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Capítulo IV: A edificação e consolidação do Estado Novo (1933-1938)

IV. 14. O Telegrama dos Vinhos

A 10 de Julho de 1938, é enviado, um telegrama, ao Presidente do Conselho, António de Oliveira Salazar, subscrito por um conjunto assinalável de vinicultores e comerciantes do concelho de Torres Vedras294, no qual era contestada a política vinícola encetada pelo governo. O seu conteúdo acabaria por provocar graves consequências.

IV. 14.1. O documento

No telegrama enviado à Presidência do Conselho, “as corporações administrativas, morais e politicas, os vinicultores, comerciantes e proprietarios do concelho de Torres Vedras…”, assumiam-se como os principais lesados da grave situação vinícola regional. Apresentados os motivos do protesto, relacionados com a “…baixa preços e recusa comprar aguardentes Junta Nacional Vinho…”, os signatários do telegrama “…protestam veemente junto de Vossa Excelencia a sua repulsa pelos metodos empregados que são um insulto à moralidade e justiça duma Nova Ordem, esperança do 28 de Maio…”, afirmando “…não poderem garantir continuidade apoio decididamente prestado até hoje ao Governo…”295

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Num tom hostil e desafiador para com Oliveira Salazar, e para com o próprio regime, os subscritores sofrerão as consequências do seu acto, de acordo com a deliberação do governo, que decretará a expulsão da UN dos filiados signatários296.

Conforme afirma o próprio presidente da comissão concelhia da UN, Augusto Boto Pimentel de Carvalhosa, a elaboração, recolha de assinaturas e envio do telegrama foi exclusivamente da sua responsabilidade, da do secretário da aludida comissão, João Augusto Clímaco Pinto e do vogal António Inácio Pereira297.

294Vide Anexo n.º 28. 295

In ANTT/Arquivo Distrital de Lisboa, Governo Civil, cx. 91, cópia de telegrama s/n de 10/07/1938.

296“…por determinação da Exmª. Comissão Executiva se devem considerar eliminados dos quadros da

U.N., todos os filiados mencionados na adjunta relação, penalidade esta a que deu motivo o facto dos referidos filiados terem assinado um telegrama dirigido ao Govêrno, em termos contrários ao espirito desta instituição” In ANTT/Arquivo da UN, Correspondência com a Comissão Concelhia de Torres

Vedras, cx. 30, mç. 96, ofício n.º 205 de 11/08/1938.

297“…verificamos e sentimos com mágoa, que lhe foi dada uma interpretação que não está de harmonia

com as intenções com que foi redigido…os signatários do presente, que constituíam a Comissão Concelhia da U.N., chamam a si a inteira responsabilidade do telegrama…Augusto Boto Pimentel Carvalhosa, António Inacio Pereira, João Augusto” In Idem, ofício s/n de 21/07/1938, pp. 1 e 2.

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IV. 14.2. A dissolução dos corpos administrativos

A par da expulsão de todos os signatários do telegrama filiados na UN, foram tomadas, por parte das autoridades de Lisboa, outras providências, com consequências imediatas na vida política local do concelho de Torres Vedras.

Assim, por despacho do Ministério do Interior, sob alçada do Ministro Mário Pais de Sousa, todas as entidades administrativas do concelho foram dissolvidas e colocadas sob regime de tutela daquele Ministério298. O processo de dissolução envolveu toda a malha administrativa local, desde a câmara municipal às juntas de freguesia. O mesmo ocorreu com as comissões concelhia e de freguesia da UN. A única excepção foi o presidente da câmara municipal, Francisco Manuel dos Reis. Este advogado torriense, não foi abrangido, pela dissolução decretada pelo Ministro do Interior. No entanto, Francisco Manuel dos Reis optou por apresentar a sua demissão299.

Apesar de Francisco Manuel dos Reis não ter sido demitido, são lhe imputadas, por parte do governador civil, algumas responsabilidades no caso do telegrama dos vinhos: “…o snr. dr. Reis não se esforçou, como deveria a meu vêr no sentido de ser evitada a expedição do telegrama, pois, tivera em seu poder, desde a tarde dum sabado, a sua cópia, e sabendo que só seria expedido ao meio dia do domingo imediato não procurou por qualquer forma, comunicar-me o facto…”300.

IV. 14.3. A nova comissão administrativa da câmara municipal

Nomeada por decreto de 30 de Setembro de 1938, a nova comissão administrativa, liderada por José Maria Teles da Silva, tomou posse a 1 de Outubro301, com a seguinte composição: João Ferreira dos Santos (industrial), Severino Henriques da Silva Gouveia (comerciante), Óscar Manuel de Castro (proprietário) e Manuel da Silva Antunes (ajudante de conservador de registo predial)302.

298“Impõe-se, por isso, a sua dissolução que desde já ordeno. No decreto a elaborar pela Direcção Geral

da Administração Politica e Civil, declarar-se-á que todos os corpos administrativos ficam em regime de tutela” In ANTT/Arquivo Distrital de Lisboa, Governo Civil, cx. 91, Despacho do Ministério do Interior

de 9/08/1938, p. 2.

299“…as condições da minha vida pessoal e política reclamam a minha actividade noutro meio onde o

trabalho seja mênos molesto e mais eficiente...tenho a honra de depôr nas mãos de V. Exª. o cargo honroso que hei desempenhado, até ésta data” In Idem, ofício n.º 480 de 6/09/1938, p. 2.

300In ANTT/Arquivo Distrital de Lisboa, Governo Civil, cx. 91, ofício n.º 2 de 7/09/1938, p. 3. 301

O Torrense, Ano IV, N.º 25, 30/10/1938, p. 1, colunas 1 e 2.

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No que concerne ao novo presidente da câmara, engenheiro civil, José Maria Teles da Silva303 era natural de Torres Vedras, filho dos Condes de Tarouca. Católico praticante, conservador e nacionalista, Teles da Silva foi sempre um apoiante de movimentos conservadores contrários à maçonaria e aos partidos. Do seu passado anterior à Ditadura Militar e ao Estado Novo, salienta-se o apoio à situação de Pimenta de Castro (1915) e à ditadura sidonista (1918). Após a intentona do 28 de Maio, ocorre a sua natural adesão ao regime, desempenhando um papel activo na comissão nacional da Liga 28 de Maio, filiando-se posteriormente na UN e na Legião Portuguesa.