1. Tipo e tipicidade definidos
1.3. O tipo penal e o pós-finalismo
1.3.1. O tipo penal segundo o funcionalismo teleológico
Dentro destas novas concepções, um posicionamento dominante das teorias funcionalistas, que buscam a construção de um sistema aberto, capaz de permanentes remodelações segundo uma evolução social e diante de conseqüências político-criminais, com a finalidade de proporcionar um modelo mais representativo da realidade, na busca de uma aplicação mais fidedigna do Direito Penal, com redução da intervenção estatal aos limites do estritamente
necessário, se faz destacar263.
Segundo estas características teleológico-funcionais, podemos
distinguir correntes moderadas e radicais264.
261
Jesús-María Silva Sánchez aponta para a metodologia espanhola de Rodríguez Muñoz como um de seus exemplos. In: SILVA SÁNCHEZ, Jesús-María. Aproximación..,. p. 63.
262
Ibid., p. 64.
263
Ibid., mesma página.
264
As teses moderadas, na busca da superação da contraposição entre o dogmaticamente correto e o politicamente satisfatório, superando as barreiras criadas entre o Direito Penal e a Política Criminal em busca de um sistema adequado às necessidades sociais, diante dos fins a que se destina o Direito Penal265.
Dentre os funcionalistas moderados, poderíamos destacar como
seu maior representante Claus Roxin266, não obstante seu posicionamento quanto
a ineficácia dos tipos penais abertos neutros para cumprirem uma função de
elemento fundamental da estrutura do delito267.
Claus Roxin abandona o conceito de ação final proposto por Hans Welsel, buscando a sedimentação de um posicionamento onde a ação constitui elemento de uma teoria de tipicidade, longe do ontologicamente previsto, constituindo verdadeiro conceito jurídico-normativo, afastando a aplicação da lei ao caso em concreto como legitimação do sistema jurídico penal, em substituição a uma afirmação de que os fins político-criminais são os próprios fins da pena,
segundo um Estado Social e Democrático de Direito268.
Desenvolve-se um conceito funcional de ação, de acordo com a exteriorização da personalidade do ser humano, caracterizador tanto de ações dolosas como culposas, absorvendo os elementos do delito, com a constituição de um tipo penal de considerações valorativas e jurídicas, com conteúdos sociais limitadores das condutas finais, envolvendo todos os pressupostos positivos e negativos da valoração do fato, em uma teoria da tipicidade com as
características sociais da ação269.
265
ROXIN, Claus. Política criminal..., p. 18 e ss.
266
Ibid., mesma página.
267
ROXIN, Claus. Teoria del tipo penal – Tipos abiertos y elementos del deber jurídico. Tradução de Enrique Bacigalupo, Buenos Aires: Ediciones Depalma, 1979, p. 265.
268
Idem, Problemas..., p. 53; 128 e ss; Derecho Penal..., p. 377 e ss.
269
Claus Roxin propõe um “tipo total”270, onde o tipo e a antijuridicidade estão organizadas em uma formulação global de injusto, que mantém um conteúdo da totalidade dos pressupostos substanciais para uma apuração de um juízo de injusto, abarcando os elementos negativos e positivos,
expressos ou não, significativos para as ações comissivas ou omissivas271.
Este modelo de “tipo total”, que superaria o tradicional tipo penal
que só congrega prescrições elementares da Parte Especial272, pois resultaria de
posicionamentos sistemáticos, dogmáticos e práticos, compreenderia a totalidade do juízo do injusto, com dedução de todas as suas circunstâncias descritivas e
determinantes, compreendidas no dever jurídico273.
Assim, à Parte Geral ficaria a tarefa de indicar princípios que regem a ação típica e as relações entre sujeitos ativo e o resultado, ficando o tipo subjetivo representado pelo dolo e demais elementos subjetivos, que fundamentam e reforçam o juízo de desvalor social sobre o fato, que não
assumiria distinção entre injusto e culpabilidade274.
De outro lado, em uma concepção mais radical do funcionalismo teleológico, poderíamos destacar o pensamento de Günther Jakobs, que se afasta da preocupação prática de Claus Roxin, rumo a uma fundamentação
metodológica275.
Günther Jacobs segue por um pensamento funcionalista, influenciado por Niklas Luhmann, com base na imputação objetiva e na
270
ROXIN, Claus. Teoria del tipo penal..., p. 273 e ss.
271
Ibid., p. 279.
272
Ibid., p. 294.
273
Suporta este conceito de tipo, segundo o próprio Claus Roxin que somente “o tipo total é realmente um tipo ‘fechado”, todavia isto não indica uma desconsideração, para o autor, dos tipos abertos, senão uma crítica ao sistema tópico, pretendendo um sistema mais apto à solução de realidades, em um “sistema aberto” de orientação teleológica. Vide: SILVA SÁNCHEZ, Jesús-María. Aproximación..., p. 69. Neste sentido a sustentação de que para Roxin o modelo de tipos penais abertos, desenvolvido segundo Welzel, não satisfaz a Teoria do Delito. In:
Teoria del tipo penal..., p. 294 e nota 259.
274
ROXIN, Claus. Derecho Penal..., p. 311 e ss.
275
imputação do resultado, levando a própria concepção do tipo penal, de modo não
muito esclarecedor, como sendo uma etapa da imputação276.
Pretende o reconhecimento do tipo do injusto como produção do confronto entre a tipicidade e a antijuridicidade, sendo representado pelo conjunto de características representativas de uma inaceitabilidade social de determinada conduta, que somente pode ser afastada com a incidência de norma permissiva277.
Segundo esta inaceitabilidade, o agente deve ser um indivíduo integrado socialmente, com conhecimento dos comportamentos considerados como inadequados ou ilícitos por esta comunidade, segundo suas expectativas de
vida digna e adequada278.
Günther Jakobs assume um tipo penal objetivo como sendo a expressão da relevância social e, assim, a exteriorização do próprio delito e da constatação da existência de efeitos externos de uma ação. Seu reconhecimento como expressão do injusto, todavia, exige uma conjunção com o tipo subjetivo,
sob pena de tornar-se irrelevante279.
Fundamentado na imputação objetiva do comportamento280,
embora considerando o tipo penal como indício da antijuridicidade, o funcionalismo de Günther Jakobs o reconhece como um conjunto de elementos
básicos, sem os quais um juízo de valor jurídico seria irrelevante281.
276
JAKOBS, Günter. Derecho Penal – Parte general; fundamentos y teoria de la imputación. Tradução Joaquim Cuello Contreras, José Luis Serrano Gonzalez de Murillo. Madrid: Marcial Pons, 1997, p. 9 e ss.
277
TAVAREZ, Juarez. Teoria do Injusto Penal..., p.145.
278
JAKOBS, Günter. Op. cit., p. 312.
279
Ibid., p. 223 e ss.
280
CAMARGO, Antonio Luis Chaves. Imputação..., pp. 105/107.
281