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2.3 Governança corporativa no setor bancário

2.3.2 Abordagens específicas

2.3.2.2 Opacidade

Segundo Caprio e Levine (2002), além da maior regulação a que estão sujeitos quando comparados às demais firmas, os bancos apresentam uma segunda característica que torna sua governança corporativa menos eficiente do que nas demais empresas: a opacidade. Macey e

O´Hara (2003) afirmam que o rápido desenvolvimento da tecnologia e a crescente sofisticação financeira têm desafiado as atividades tradicionais de regulação e supervisão para a manutenção da segurança do setor bancário, e essa complexificação das atividades bancárias tem sido apontada como responsável por obscurecer os riscos associados aos bancos.

Bhattacharya, Boot e Thakor (1998) argumentam que os depositantes não são capazes de compreender a estrutura financeira dos bancos e consideram as informações a esse respeito incomunicáveis aos usuários das demonstrações financeiras. Para os autores, os depositantes não sabem o real valor do portfólio de um banco. Na medida em que os portfólios bancários se apresentassem muito fungíveis, essa informação seria praticamente incomunicável, além de extremamente onerosa.

Morgan (2002) sugere que os problemas de agência associados com a intermediação de ativos criam incertezas adicionais tanto para as agências de rating quanto para os investidores. Ainda de acordo com o autor, toda a regulação do setor bancário teria justificativa na sua grande opacidade, pois, caso os bancos demonstrassem o mesmo grau de transparência das demais empresas, a falência de um deles não teria o efeito de contagiar os demais. Nas palavras do autor, o raciocínio que motiva a regulação do setor é o seguinte:

Banks are black boxes. Money goes in, money goes out, but the risks taken in the process of intermediation are hard to observe from outside the bank. Absent the steadying had of government (deposit and payments insurance, lender of last resort, supervision and regulation of bank risk taking) the opacity of banks exposes the entire financial system to bank runs, contagion and other strains of systemic risk (MORGAN, 2002, p. 874).

Tomando a concordância de duas agências de rating (Moody´s e Standard and Poors [S&P] ) como uma proxy de transparência e utilizando-se de dados de títulos emitidos no mercado norte-americano no período de 1983 a 1993 , Morgan (2002) verificou que os títulos emitidos por bancos geram maior discordância a respeito de seu risco do que as demais empresas, com exceção das companhias seguradoras, que o autor denomina irmãs dos próprios bancos. O raciocínio do autor foi que, caso o risco bancário fosse mais difícil de ser observado, isto é, caso os bancos fossem mais opacos, as agências de rating discordariam mais a respeito do risco dos títulos das empresas desse setor do que a respeito das demais.O gráfico 4 ilustra a

evolução do nível de discordância das empresas de rating sobre o risco de bancos, seguradoras e de empresas de demais setores.

Gráfico 4 – Risco de bancos, seguradoras e demais empresas: nível de discordância Fonte – MORGAN, 2002, p. 882.

A explicação oferecida por Morgan (2002, p. 881) para a maior opacidade observada no setor bancário em relação aos demais7reside na própria natureza dos ativos bancários: “[...] the

heart of a bank is a vault with a lot of paper in it: loan documents, securities and cash. Compared to other firms, banks hold very few assets that are physically fixed – bolted to the floor, in other words”. A ausência de ativos fixos poderia representar um convite à

substituição de ativos e a outros problemas de agência envolvendo de um lado os proprietários e executivos e, de outro, os credores e depositantes. Por fim, o autor considera que a opacidade dos bancos constitui justificativa para a intervenção governamental do setor, na medida em que as falências, o contágio e o próprio risco sistêmico se derivam da própria opacidade dos ativos bancários.

Utilizando uma base de 2.473 títulos emitidos por empresas europeias no período de 1993 a 2003, Iannotta (2006) também verificou que diferentes agências de rating discordam mais frequentemente sobre questões relacionadas a bancos do que sobre questões não relacionadas a bancos. Ainda, de acordo com o autor, a opacidade está relacionada aos ativos financeiros detidos pelos bancos e varia de acordo com o tamanho dessas empresas: quanto maior o banco, maior é sua tendência à opacidade.

Já Flannery, Kwan e Nimalendran (2004) analisaram propriedades microestruturais de mercado e previsões de analistas sobre os lucros de bancos norte-americanos a fim de

determinar a maior ou menor opacidade de seus ativos em relação a empresas não bancárias do mesmo porte. Não foram, contudo, encontradas evidências de que os bancos sejam mais opacos. Ao contrário, o comportamento das ações de bancos sugeriu que suas ações não são incomumente mais difíceis de avaliar. De acordo com os autores, os bancos de maior porte, negociados na NYSE, não diferem significativamente das firmas não financeiras. Já em relação aos bancos de menor porte, listados na NASDAQ, apesar de significativamente menos negociados do que outras empresas comparáveis, apurou-se que os analistas predisseram seus resultados tão acuradamente quanto das empresas não bancárias, o que implica que os bancos menores sejam ainda menos opacos do que seus correspondentes não bancários.

De acordo com os autores, a iliquidez dos empréstimos e informações privadas sobre tomadores específicos não necessariamente torna os bancos mais difíceis de serem avaliados do que as firmas não financeiras. Assim como muitos empréstimos não são negociados nos mercados secundários ativos, também muitos ativos de firmas não financeiras não o são, como planta e equipamento, patentes, capital humano ou contas a receber (FLANNERY, KWAN e NIMALENDRAN, 2004). Empiricamente, portanto, opacidade dos bancos não parece bem estabelecida.