• Nenhum resultado encontrado

Os locais de coleta

No documento Letramento em comunidade de surdos (páginas 59-63)

CAPÍTULO 3 – Aspectos metodológicos da pesquisa

3.2 Os locais de coleta

Através de conversas e entrevistas em encontros formais e informais, surdos adultos e adolescentes e seus familiares relataram suas rotinas: atividades de lazer, de trabalho, vida escolar, relações afetivas, comunicação diária dentro e fora de suas casas, dificuldades típicas de usuários de uma língua minoritária, opiniões e sugestões. Tudo isso foi detalhadamente narrado e explicado ao longo de um ano de investigação, buscando sempre enfatizar os significados e usos da escrita em situações variadas. Os participantes das entrevistas e das conversas informais foram criteriosamente escolhidos para que pudessem representar diferentes faixas etárias, níveis educacionais e profissões. Esta diversidade tornou possível a visão de um cenário mais abrangente da vida social da comunidade, incluindo uma variedade de contextos familiares e culturais.

3.2.2 As organizações de apoio social ao surdo

As organizações sociais (voltadas aos interesses de surdos) de referência da cidade foram contatadas e seus funcionários convidados a participar do presente estudo. Após alguns contatos iniciais, foram identificadas as pessoas que mais poderiam ajudar, ora por manter contato mais íntimo com surdos, ora por conhecer mais detalhadamente o funcionamento das organizações das quais faziam parte. Na maioria das vezes, as pessoas aceitavam, sem objeções, participar do estudo, oferecendo informações importantes sobre o comportamento social dos membros da comunidade e indicando nomes representativos a serem contatados pela

pesquisadora. Muitos deles também aceitaram ser submetidos a entrevistas gravadas. As organizações visitadas foram: Federação Nacional de Educação e Integração do Surdo (FENEIS), Associação de Surdos de Pernambuco (ASSPE) e o Núcleo Integrado de Apoio Multidisciplinar ao Surdo (NIAMS).

A Federação Nacional de Educação e Integração do Surdo (FENEIS) é uma instituição nacional com filiais em diversos estados brasileiros (Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo, Amazonas, Ceará, Minas Gerais, Goiás e Paraná). Tem como finalidade assistir surdos, familiares e profissionais afins no sentido de divulgar informações importantes sobre a comunidade, promover cursos, discutir legislações, incentivar pesquisas e projetos educacionais, estudar e divulgar o mercado de trabalho para surdos, e, principalmente, servir como espaço de interação da comunidade surda.

A FENEIS como entidade filantrópica, de cunho civil e sem fins lucrativos, trabalha para representar as pessoas surdas, tendo caráter educacional, assistencial e sociocultural. Uma das suas principais bandeiras é o reconhecimento da cultura surda perante a sociedade. São atendidos pela Feneis além de surdos, familiares, instituições, organizações governamentais e não governamentais, professores, fonoaudiólogos e profissionais da área. Atualmente, possui 136 entidades filiadas, 7 Escritórios Regionais, além da matriz, e uma representação em Teófilo Otoni/MG. É filiada à Federação Mundial dos Surdos (FMS/WFD), que tem sede e administração na Finlândia. Essa entidade representa os surdos em organizações mundiais como a ONU, UNESCO, OEA, OIT, sempre trabalhando no sentido de garantir os direitos culturais, sociais e lingüísticos da comunidade surda mundial. A participação da Feneis numa entidade como essa propicia o constante intercâmbio com surdos do mundo todo, conhecendo a luta de cada um e formando uma rede em prol do direito universal à cidadania (FENEIS, 2006).

A Feneis-PE foi fundada no dia 13 de abril de 2002, localiza-se na Av. Guararapes, 178, sala 320, no bairro de Santo Antônio, e atualmente oferece os seguintes serviços: inserção do surdo no mercado de trabalho, cursos de LIBRAS, cursos de instrutor de LIBRAS, cursos de intérpretes, projetos de comunicação e conscientização, setor de pesquisa.

A Feneis-PE está aberta a receber familiares, estudantes e pesquisadores , para mostrar o trabalho realizado e auxiliar no que for necessário. Está aberta também a esclarecer às empresas interessadas, a qualitativa mão de obra desenvolvida pelas pessoas Surdas (FENEIS-PE, 2006).

Outra associação visitada foi a Associação de Surdos de Pernambuco (ASSPE). Fundada em 17 de outubro de 1985, a ASSPE objetiva promover a sociabilização dos surdos em Pernambuco, através da promoção de eventos de lazer (festas em datas comemorativas, encontros semanais, esportes) além de palestras sobre assuntos importantes para a comunidade. É dirigida por surdos.

O objetivo da ASSPE é oferecer aos surdos a oportunidade de freqüentar um grupo onde todos falam a mesma língua; fazer o surdo se conscientizar de que não é o único portador de deficiência; informar respeito de leis, eventos e acontecimentos que interessam aos surdos. Enfim, congregar, reunir os surdos (ASSPE, 2006).

O NIAMS é uma empresa privada constituída por profissionais qualificados e habilitados em LIBRAS que oferece serviços de apoio à integração social do surdo no âmbito educacional e na saúde. Funciona há menos de um ano e está situada no centro da cidade de Recife. Alguns serviços que o NIAMS oferece: cursos de LIBRAS, apoio fonoaudiológico e psicológico (NIAMS, 2006). É uma instituição nova, porém de referência na comunidade.

3.2.3 Instituições educacionais

Foram contatados para participar do estudo alunos e profissionais de oito (08) escolas públicas e duas (02) privadas de ensino infantil, fundamental, médio que apresentam surdos usuários de LIBRAS em seu quadro discente. Com relação ao ensino superior, foram visitadas cinco (05) instituições. A única instituição que oferece um modelo de educação inclusiva ao surdo, ou seja, a presença de intérpretes contratados pela própria faculdade em todas as salas de aula freqüentadas por surdos, será descrita com destaque por seu trabalho pioneiro e inovador. As demais instituições de ensino superior da cidade, apesar de contarem com alunos surdos usuários de LIBRAS, não oferecem a acessibilidade ao ensino necessária a esses jovens. Fica por responsabilidade do aluno, contratar seu próprio intérprete.

Educadores de surdos constituíram, para esta pesquisa, uma fonte rica de informações. Diversas conversas foram realizadas ao longo de meses, algumas informais e outras vídeo-gravadas, caracterizando uma entrevista. Professores de surdos em diversos níveis de escolarização contribuíram com informações a respeito do uso da escrita em contexto escolar e fora dele, assim como comentários a

respeito de práticas sociais e familiares. Por manter contato direto com famílias de surdos, esses profissionais conhecem dinâmicas familiares peculiares e interessantes, e ao se explorar essas dinâmicas, pode-se ter uma maior compreensão sobre traços culturais desta população. Além dos professores, diretores, alunos surdos e alunos ouvintes (colegas de classe dos surdos) também foram escutados. Os diretores contribuíram mostrando detalhes de como uma escola com crianças surdas funciona.

A maioria das escolas visitadas recebe surdos e ouvintes. Apenas uma das escolas visitadas é designada especificamente para surdos, não contendo ouvintes integrados. Os alunos surdos e ouvintes foram importantes por relatar vivências de sala de aula vistas por um diferente ângulo (quando comparado ao do professor). Em todas as conversas e entrevistas, buscava-se compreender o mundo desses indivíduos, suas ações sociais, seus comportamentos, sua comunicação com outros surdos ou com ouvintes, e, especificamente, o uso e a função atribuída à escrita nas mais diversas situações. Para que se possa compreender melhor o cenário da coleta de dados, detalhes sobre o funcionamento das instituições educacionais serão apresentados juntamente com os resultados encontrados em cada um delas.

3.2.4 Instituições religiosas

Uma igreja da religião católica (Matriz de São Sebastião) e duas da religião batista (Igreja Batista da Capunga e Igreja Batista da Concórdia) também foram locais de coleta para esta pesquisa. A pesquisadora freqüentou, durante um ano, encontros em três igrejas do Recife que recebem grande quantidade de surdos e realizam um trabalho específico para esta população. Além dos encontros regulares dessas instituições (missas e cultos), também foi possível vivenciar outros tipos de eventos religiosos (sociais e educacionais) que aconteceram ao longo desse tempo, como por exemplo, encontros de confraternização, cursos de educação religiosa para surdos e um Congresso para Surdos e Familiares, promovido por uma das igrejas Batista, com a finalidade de discutir temas importantes atrelados à vida desta população. Os cursos são oferecidos todos os domingos e incorporam crianças e adultos surdos. Seus objetivos, procedimentos e dinâmicas educacionais serão devidamente explicados no capitulo seguinte, juntamente com as informações coletadas. Quanto ao congresso, houve palestras de profissionais religiosos, intérpretes de LIBRAS, psicólogos, entre outros membros da comunidade surda.

Mais detalhes também serão descritos em conjunto com os dados encontrados nessa ocasião.

3.2.5 Internet

Salas de bate-papo, site de relacionamento (orkut) e e-mails transformaram- se em cenários apropriados para a observação do uso da escrita na vida dos surdos. Freqüentemente, esse tipo de comunicação (digital) era estabelecido entre a pesquisadora e os membros participantes deste estudo. Conversas informais, agendamentos, informações referentes à pesquisa e outros assuntos corriqueiros foram, ao longo do período da coleta, aumentando em quantidade e qualidade. Esse tipo de fonte de dados não havia sido planejado no início da pesquisa, no entanto, foi recebendo um espaço cada vez mais valioso durante o processo, chegando a se tornar fundamental para a compreensão de práticas de escrita de surdos. Nas salas de bate-papo (em tempo real) e no site de relacionamento (orkut), geralmente abordava-se assuntos corriqueiros sobre possíveis eventos a acontecer, ou eventos já vivenciados. Conversas pessoais facilitaram o acesso da pesquisadora ao mundo dos surdos e contribuíram para compreensão do papel deste gênero digital escrito na vida de seus usuários. E-mails foram utilizados para situações mais formais, geralmente agendamento de encontros ou informações menos pessoais.

No documento Letramento em comunidade de surdos (páginas 59-63)