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A Internet pode ser colocada como uma das maiores revoluções do século XX. Por meio dela, as fronteiras não mais existem, sendo possível acessar uma informação disponível em qualquer lugar do planeta, em segundos. Hoje, qualquer pessoa pode ter acesso à cultura de países distantes e se comunicar com outras que estão do outro lado do globo, em tempo real, inclusive com a disposição de imagens e sons. É possível armazenar arquivos e pesquisas – inclusive fora do local onde a pessoa se encontra, por meio da computação em nuvem –, acessar informações acadêmicas em sites hospedados em diferentes países, disponibilizar informações, conhecer pessoas, fazer as compras mensais, acessar conta corrente, pagar contas, fazer qualquer transação bancária, inclusive empréstimos.

Tornou-se real a possibilidade de se, por exemplo, estudar em instituições de ensino de qualquer parte do mundo, sem sair de casa, por meio do e-learning73. Há uma infinidade de coisas que se pode fazer por meio da Internet, e a cada dia que passa percebe-se que a globalização não é apenas uma palavra que faz parte do vocabulário político e econômico, mas do cotidiano de todos, pois a realidade faz as pessoas globalizadas, “plugadas”.

E, como não poderia deixar de ser, a utilização da rede para a venda de produtos e serviços, nos mais variados ramos de atividade, é cada vez mais crescente. O e-commerce74 é hoje, sem dúvida nenhuma, o carro-chefe – ou muitas vezes a única forma de comercialização – de muitas empresas. Hoje, uma empresa que não tem um site institucional pode se considerar praticamente fora do mercado de consumo. As empresas utilizam suas páginas para prestar informações a respeito de seus produtos, divulgar suas marcas, prestar atendimento a seus clientes, enfim, são capazes de centralizar inúmeros serviços na Internet, reduzindo seus custos, tornando-se mais competitivas e, consequentemente, aumentando sua margem de lucro.

Portanto, a crescente utilização da Internet para os mais variados fins, traz, em paralelo às suas vantagens, inúmeros problemas, seja no campo tecnológico, financeiro, fiscal ou jurídico, este último diretamente ligado a esta pesquisa.

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Ou eletronic learning, é um meio de aprendizagem onde os cursos são ministrados via Internet. Hoje, há vários tipos de cursos oferecidos pela Internet, desde idiomas até pós-graduação.

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Denominação em inglês para “comércio eletrônico”. Preferimos utilizar essa terminologia por ser a utilizada pelas empresas de publicidade, informática e também pela “rede”.

A Internet foi idealizada75 na década de 1960, com o objetivo de manter um grande potencial de troca e compartilhamento de informações, cujo projeto era sigiloso e voltado para fins militares e científicos. O objetivo era criar uma forma “indestrutível” de conexão de informações, de tal modo que, se uma parte da conexão fosse destruída, a própria “rede” (net, em inglês), encontraria outro caminho para se conectar. Assim, a troca e o compartilhamento de informações seriam mais eficazes e protegidos, tornando contínua a circulação da informação. Desenvolveu-se, então, uma interligação entre computadores, como uma espécie de “teia” (web, em inglês).

No período da Guerra Fria, as duas então superpotências da época, Estados Unidos e União Soviética, juntamente com seus respectivos aliados, travavam uma guerra de espionagem. Para que não ocorresse a interrupção da comunicação no caso de um ataque, foi desenvolvida “a rede”, capaz de, em caso de destruição de uma conexão, escolher um caminho em funcionamento, de acordo com o menor tempo possível, para efetivar a informação. Foi, então, criada a ARPA – Advanced Research Project Agency, em 1957, agência americana responsável pela tecnologia nos Estados Unidos naquele período.

O desenvolvimento de transmissão de pacotes de dados se intensificou e, em 1969 é criada a ARPAnet, com a participação de universidades e institutos de pesquisa. No início, era efetuada a conexão entre quatro computadores, instalados na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, no Standford Research Institute, na Universidade da Califórnia em Santa Bárbara e na Universidade de Utah. (ERENBERG, 2003) A Inglaterra e a Noruega foram os dois primeiros países que estabeleceram uma conexão internacional com a ARPAnet, em 1973.

No ano seguinte, com a expansão da rede, foi necessário o desenvolvimento de um conjunto de protocolos que permitissem a comunicação entre diferentes sistemas. Foram criados, então, os protocolos TCP76 e IP77, por Vinton G. Cerf e Robert E. Kahn78. A

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Dominique Cardon pontua: “Muito se fala sobre as origens militares da Internet. A agência de pesquisa do exército americano financiou a Arpa-Ipto, uma pequena equipe de pesquisa que concebeu os primeiros protocolos de transmissão em rede ARPANET (que mais tarde se tornará a Internet, deixando o jargão militar para entrar nas redes de computadores universitários. Porém um fato é comprovado: a Internet nasceu sobretudo do encontro entre a contracultura americana e o espírito meritocrata do mundo das pesquisas. Os informatas impulsionaram seu desenvolvimento a partir de suas práticas de cooperação, de cococepção e de reputação junto a seus pares. Estabeleceram um código deontológico que valoriza a autonomia, a liberdade da palavra, a gratuidade, o consenso, a tolerância. Isto feito, os inventores da Internet materializaram um conjunto de valores que exerce um efeito persistente sobre a forma da rede, sobre sua organização (libertária) e sobre suas práticas (solidárias).” (CARDON, 2012, p. 7-8).

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Transmission Control Protocol

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ARPAnet se desenvolveu e, em 1983 foi cindida em duas, a Milnet e a Internet, cuja primeira permaneceu com objetivos militares.79

Ainda em 1988, surge o embrião da Internet no Brasil, com um projeto que conectou universidades e institutos de pesquisa de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre com entidades dos Estados Unidos voltadas para os mesmos fins. Mas foi em 1990 que o Brasil efetivamente entrou para a Internet. A finalidade, porém, era apenas para fins de pesquisas, vedada a sua utilização comercial. Em 1991 tal proibição foi suspensa. Essa suspensão trouxe um novo mercado para a nossa realidade: o mercado virtual, dando origem ao comércio eletrônico. (CARVALHO, 2006)

Os Ministérios da Comunicação e da Ciência e Tecnologia, em 1995, instituíram o Comitê Gestor da Internet do Brasil, por meio da Portaria Interministerial 147. Os objetivos eram os de “assegurar a qualidade e eficiência dos serviços ofertados, a justa e livre concorrência entre os provedores80 e o estabelecimento de padrões de conduta aplicáveis a provedores e usuários”. (BRASIL, 1995) Porém, apenas em setembro de 2003 foram definidas as atribuições e normas de funcionamento do Comitê Gestor, pelo Decreto nº 4.829. O Decreto determinou o Comitê como pessoa jurídica, capaz de administrar a arrecadação de valores de registro de nomes de domínio, e concedeu-lhe uma maior democratização na escolha dos representantes. (BRASIL, 2003)

Hoje, sendo a Internet pública, aberta e interativa, a grande preocupação dos governos é estabelecer certas restrições, vedando a veiculação de conteúdos ilegais e imorais, porém esbarra-se em grandes dificuldades, tanto do ponto de vista tecnológico quanto legal, tomando o cuidado de não ferir liberdades, como, por exemplo, a liberdade de expressão.81

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Em artigo intitulado A Protocol for Packet Network Intercommunication, os criadores dos protocolos TCP/IP discorrem sobre seu desenvolvimento, arquitetura e funcionalidades (CERF; KAHN, 1974). Anexo B.

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No ano de 1983 também foi criado o primeiro vírus de computador, por Fred Cohen, com o objetivo de comprovar a vulnerabilidade da rede e sem fins de causar danos. (HSBC, S/d)

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Provedor é gênero composto por algumas espécies. A Ministra Nancy Andrighi, ao julgar o Recurso Especial n° 1.193.764/SP, sintetiza esses conceitos: “Os provedores de serviços de internet são aqueles que fornecem serviços ligados ao funcionamento dessa rede mundial de computadores, ou por meio dela. Trata-se de gênero do qual são espécies as demais categorias, tais como: (i) provedores de backbone (espinha dorsal), que detêm estrutura de rede capaz de processar grandes volumes de informação. São os responsáveis pela conectividade da internet , oferecendo sua infraestrutura a terceiros, que repassam aos usuários finais acesso à rede; (ii) provedores de acesso, que adquirem a infraestrutura dos provedores backbone e revendem aos usuários finais, possibilitando a esses conexão com a internet ; (iii) provedores de hospedagem, que armazenam dados de terceiros, conferindo-lhes acesso remoto; (iv) provedores de informação, que produzem as informações divulgadas na internet ; e (v) provedores de conteúdo, que disponibilizam na rede as informações criadas ou desenvolvidas pelos provedores de informação.” (BRASIL, 2010)

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A cada dia, mais e mais pessoas têm acesso à rede, que passou a fazer parte do cotidiano de grande parte da população mundial. O volume de vendas por meio do comércio eletrônico é crescente, motivo pelo qual há uma grande preocupação com a oferta de produtos e serviços.

O faturamento anual com o comércio eletrônico no Brasil82, nos últimos 12 anos, foi de R$ 500 milhões em 2001 para R$ 28 bilhões em 2013. Em comparação, verifica-se que em 2002 o PIB cresceu 1,9%, contra 55% no comércio eletrônico; em 2006 o crescimento do PIB foi de 2,9%, contra 76% do comércio eletrônico; em 2010 o PIB aumentou 7,5%, contra 40% do comércio eletrônico; e em 2013 o PIB aumentou 2,3%, contra 24% do comércio eletrônico.83 O e-consumidores – consumidores por meio da Internet – aumentou de 1,1 milhão em 2001 para 51 milhões em 201384, gerando um aumento de quase 5000% de consumidores em um período de doze anos.

Todo esse crescimento, especialmente por se traduzir em faturamentos bilionários, ocasiona problemas na mesma proporção, motivo pelo qual se faz necessário analisar as relações jurídicas ocorridas no espaço virtual, mais especificamente as relações de consumo, sendo este parte do escopo desta pesquisa.