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CAPÍTULO 1: O CONTEXTO DA VILA DE DEIR EL-MEDINA

1.1 O Surgimento e Desenvolvimento da Vila Durante a XVIII Dinastia

Ahmés I (c. 1550-1525 a.C.), o fundador da XVIII dinastia, preocupou-se em construir um cenotáfio na cidade de Abydos, que se tornou a última pirâmide real no Egito, ao mesmo tempo em que planejou uma tumba em Tebas. A sua localização exata não é conhecida; talvez estivesse entre as demais que formam a necrópole de Dra Abu el-Naga mas, por um golpe de sorte, sua múmia foi localizada em 1881. O faraó havia sido reinumado por sacerdotes na Antiguidade, que o deixaram entre as outras 39 múmias de figuras régias e sacerdotais em uma tumba que ficou conhecida como “Primeiro Esconderijo Real”. Descobertas arqueológicas feitas nas décadas de 1980 e 1990, somadas à reanálise de antigos documentos, mostram que a expulsão definitiva dos hicsos e a consequente reunificação do Egito aconteceram nos últimos dez anos de seu reinado14.

Neste período, o crescimento e o desenvolvimento econômico do Egito foram assegurados por meio de campanhas militares, que foram posteriormente continuadas por seu filho e sucessor, Amenhotep I (c. 1525-1504 a.C.), e resultaram na expansão do domínio egípcio até a Palestina, ao nordeste, e até o Reino de Kush, ao sul15. Este desenvolvimento

12 CRIADO BOADO, F. Del terreno al Espacio: Planteamientos y Perspectivas para la Arqueologia del Paisaje.

In: CAPA 06 – Critérios y Convenciones en Arqueologia del Paisaje. Madrid: Editora Universidade de Santiago de Compostela, 1999, p. 6-7.

13 Ibidem. p.16.

14 SHAW, I. (org.). The Oxford History of Ancient Egypt. Oxford – New York: Oxford University Press, 2000. p.

207.

também foi assegurado pela reativação de minas, como a de turquesa no Sinai, e a abertura de novas pedreiras, como a de Gebel el-Silsila, que forneceram o material necessário para dar continuidade ao programa de construções do faraó16.

Com relação às edificações de caráter funerário levadas a cabo por Amenhotep I, é importante salientar que ele foi o primeiro faraó a construir uma tumba separada do templo funerário. Mas o seu local de inumação, tal como o de seu predecessor, é debatido entre os especialistas. Há dois locais possíveis a KV3917 e a AN B, localizada na necrópole de Dra Abu el-Naga18. Seja qual for o local utilizado pelo rei, ambos precisaram da força e do empenho de inúmeros egípcios munidos de instrumentos simples, como o malho e o cinzel, para serem construídos. Coube ao rei a reunião do primeiro grupo de trabalhadores que se converteriam, em épocas posteriores, em uma equipe especializada na produção de tumbas. Uma das possíveis provas para esta afirmação é o fato de Amenhotep I e sua mãe, a rainha Ahmés-Nefertari, terem sido adorados em Deir el-Medina como divindades e patronos dos trabalhadores. Inúmeras estátuas suas, de madeira e pedra, além de pinturas no interior das tumbas, foram produzidas ao longo de séculos. O próprio Amenhotep I, já morto, presidia julgamentos por meio de oráculos e era cultuado em capelas a ele dedicadas pelos trabalhadores19.

No reinado de seu sucessor, Tothmés I (c. 1504-1492 a.C.), é certo que tais trabalhadores já se encontravam assentados na vila, pois o muro que a circunda em sua primeira fase contém tijolos com inscrições deste faraó. Esta fase de ocupação teve seu início na porção norte do vale, quando foram edificadas vinte e três casas, sendo treze no lado oeste e dez no lado leste. Este conjunto era separado por uma via, cuja entrada situava-se ao norte e era controlada por um porteiro. Logo após a passagem pela porta havia um pequeno pátio, que

16 Ibidem. p. 214.

17 Esta sigla significa “King’s Valley” e é utilizada para designar todas as tumbas do Vale dos Reis por ordem de

“descoberta”. A primeira tumba é a de Ramsés VII que, embora estivesse aberta desde a antiguidade, só foi registrada nos anos de 1737-1738 por Richard Pococke, um viajante britânico que produziu um dos primeiros mapas do Vale dos Reis. Disponível em: http://www.thebanmappingproject.com/sites/browse_tomb_815.html Acesso em: 15 de junho de 2011. A última tumba descoberta foi a KV64 em 25 de janeiro de 2011, situada nas proximidades da tumba de Tothmés III (KV34). Devido aos problemas enfrentados pelos egípcios que resultaram na queda do ditador Hosni Mubarak, a descoberta permaneceu oculta e só foi anunciada oficialmente quase um ano depois, em 15 de janeiro 2012. O crédito é de uma equipe da Universidade de Basileia, que desenvolve um projeto sobre o Vale dos Reis, sob coordenação da egiptóloga Dr. Elena Pauline-Grothe. Disponível em: http://aegyptologie.unibas.ch/forschung/projekte/university-of-basel-kings-valley-project/report- 2012/ Acesso em: 20 de janeiro de 2012.

18 REEVES, N. & WILKINSON, R. H. The Complete Valley of the Kings: tombs and treasures of Egypt’s

greatest pharaohs. London: Thames and Hudson, 2002. p. 88-91.

19 LESKO, L. H. (ed.) Pharaohs Workers. The village of Deir el-Medina. Ithaca & London: Cornell University,

contava com o abastecimento de água que era renovada diariamente. O esquema presente na figura 1 mostra a distribuição espacial da vila nesta época.

Figura 1 – Esquema da primeira fase da vila, com indicações de cada área. O desenho de linha pertence à obra de SÉE, G.; BAUX, J-P. Grandes Villes de l’Egypte antique. Paris: Serg, 1974, p. 38; notas indicativas de Moacir E. Santos

Poucos documentos restaram desta primeira fase, dada a ocupação contínua até a época Raméssida. Os trabalhadores escolhidos para a construção da tumba régia certamente foram reunidos para executarem as atividades de uma forma rápida e discreta. Uma inscrição confirma que o delegado para os trabalhos de supervisão e construção foi o “Supervisor das construções de Karnak, Ineni”. Um texto encontrado em sua tumba auxilia na elucidação deste ponto:

Eu supervisionei a construção da tumba de Sua Majestade sozinho, sem ninguém ver ou ouvir (...). Eu era vigilante na procura do que era excelente. Eu deixei campos de argila aptos para o reboco de suas tumbas na necrópole. Este é um trabalho que os ancestrais não tiveram e que eu fui obrigado a fazer lá. 20

20 BIERBRIER, M. The tomb-builders of the pharaohs. Cairo: The American University of Cairo Press, 2003. p.

O reboco com “muna”21 era comum nas tumbas privadas, mas não nas régias, em que se utilizava o estuque. Talvez Ineni tenha sido não somente o responsável pela tumba real, mas também pela de outros membros da elite, conforme indica a forma plural no que se refere a “suas tumbas”.

O local originalmente escolhido para a construção da tumba de Tothmés I permanece em discussão, visto que há duas tumbas relacionadas a ele. A primeira, seguramente uma das mais antigas do Vale dos Reis, é a KV20, e a segunda é a KV38. Consoante a opinião exposta por Vandersleyen, a KV20 provavelmente tenha sido construída originalmente para abrigar a múmia de Tothmés I, pois um sarcófago com o nome deste faraó foi encontrado na tumba. Posteriormente esta foi ampliada para ser ocupada por Hatshepsut22. Desta maneira, a tumba real construída por Ineni, conforme aponta o texto acima, seria, certamente, a KV20. As paredes irregulares e a péssima qualidade da rocha não permitiram um nivelamento da superfície, visto que o projeto inicial era restrito e o seu comprimento deveria ir somente até a altura da primeira câmara.

Posteriormente, no reinado de Totmés III, a múmia de Tothmés I, que havia sido inumada na KV20 foi transferida para a KV38. Esta se encontra entre as menores tumbas construídas no Vale dos Reis. Ela consiste em uma escadaria com um corredor que conduz a uma antecâmara. Nesta há uma escadaria que leva à câmara funerária. Com formato de cartucho há um pilar ao centro, além de duas depressões no chão: uma para o sarcófago, que ainda se encontra no local, e a outra menor para a caixa com os vasos canópicos. As paredes foram estucadas e pintadas com cenas da Amduat. Ao final da câmara, no lado esquerdo, há uma sala anexa, de pequenas proporções que serviria como local destinado a outros bens funerários23. Um local construído para o culto do faraó morto não foi localizado, mas há uma capela dedicada a ele no templo funerário de Hatshepsut em Deir El-Bahari.

A curta duração do reinado de Tothmés I, cerca de onze anos conforme pesquisas de Luc Gabolde24, é inversamente proporcional ao seu impacto nas características da monarquia no final da XVIII Dinastia. A expedição militar à Ásia empreendida por este faraó está descrita em tumbas de oficiais do período de Tothmés III, e nelas é possível observar a importância desta campanha para a consolidação do Egito como uma liderança diplomática e comercial na região do Oriente Próximo no final da Idade do Bronze.

21 Mistura de argila com palha de trigo triturada que era empregada para regularizar as paredes de uma câmara. 22 VANDERSLEYEN, C. L'Egypte et la vallée du Nil. Tome 2: De la fin de l'Ancien Empire à la fin du Nouvel

Empire. Paris: Presses Universitaires de France, 1998. p. 263.

23 BADAWY, A. A history of Egyptian architecture: the Empire (the New Kingdom). Berkeley: University of

California Press, 1968, p. 400.

As primeiras ampliações na vila de Deir el-Medina aconteceram entre os reinados de Tothmés II (c. 1492-1479 a.C.) e Hatshepsut (c. 1473-1458 a.C.). Os dois reinados ocorreram em períodos de paz e prosperidade, fato que pode ser confirmado por meio da análise da documentação, que mostra que ocorreram poucas expedições militares nestes anos. Tothmés II reinou por poucos anos e até o presente não se conhece o plano de construção deste rei e não há um consenso entre os pesquisadores sobre a localização de sua tumba. Três locais são propostos a KV42, a Bab el-Muallaq (WN A) e a DB35825. A múmia de Tothmés II também estava entre as múmias régias e sacerdotais do Primeiro Esconderijo Real.

Após sua morte, seu filho, Tothmés III (c. 1479-1425 a.C.), assumiu o trono. A sobreposição de datas de governo é explicada pelo fato de que Hatshepsut atuou, inicialmente, como regente de Tothmés, que era uma criança quando subiu ao trono. Por volta do sexto ano, porém, Hatshepsut, enquanto corregente de seu sobrinho, assumiu as prerrogativas reais e tornou-se faraó. Para se legitimar no trono, a rainha-faraó representou, nas paredes de seu templo funerário, em Deir el-Bahari, cenas que mostram a sua origem divina. Nas imagens, sua mãe, a rainha Ahmés, aparece sendo cortejada pelo deus Amon, que tomou a forma do rei, para engravidá-la. Hatshepsut, então, teria nascido desta relação.

Deir el-Bahari foi a principal obra do governo de Hatshepsut. Seu programa de construções, no entanto, incluiu a edificação e renovação de templos no Médio Egito, local que ainda não havia sido contemplado pelos governantes da XVIII Dinastia. Em Tebas, ordenou ampliações no templo de Amon em Karnak e criou uma via processional ligando os templos de Amon e Mut26. Aqui nos cabe ressaltar a importância destas construções que em conjunto eram utilizadas para a Bela Festa do Vale, ocasião em que as divindades Amon, Mut e Khonsu eram conduzidas em suas barcas portáteis em uma grande procissão que, em uma determinada altura, atravessava o rio e chegava até o templo funerário. Acreditava-se que, nesta ocasião, os mortos se juntavam aos vivos, que realizavam um banquete junto à capela de cada tumba27.

Os artesãos de Deir el-Medina construíram duas tumbas para Hatshepsut. A primeira delas (WA D) no Wadi Sikket Taqa el-Zeide, situa-se no meio de um paredão há 70 metros acima do nível do solo. Foi preparada ainda no reinado de Tothmés II, visto que se destinava à governante enquanto rainha, o que é comprovado pela inscrição no sarcófago: “A princesa

25 REEVES, N. & WILKINSON, R. H. op cit p. 96. 26 SHAW, I. op. cit. p. 231.

hereditária, grande em favor e graça, senhora de todas as terras, filha do rei, irmã do rei, esposa do deus, grande esposa do rei, senhora das duas terras, Hatshepsut”.28

A tumba é pequena e possui uma planta simples, composta por um corredor que conduz a uma câmara de formato quadrangular que se situa no lado direito. A partir desta última câmara há um segundo corredor estreito que termina em outra câmara quadrangular. Ao centro uma passagem foi escavada em forma de rampa que chegaria até a câmara funerária, que foi deixada inacabada. O sarcófago, que não chegou a ser utilizado, foi deixado na segunda câmara retangular29. Atualmente encontra-se no Museu do Cairo.

Com a ascensão de Hatshepsut ao trono do Egito a primeira tumba foi abandonada, visto que era sua intenção ser inumada no Vale dos Reis. A segunda tumba de Hatshepsut, a KV20, foi construída, conforme mencionamos, para seu pai Tothmés I. Posteriormente, Hatshepsut ordenou uma alteração no projeto, que foi ampliado, atingindo ao final atingiu 213 metros de extensão. Na tumba já havia duas câmaras que eram cortadas por escadarias que levavam até uma câmara quadrangular, originalmente construída para abrigar o corpo de Tothmés I. Hatshepsut construiu, no canto noroeste desta, uma escadaria reta que conduzia à nova câmara funerária retangular, voltada para a direita em direção norte. Nesta há três pilares centralizados. Na parede norte há duas câmaras e uma terceira na parede oeste, próxima às outras duas. Como a rocha da tumba era de má qualidade, a solução encontrada para a disposição daquelas que seriam as primeiras manifestações escritas e iconográficas do Livro da Amduat, que narra a passagem do deus Ra pelo outro mundo30, foi a disposição de quinze blocos de pedra que ficariam alinhados ao longo da câmara. Nesta foram encontrados os sarcófagos de Hatshepsut e de Tothmés I. Tal descoberta revela que ela tinha a intenção de ser inumada junto a seu pai. Com a ascensão de Tothmés III, contudo, a situação modificou-se novamente, visto a transferência da múmia de Tothmés I para a KV3831.

Com relação à sua atuação externa, a principal realização da rainha-faraó foi uma expedição à Terra de Punt para a aquisição de incenso e produtos exóticos. Tal viagem está documentada nas paredes de seu templo funerário e deve ter servido para estimular o interesse dos egípcios por bens de luxo, visto que muitos artefatos, tanto de uso cotidiano quanto de uso funerário, foram produzidos com madeira de ébano e com incrustações de marfim.

28 CARTER, H. A tomb prepared for queen Hatshepsut and other recente discoveries at Thebes. JEA. London:

The Egyptian Exploration Fund, v. IV. Parts II-III, 1917, p. 115.

29 Ibidem. p. 114-118.

30 REEVES, N. & WILKINSON, R. H. op cit p. 93. 31 Ibidem, p. 91-92.

A vila de Deir el-Medina passou, nesta época, por duas ampliações sucessivas visto a necessidade do Estado em utilizar a mão de obra de mais trabalhadores. Só não temos certeza sobre em qual reinado ocorreram as modificações, se foi sob Tothmés II ou sob a rainha- faraó, já que não há, como no caso da primeira fase, tijolos com impressões dos nomes destes governantes. Quando destas ampliações, foram acrescentadas, na parte sul da vila, respectivamente, dez e seis casas. Duas pequenas ruelas foram abertas, sendo que a que se situa mais ao norte segue em direção ao oeste, e a que se localiza ao sul conduz às casas da parte leste. Ao término da segunda fase havia trinta e nove residências em Deir el-Medina. A figura 2 mostra como ficou a distribuição espacial da vila após esses novos acréscimos.

Figura 2 – Esquema da segunda fase, com a primeira e segunda ampliação da vila com indicações de cada área. Os desenhos de linha pertencem à obra de SÉE, G. & BAUX, J-P. Grandes Villes de

l’Egypte antique. Paris: Serg, 1974, pp. 39-40; com alterações e notas indicativas de Moacir E. Santos.

Os trabalhadores da vila durante a XVIII dinastia eram chamados de “Servos do Grande Lugar” ou “Servos do Belo Lugar do Rei Poderoso”, e estavam sob a direção de um administrador cujo título era “Superintendente do Grande Lugar”. Para Bierbrier32 os artesãos e trabalhadores parecem ter sido segregados inicialmente de outros grupos que construíam os templos mortuários e escavavam as tumbas dos nobres. Algumas ostraca encontradas em Deir el-Medina informam sobre as construções de Hatshepsut e de Tothmés III e mostram que os

trabalhadores parecem ter sido recrutados para tais projetos, pois eram provenientes de outras localidades. Romer afirma que, quanto a tais construções privadas, é certo que não eram feitas pelos trabalhadores da necrópole real, exceto no tocante a seus próprios túmulos, que se encontram situados próximos à vila. Ele baseia suas conclusões em documentos provenientes da própria vila e no fato de que os registros de presença dos trabalhadores apontam meses de permanência na obra do hipogeu real, o que tornaria difícil um trabalho extra. Segundo este autor, aqueles responsáveis pelas tumbas dos nobres provavelmente seriam residentes em outros locais, notadamente em Tebas, e possuíam um status diferente dos ocupantes de Deir el-Medina33. Mas a opinião não é conclusiva, conforme veremos ao final deste capítulo.

A demanda crescente para os trabalhos provavelmente levou a um novo aumento da população da vila, caracterizando uma terceira fase, que certamente ocorreu no reinado de Tothmés III, já que o seu nome foi encontrado nos tijolos que formam o muro externo na área leste. Foram incorporadas oito novas residências no lado oeste e quatro na parte sul. As casas do leste tornaram-se acessíveis graças a uma ruela, cujo início é claramente da fase anterior, que partia da via central rumo a leste e, num ângulo de noventa graus, seguia para o norte formando um “L”. Esta nova ampliação é mostrada na figura 3.

Figura 3 – Esquema da terceira fase, com a terceira ampliação da vila com indicações da área. O desenho de linha pertence à obra de SÉE, G.; BAUX, J-P. Grandes Villes de l’Egypte antique. Paris: Serg, 1974. p. 40. Nota indicativa de Moacir E. Santos.

33 COONEY, K. M. Profit or exploitation? The production of private Ramesside tombs within the West Theban

O reinado de Tothmés III foi marcado pelo estabelecimento do domínio egípcio sobre a Palestina e também pelas fortes relações instituídas com o sul da Síria. O faraó realizou várias campanhas na Ásia, que estão descritas nos “Anais” de seu governo no templo de Karnak. Além deste templo, o rei ampliou e construiu estruturas dedicadas a Amon e outros deuses de norte a sul do Egito. Quanto às construções relacionadas à sua vida post mortem, a principal é a sua tumba no Vale dos Reis, a KV34. Construída com a forma de um eixo inclinado, em “L”, ela representa a primeira tumba com um planejamento em que a arquitetura, os textos e as imagens estão intimamente relacionados. A tumba de Tothmés II é acessível por meio de uma escadaria que conduz a um corredor até uma pequena câmara quadrangular cortada por uma escadaria que leva a um segundo corredor. Ao final deste há um poço e, por fim, uma câmara com dois pilares ao centro. Neste local foi encontrada uma lista com 741 divindades e na lateral há uma escadaria que dá acesso à câmara funerária, com sentido norte/sul, contendo dois pilares centralizados com quatro câmaras anexas.34. As paredes e pilares da câmara funerária, cujo formato é de um cartucho, encontram-se pintadas de amarelo e sobre elas foram inscritos dois conjuntos de textos funerários que surgiram no princípio do Reino Novo. Em um deles, a Litania de Ra, pintada sobre as colunas, os nomes do deus-sol são utilizados para ajudar o rei em sua jornada no outro mundo. Já as paredes contêm o Livro do que está no Mundo Inferior (Amduat), devidamente posicionado com um ordenamento temporal. Neste livro o faraó morto acompanha o deus sol pelo mundo do além, através das 12 horas noturnas35.

Associado a este crescimento da vila durante a XVIII Dinastia está o desenvolvimento das necrópoles ao redor de Deir el-Medina. Este será o tema discutido a partir de agora.