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5 ANÁLISE CRÍTICA DOS PROGRAMAS SOCIAIS DA DEFESA E

5.2 O MAPA HISTÓRICO DAS FONTES COMO SUBSTRATO EMPÍRICO PARA A

5.2.1 Os antecedentes do governo Fernando Henrique Cardoso

Iniciando o governo Fernando Henrique Cardoso, como mostramos no capítulo 03, presenciamos um ambiente de mudanças institucionais. Dentre elas relembramos a criação da Comissão de Relações Exteriores e Defesa no conselho de Governo e o lançamento do Documento para uma Política de Defesa Nacional. Em 1999 a Constituição sofreu emendas para comportar o Ministério da Defesa e uma série de outras mudanças institucionais, como extinção de ministérios e redesenho administrativo, com o aprofundamento da descrição da cadeia de comando sobre as Forças Armadas.

De acordo com o que acompanhamos do quadro retomado acima, identificamos um quadro de refinamento institucional e reforço das funções democráticas na política de defesa. Foram dignas de nota, no Documento para uma Política de Defesa Nacional, que as ações subsidiárias não-coercitivas ali descritas estavam mais centradas e definidas em torno da defesa civil. Não havia referências até então sobre alguma ligação direta entre elas e questões sociais ou o desenvolvimento nacional.

É também característico do governo Cardoso o movimento de se privilegiar mais a Amazônia como o foco estratégico da política de defesa brasileira. Essa mudança, como vimos, foi mais marcante do período mais tardio do mandato deste presidente e foi materializada posteriormente.

Houve, também neste período, ocorrência de participação das Forças Armadas em segurança pública, cujo exemplo mais marcante foi a Operação Rio. A ação militar, que nos dispositivos constitucionais deveriam ocorrer em caráter excepcional e de emergência, deixaram de ser episódicas e passaram a figurar como programas de governo.

5.2.2 As linhas gerais do governo Lula da Silva e inserção do “tema social” na política de defesa brasileira

Na revisão que fizemos do governo Lula da Silva, vimos que seu programa de eleição tinha viés desenvolvimentista, com promessas de aumento de gastos em defesa. O cenário inicial de governo, no entanto teve escassez de divisas, um elemento já presente no governo Cardoso. Além disso, nesse momento também houve a declaração de que as Forças Armadas

atuariam no combate à fome e seriam um vetor de profissionalização de jovens, não necessariamente para a profissão militar.

Outro elemento de continuidade entre o governo Lula da Silva em relação ao anterior foi a atenção à Amazônia. Aquilo que havia começado a se desenhar tomou corpo no primeiro mandato do presidente eleito do Partido dos Trabalhadores, se aprofundando até o final de seu segundo mandato. O elemento desenvolvimentista e de apoio social foi a novidade nesta área, que passou a correr em paralelo com o viés estratégico e de gerenciamento das fronteiras da região.

Uma iniciativa importante para a defesa brasileira, característica do governo Lula da Silva foi a ligação entre a defesa e a integração regional. A integração da América do Sul, antes centrada no Mercosul e nas atividades econômicas, com ênfase nas questões comerciais, passou a empreender a integração de infraestruturas, tanto de uso civil quanto de uso militar. Além disso, é do período Lula da Silva, especialmente a partir de 2007, a construção do Conselho de Defesa Sul-Americano.

A participação brasileira no comando da Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti foi um marco característico do governo Lula da Silva. Dentre outras questões que são secundárias a nosso recorte, ressaltamos que o envolvimento das Forças Armadas brasileiras na missão teve a ver com a projeção da defesa brasileira internacionalmente, o aumento do prestígio da instituição militar em âmbito nacional e a retomada de seu aparelhamento material.

Oito anos de governo, no entanto, não poderiam ser tão homogêneos em termos de realizações ou mudanças. Por isso é importante ressaltar que houve um elemento interessante de análise que aproveitamos para entender o período: as mudanças de mandato do Ministério da Defesa. O primeiro deles, José Viegas, teve como questões marcantes a elaboração da Política de Defesa Nacional, a criação de um batalhão do exército específico para o treinamento para ações de Garantia da Lei e da Ordem e o envolvimento do Brasil como chefe de missão militar das Nações Unidas. Mais marcante ainda foi sua renúncia como parte de uma crise na cadeia de comando militar brasileiro.

O período de José Alencar, então vice-presidente, além de ser uma estratégia de superar provisoriamente a crise de autonomia militar, foi marcante por conta do lançamento e da oficialização da Política de Defesa Nacional, do relançamento do Programa Calha Norte (um dos posteriormente chamados Programas Sociais da Defesa) e da Sistemática de Planejamento Estratégico Militar (SISPEM).

O período Waldir Pires foi marcado pela crise da aviação civil brasileira dada por dois grandes acidentes aéreos civis, que redundou em nova crise de autonomia militar que custaria o mandato do ministro.

A gestão de Nelson Jobim no Ministério da Defesa significou um divisor de águas para a área, pois as crises da pasta motivaram maior orçamento para si. A escolha do ministro também foi vista como um contorno à autonomia castrense. Deste período foram marcantes a criação do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas, a continuação da ação em segurança pública das Forças Armadas, a Estratégia Nacional de Defesa, a intensificação de movimentos na indústria de defesa, o reforço da integração econômica e de defesa da América do Sul, as compras de materiais bélicos pra todas as forças, o aumento em 47% de salários (com ênfase em patentes inferiores), a diplomacia presidencial e ministerial para a construção de satélites e compras de materiais de defesa em nível extra regional.

Ressaltamos que em 2007 houve forte incentivo financeiro ao recentemente relançado Programa Calha Norte, e que em 2008, as previsões da Estratégia Nacional de Defesa sobre o deslocamento de efetivos para a Amazônia se concretizam. Além disso, Jobim fez diversas declarações públicas defendendo o emprego das Forças Armadas para além da missão militar. Afirmou ele que sua atuação como polícia geraria sensação de segurança e que a missão no Haiti servia como laboratório para seu emprego em território nacional. Sua perspectiva foi acompanhada por outros ministérios do governo, como o das Cidades, de Minas e Energia e Meio-Ambiente, que requisitaram as Forças Armadas como forças de segurança em diversas ocasiões. Foi marcante ainda no período o acréscimo do orçamento de defesa brasileiro, que foi de 40% entre 2005 e 2010, de acordo com o SIPRI, o Instituto de Pesquisa para a Paz de Estocolmo.

5.2.3 O governo Dilma Rousseff e a maturidade da inserção dos programas sociais na política de defesa

Considerando as fontes reunidas sobre a defesa durante o governo Dilma Rousseff, percebemos alguns elementos da continuidade defendida por autores citados na seção anterior deste capítulo. Diversos investimentos em materiais e estruturas de defesa foram concluídos, remodelados ou seguiram projetos do governo anterior. O lançamento do Livro Branco da

Defesa, em 2012, é a realização de mais alto nível em planejamento e política de defesa do governo Rousseff e dá especial atenção aos programas sociais.

Voltando-nos a uma leitura dirigida a nosso objeto de interesse, considerando primeiramente a ação das Forças Armadas para além da defesa externa, figuraram ações contra a dengue e segurança patrimonial do Programa de Aceleração do Crescimento. Além disso, as Forças Armadas atuaram como polícia em conflitos fundiários, inclusive investigando crimes, apoiaram a implantação de Unidades da Polícia Pacificadora no Rio de Janeiro e monitoraram greves de policiais na Bahia e no Maranhão. Atuaram elas ainda em garantia à integração nacional, transportando insumos para a alimentação do gado e garantir preço da carne e fizeram a segurança de urnas em eleições. A realização de grandes eventos, como a Copa do Mundo FIFA e a visita do mandatário do Vaticano e Papa da Igreja Católica motivaram ações de inteligência e policiamento extensivo pelas Forças Armadas.

Antes de procedermos à análise completa das ações políticas dos governos Lula da Silva e Dilma Rousseff, resta-nos expor uma descrição mais detalhada dos documentos base da defesa no período 2003-2014, com foco especial para os Programas Sociais da Defesa. Justifica-se isso especialmente por conta de seu caráter de mudança e de construção institucional da defesa, não apenas porque modifica muitas coisas em seu interior, mas porque explicita e detalha ainda aquilo que não foi mudado. Permite-se aí que nosso estudo entenda governo e política de defesa como atores políticos a partir das características das políticas implementadas, sejam elas mais abrangentes, localizadas, materiais, discursivas ou simbólicas.

5.2.4 Documentos base da defesa, dos Programas Sociais da Defesa e seu contexto