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4. O SETOR FARMACÊUTICO

4.2 O Setor Farmacêutico no Brasil

Observa-se que o setor farmacêutico no Brasil é formado por um número muito maior de empresas nacionais do que transnacionais, entretanto o faturamento total das empresas transnacionais é ao redor de três vezes maior do que o faturamento das nacionais (FEBRAFARMA, 2007). Um dos agentes desse panorama é histórico. Um aspecto importante é o nível de pesquisa e desenvolvimento tecnológico (P&D). Historicamente, pode-se observar o grande volume de capital investido em P&D para alavancar não só a descoberta de novos medicamentos com a produção em larga escala, já que se trata de um volume de capital estratégico.

Os estudos realizados para entender os arranjos e redes organizacionais na indústria farmacêutica indicam que as empresas transnacionais convergem a maior parte de P&D em seus países de origem e concentram e deslocam a produção e comercialização dos medicamentos para outros países (FEBRAFARMA, 2007).

A história da indústria farmacêutica no Brasil teve seu início com a chegada do primeiro farmacêutico, Diogo da Costa, que desembarcou na Bahia em 1549, fazendo parte da comitiva do primeiro governador geral da colônia portuguesa, Thomé de Souza (CRF SP, 2007). A seguir são apresentadas, esquematicamente, no Quadro 6 a evolução e a história da indústria farmacêutica no Brasil:

Quadro 6: Evolução histórica da indústria farmacêutica no Brasil

Evolução Fato importante na indústria (continua)

1550 As boticas jesuítas - os jesuítas desembarcam na nova colônia portuguesa com a missão evangélica e também sanitária. Foram eles que atuaram como boticários, preparando remédios e tratando doentes. Absorvem muitos dos preparados indígenas.

1640 Permitido funcionamento de boticas - a Coroa portuguesa permite o funcionamento de boticas no território da colônia, melhorando o comércio local de remédios.

1700

A primeira fórmula brasileira - surge o primeiro medicamento genuinamente brasileiro. A Tríaga Brasílica era composta de várias drogas nacionais produzida pela Botica do Colégio dos Jesuítas da Bahia. Era usada como antídoto e contra veneno na picada de animais peçonhentos e em doenças febris.

1794

Regulamentação das boticas - Maria I publica edital em que torna obrigatório que toda botica tenha um exemplar da Pharmacopéia Geral. As especialidades encontradas nas boticas eram em grande maioria importadas da França, Inglaterra e EUA, como Purgativo Le Roy, Água de Melissa dos Carmelitas, Água Francesa e a da Rainha da Inglaterra; Pílulas de Belloste, Peitoral de Cerejas de Ayer; Maravilha Curativa de Humphrey, Pastilhas de Vichy, Emulsão de Scott, etc.

1832 Cursos de farmácia - São criados os primeiros cursos de farmácia no país, integrados às Escolas de Medicina do Estado do Rio de Janeiro e da Bahia. 1839 Primeira escola de Farmácia - Criada a Escola de Farmácia de Ouro Preto em 4 de abril, pelo governo provincial de Minas Gerais, pioneira na formação de farmacêuticos no país.

1858 Boticas e médicos em SP - Havia nesta data apenas quatro boticas na cidade de São Paulo e doze médicos, ano em que o alemão Gustav Schaumann inaugura à Rua São Bento a botica Veado D'Ouro.

1860 Primeiro produto industrializado - Lançado pelo farmacêutico gaúcho João Daudt Filho, a pomada Boro-borácica é considerada o primeiro produto nacional industrializado.

1870

Boticas viram farmácias - Surgem várias boticas ou "farmácias", como passam a se denominar, na capital paulista. Também foram criadas as drogarias, que deveriam por lei restringir-se à venda de drogas aos farmacêuticos, mas que frequentemente vendiam medicamentos ao publico em geral. As farmácias foram no Brasil, assim como nos demais países ocidentais, berços da indústria farmacêutica que a partir do fim do século passam a se ocupar da produção de remédios em larga escala. Nasce a Casa Granado, um dos laboratórios pioneiros do país instalado no Rio de Janeiro, criador de diversas especialidades farmacêuticas como Água Inglesa Granado, Magnésia fluida Granado, Vinho de Quino, Xarope Antiasmático Imabaibina, Xarope de Urucu composto.

1889

Primeira fase industrial - A proclamação da República em 15 de novembro encontrou a produção farmacêutica brasileira no apogeu de sua primeira fase industrial, que se prolongaria até 1914 e que assistiu à fundação dos primeiros laboratórios industriais produtores não só de medicamentos de origem vegetal, mas também de origem mineral e até animal (opoterapia, soros e vacinas). Havia então 35 laboratórios no país.

1901 Profissão farmacêutica reconhecida - Lei Epitácio Pessoa determina que só farmacêuticos formados poderiam exercer a profissão. Gradativamente os "boticários aprovados" e práticos começavam a desaparecer.

1906 Fundação do Instituto Pasteur - Instalado em São Paulo, sob a forma de fundação, o Instituto Pasteur tinha a finalidade de preparar vacinas contra a raiva. 1907 Censo de laboratórios - o censo realizado pelo Centro Industrial do Brasil daquele ano revelou a existência de 60 laboratórios farmacêuticos em funcionamento no país.

1915

Segunda fase da indústria farmacêutica - Este ano marca o início da segunda fase industrial impulsionada pela deflagração da Primeira Grande Guerra, que privou o Brasil de grande soma de medicamentos e deu início a uma fase de desenvolvimento geral dos nossos laboratórios, com ao aperfeiçoamento dos métodos científicos e da produção. Além disto foi o período do despertar dos laboratórios estrangeiros para o potencial representado pelo mercado brasileiro. Teve início a produção no Brasil de produtos de origem francesa, italiana, suíça, alemã, inglesa e norte-americana, em pequena escala. Ainda se fazia necessária a importação de quase todos os produtos químicos básicos. Ë fundado em São Paulo o Instituto Medicamenta - Fountoura pelo farmacêutico Cândido Fontoura, que se reuniu mais tarde em sociedade com outro farmacêutico, Francisco Serpe, originando assim o Instituto Medicamenta - Fontoura & Serpe.

1917 Primeira Pharmacopéia - Editada a Pharmacopéia Paulista, pioneira no país, oficializada pelo governo passando a vigorar imediatamente em todo o Estado de São Paulo. 1920 Censo de laboratórios - O Recenseamento Geral da República encontra 186 indústrias farmacêuticas instaladas no país,o triplo do que existia há uma década.

Quadro 6: Evolução histórica da indústria farmacêutica no Brasil

Evolução Fato importante na indústria (conclusão)

1926 Primeira Pharmacopéia nacional - Editada a Pharmacopéia dos Estados Unidos do Brasil, organizada pelo farmacêutico Rodolpho Albino Dias da Silva, com declaração de uso obrigatório a partir de agosto de 1929.

1940

Terceira fase da indústria farmacêutica - Inicia-se a terceira fase industrial do setor farmacêutico brasileiro. Com as insuperáveis dificuldades para importação de matérias-primas, máquinas e utensílios, nossos laboratórios viram-se obrigados a suprir sozinhos a demanda interna, chegando até a suprir os países europeus de alguns produtos.

1959 Pharmacopéia Brasileira II - Publicado o decreto 45.502, em 27 de fevereiro, oficializando a Pharmacopéia Brasileira II, Que passou a vigorar em todo o território brasileiro.

1967

Nomenclatura dos fármacos - Portaria No. 9 do SNFMF - Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e Farmácia - editada em 26 de maio de 1967, "disciplina a nomenclatura das formas farmacêuticas evitando o uso, em cartuchos, rótulos e bulas, de termos inadequados". Fica proibida a nomenclatura do medicamento com nome de fantasia.

1969

Lei não reconhece patentes - Legislação nacional passa a admitir a produção de produtos similares. A lei estimula a produção de matéria-prima farmacêutica por cópia de processos conhecidos a custos bem menores, que os necessários no desenvolvimento de novos medicamentos.

1970 Governo estabelece o INPI - A Lei n 5.468, de 11 de dezembro, criou o INPI - Instituto Nacional de Propriedade Industrial. Sua função é "executar as normas que regulam a propriedade industrial". 1971 Criação da CEME - Ë criada a Central de Medicamentos, órgão do governo federal responsável pela compra e distribuição de medicamentos para a população.

1976 Receitas médicas - Em 23 de setembro, a Lei 6.360 cria a exigência de apresentação de receita médica na venda de medicamentos, com o objetivo de controlar o consumo de fármacos que geram dependência química.

1977

Embalagens - O Decreto No. 79.094 estabelece a obrigatoriedade da impressão nas embalagens dos medicamentos, de tarjas para duas categorias: vermelha para medicamentos éticos e preta para medicamentos psicotrópicos que causam dependência.

1997

Patente sobre medicamentos - Em 15 de maio é sancionada a Leis n. 9.279, que institui o novo Código de Propriedade Industrial para o país, estabelecendo novas regras para o registros de patentes sobre medicamentos, alimentos, produtos químicos e bacteriológicos. O período de vigência das patentes para invenções é de 20 anos e, para registro de marcas de 10 anos.

FONTE: Adaptado pelo autor de CRF SP. Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo. Mar. 2007

Embora o parque industrial brasileiro no que se refere à produção de medicamentos seja bastante desenvolvido, inclusive com capacidade produtiva tanto de produtos finais quanto como para alguns produtos da química fina, o segmento químico-farmacêutico em seu conjunto é ainda pouco desenvolvido (RADAELLI, 2003). A Associação Brasileira da Indústria de Química Fina reúne 20 associados com uma produção de US$ de 359 milhões e é uma parte da cadeia produtiva com possibilidades de crescimento no Brasil, embora tenha perdido espaço, nos últimos 10 anos, para a Índia e a China na produção de fármacos (FRENKEL, 2002).

Segundo Galembeck (2001), a estrutura econômica dos setores farmoquímico e farmacêutico é muito contrastante, aproximadamente 80% dos medicamentos são produzidos no Brasil, em contraste com os 20% de fármacos que são fabricados nacionalmente.

Um estudo realizado pela ABIQUIM em 2000 mostrou que de 93 produtos importados com valores acima de US$ 10 milhões 17 eram fármacos (Hasenclever, 2002). Uma

retrospectiva histórica esclarece as razões dessa discrepância entre os dois setores, demonstrando que essa relação se consolidou a partir da década de 90.

Durante a década de 80, certas medidas governamentais de fomento ao setor farmoquímico foram adotadas, com destaque para duas delas. A Portaria nº 4 de 1984, que proibia a importação dos fármacos que viessem a ser produzidos no Brasil, e a construção de laboratórios especializados na produção de fármacos. Tais medidas, inseridas em um cenário no qual a legislação patentária permitia a cópia de moléculas, propiciaram um aumento na produção nacional de fármacos. A situação promissora do setor farmoquímico foi alterada com as medidas governamentais adotadas já no início da década de 90 e perpetuadas ao longo do período. De forma resumida, ressaltam-se: a redução das tarifas de importação, a alteração na legislação patentária (com proibição de cópias de moléculas) e a desativação de centros governamentais destinados à produção de fármacos (QUEIROZ; GONZÁLEZ, 2001).

O amplo leque de classes terapêuticas, aproximadamente 264, faz com que o setor seja formado por oligopólios e monopólios. Os cinco medicamentos mais vendidos no Brasil, de 2000 a 2001, foram: Cataflan (Novartis), Hipoglós (Procter & Gamble), Neosaldina (Knoll), Novalgina (Aventis) e Tylenol (HASENCLEVER, 2002).

Nenhuma empresa detém mais que 7% do faturamento do mercado farmacêutico no Brasil. As cinco empresas que apresentaram os maiores faturamentos no período de 1999 a 2000 foram: Aventis Pharma (6,5%), Novartis (5,9%), Aché (5,7%), Bristol Meyers Squibb (3,9%) e Roche (3,7%) (HASENCLEVER, 2002).

Os laboratórios públicos no Brasil, 15 no total, são responsáveis por 3% da produção nacional em valor e 10% em volume de produção. O grau de importância desses institutos está na função de minimizar o suprimento de medicamentos de menor interesse para o setor privado. Dentre esses laboratórios, destaca-se o Instituto Oswaldo Cruz, que em 1998 entrou com pedido para os dois únicos pipelines solicitados no Brasil, na área de biotecnologia. Em 2000, os gastos com P&D na Fiocruz representaram 26% das despesas totais em programas da instituição (HASENCLEVER, 2002).

Segundo a Anvisa (2007), a porcentagem de faturamento das empresas nacionais corresponde a 20% do setor. A tradição de produção do setor é que as empresas farmacêuticas estrangeiras instaladas no Brasil fabriquem mais medicamentos de referência e as nacionais, mais os produtos similares ou, atualmente, os genéricos.

Dentro dos quatro estágios da cadeia de produção de medicamentos, no Brasil, as empresas transnacionais concentram suas atividades nos dois últimos estágios, ou seja, na formulação de medicamentos e sua introdução no mercado. Queiroz e González (2001)

consideram que o aumento no número de pesquisas clínicas desenvolvidas no Brasil por empresas transnacionais, na década de 90, não deve ser menosprezado, já que representam uma parte significativa da pesquisa e do desenvolvimento de um medicamento.

Com referência aos pedidos de patentes no Brasil, é interessante observar a sua distribuição ao longo do tempo e a sua classificação de acordo com a natureza do produto final. Durante o período de 1992 a 1998, observa-se claramente o aumento de patentes a partir de 1996, quando a nova lei de Propriedade Industrial foi aprovada. Os produtos de origem química são quantitativamente superiores aos obtidos por biotecnologia tradicional ou moderna e os países com maior número de patentes solicitadas naquele período foram: EUA e Alemanha para produtos de origem química, EUA e Brasil para produtos originados de biotecnologia tradicional e EUA e França para aqueles originados a partir de biotecnologia moderna (QUEIROZ; GONZÁLEZ, 2001).