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Conforme Aguiar (2008), a tributação extrafiscal, ou seja, aquela tributação que tem a finalidade de influenciar os comportamentos dos agentes econômicos de acordo com os interesses do Estado, está relacionada com os incentivos fiscais.

O autor define os incentivos fiscais como “[...] instrumentos manejados pelo legislador para, por meio da tributação, alcançar outros fins que não os meramente arrecadatórios, configuram o fenômeno conhecido como extrafiscalidade.” (AGUIAR, 2008, p. 140).

Para Tavares (2006) o incentivo é que se denomina como implemento de alguma atividade no plano econômico, implemento esse de concessão estatal. Afirma o autor, que a atividade econômica a que se refere é aquela exercida pela iniciativa privada, mas incentivada através de benefícios ou vantagens concedidas pelo Estado.

“Por isso, o incentivo não pode redundar em impedimento para outras atividades ou para determinado grupo de agentes econômicos. O benefício de uns não pode provocar a derrocada de outros.” (TAVARES, 2006, p.313).

A CRFB/1988 trata de normatizar tal instrumento no art. 155, conforme segue:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

XII – cabe à lei complementar:

g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. (BRASIL, 1988)

Ressalta-se a importância da existência de uma lei complementar capaz de regular o tema entre os Estados e o Distrito Federal. O legislador constituinte observou, nesse sentido, o objetivo da lei complementar conforme segue:

Art. 146. Cabe à lei complementar:

I – dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;

III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;

c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.

d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239.

Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d, também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, observado que:

I – será opcional para o contribuinte;

II – poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado;

III – o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento;

IV – a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes. Art. 146-A. Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo. (BRASIL, 1988)

Nesse sentido, como é obrigatório o exercício competência tributária do ICMS nos termos do art. 11 da Lei Complementar 101/200020, a omissão do legislador sobre esse tributo se caracterizaria como benefício fiscal.

Jorge (2012, p. 8) reforça essa característica do ICMS quando compara com o poder de tributar. No entendimento do autor no exercício da competência tributária a doutrina afirma que “o poder de exonerar corresponderia a uma derivação do poder de tributar”, pois essa exoneração precisa ser orientada até o limite da competência.

Desse modo, nada impede que a competência desonerativa encontre limitações diversas daquelas aplicáveis à competência tributária. No entanto, face à rigidez do nosso sistema constitucional tributário, tais restrições devem defluir da própria Constituição, seja implícita ou explicitamente. Do contrário, a competência tributária e a competência exonerativa se sujeitarão ao mesmo regime jurídico, sendo esta corolário lógico daquela. (JORGE, 2012, p. 8-9).

Assim, o ICMS sendo um imposto não-cumulativo, onde as consequências irão se manifestar por todo território nacional, exige uniformização para evitar conflitos de legislações estaduais.

Sem essa uniformidade de tratamento, questões como a não- cumulatividade do imposto, a sua incidência em operações/prestações interestaduais, as alíquotas e a concessão de incentivos fiscais ficariam ao bel-prazer de cada Estado-membro, o que decerto ocasionaria guerras fiscais permanentes e, consequentemente, comprometeria a própria unidade da federação. (JORGE, 2012, p. 9).

20Art. 11. Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão

e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação. (BRASIL, 2000).

Por outro lado, observa-se que a competência para concessão de benefícios fiscais ainda pode ser realizada, mas de forma conjunta entre os entes conforme dispõe a Lei complementar nº 24/197521 “a qual prevê a figura dos convênios como instrumentos de exteriorização formal do prévio consenso institucional entre as unidades federadas, no tocante à concessão e revogação de benefícios relativos ao ICMS” (JORGE, 2012, p.10):

“Art. 1º - As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, segundo esta Lei.” (BRASIL, 1975).

O efeito prático das isenções em termos de ICMS é a redução da carga tributária concedido aos beneficiados do incentivo fiscais.

Entretanto, ressalta-se que além de incentivos fiscais, existem outras espécies de benefícios e, nesse segundo grupo, estão os benefícios financeiros, tais como aqueles que permitem a participação societária estatal, a doação de imóveis, o fornecimento de infraestrutura, a concessão de financiamentos de longo prazo.

Além disso, deve-se obervar que a extrafiscalidade pode ser utilizada como ferramenta para inibir práticas da empresa privada.

[...] Assim, estar-se-á diante de uma tributação com função extrafiscal quando a tributação servir de mecanismo de efetivação de políticas públicas governamentais, seja para estimular ou mesmo para desestimular condutas dos particulares. (AGUIAR, 2008, p.140).

Já para Harada (2011), o incentivo fiscal deriva da Ciência das Finanças, pois está no âmbito da extrafiscalidade e “implica redução da receita pública de natureza compulsória ou a supressão de sua exigibilidade”.

O autor lembra que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – Lei Complementar nº 101, de 2000 – traz várias espécies de incentivos ou benefícios de natureza tributária, mas traz a ressalva que:

21A autorização para o exercício conjunto da deliberação, ou seja, a celebração de convênios

interestaduais precisa passar, primeiramente, pela aprovação unânime pelos representantes de todos os Estados e, depois, pela ratificação, que é o decreto executivo. Observa-se nesse último momento a possibilidade da ratificação tácita que, nessa situação, é a falta de manifestação do chefe do executivo estadual. Tal regramento está previsto no art. 4º da Lei Complementar 24 de 1975.

[...] o incentivo fiscal não se confunde com a isenção tributária, mesmo na hipótese que implique total exoneração do tributo. É que a isenção tributária não é um instrumento de intervenção na economia tal como o incentivo fiscal (SUDENE, SUDAM, SUFRAMA, FLORESTAMENTO, REFLORESTAMENTO etc.). [...] É um instrumento do dirigismo econômico; visa desenvolver economicamente determinada região ou certo setor de atividade”. (HARADA, 2011).

Dessa forma, para o autor, a finalidade da isenção fiscal não é o incremento da atividade econômica ou desenvolvimento de determinada região do país, que são finalidades do incentivo fiscal:

A motivação da isenção, pode-se dizer, é semelhante a da imunidade pela qual a Constituição retira o poder tributário em relação a certos bens, serviços ou pessoas. Só que, enquanto a imunidade atua no campo da definição de competência, a isenção atua no campo do exercício da competência tributária. (HARADA, 2011).

A LRF tem o objetivo de reduzir o déficit público e buscar a estabilização da dívida pública consoante o art. 1º:

Art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição.

§ 1o A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar. (BRASIL, 2000)

E, sobre os incentivos de natureza tributária, a LRF impõe limites e condiciona a concessão ou mesmo a ampliação de determinado incentivo fiscal que possa vir a impactar em renúncia de receita pública:

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de

natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no

exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:

I – demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

II – estar acompanhada de medidas de compensação, no período

elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 1º A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

§ 2º Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.

§ 3º O disposto neste artigo não se aplica:

I – às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do art. 153 da Constituição, na forma do seu § 1º;

II – ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança. (BRASIL, 2000, grifo nosso).

Nesse sentido, para a renúncia de receita tributária é necessário que o interesse público seja atendido. Harada (2011) explica que, por exemplo, os incentivos fiscais descritos no art. 151, I, da CRFB/1988, que visam promover o equilíbrio social e econômico entre as diversas regiões do país têm o objetivo de atender o bem comum. E lembra que “Esse princípio tem aplicação nos âmbitos estadual e municipal, por força do princípio da simetria. O que não se admite são as ‘guerras tributárias’, infelizmente, arraigadas na cultura dos governantes e que acabam agravando os desníveis regionais.” (HARADA, 2011).

Já o § 3º do mesmo dispositivo legal, retira do campo de incidência da concessão de benefícios tributários os impostos federais de natureza regulatória, os extrafiscais, quais sejam o imposto de importação, o imposto de exportação o imposto sobre produtos industrializados e o imposto sobre operações de crédito, câmbio, seguro e sobre operações relativas a títulos e valores mobiliários.

Entre as diversas espécies de benefícios fiscais, as isenções, a anistia, a remissão, os diferimentos, as reduções da base de cálculo, as reduções de alíquota e o crédito presumido têm maior relevância para esse trabalho acadêmico.

Assim, a isenção fiscal é dispensa legalmente constituída do pagamento de um tributo.

Após descrever o fato gerador da obrigação tributária, hipótese legal de incidência do tributo, o legislador retira desse campo de incidência certos fatos ou atos que passam a ser insuscetíveis de tributação. A hipótese de isenção implica modificação do aspecto nuclear do fato gerador da obrigação tributária, ou seja, da norma legal que define a hipótese tributária. (HARADA 2011).

Há uma observação doutrinária quanto à isenção. De um lado a doutrina clássica, e aí incluído o posicionamento também do Código Tributário Nacional (CTN), que conceitua a isenção como dispensa do pagamento tributo nos termos do Capítulo V, pois incluiu tanto a isenção, como anistia nas hipóteses de exclusão do crédito tributário. De outro lado, segundo Harada (2011), uma visão da doutrina moderna sobre esse benefício fiscal, onde:

[...] não seria possível pressupor prévia incidência de norma jurídica de tributação para, ao depois, incidir a norma jurídica de isenção. Dessa forma, ela se confundiria com a não-incidência expressamente prevista em lei, para alterar parcialmente o conteúdo da hipótese de tributação. Quando a não- incidência estiver prevista na Constituição, deve entender-se como imunidade, segundo a doutrina e jurisprudência unânime. (HARADA, 2011). A anistia, elencada no art. 180 a 182 do CTN abrange somente as infrações cometidas antes da vigência da norma que a concedeu. Carvalho (2010, p. 37) define a anistia fiscal como “perdão de falta cometida pelo infrator de deveres tributários e também quer dizer o perdão da penalidade a ele imposta por ter infringido mandamento legal”.

Para esse autor, há duas acepções de anistia fiscal. A primeira é a do perdão pelo ilícito, a segunda a do perdão da multa. Além disso, apresenta o caráter retroativo, “pois alcança fatos que se compuseram antes do termo inicial da lei que a introduz no ordenamento”. (CARVALHO, 2010, p. 337).

Muito semelhante à anistia fiscal, está o instituto da remissão, prevista no art. 172, do CTN, que é o perdão do crédito tributário, ou seja,

[...] ao remir, o legislador tributário perdoa o débito tributário, abrindo mão do seu direito subjetivo de percebê-lo; ao anistiar, todavia, a desculpa recai sobre o ato da infração ou sobre a penalidade que lhe foi aplicada. Ambas retroagem, operando em relação jurídica já constituída, porém de índole diversa: a remissão, em vínculo obrigacional de natureza estritamente tributária; a anistia, igualmente em liames de obrigação, mas de cunho sancionatório. (CARVALHO, 2010, p. 337).

Quanto à redução da base de cálculo, com previsão legal no art. 97, II, do CTN, refere-se ao aspecto quantitativo do fato gerador da obrigação tributária.

Assim, uma mercadoria com valor de R$ 1.000,00 e que tem alíquota de 17%, onde a legislação conceda um benefício fiscal de modo que a carga tributária seja reduzida 12%, terá uma redução na sua base de cálculo em 29,41%. Desse

modo, o ICMS que seria inicialmente de R$ 170,00, passa ao valor de R$ 120,00. Esse valor é encontrado sobre uma base reduzida de 29,41%, que passa de R$ 1.000,00 para R$ 705,90 e, sobre esse valor, calculado o ICMS de 17%.

Sobre as espécies de benefícios fiscais definidas como diferimentos, reduções de alíquota e o crédito presumido serão estudadas no próximo capítulo, realizando, assim, comparação com a legislação catarinense do ICMS e seu instituto de incentivo fiscal.