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Oposição, Debate Público e Participação Social: Dimensões da

CAPÍTULO 1 CONTEXTUALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS CULTURAIS NO

1.6 PRINCÍPIOS DE IGUALDADE E DE LIBERDADE DE

1.6.2 Oposição, Debate Público e Participação Social: Dimensões da

Quino

Entre a liberdade de participar nas decisões políticas e o modo como uma pessoa ou grupo se sente predisposto ou com necessidade de agir, têm-se o modo como o governo ou regime político possibilita espaço para as participações políticas, oposições, dissensos e debate público.

Conforme anteriormente mencionado sobre o livro "La poliarquia", de Robert Dahl, retoma-se a discussão da democracia pelo viés de dois dos componentes básicos deste regime político, os quais, quando relacionados, podem estabelecer parâmetros para uma medida da intensidade ou do grau de democracia em um governo. Isso importa na medida em que o autor estabelece o debate público e a participação social como medidores deste regime político.

Ainda, a possibilidade de opor-se ao poder dominante de forma organizada, aberta e legalizada, tanto por partidos políticos quanto por organizações da sociedade civil, assim como a possibilidade de haver dissenso em um regime político, são componentes que determinam a tendência democrática do regime. Regimes políticos podem ser comparados pela amplitude com que facilitam a oposição, o debate público e a luta política (DAHL, 2009b, p.14), o que se aproxima da importância dada à oposição política, conforme apresentada por Amarthya Sen (2009).

Há, ao menos, duas dimensões teóricas da democracia a que Dahl se refere, que são o debate público e o direito a participar. Ainda que se tenha presente o fato de que o sistema de debate público não define uma democracia como plena. Na medida que participar codepende de se ter informação sobre e acesso à discussão, e como visto anteriormente, da qualificação para intervir de modo efetivo no debate, pressupõe-se que essas condições alteram o potencial democrático de um processo para a elaboração de uma política pública.

Essas duas dimensões são definidas pelo autor como oportunidade de opor-se ao governo para formar organizações políticas, para expressar livremente as matérias políticas sem medo das represálias do governo, ler e ouvir pontos de vista distintos sobre uma mesma questão, emitir voto secreto nas eleições em que os candidatos dos diferentes partidos lutam para obter esses votos e os derrotados aceitem pacificamente a vitória dos ganhadores.

Mesmo que o debate público e a capacidade de representação variem indepen- dentemente um do outro – a Suíça foi considerada como um país que conta com um dos sistemas de debate público mais avançados do mundo, e onde, contudo, as mulheres foram excluídas do direito de votar até o ano de 1941 –, quanto mais cidadãos gozarem do direito de participar e votar, maior será a representatividade do governo (DAHL, 1979a).

Segundo o mesmo autor, essas prerrogativas podem parecer comuns; porém, para quem nunca as teve ou para quem as teve e as perdeu, tais características que definem estas duas dimensões da democracia ganham outra força e dimensão. Para os que vieram de uma herança de ditadura, censura e autoritarismo nas relações, estas são prerrogativas pelas quais se devem lutar para existir nos espaços de participação e para a elaboração de programas políticos, econômicos, educacionais, sociais e culturais, pois, como visto anteriormente, afetam o alcance dos direitos humanos e básicos, de manifestação das necessidades e dos desejos. Isto é, dependendo de como essas duas dimensões existam ou não, serão, também, elaboradas ou não as leis que possam atender aos pressupostos das pessoas, constituindo-os como cidadãos. Cabe então, questionar: uma pessoa pode ser considerada como cidadã quando não tem acesso ao debate público?

De outro modo, a participação, segundo Dahl (2009a, p.15), "[...] es decir, tener

voz en un sistema de debate público", o que dialoga com a premissa de Bunge

(2009), para quem participação demanda equanimidade, assim como o exercício da liberdade (grifo nosso). E, muitas vezes, os regimes políticos apenas alternam as pessoas que ocupam os cargos, a retórica, e mantêm-se preceitos vazios, sem conteúdo e sem alterar a lógica de funcionamento e organização, pois é mais fácil continuar lutando em práticas já existentes do que incutir novos modelos em lógicas tradicionais.

Desse modo, a participação na decisão das escolhas políticas é restrita, muitas vezes, pela ideia de democracia representativa, com a noção da forma majoritária de governo, "aquela que aglomera o maior número de interesses sociais como sendo uma medida substantiva do bem comum", e na qual baseia-se a vontade da maioria "apenas nos números de votos expressos como uma vontade geral e que no máximo chega a ser procedimentos comuns para resolução de divergências" (FREIRE, 2006, p.33).

A grande maioria das democracias é representativa e dita leis executando supostos interesses comuns em detrimento "de um estreitamento da participação política". Pode muito bem existir, por exemplo, um Estado democrático em uma sociedade em que a maior parte das instituições não possui práticas democráticas (FREIRE, 2006, p.106). Já a democracia participativa deve manter a agenda de debate aberta permanentemente para que as contribuições dos cidadãos ocorram a qualquer momento entre períodos eleitorais.

Nesse sentido, Dahl (2009a), em função das diferentes gradações que podem haver no espaço compreendido entre ambas as dimensões que compõem um regime democrático, a do debate público e a da participação política, e por entender que não há nenhum sistema atual de governo totalmente democratizado, irá definir o regime relativamente democratizado como Poliarquia, que toma a trajetória III da Figura 7:

Figura 7 - Liberalización, representación y democratización Fonte: Dahl (2009a, p.18)

É o espaço compreendido entre ambas as dimensões que varia e que pode denominar a classificação de regimes distintos. Por exemplo, uma trajetória I representa o trânsito de uma hegemonia fechada a uma oligarquia competitiva. E também pode ocorrer que a hegemonia fechada se torne mais compreensiva, sem ampliar as oportunidades para o debate público ao seguir a trajetória II (DAHL, 2009a, p.17). Têm-se a "Hegemonia cerrada", a "Oligarquia competitiva" e a "Hegemonia compreensiva", e a democracia se situaria no ângulo superior direito da Figura.

Para Dahl (2009a), o debate é considerado a contestação e o debate público, a contestação pública. Contestação, como na tradução do inglês, que significa fazer de algo objeto de discussão = disputar, desafiar ou rivalizar (DAHL, 2009a, p.19).

O debate público e o direito a participar, na medida em que participar codepende de se ter a informação e acesso à discussão e, como visto em Dahl (2009b), da qualificação para intervir de modo efetivo no debate, pressupõe condições que alteram o potencial democrático de um processo, e requer conhecer os modos de organização e atuação da sociedade civil:

A combinação destes elementos, cidadania cultural, novo pacto federativo para a cultura e a perspectiva de implantação de políticas públicas de cultura – dependerá, inevitavelmente, da ampliação dos limites da democracia representativa em direção a modelos democráticos mais participativos (PIVA, 2008, p.18).