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ORGANIZAÇÃO DOS HORÁRIOS ESCOLARES

No documento Organização escolar: o tempo (páginas 70-73)

Organização das atividades escolares

5. ORGANIZAÇÃO DOS HORÁRIOS ESCOLARES

5.1. Introdução

Na década de 90 do Século XX, existiu um debate muito intenso na agenda das políticas educativas internacionais (OCDE, 1990; 1991; 1993; 1994; 1998; 1999) sobre o currículo, com paralelo no campo teórico (Giméno Sacristán, 1994; Zabalza, 1992; Hutmacher, 1992, 1999; Roldão, 1995, 1997, 1998, 1999a, 1999b) que conduziu, nos países de tradição centralista, à passagem do paradigma do currículo uniforme, prescritivo e à adoção de um paradigma da flexibilização ou da contextualização curricular.

Essa mudança de paradigma configurou um binómio curricular que se traduziu: i) em aprendizagens curriculares essenciais comuns (core curriculum); ii) articuladas com a diversidade de projetos curriculares correspondentes a contextos diferenciados (Roldão, 1999b, 2000).

Em Portugal, estas políticas encontraram repercussão na reorganização curricular do ensino básico, iniciada em 1997 com o Projeto de Gestão Flexível do Currículo (Despacho n.º 4848/97, 30 de julho), a que aderiram de forma experimental várias escolas. O Projeto propunha-se a “promover uma mudança gradual nas práticas de gestão curricular nas escolas do ensino básico”, para desenvolver “a eficácia da resposta educativa aos problemas surgidos da diversidade dos contextos escolares” tais como, “fazer face à falta de domínio de competências elementares por parte de muitos alunos à saída da escolaridade obrigatória” (Despacho n.º 9590/99, 14 de maio, preâmbulo).

A gestão flexível do currículo era definida no anexo do Despacho n.º 9590/99, de 14 de maio, como “a possibilidade de cada escola organizar e gerir autonomamente o processo de ensino/aprendizagem, tomando como referência os saberes e as competências nucleares a desenvolver pelos alunos no final de cada ciclo e no final da escolaridade básica, adequando-o às necessidades diferenciadas de cada contexto escolar e podendo contemplar a introdução no currículo de componentes locais e regionais”.

Deste modo, a gestão flexível do currículo, consagrada mais tarde no Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de janeiro, afastou a continuidade de um currículo nacional prescritivo, postulando a concretização do currículo como um projeto a ser desenvolvido ao nível de cada escola e culminou com publicação do

Currículo Nacional do Ensino Básico – Competências Essenciais, como documento de referência para a

gestão curricular.

É neste diploma que surgiu, pela primeira vez, a referência ao projeto curricular de escola como documento das estratégias de desenvolvimento do currículo nacional adaptado ao contexto de cada escola (Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de janeiro, Art.º 2.º, n.º 3 e 4). Desta forma, o processo de desenvolvimento contextualizado do currículo nacional, no quadro da autonomia das escolas, deveria ser objeto de um projeto curricular de escola/agrupamento que seria adaptado ao contexto de cada turma, originando depois um projeto curricular de turma.

Nesta perspetiva a gestão curricular introduziu uma deslocação de centros de decisão, novas modalidades e articulação entre níveis de decisores (Roldão 1999b, 2000). O que requer que se articulem os seguintes níveis de decisão: i) o central, ao nível da administração central que estabelece o core curriculum; ii) ao nível institucional da escola que com base no projeto curricular de escola concebe um conjunto de estratégias para a ação conjunta permitindo uma cultura de colaboração; iii) ao nível dos órgãos intermédios da escola que se materializa no projeto curricular de turma; iv) e por último ao nível da sala de aula, em que

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o professor recontextualiza o currículo. O desenvolvimento curricular torna-se num processo contínuo de negociação e articulação entre diferentes níveis que valoriza modos de planificar flexíveis e, por isso mesmo, adaptados a cada contexto educativo.

Este novo paradigma curricular tem sido reafirmado nas sucessivas revisões curriculares pela introdução de medidas (ver capítulo 4 do estudo) que permitem uma maior autonomia às escolas, assim, impõe-se equacionar as implicações que tal mudança estrutural implicou na gestão do currículo ao nível das escolas. O presente estudo foi desenvolvido pelo Conselho Nacional de Educação em colaboração com o Projeto

Curriculum Monitor desenvolvido no Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade Nova

(CICS.NOVA). O objetivo do estudo foi, precisamente, de compreender a forma como as escolas gerem, ora aspetos organizacionais da gestão curricular, como é o caso da organização do tempo escolar, ora aspetos curriculares, designadamente pela introdução de saberes adaptados ao seu contexto educativo, por exemplo pelo estabelecimento do currículo da oferta complementar prevista nas matrizes curriculares do 1.º, 2.º e 3.º ciclos de ensino.

Este estudo considerou assim as seguintes dimensões de investigação:

 Unidades de tempo letivo adotadas pelas escolas

 Organização dos tempos letivos das disciplinas

 Gestão da flexibilidade permitida pela legislação na distribuição da carga horária por disciplinas e

áreas disciplinares

 Opções da oferta complementar

 Distribuição semanal dos apoios e disciplinas a que se destinam

 Concentração das atividades letivas (turno da manhã, da tarde, misto)

 Tempo de permanência na escola

 Gestão dos intervalos (almoço e entre as atividades letivas)

 Distribuição das componentes do currículo ao longo da semana

Neste sentido, analisou-se uma amostra de horários escolares do 5.º e 9.º anos de escolaridade, referentes ao ano letivo 2015/2016. A opção de se limitar o estudo ao 5.º e 9.º anos ficou a dever-se ao facto do primeiro ano marcar a transição da monodocência para a pluridocência e constituir-se como um ano intermédio entre os nove anos do ensino básico em Portugal. O segundo ano coincide com o final do ensino básico e é um ano de exames nacionais. É de sublinhar o facto da idade ajustada (idade expectável) para a frequência do 5.º ano ser de 10 anos, o que em 2014/2015 correspondia a 75,2% do total de alunos matriculados no ensino regular nesse ano. No caso do 9.º ano, a idade ajustada é de 14 anos, o que correspondia a 68,8% do total de alunos matriculados em 2014/2015 (dados disponibilizados pela DGEEC, 2016).

Os horários dos agrupamentos foram recolhidos a partir dos respetivos sites e os que não se encontravam disponíveis online foram solicitados por email às respetivas unidades orgânicas (UO). A recolha teve como critério reter os horários de todas as turmas do 5.º e 9.º ano de escolaridade das UO selecionadas.

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5.2. Metodologia: Construção e caracterização da amostra

Este estudo incluiu 231 agrupamentos da rede escolar pública não superior, com base numa amostra aleatória representativa (Portugal Continental) dos agrupamentos verticais do ensino básico e secundário existentes no ano letivo de 2015/2016. A dimensão dos estratos foi calculada a partir dos dados disponibilizados pela Direção-Geral da Administração Escolar (5 de março de 2015) que indicavam a existência de 713 agrupamentos verticais e horizontais, dos quais não foram considerados os seguintes: os agrupamentos pertencentes aos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária, devido à especificidade do seu contexto educativo e à ausência dos horários escolares na esmagadora maioria dos seus sites; e os agrupamentos horizontais, por não incluírem os anos que são objeto do presente estudo. A amostra foi estratificada em função da natureza dos agrupamentos e das regiões NUTS II, com um intervalo de confiança de 95% e uma margem de erro de 5%. Os agrupamentos dentro de cada estrato foram selecionados de forma aleatória com recurso ao módulo Complex Samples do SPSS Statistics®, versão 24. A amostra inclui, assim, um total de 178 agrupamentos sem autonomia e 53 com autonomia distribuídos pelas NUTS II, tal como se pode verificar pela Tabela 5.2.1.

Tabela 5.2.1. Caracterização da amostra para o 5.º e 9.º anos de escolaridade.

NUTS III N UO sem autonomia % N UO com autonomia %

Alentejo Central 4 2,25 - - Alentejo Litoral 3 1,69 1 1,89 Algarve 10 5,62 1 1,89 Alto Alentejo 4 2,25 1 1,89 Alto Minho 7 3,93 - - Alto Tâmega 3 1,69 - -

Área Metropolitana de Lisboa 37 20,79 12 22,64

Área Metropolitana do Porto 24 13,48 9 16,98

Ave 6 3,37 5 9,43

Baixo Alentejo 4 2,25 1 1,89

Beira Baixa 2 1,12 - -

Beiras e Serra da Estrela 6 3,37 3 5,66

Cávado 6 3,37 4 7,55 Douro 4 2,25 1 1,89 Lezíria do Tejo 7 3,93 1 1,89 Médio Tejo 6 3,37 2 3,77 Oeste 8 4,49 1 1,89 Região de Aveiro 7 3,93 2 3,77 Região de Coimbra 8 4,49 2 3,77 Região de Leiria 4 2,25 4 7,55 Tâmega e Sousa 8 4,49 1 1,89 Terras de Trás-os-Montes 4 2,25 - -

Viseu Dão Lafões 6 3,37 2 3,77

Total 178 100 53 100

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5.2.1 Critérios de codificação dos dados

Dos agrupamentos selecionados consideraram-se as turmas do ensino regular e do ensino articulado, desde que não integrassem meramente os alunos dos cursos de ensino artístico especializado de nível básico, criados pela Portaria n.º 691/2009, de 25 de junho e, dessa forma, contemplassem todas as disciplinas das matrizes curriculares do 5.º e 9.º anos de escolaridade. No caso das turmas com alunos do ensino articulado, não foram tratadas as disciplinas dos cursos de ensino artístico especializado que vulgarmente são lecionadas nos conservatórios ou em outros estabelecimentos de ensino, como por exemplo, Formação Musical, Instrumento ou Classe de Conjunto, no caso de articulação com o Curso Básico de Música (Decreto n.º 107/2012, de 30 de julho) e que se dirigiam apenas aos alunos dos cursos de ensino artístico especializado. As turmas com Percurso Curricular Alternativo (PCA), criadas ao abrigo do Despacho Normativo n.º 1 de 2006, de 6 de janeiro, também não foram consideradas neste estudo, assim como as turmas de cursos vocacionais no ensino básico, regulamentadas pela Portaria n.º 341/2015, de 9 de outubro. A codificação dos dados obedeceu ainda aos seguintes critérios específicos:

 Os agrupamentos com disciplinas quinzenais foram contabilizadas semanalmente com metade do

respetivo tempo;

 Os apoios para alunos com necessidades educativas especiais não foram considerados;

 No caso dos horários apresentarem duas opções para a disciplina de Educação Moral e Religiosa (e.g.

católica e evangélica) apenas foi contabilizada a duração de uma delas;

 A direção de turma (DT) foi considerada como Tutoria;

 Os horários que incluíam projetos dirigidos para a turma não foram tomados em conta (e.g.,

“Desporto Escolar”, “O Canto também é meu” ou Projeto EPIS);

 Os tempos para as aulas de substituição não foram contabilizados;

 O tempo da orientação vocacional do Serviço de Orientação Profissional não foi considerado;

 Nos casos com disciplinas colocadas em simultâneo, optou-se pela primeira disciplina do currículo

obrigatório (e.g., Matemática, Apoio, Educação Moral e Religiosa).

Em relação à recolha dos dados, começou-se por proceder à elaboração de uma base25 com a identificação

de um conjunto de variáveis que permitiu extrair informação dos horários com recurso ao software

Microsoft Office Excel®. Uma vez terminado este processo de codificação, as variáveis foram importadas

para o SPSS Statistics®, versão 24, para análise univariada, bivariada e multivariada, cujos resultados se apresentam de seguida.

Para facilitar a apresentação dos resultados de cada um dos anos de escolaridade, decidiu-se organizá-los em duas partes. A primeira relativa à carga horária semanal das diferentes áreas disciplinares, da coadjuvação, da oferta complementar e do apoio. A segunda relativa à organização das atividades letivas, no que se refere aos tipos de horário, tempos de almoço, tempos de intervalo e distribuição das componentes do currículo no horário dos alunos.

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