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6.4 CONFLITOS E PROBLEMAS AMBIENTAIS

6.4.1 Ocupação e uso irregular do solo

As irregularidades ocorridas na Praia brava se deram principalmente devido à ocupação indiscriminada de Áreas de Preservação Permanente - APP, o que caracteriza um descumprimento do Código Florestal - Lei Federal nº 4.771/1965; e também devido à ocupação das chamadas áreas de marinha, previstas no Decreto Lei nº 9.760/1946.

O maior problema de ocupação irregular de APP existente durante o desenvolvimento da Praia Brava é marcado pela construção de estabelecimentos comerciais sobre a faixa de restinga - vegetação fixadora de dunas - ao longo da orla, bem como pelo estacionamento de veículos sobre estas áreas, na busca dos usuários pelo conforto junto ao mar, conforme demonstrado na Figura 13. Segundo Santos (2007), as dunas têm um processo histórico de ocupação desde a década de 70 com a abertura da Avenida José Medeiros Vieira (beira mar). Estes problemas foram agravados pelo expressivo número de freqüentadores recebidos durante a temporada, privatizando locais que deveriam ser utilizados por todas as pessoas e comprometendo a paisagem e a área pública para o lazer e o turismo.

Como dito anteriormente, as dunas encontradas ao longo da orla da Praia Brava cumprem um papel importante de manutenção da linha de costa durante eventos de fortes ondulações, que são popularmente conhecidos como ressaca. A destruição da restinga foi crucial para que estes eventos provocassem danos consecutivos, causando prejuízos aos próprios interessados que freqüentam o local: moradores, turistas e comerciantes, etc. Podemos citar o alagamento da Avenida beira-mar - José Medeiros Vieira e a conseqüente formação de buracos, causando danos aos veículos e a perda de área de estacionamento; o surgimento de resíduos na praia vindos da estrada; a destruição dos próprios bares e quiosques, conforme trecho abaixo de caso noticiado pela prefeitura de Itajaí e, sobretudo, o aspecto de destruição que foi formado, perdendo-se toda a beleza cênica de um patrimônio ecológico bem preservado.

Atingidos pela fúria do mar, estabelecimentos construídos em área de preservação não poderão ser reerguidos no mesmo lugar.Além das inundações e desabamentos provocados pelas chuvas, o mau tempo

Na noite de terça, dia 9, a fúria do mar destruiu - total ou parcialmente - diversos estabelecimentos localizados na orla. (PREFEITURA MUNICIPAL DE ITAJAÍ, 2005).

FIGURA 13 - Supressão da restinga ao longo da orla da Praia Brava Fonte: FAMAI, 2005.

QUADRO 4 - Erosão devido à destruição da vegetação fixadora de dunas

Devido ao fato de se tornar um dos últimos espaços com ambientes relativamente conservados, de acordo com Santos Junior (2006), a Praia Brava tornou-se alvo de grande especulação, principalmente voltada ao turismo de relação com a natureza e de aventura, ressaltando ainda o aumento do valor de terrenos e moradias.

Concordando com esta colocação, Santos (2007) complementa dizendo que

Com o aumento da especulação imobiliária e com a divulgação da Praia Brava, essa passa a ter uma visão de mundo de um local que proporciona casas noturnas e festa “rave”, sendo que essas duas visões de mundo coexistem com a de local isolado e alternativo para viver em contato

com a natureza, principalmente para atender o publico que freqüenta essas casas noturnas.

Conforme coloca o autor, apesar das considerações dando suas virtudes pelos atrativos de entretenimento, as casas noturnas marcam o centro dos conflitos na Praia Brava, especialmente na porção norte da praia, denominado Canto do Morcego, sendo alvo de uma série de ações judiciais a partir do ano de 2001.

“A partir do ano de 2000 a coisa começou a fugir do controle, especialmente pela massiva divulgação da Praia Brava realizada pelos bares Kiwi e Galeras, que a esta altura já atuavam como casa noturna. Foi um período complicado, quando se começou a construir a imagem da Praia Brava como local de raves e baladas, como espaço de uma juventude elitizada.” (ator chave 3) (SANTOS, 2007 p. 40).

Atualmente, a casa noturna “Warung”, promotora de festas “rave”, é o atributo construído mais importante da Praia Brava, estando esta localizada no Canto do Morcego.

O surgimento das casas noturnas, aliado à degradação ambiental que já se caracterizava ao longo da orla, fez despertar a preocupação da população local.

Nesse sentido, membros da comunidade se organizaram e lutam para manter preservadas as características naturais básicas do local buscando, além da conscientização da comunidade, representada sobretudo pelos movimentos ambientalistas, e pelos habitantes do local, elaborar uma agenda que possa definir políticas de desenvolvimento urbano e de planejamento ambiental que levem em consideração as características locais e as peculiaridade da Praia brava. (SANTOS JUNIOR, 2006 p. 156).

De acordo com Santos (2007), os resultados dessa mobilização começam a aparecer através da realização das seguintes ações:

1. Em parceria com a UNIVALI, no ano de 1999 começa a execução de um projeto de Educação Ambiental na Praia Brava, inicialmente na Escola Básica Ariribá e posteriormente na Escola Básica Yolanda Laurindo Ardigó.

2. Realização de ações vinculadas à proteção do sistema costeiro das dunas da Praia Brava, com atividades de estaqueamentos dos cordões de dunas, evitando desta forma o uso inadequado destes como estacionamento e trilhas de acessos em excesso. Foram realizados dois estaqueamentos durante os anos de 1999 e 2000, promovidos por movimentos ambientalistas, comunidade e UNIVALI, tendo grande repercussão dentro do município de Itajaí e dando visibilidade para a causa ambiental dentro do município.

QUADRO 5 - Estaqueamentos realizados no ano 1999 e 2000

Fonte: Santos, 2007.

Além de ações desse tipo, era preciso não apenas evitar que o problema se tornasse mais grave, mas sim restaurar toda a faixa de vegetação ainda existente. Para isso era necessária a retirada dos estabelecimentos comerciais edificados sobre as dunas. Começam então a surgir denúncias de crime ambiental pelo uso e ocupação irregular das APPs (campo de dunas), elaboradas principalmente pelos movimentos ambientalistas.

Tais denúncias surtem efeito já no ano de 2001, quando Ministério Público Federal e IBAMA abrem uma Ação Civil Pública, nº. 2001.72.08.000141- 4, tendo como réus os estabelecimentos comerciais e as Prefeituras Municipais de Itajaí e Balneário Camboriú.

“Problemas relacionados à utilização de Áreas de Uso Comum e/ou de Preservação Permanente (APP), por uso privado tem sido foco de discussões entre diversos atores nos últimos anos, culminando com uma Ação Civil Pública, movida por Ongs locais contra a Administração Pública e proprietários de quiosques localizados sobre o campo de dunas.” (PROJETO ORLA, 2004 p. 32).

“Diante desses interesses difusos existentes na comunidade e a partir de denúncias de crimes ambientais encaminhadas pelas associações ambientalistas ao Ministério Publico Federal, resultando em Ação Civil Pública (ACP)...” (SANTOS JUNIOR, 2005 p 194).

A ACP movida ainda no ano de 2001 reivindicou a demolição de 14 quiosques existentes além da recuperação das dunas e restingas, bem como a revitalização e urbanização da orla da praia Brava, com a regularização dos acessos, sistema de tratamento de resíduos e relocação dos quiosques localizados sobre APP. Depois de várias audiências públicas, a Justiça Federal determinou que a Prefeitura de Itajaí apresentasse um projeto de recuperação do campo de dunas e de reurbanização da Orla.

Por conseguinte, em dezembro de 2003 a Prefeitura contratou a UNIVALI, que então elaborou um projeto denominado “Plano de Restauração Ambiental e Ordenamento da Orla da Praia Brava”, o qual acabou tornando-se parte integrante do Projeto de Gestão Integrada da Orla Marítima - “Projeto Orla”, que começara a ser desenvolvido ao longo do ano de 2003, onde a Praia Brava ficou definida como localidade prioritária.

O Projeto Orla é uma iniciativa do Ministério do Meio Ambiente - MMA, em parceria com a Secretaria do Patrimônio da União - SPU, que busca contribuir, em escala nacional, para aplicação de diretrizes gerais de disciplinamento de uso e ocupação da Orla Marítima. Em Itajaí foi concluído em 2004, ano em que ocorreram as eleições municipais.

Podemos dizer que o ano de 2005 é um divisor de águas para as questões ambientais na Praia Brava, pois marca o início de sua recuperação - como veremos em seguida - e a consolidação do poder da sociedade civil organizada na busca pela preservação da natureza. Os conflitos gerados até aquele ano pelas irregularidades de uso e ocupação do solo, hora discutidos no estudo em tela, podem ser resumidos de acordo com o quadro abaixo:

QUADRO 6 - Conflitos de uso e ocupação do solo

PROBLEMAS RELACIONADOS EFEITOS / IMPACTOS

C O N F L IT O S Uso de áreas comuns X Privatização de áreas públicas (uso comercial)

- Uso e ocupação indevidos da área de uso comum (praia);

- Ocupação irregular das áreas de restinga e dunas;

- Deficiência no controle pelos órgãos competentes.

- Degradação da paisagem - Privatização do espaço público

- Desestabilização da linha de costa (erosão costeira) Preservação das características naturais (restinga dunas e praia) X Ocupações Irregulares e/ou Inadequadas

- Ocupação indevida sobre a praia, campo de dunas, área de restinga e margem dos cursos d’água; - Disposição inadequada de resíduos líquidos e sólidos na praia.

- Supressão da vegetação nativa e introdução de vegetação exótica; - Perda de características ecológicas e paisagísticas;

- Contaminação da areia;

Alteração da dinâmica sedimentar. - Estacionamento de veículos sobre

área de restinga, intensificação de tráfego de pedestres sobre dunas.

- Comprometimento das características ecológicas e paisagísticas;

- Supressão da vegetação nativa; - Retração do turismo ecológico. - Erosão praial.

- Destruição de edificações e vias de acesso em períodos de ressaca e/ou chuvas fortes; - Degradação da paisagem.

- Aterro para a expansão da avenida beira-mar sobre as dunas.

- Redução da faixa de dunas; - Supressão da vegetação nativa; - Contaminação da área e erosão praial.

Em atendimento à determinação judicial, as obras de restauração ambiental e reordenamento da orla da Praia Brava começaram a ser desenvolvidas logo no início de 2005. Prioritariamente foram retirados os bares e quiosques irregulares, retirado o aterro depositado sobre a restinga e feito reestaqueamento para aumento da área de vegetação; a instalação de novos postos salva-vidas; e o início da recuperação da restinga, através do plantio de novas mudas. Estas obras se desencadearam ao longo dos anos 2005 e 2006, conforme apresentado no Quadro 7.

“...Depois de discutido com a comunidade começa a sair do papel o projeto de Restauração Ambiental e Reordenamento da Orla da Praia Brava. As Secretarias de Panejamento, Obras e a Fundação do Meio Ambiente de Itajaí trabalham na recuperação da restinga e no realinhamento da Avenida José Medeiros Vieira, a Beira Mar.

Os trabalhos iniciaram ontem (1) e vem sendo executado da área sul da Praia, Ribeirão Aririba, divisa com Balneário Camboriú. As máquinas da Secretaria de Obras e Serviços Municipais realinham a avenida que vinha causando transtornos à comunidade e o reestaqueando para proteção da vegetação nativa e das dunas.

O oceanógrafo da Famai, Fabrício Estevão da Silva, coordena a equipe de recuperação ambiental que vem atuando na Praia Brava. Na primeira etapa está sendo retirado o aterro depositado sobre a restinga e as dunas até encontrar a areia. Ainda será realizada a recuperação desta vegetação nativa em 18 mil metros quadrados, dobrando a sua área.

Os postos de salva-vidas projetados pela Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Urbano irão servir de referência para todo o Estado, conforme sugestão do comando estadual do Corpo de Bombeiros. A proposta apresentada (madeira ou alvenaria) prioriza o conforto do profissional, segurança no armazenamento dos equipamentos de segurança e durabilidade da construção”. (PREFEITURA MUNICIPAL DE ITAJAÍ, 2005).

Fonte: FAMAI, 2005.

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