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2.1 ESTUDO TEÓRICO E EMPÍRICO

3.1.1 Origem moderna – a burguesia como classe

O percurso histórico desta narrativa pode ser iniciado no ambiente da nobreza empobrecida pelas lutas e guerras que passa a depender dos favores e recursos da burguesia emergente do comércio, desde as grandes navegações ao mercantilismo. Esse é o mesmo ambiente de origem dos direitos na modernidade, associados ao contratualismo que desbanca a "autoridade superior" do clero e da nobreza, na definição do "bem comum". Como suposto, os contratualistas entendem que o Estado (ou Sociedade) nasce como um contrato. Desse modo, o Deus no homem deixou de ser revelado aos escolhidos para governar. No quadro de grandes conflitos sociais, desordens e instabilidades, o realismo racional se impôs como melhor solução para as sociedades emergentes do comércio, do mercantilismo e das trocas culturais - a aproximação com outras civilizações e formas de governo.

Porém muitos conceitos e práticas ainda hoje vigentes se mostram presentes no pensamento político que forja os primeiros passos do contratualismo, p. ex., nas ideias do florentino Maquiavel (1469-1527) e a defesa da verità effettuale – a verdade efetiva das coisas. Maquiavel examinou <a realidade como ela é> quando a maior parte dos governantes não conseguia manter-se no poder por período superior a dois meses; nesse quadro ele analisou o <poder> como algo que muitos almejam e desconhecem, no ideal d´O

Príncipe (1513), indivíduo ou corpo administrativo capaz de fazer reinar a ordem e estabilizar

o Estado. Para Maquiavel, os ciclos de estabilidade e paz entre conflitos e anarquia eram decorrentes da própria natureza humana e suas paixões e instintos malévolos: homens em geral ingratos, volúveis, simuladores, covardes ante o perigo e ávidos de lucro.

O termo corrupção ainda não tinha entrado na gramática política. Porém Maquiavel foi o primeiro a identificar a instabilidade social como duas forças opostas: “uma das quais provém de não desejar o povo ser dominado nem oprimido pelos grandes, e a outra de quererem os grandes dominar e oprimir o povo.” (apud SADEK, 2011: 18). O problema político tornava-se, para O Príncipe, encontrar mecanismos que impusesse a estabilidade das relações – o que significava sustentar determinada correlação de forças. Ao tempo de Maquiavel, a melhor solução para governar estava no Principado ou na República; a escolha dependia da necessidade concreta para inibir a vitalidade das forças desagregadoras. Nesse quadro, os conflitos se tornavam desejáveis enquanto sinal da cidadania ativa.

Maquiavel amargou grandes perseguições por enfrentar o dogma da predestinação do governante e manteve-se coerente com o que defendeu como atividade política. Para ele, a política é uma prática do homem de virtù, que possui o domínio da fortuna - o homem que faz a história. Sua ideia de fortuna esteve vinculada à deusa que em diferentes culturas era possuidora dos bens mais desejados: honra, riqueza, glória e poder, somente acessíveis aos possuidores da virtù. Em sua lógica, o livre-arbítrio responde por metade das ações humanas e a outra metade é creditada ao destino. Mas é apenas a liberdade do homem que pode levá-lo a escolher a virtù para conquistar a fortuna34. 34 Vale destacar que em sua imagem da virtù não cabe a bondade angelical religiosa, mas as formas de lidar com as tentações mundanas. Assim, o poder é o uso virtuoso da sabedoria no uso da força. A posse da virtù é a chave do sucesso do Príncipe; para manter essa conquista ele deve ser capaz de resistir aos inimigos e golpes da sorte. (Ibidem). O Príncipe sábio guia-se pela necessidade: “aprender os meios de não ser bom e fazer uso ou não deles, conforme a necessidade.” (MAQUIAVEL, apud SADEK, 2011: 20).

Desde Maquiavel até o contrato social de Hobbes (1588-1679), os homens são considerados em sua natureza violenta. Assim, com o jus naturale ou direito de natureza, Hobbes dá a cada um a liberdade de usar seu próprio poder da maneira que quiser para preservar a própria vida. Os desejos e paixões humanas, ou as ações que delas resultam, não são em si mesmo um pecado até que se tome conhecimento de uma lei que os proíba. Essa lei precisa ser criada por alguém e nenhuma lei pode ser definida antes que o conjunto de cidadãos interessados no contrato tenha determinado qual a pessoa que deverá fazê-la.

Na obra Leviatã, de 1651, Hobbes definiu o contrato entre indivíduos como um ato político que cria o Estado e estabelece quem o governa. Também o Leviatã pode ser um único homem ou um conjunto deles escolhido para a função. Porém o governante deve estar acima do bom ou mau homem que lê aos outros com base em si mesmo; ele deve ser capaz de ler o gênero humano em sua pluralidade, com base na lei de natureza. Desse modo Hobbes distingue o direito (jus) da lei (lex). O direito é a liberdade de fazer ou de omitir, ao passo que a lei determina ou obriga a uma dessas duas coisas.

O que ele chama de lei de natureza é um preceito geral que proíbe a um homem submetido ao contrato social: fazer tudo o que possa destruir a própria vida; privá-lo dos meios necessários para preservá-la; ou omitir o que pense poder contribuir para preservá-la. Assim, a primeira lei fundamental de natureza é procurar a paz e segui-la. Dessa lei derivam as outras (RIBEIRO, 2011: 49). O pecado de Hobbes em seu ambiente social foi defender que mesmo a propriedade privada deveria ser disponibilizada ao Leviatã que daria à mesma o melhor uso. Coube a J. Locke (1632-1704) a ideia de governo para uma sociedade de proprietários e a crítica à tradição do direito divino, na ideia da vida política como uma invenção humana. Locke popularizou o ideal de que, para garantir os direitos naturais, os homens criam os governos e, por consentimento, constituem autoridades. Diferente do que acontecia no absolutismo hobbesiano, as pessoas podem contestar um governo injusto e não são obrigadas a aceitar suas decisões. Seu contrato social ofereceu a separação nominal jurídica entre o público e o privado, na tentativa de equacionar o problema da liberdade e da igualdade, temas fortes disputados entre burgueses e nobres (CARNOY, 1988:24).

No contexto daquele século o governo consolidou-se como separação de poderes. Montesquieu (1689-1755) teve a preocupação cívica, ainda que aristocrática, com o mau uso

prolongado do poder e o risco ao retorno do despotismo - caso em que perdem a validez as leis que governam os atos dos cidadãos e estabilizam o corpo político, como os costumes estabilizam a sociedade. Na análise de Althusser (1969), a separação dos poderes criada por Montesquieu quis assegurar uma instância independente e capaz de moderar o poder executivo, garantir uma correlação de forças como freios e contrapesos, cuja força política se encontrasse em base social distinta. Existiam, ao tempo, duas fontes de poder político: o rei, cuja potência era a nobreza, e o povo - que designava a burguesia. Nesse quadro, “seria necessário que o funcionamento das instituições permitisse ao poder das forças sociais contrariar e, portanto, moderar o poder das demais” (ANTHUSSER, apud ALBUQUERQUE, 2011:94).

As interpretações abriram controvérsias ainda atuais sobre a lógica de governo em Montesquieu - se ela de fato quer fortalecer o poder do povo. Na visão de Held (1996), o Estado constitucional de Montesquieu deveria limitar-se a manter a lei e a ordem no país e proporcionar proteção contra agressores externos. Montesquieu não teria usado o termo “Estado constitucional”, mas desenvolveu argumentos que visavam, em parte, a “despersonalizar” a estrutura de poder do Estado de modo que ela se tornasse menos vulnerável a abusos por parte de indivíduos ou grupos (1996:51 – grifo do mesmo).

De todo modo, os governos escolhidos (representativos) desde então passaram a amparar-se em constituições escritas, judiciários independentes e leis que garantiam procedimentos jurídicos ainda atuais:

(...) invenção como o habeas corpus (proibições para tortura e aprisionamento), eleições periódicas de candidatos à legislatura, tempo limitado para período de gestão política, voto secreto, referendo e cassação de mandato, colégios eleitorais, partidos políticos competitivos, ouvidoria pública, sociedade civil e liberdades civis como o direito à assembleia pública, e liberdade de imprensa (KEANE, 2006: 2-3)35.

35 Tradução livre para: “(...) invention like habeas corpus (prohibitions upon torture and imprisonment), periodic

election of candidates to legislatures, limited-term holding of political offices, voting by secret ballot, referendum and recall, electoral colleges, competitive political parties, ombudsmen, civil society and civil liberties such as right to assemble in public, and liberty of the press.” (KEANE, 2006: 2-3).

Esse modelo representativo foi contestado por Rousseau (1712-1778) em sua dimensão política. Porque conheceu a liberdade em seu Estado e cidade de origem (Genebra-Suíça), Rousseau entendeu que <todos> os homem nascem livres e iguais, sejam eles nobres, burgueses, lavradores, artesãos ou operários. Preocupado com as questões do direito e da justiça, suas ideias inspiraram o desenvolvimento da democracia, em especial a democracia participativa, tema desta tese. Ele defendeu um contrato social capaz de garantir os direitos da coletividade - pessoas que voluntariamente convivem, não por dever ou medo, mas por convenção.

Para Rousseau, “somente a vontade geral tem possibilidade de dirigir as forças do Estado, segundo o fim de sua instituição, isto é, o bem comum” (ROUSSEAU, 2002:36). Com essa ideia de direito político democrático ele faz a distinção entre “Estado e governo, entre o

poder soberano e sua forma transitória de organização” (NOBRE, 2004:25, grifo meu),

conceitos caros à ideia de política nos dias atuais:

“Que é, portanto, o governo? Um corpo intermediário, estabelecido entre os vassalos (o Estado) e o soberano (o povo), para possibilitar a recíproca correspondência, encarregado da execução das leis e da manutenção da liberdade, tanto civil como política” (ROUSSEAU, 2002: 59).

Na lógica de Rousseau, o exercício da vontade geral torna a sociedade um ser coletivo e soberano que não pode ser representado senão por si mesmo. A representação política é, para ele, um mecanismo ilegítimo na constituição das leis porque tende a informar a vontade de poucos sobre o geral, o que destrói o corpo político: “o particular, por sua natureza, tende às preferências, e a vontade geral à igualdade” (2002: 37). A concepção de administração legítima quis superar as práticas de governo predominantes na Europa. Para Rousseau, a ideia de que apenas uma centena de homens governa como se fossem os únicos seres humanos, divide a espécie humana em “rebanhos de gado”, dos quais o governante cuida para devorá-los. “A força constituiu os primeiros escravos, a covardia os perpetuou” (Ibidem).

No ideal de democracia de Rousseau, homem nenhum possui autoridade natural sobre seu semelhante: o medo, a força, a loucura, não produzem o direito. Assim entendeu que renunciar ao direito político é renunciar à própria liberdade: “é o mesmo que renunciar

à qualidade de homem, aos direitos de humanidade, inclusive aos seus deveres” (Idem, p. 17). Mas, para deliberar sobre o bem comum a vontade geral deve se distinguir da vontade de todos: a vontade geral olha para o interesse comum, enquanto a outra cuida do interesse privado, ou a soma de vontades particulares. Assim definiu uma regra básica de deliberação ainda útil: “tirai dessa mesma vontade as que em menor ou maior grau reciprocamente se destroem, e resta como soma das diferenças a vontade geral” (Idem, p. 41). No contrato social que Rousseau definiu, cada contratante condiciona sua liberdade ao bem da comunidade e procura proceder de acordo com as aspirações de todos - ou da maioria; o legislador deve buscar o “maior bem de todos”: a liberdade e a igualdade. Rousseau entendeu a dificuldade para a igualdade como graus de poder e riqueza desiguais: “(...) quanto ao poder, esteja acima de toda violência e não se exerça jamais senão em virtude da classe e das leis; e quanto à riqueza, que nenhum cidadão seja assaz opulento para poder comprar outro, e nem tão pobre para ser constrangido a vender-se”(Idem, p.73). No Estado soberano que ele prevê, as ordens podem ser consideradas como vontade geral apenas “enquanto o soberano, livre para a isso se opor, não o faz. Em semelhante caso, deve-se, do silêncio universal, presumir o consentimento do povo” (Idem, p. 37). Para Rousseau, a participação política é educativa na medida em que: as decisões são melhor acatadas se construídas de forma coletiva; a cooperação apenas dá-se em torno de interesses comuns, em geral mais abrangentes; os indivíduos são parte de uma coletividade; e, em especial, a vontade geral pode errar em sua busca do melhor, onde cabe a reavaliação de processos. Assim, pode-se dizer que o contrato social de Rousseau contava com a educação, a racionalidade fundamental e a boa vontade dos homens para obter o equilíbrio e manter o interesse social sobre o interesse individual. A escolha pela liberdade, vinculada à condição de consciência e informação dos cidadãos comprometidos com a vontade geral e sua soberania, seria a garantia de evitar o excesso de riqueza ou pobreza. Assim, acreditava, a tirania só prosperava onde as condições democráticas não se cumpriam (CARNOY, 1988:36).

Porém Smith (1723-1790), contemporâneo de Rousseau alavancou a teoria clássica liberal de Locke sobre as elites nas relações sociais com a "mão invisível" do capital na

sociedade36. Smith defendeu que as paixões humanas, submetidas a impulsos irresistíveis de

ganho material, eram não só desejáveis mas resultara em benefício para o maior número de pessoas. Seu axioma fundamental afirmou que "cada indivíduo agindo em seu próprio interesse (econômico), quando colocado junto a uma coletividade de indivíduos, maximizaria o bem-estar coletivo" (SMITH, 1988:37 apud Carnoy (1988). A "mão invisível" justificaria um paradoxo da época: Mandeville, setenta anos antes, teria prenunciado os riscos do desemprego e da insuficiência de consumidores associada às paixões humanas, ou seja, à tendência da produção industrial entrar em colapso por falta de consumidores.

Smith defendeu que o resultado geral de prosperidade e bem-estar da sociedade justificava a paixão pela aquisição não como avareza nem imoral. Assim, "considerou a configuração dos sentimentos humanos de tal forma que a sociedade poderia existir sem a intervenção direta da vontade geral" (CARNOY, 1988:40 – grifo do mesmo). Esse ideal veio a construir a base de discussão para o pensamento utilitarista, essência da doutrina liberal capitalista no século XIX, já no ambiente social do conflito de classes, na resistência dos artesãos ao sistema fabril e reivindicações dos trabalhadores. Em especial na Inglaterra, eles reclamavam por direitos políticos (votar e ser votado), então limitados aos proprietários.

No que defendeu a autonomia dos indivíduos como base para a prosperidade dos negócios, Smith provocou o desenvolvimento, no quadro político, da representação dos interesses. Defendida pelos ingleses Jeremy Bentham (1748-1832) e James Mill (1773-1836), a escolha realizada através do voto foi vista como o exercício de alguma forma de controle dos cidadãos sobre seus representantes; tinha-se em mente a proteção dos interesses privados. Ainda que se tratasse de uma cidadania limitada a proprietários, James Mill destacou a necessidade da educação do eleitorado para o voto responsável.

A questão passou a ser como o Estado liberal deveria se comportar em uma sociedade atingida pelo conflito de classes – trabalhadores e burgueses. O Estado passou a ser questionado em suas funções e prevaleceu o princípio utilitarista: o ordenamento de leis 36 A ideia da "mão invisível" do capital provocaria reviravoltas no debate sobre o papel do Estado nos países capitalistas avançados. Carnoy (1988) sugere que mesmo o pensamento de Marx incorporou a perspectiva de Smith (e Mandeville) na teoria materialista da contradição não intencional, a antítese contida entre as classes inerentemente antagônicas. Smith construiria ainda a base de discussão para o pensamento utilitarista, essência da doutrina liberal no século XIX, já no ambiente social de 'violência' entendida no que seria o conflito de classes, na resistência dos trabalhadores ao sistema fabril. Em especial na Inglaterra, eles reclamavam por direitos políticos (votar e ser votado), até então limitados aos proprietários.

civis e criminais seria capaz de estabelecer a ordem necessária; uma melhor distribuição de direitos e deveres resultaria na maior felicidade para o maior número de pessoas. "Essa finalidade mais geral das leis poderia, segundo J. Bentham, ser dividida em quatro finalidades subordinadas: favorecer a subsistência, produzir a abundância; favorecer a igualdade; e manter a segurança" (MACPHERSON, 1977:26-27 apud CARNOY, 1988:45).

“A democracia não era mais o instrumento de controle dos excessos econômicos visualizados por Rousseau; ao contrário, para Bentham e James Mill, a democracia era necessária somente para limitar os excessos inatos dos funcionários governamentais, dando aos cidadãos o poder para mudar tais funcionários através da vontade geral” (CARNOY, 1988:47).

Porém a ideia de soberania no domínio do povo permaneceu latente no seio da sociedade. Na visão de Held (1996), ela conduziu ao desejo de uma comunidade de iguais, não como igualdade de posses mas, como igualdade política de direito moral. Porque os burgueses defenderam que os direitos são faculdades ou capacidades inerentes ao ser humano, a reivindicação fundamental passou a ser a igualdade no uso da liberdade; a ideia da liberdade passou a demandar a igualdade de oportunidades pessoais no plano econômico e social para realizá-la.

Ou seja, o mesmo princípio da soberania na sociedade do conflito de classes reclamou a atenção para as condições da igualdade produtiva; as pessoas deveriam possuir a quantidade mínima de recursos exigida ao exercício de seus direitos, na forma de renda garantida a todos os adultos, independente de envolvimento com o trabalho assalariado ou doméstico (HELD, 1996). “Sem um mínimo de recursos, (as pessoas) permaneceriam altamente vulneráveis e dependentes de outras, incapazes de exercer plenamente uma escolha independente ou de se dedicar a diferentes oportunidades colocadas formalmente diante delas” (1996:265).

As pressões sociais do século XVIII responderiam por duas reformas eleitorais na Inglaterra e pelo sufrágio universal na França. Nesse contexto, o Estado liberal, que deveria resguardar a autonomia privada no âmbito das trocas de mercadorias e do trabalho social, assumiu funções de intervenção no privado, ao tornar obrigatório o ensino e o serviço

militar. Habermas (2003) associa essas funções acrescidas ao Estado com a origem dos direitos sociais e do que veio a abalar as barreiras com a sociedade:

“Por um lado, a concentração de poder da esfera privada do intercâmbio de mercadorias e, por outro, a esfera pública estabelecida, com a institucionalizada promessa de acesso a todos, reforçam uma tendência dos economicamente mais fracos contrapor-se, agora com meios políticos, a quem seja superior graças a posições de mercado” (HABERMAS, 2003: 173).

A permissão formal de participação política levou as camadas pobres e as classes ameaçadas de pauperização (ex. dos artesãos, devido a produção mecanizada) a conquistar influências para alcançar a igualdade de oportunidades vinculada ao setor econômico; os sindicatos passaram a organizar partidos socialistas com pretensões de influir na legislação; os empresários - "forças conservadoras" do Estado - se posicionaram contra, convertendo sua força social privada em força política. "A lei anti-socialista de Bismarck37 é um caso

exemplar; mas o seguro social que ele organiza à mesma época também mostra em que medida a intromissão do Estado na esfera privada precisa ceder às pressões vindas de baixo" (HABERMAS, 2003:174).

3.2 SOCIALDEMOCRACIA E CLASSE OPERÁRIA

Tem-se, portanto, que o reconhecimento dos direitos políticos aos burgueses incorreu em novas relações entre as forças produtivas - capital e trabalho - abrindo espaço a discursos divergentes sobre o Estado e a soberania do povo, que provocou a emergência da

37 A lei antissocialista do Bismarck, aprovada em 1848, proibia o funcionamento dos partidos socialdemocrata,

socialista e comunista, cada vez mais fortes na Alemanha. Um atentado ao imperador Guilherme I e uma confissão forçada de autoria do atentado como sendo um socialdemocrata teria convencido o Parlamento a aprovar a lei, proibindo inclusive a imprensa socialdemocrata de circulação. A medida teria fortalecido a socialdemocracia entre os trabalhadores (DW Akademie, Calendário Histórico. Disponível em http://www.dw.de/1878-a-lei-antissocialista-de-bismarck/a-313816-1, acessado em 11/05/2013. Ao mesmo tempo Bismarck teria aprovado uma lei de acidente do trabalho, seguro doença e reconhecido a função dos sindicatos.