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IV. PRÁTICA LETIVA

4.6 Reflexões sobre a intervenção pedagógica

4.6.2 O Sistema Educativo

O quadro atual da sociedade modificou-se consideravelmente. A informação e o conhecimento é disponível e deixou de ser um privilégio para um número reduzido de indivíduos, vive-se na era da abundância (Figueiredo, 2011; Lopes et al. 2014a). A evolução complexa e rápida que se vive hoje, tendo em conta as mudanças no conhecimento, nas tecnologias disponíveis, nas metodologias, entre outros, obriga a novas formas de pensamento que levem a atuar de forma diferente criando soluções adaptadas a um amanhã que se sabe que será diferente. (Simões et al., 2012)

Num sistema educativo tradicional ainda hoje predominante, pouca coisa mudou desde o seu nascimento com a revolução industrial no final do século XIX. No entanto, os estudantes, a sociedade, o mercado de trabalho sofreram alterações profundas. A escola de massas, onde um professor ensinava ao mesmo tempo e no mesmo lugar dezenas de alunos, onde o conhecimento era centrado no professor e a formação centrava-se principalmente no ensino em vez de se centrar na aprendizagem, na reprodução em vez da produção, continua a dar resposta as necessidades de formação dos Homens para este amanhã incerto?

“Neste cenário, começa a tornar-se evidentes as insuficiências dos sistemas escolares, tanto no que se refere à capacidade para se renovarem como no que toca à preparação das gerações futuras para um mundo onde a criatividade e a inovação se tornaram fatores primários de diferenciação.” (Figueiredo, 2011, p.13)

Wagner (2008), investigador de inovação na educação no centro de tecnologia e

empreendedorismo da universidade de Harvard, descreve que o que está a ser ensinado aos jovens nas escolas, não é aquilo que eles deveriam estar a aprender para triunfarem nas suas carreiras, numa economia global.

O autor defende que a escola deveria desenvolver sete "competências de sobrevivência" necessárias para que as crianças possam enfrentar os desafios futuros: o pensamento crítico e a capacidade de resolução de problemas, a colaboração, a agilidade e a adaptabilidade, a iniciativa e o empreendedorismo, a boa comunicação oral e escrita, a capacidade de aceder à informação e analisá-la e, por fim, a curiosidade e a imaginação.

Barroso citado por Martins (2013) apresenta para os problemas e os desafios que se colocam à escola, três futuros possíveis para o processo de escolarização: a hiperescolarização, a desescolarização e a refundação, todos eles potenciados pela utilização das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC).

A primeira hipótese seria “mais do mesmo” com o upgrade de alguns artefatos tecnológico (retroprojetores, vídeos, powerpoint, etc..) que teriam como efeito pequenas transformações nas práticas docentes, mas que não mudariam substancialmente a relação aluno-professor-conhecimento.

A segunda hipótese seria a “morte” da escola como instituição. A educação passaria então a ser feita em casa com os pais e com apoio de software educativos.

Finalmente, a terceira proposta seria o que o autor defende, uma entrada na era digital da escola acompanhada duma mudança das práticas pedagógicas, do currículo e do trabalho dos professores. Barroso (2013), cita dois exemplos nacionais, a Escola da Ponte e a proposta pedagógica Freinet como exemplos de soluções coerentes com aquilo que deveria ser a escola.

O poder político tem nas suas mãos a responsabilidade de trilhar novos caminhos. No entanto, a reformulação da “pesada máquina” do sistema de ensino vigente necessitaria, provavelmente, de uma maior estabilidade dos poderes executivos, possibilitando uma planificação a médio e longo prazo (passando pela formação dos professores, a organização administrativa, a resolução de problemas logísticos, as barreiras culturais, etc.).

Sem esperar por estas macro mudanças, defende-se que o professor (principal agente de mudança) tem a responsabilidade de concretizar iniciativas pedagógicas coerentes com as mudanças observadas. Adotar estilos de ensino (aprendizagem!) tendencialmente mais produtivos do que reprodutivos. No fundo, procurar afastar-se do

ensino (entendido como um processo centrado no professor) e favorecer a aprendizagem (entendido como um processo centrado no aluno).

O professor deve livrar-se do seu limitado papel transmissor de conhecimento para ser um mediador, entre o aluno e o saber (Barroso, 2013), assegurar situações criativas, promover a aprendizagem, levar a compreensão das razões por detrás das coisas, ler, sonhar, falar, encontrar soluções por si próprio.

“Ainda existe um longo caminho a percorrer no sistema educativo, não podemos assistir passivamente à sua “destruição”. Temos de ter um papel activo estimulando os nossos alunos para a aquisição de novas competências e potencialidades e contribuir para mudar as tendências que existem no ensino.”

(Simões et al. 2012 p.169) A reflexão realizada permitiu apontar algumas pistas estratégicas que poderiam ser ainda mais desenvolvidas para concretizar algumas mudanças efetivas no processo de ensino aprendizagem:

(i) Promover sempre que possível a interdisciplinaridade por questões evidentes de lógica de aprendizagem, ligando o que é sempre, de alguma forma, interligado e nunca hermético e isolado. Cada grupo de professor tem a sua sala separada dos outros grupos (o que traz vantagens de organização temporal e espacial mais também de sensibilidades e interesses) e poucos são os momentos onde existe socialização entre os professores da mesma turma. O professor deve procurar conhecer, trocar ideias, apresentar objetivos e/ou projetos com os colegas de forma a promover esta cooperação; (ii) Redefinir os deveres e direitos do representante dos alunos. Poderia ser ponderado um alargamento da sua intervenção de forma a desenvolver as competências inerentes a esta responsabilidade, como a comunicação, o sigilo, o espírito crítico, entre outras (ultrapassando as redutoras tarefas como aquela que lhe são (mal) atribuídas: distribuir folhas, contactar colegas, etc.). Por exemplo, parece ser pertinente defender a presença do representante dos alunos nas reuniões onde são debatidos assuntos relativos aos seus colegas. No fundo, promover a transparência e uma participação democrática efetiva dos principais interessados.

(iii) Repensar e valorizar o desporto escolar. Existe esta opção para quem gosta e pretende praticar uma modalidade no quadro da escola. O desporto escolar deve responder a esta procura, respeitando seu caráter inclusivo, sem nunca cair na tentação de ser seletivo e perder a sua essência e algumas das suas virtudes. Os resultados desportivos alcançados que decorrem das competições organizadas nunca poderão ser um fim em si mas ser parte integrante do processo educativo. Os diferentes núcleos também deveriam poder usufruir de horários de treino mais adequadas à prática desportiva, sem ter de deixar de almoçar para treinar.

(iv) Promover uma maior abertura à comunidade, nomeadamente aos EE. O professor poderia disponibilizar uma hora de atendimento, na qual cada EE poderia marcar uma reunião. A participação ativa dos mesmos deve ser sempre que possível encorajada nas atividades da turma ou mesmo da escola. Porque não abrir pontualmente, as portas das salas de aula? Fazer participar os EE nos trabalhos da escola (limpeza, cantina, bar, demonstração e partilha de experiência entre outro).

(v) Publicitar e valorizar os inúmeros núcleos, projetos, clubes existentes na escola para que os alunos tenham a oportunidade de se diferenciar, desenvolvendo competências á partir das sensibilidades, curiosidades e gostos de cada um.

(vi) Reorganizar as salas de aula poderia também ser uma forma de intervir. Porquê insistir numa disposição tradicional onde os alunos são “alinhados”/“arrumados” e o professor (num patamar elevado), debitando matéria à frente deles? Porque não criar zonas de trabalho de grupo, mesas redondas onde todos podiam olhar uns para os outros, no fundo transformar a sala de aula em espaço de trabalho?

(vii) Procurar rentabilizar os espaços de aula (campos de jogo e salas). Solicitar a sua utilização nas horas que não são ocupadas para permitir uma prática desportiva autónoma (comportamento estimulado nas aulas de EF) e possibilitar a realização de trabalhos de grupo, etc.

Fazer da escola mais do que um espaço de aula, onde se ensina matérias, um espaço de vida, um espaço interativo, um espaço de trabalho no qual os alunos possam se identificar e aprender. O futuro da escola é a mudança da organização do ensino, da relação pedagógica entre professores e alunos, da organização do tempo, do espaço, do

currículo. No fundo, a transformação da sala de aula, que é o núcleo duro da escola (Martins, 2016).