastra igual às anteriormente descritas, e incorpora uma janela iluminante idêntica às atrás mencionadas.

No caso do alçado lateral (Norte), este, tal como já tinha acontecido (bem visível, por exemplo, na gravura de Legrand), actualmente encontra-se, ao nível do rés-do-chão, ladeado por um corpo acrescentado, construído nos anos 50 e ampliado em 2008) (Fig.180) onde funciona a sacristia, salas de reuniões, etc..

Superiormente o edifício é rematado por cornija continuada, abaixo da qual existem as gárgulas.

A cabeceira do templo (Fig.178,179), destaca-se pela incorporação no alçado de uma torre de cantaria, ao centro, com quatro ventanas sineiras (em arcadas simples com trave superior) – definida por pilastras, sendo cada canto marcado por uma voluta; ostenta um nicho a albergar figuração escultórica de Santa Clara, sobrepujada por entablamento a terminar em frontão angular; sob a imagem de Santa Clara observa-se um pequeno quadrado e mais abaixo um rectângulo, ligeiramente afundados, em reboco, vazios – segundo o Padre Filinto “em recuados anos do Mosteiro, ao quadrado agarrava-se o braço de um lampião e, do rectângulo, farolava um reflector para todas as embarcações

81 do Tejo que, noite dentro, se faziam a este porto fluvial de Sacavém, nas embocaduras do Trancão.”212

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RAMALHO, Filinto, 1987, p.24

Quanto ao alçado Poente (Fig.181), o pano murário é ocupado, ao centro, por uma edícula (Fig.182) com decoração arquitectónica, em mármore branco e rosa, sobre e sob a qual se acham dois janelões rectangulares, simples.

A edícula, representa um dos mais interessantes vestígios maneiristas do templo; a sua concepção remete-nos para concepções arquitectónicas ditas da “grande arquitectura”. A sua “arquitectura a escala menor” faz lembrar grandes obras como a capela-mor da igreja de Santa Maria de Belém; a sua escala miniaturizada, relativamente grande e espectacular em relação à obra em que está inserida, revela o tipo de pessoas que estiveram envolvidas na obra e a sua capacidade técnica. O nicho, em arco de volta perfeita com chave central acolhe, em perspectiva, uma abóbada de caixotões (evidenciados pelo mármore rosa); é enquadrado por duas colunas toscanas que suportam um entablamento que alterna entre o rosa da arquitrave e da cornija e o branco do friso, decorado com pontas de diamante a rosa. O jogo de cores, também presente nas colunas, ajuda, aliás, a evidenciar e formar o próprio conjunto. Pela sua localização, tudo leva a crer que fizesse parte do antigo coro, não sendo de excluir a hipótese de ter alguma vez ocupado outro lugar, por exemplo, no altar-mor.

Era por este alçado que, através de outro corpo rectangular então existente, o convento se articulava com a igreja, um coro fundo de dois andares.

É no interior que a igreja se apresenta mais descaracterizada, e em que para além de uma estrutura pré-existente que se mantém, se encontram mais elementos novos. A sua nave única, característica que se integra na tipologia corrente das igrejas de freiras, apresenta uma cobertura em abóbada de nervuras (algo “modernizada”) assente em mísulas (Figs.186,187,190); os muros estão revestidos por um lambrim azulejar historiado, com cenas da vida da Virgem, estilo D. João V, produzido pela Fábrica da Loiça de Sacavém, oferecido pelos donos da fábrica (Figs.214-216). Estes painéis, pintados pelos mestres António Moutinho (figuração) e Abel Santos (composição ornamental), são reveladores da qualidade artística dos pintores da Fábrica de Sacavém. Alguns pormenores da composição ornamental revelam que foram buscar alguma inspiração no anterior lambrim que forrava a igreja.

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De cada lado da igreja encontramos, altares inscritos em arcos de volta perfeita (Figs.188,189,191,192) em cantaria, delimitados superiormente por verga recta destacada, suportada por pilastras ornadas com sugestões de capitéis jónicos.213

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Ficha inventário ex-DGEMN (IHRU), NºIPA PT0311107120007, p.2

Nestes altares encontram-se esculturas setecentistas (meados do séc. XVIII) de Santa Ana Mestra e de São José; ambas as esculturas encontram-se inseridas em baldaquinos, com peanha, iguais. Depreende-se pelas suas similitudes estilísticas e decorativas que sejam da mesma proveniência, podendo estar originalmente, ou colocadas nestes altares ou no altar-mor, inseridas em retábulos de talha dourada. Durante bastante tempo estiveram a ornamentar a Capela de Nossa Senhora da Saúde.

O culto de Santa Ana Mestra conheceu especial auge em Portugal já em pleno séc. XVIII estimulado pela devoção de D. João V e D. Maria Ana de Áustria; nesta escultura (Fig.193), de elegante concepção geral, Santa Ana apresenta-se de pé e frontal, ensinando a ler a Nossa Senhora, representada enquanto criança, que sentada sobre o braço esquerdo, segura um livro que a mãe ampara com a mão direita. A forma como as pregas são utilizadas, quer nas vestes, quer no fundo do baldaquino, produzem um jogo lumínico interessante, que numa observação revela a utilização do esquema cromático habitual enriquecido com motivos florais e vegetalistas dourados delimitados e salientados por punção – um vestido avermelhado e um manto verde. De facto, as vestes aparentam estofo elaborado, um pregueado anguloso cujo tratamento plástico reforça o dinamismo e teatralidade barroca que emana do conjunto; posteriormente o manto de Santa Ana, é marcado por pregas paralelas tendendo para a verticalidade. A ideia de mulher madura é transmitida pelo seu rosto magro e largo, que revela doçura e serenidade.

Também São José (Fig.194) segue a sua representação habitual; encontra-se de pé, frontal, olhando em frente, com a mão direita segura o bastão florido e com a esquerda o Menino. O tratamento dado à figuração, é similar à anterior, nomeadamente, a nível dos panejamentos (também enriquecidos com ramagens douradas) e respectivas pregas; enverga uma túnica de decote redondo, comprida, ostentando pregueado vertical mas desenhando as curvas do corpo, sendo bastante mais fluído na zona do peito. O manto é lançado sobre ombro esquerdo. O Menino possui o rosto arredondado com as faces cheias e enverga túnica comprida, cingida na cintura, com motivos idênticos aos das vestes de São José.

83 O arco triunfal (Figs.185,201,213) que precede a capela-mor é de volta perfeita, em cantaria, articulado com 2 vãos de volta perfeita também de cantaria, definindo altares colaterais com peanhas (introduzidas nas obras dos anos 50), onde estão colocadas as imagens de S. Miguel Arcanjo, à direita, e da padroeira, Nossa Senhora da Purificação, à esquerda.

No que se refere a São Miguel Arcanjo (Fig.197), esta escultura terá vindo da Capela de Nossa Senhora da Saúde (ou de outra, cujos bens nela tenham sido incorporados); trata-se de uma imagem significativamente maior que as anteriormente descritas. Deverá ser do séc. XVIII ou XIX; é um Arcanjo guerreiro, decidido e simultaneamente sereno. Não tem escudo, mas mão direita empunha a espada que, quase numa atitude passiva, trespassa o dragão ou demónio (nu e com corpo de homem) a seus pés. O seu braço esquerdo encontra-se levantado, como que a apontar para o céu; ao contrário do habitual, não é representado com a balança, com a qual pesa a alma dos mortos.

A imagem de Nossa Senhora da Purificação (Conceição) (Fig.196), fortemente repolicromada, apresenta elementos novos, como a base (que tinha sido serrada), o ceptro e a coroa, desenhados pelo Padre Filinto. Estamos perante uma escultura do séc. XVIII, de grande harmonia, proporção e dinamismo. Nossa Senhora encontra-se de pé e frontal com o braço direito projectado e levemente aberto, empunhando o ceptro, e segurando no esquerdo o Menino Jesus, sentado; ambos estão coroados. O eixo corporal descreve uma ligeira curva, ampliada pela flexão da perna e pelo movimento do manto, cujo pregueamento, muito bem conseguido, ajuda a dar volume à representação; as cores do vestido e do manto são enriquecidas por um intenso padrão floral dourado, que ajuda ainda mais a evidenciar todo o conjunto e o rosto jovem e sereno desta Nossa Senhora.

Actualmente (durante muitos anos, na capela-mor, à esquerda do celebrante), o sacrário (Fig.195) encontra-se aos pés desta imagem. É um sacrário, muito provavelmente do último quartel do séc. XVIII, séc. XIX, em talha dourada e pintura em marmoreado verde (fundo) – apresenta um formato semi-circular, com cobertura cupuliforme, decorada por motivos vegetalistas simétricos, sendo a frente preenchida por porta entalhada com representação de cálice com o Santíssimo Sacramento, em alto-relevo; o cálice é rodeado por resplendor de raios setiformes e assenta em nuvens. As ilhargas são apaineladas, decoradas com ramos de espigas e cacho de uvas, dourados e entalhados. A capela-mor (Figs.198,199), funda, é sobreeelevada, relativamente ao restante corpo da igreja e iluminada por janelas laterais, apresentando cobertura em dossel / abóbada

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de aresta (anteriormente, segundo o Padre Filinto, seria em abóbada de canhão214

) (Fig.203).

Na parede do fundo, por detrás do altar, encontra-se um Cristo Crucificado, séc. XVIII (a Cruz é posterior e adaptada) (Fig.204); apesar da sua postura algo hieratizada e rígida, este é um Cristo ainda vivo, em sofrimento, que contempla o observador. A forma como é figurado, revela um bom domínio técnico, assim como algum conhecimento de anatomia por parte do escultor.

É através da capela-mor, pelo lado esquerdo, quando virados para o altar, que temos acesso à sacristia (Fig.202), acesso que devia corresponder ao anterior; a sacristia e demais valências, ocupam o já referido novo corpo, construído nos anos 50 e ampliado para Oeste, ao longo do alçado, há pouco tempo. Encontram-se vestígios como um antigo lavatório e um nicho vazio, indiciadores desta se tratar da antiga zona da sacristia, completamente renovada e ampliada, correspondente ao corpo visível nas gravuras e visível na planta geral do quartel datada de 1927 (Figs.8,9). A última ampliação levou a que o acesso para esta zona de reuniões, cartório, sacristia, gabinete, passasse também a ser feita por uma porta em frente ao portal de entrada, da qual podemos ter acesso ao coro; o coro alto (Figs.205,212), construído aquando das obras de restauro efectuadas pelo padre Filinto, foi feito em betão e apresenta uma guarda contracurvada com balaústres. Na parede fundeira, encontra-se um vitral com a representação da Glória da Mãe de Deus. (Fig.206)

Sob este coro alto, encontra-se o baptistério (Fig.207); rodeado por uma balaustrada, abre-se na parede fundeira, ostentando ao fundo um díptico, uma pintura contemporânea de Graça Antunes, representando o Baptismo de Cristo (Fig.208). A pia baptismal (Fig.209), será a que se encontra rodeada pela antiga lenda ligada à Batalha de Sacavém – segundo ela esta pia seria a cúpula do mirante do antigo Alcaide Mouro entretanto convertido; o facto é que dificilmente é perceptível uma possível reutilização desse