• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 2 − ESCORÇO HISTÓRICO DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL E SEU IMPACTO

2.3 O NEGRO NO QUADRO CONTEMPORÂNEO

2.3.2 Os números da exclusão racial no Brasil

No particular, analisam-se os dados do relatório do PNUD 2005 sobre racismo, pobreza e violência, no Brasil, para melhor compreender a abissal desigualdade entre negros e brancos, e dentre estes, mulheres negras e brancas, desigualdade esta que pode ser imputada, em larga medida, às conseqüências dos fatos históricos precedentemente colacionados, associados a fatores outros, tais como políticas neoliberais, automação industrial e consectários.

O relatório revela que 64,1% dos pobres são negros, correspondendo, portanto, à maioria, e em relação aos indigentes constituem 70%.423 A renda per capita média dos negros em 2000 (R$ 162,75) correspondeu a menos da metade do que ganhavam os brancos em 1980 (R$ 341,71, em valores corrigidos), ou seja, vinte anos antes.424

O relatório aponta também que, ao longo das duas décadas que separam os dados, a diferença econômica entre os dois grupos se manteve praticamente inalterada.425

Dá conta, ainda, que quanto à divisão entre sexos, a composição fica ainda mais desequilibrada: os homens brancos respondiam por 50% da renda disponível, ao passo que as mulheres brancas por 24%. Já os homens negros, respondiam por apenas 18%, e as mulheres negras por somente 8%.426

A distorção decorrente dessas diferenças resulta ainda mais flagrante se forem confrontadas com outros dados. Isso porque, apesar de os negros

421

BRASIL. Retrato das Desigualdades: gênero e raça. Disponível em: < htttp://www.ipea.gov.br>. p. 04.

422

HENRIQUES. R. Desigualdade racial no Brasil. Texto para discussão n. 807, p. 05. 423

Programa das Nações Unidas para o desenvolvimento: racismo, pobreza e violência – Relatório de Desenvolvimento Humano – BRASIL, 2005, p. 62.

424 Ibid., p. 60. 425 Loc. cit. 426 Ibid., p. 64.

representarem 44,7% da população brasileira, no ano de 2005, sua participação chega a 70% entre os 10% mais pobres. Já entre os 10% mais ricos, eles não passam de 16%. Por conseguinte, representam 70% dos pobres e 16% entre os mais ricos.427

Dentre os 53 milhões de indivíduos que se encontram abaixo da linha da pobreza, cerca de 64,17%, são compostos por negros, isto significa, que, a cada dez pobres no Brasil, sete são negros.428

O mencionado relatório ainda aponta para a necessidade de se conjugarem, os fatores: desigualdades raciais e as desigualdades regionais. Assim, há mais pobres negros e brancos na região Nordeste, do que na região Sudeste.429

Nesse sentido ainda pode-se mencionar os estudos de Nelson do Valle e Silva, o qual revela que praticamente metade da população “parda”, encontra-se na região Nordeste (48%), em contrapartida a fração branca corresponde apenas 15,1% do total da população. De outra feita, as áreas do Sudeste e do Sul somam- se 64,9% da população branca e somente 22,4% da população parda.430

E conforme os dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD revelam, o índice de desenvolvimento humano de brancos residentes na região sudeste, é de 0,833, equivalente à 37ª. posição no ranking de países, aproximando-se de um IDH – M da Polônia. De outro lado, negros residentes na região Nordeste do Brasil, ostentam um IDH – M de 0,652, correspondente à 115ª. posição no ranking de países, equivalente à condições de desenvolvimento humano semelhante ao da Bolívia.431

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada divulgou em agosto de 2008 uma pesquisa segunda a qual revelou que três milhões de pessoas saíram da pobreza nas seis principais regiões metropolitanas do país (Recife, Salvador, São

427

Programa das Nações Unidas..., p. 60. 428

Loc. cit. 429

Ibid., p. 61. 430

O autor conclui que a divisão desigual, constitui um fator de explicação para a difícil mobilidade ascendente da população não branca, obstada pela concentração em lugares menos dinâmicos, nas áreas rurais em detrimento às cidades, e dentro das cidades, nos bairros mais periféricos. VALLE E SILVA, N. Uma nota sobre raça social no Brasil. Estudos Afro-Asiáticos, 26, 1994, p. 07.

431

Observa o relatório que “A desigualdade regional, porém, não é suficiente para explicar o fosso entre brancos e negros. Em 2000, não havia região ou estado brasileiro em que o índice da população negra fosse superior ao da branca — o mesmo valendo para cada uma das três dimensões do IDHM: longevidade, educação e renda. “Isso mostra que as diferenças regionais esclarecem apenas parcialmente as diferenças entre os indicadores nacionais de negros e brancos”. VALLE E SILVA, op. cit., p. 07.

Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte e Rio de Janeiro) no período entre os anos 2002 e 2008.

Em 2002 o país registrava 14,352 milhões de pobres, e em 2008, são 11, 356 milhões, sendo que a taxa de pobreza nesses locais que era de 32,9% caiu para 24,1%, durante esse período. A pesquisa aponta ainda que entre 2003 e este ano 4,1 milhões de pessoas tenham superado a linha da pobreza.

Apesar de em 2008, ter diminuído a desigualdade no país, a pobreza dos negros é mais que o dobro da branca, segundo resultados da pesquisa “Retrato das desigualdades de gênero e raça”, realizado pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher. A pobreza e a indigência negras são três vezes maiores que a pobreza e a indigência brancas.432

Assim conforme a pesquisa aponta, segundo as informações para 2006, 14,5% da população branca situava-se abaixo da linha de pobreza, enquanto mais do que o dobro, ou 33,2%, da população negra encontrava-se na mesma situação de vulnerabilidade. Em relação à indigência, a situação é tão ou mais grave, enquanto 4,5% dos brancos recebem menos de um quarto de salário mínimo per capita por mês, esse percentual eleva-se para 11,8% da população negra, quase três vezes mais na comparação com o grupo dos brancos.433

Não obstante, se possível perceber uma redução na proporção de pobres em todos os grupos da população brasileira Referida redução, se diferencia conforme analisa-se cor/raça dos indivíduos e região em que habitam. Com efeito, entre 2006 e 1996, a proporção de brancos pobres passou de 21,5% para 14,5%, registrando uma redução de 33%. Por outro lado, no caso da população negra, essa redução foi inferior, alcançando 29%.434

O estudo ainda revela que, em decorrência das desigualdades educacionais, da segregação dos negros em postos de trabalho de menor qualidade e do próprio fenômeno social da discriminação, os rendimentos dos brancos tendem a ser mais elevados do que o dos negros. Com efeito, em 2006, os homens recebiam, em

432

Considera-se pobre quem sobrevive com até meio salário mínimo per capita por dia e indigente, quem sobrevive com até um quarto do salário mínimo per capita por dia. Cf. BRASIL. Retrato das desigualdades de gênero de raça. 3. ed. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, o IPEA − Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher. Brasília, setembro de 2008.

433

Ibid., p. 14. 434

média, R$ 986,50 ao mês, enquanto, os negros recebiam cerca de metade do salário dos brancos, perfazendo R$ 502,00 em média por mês.435

As regiões brasileiras menos desenvolvidas concentram a maioria da população pobre ou em situação de extrema pobreza, bem como as zonas rurais. Por conseguinte, enquanto no Nordeste 44,3% dos negros são pobres, o Sul registra a proporção de 12,6%. Entre a população da zona urbana, a pobreza atinge 19% do total, enquanto nas áreas rurais, o número atinge a expressiva proporção de 47,6%. Frise-se que, nesses casos, o fator racial conjugado com o local de moradia, intensifica a desigualdade e a vulnerabilidade desse grupo social específico.436

Ademais se destaca que a desigualdade nos rendimentos existentes entre brancos e negros, evidencia-se quanto mais avança-se em direção aos grupos populacionais de maior renda. Assim, em 2006, entre os 10% mais pobres, os negros correspondiam 63,4%; sendo que esta proporção cai para 24,3% no grupo dos 10% mais ricos. De outra parte, no grupo de 1% mais rico da população, somente 14,1% são negros. Por conseguinte, ainda que se vislumbre uma pequena melhora na distribuição da riqueza produzida no Brasil ao analisar negros e brancos, a desigualdade ainda permanece.437

Nessa esteira também se apresenta os dados em relação à inserção da população negra e branca no mercado de trabalho brasileiro, segundo pesquisa empreendida pela Diretoria de Estudos Sociais (Disoc) do IPEA – Instituto de Pesquisa Aplicada – em 13 de maio de 2008.

Conforme tal estudo, os setores econômicos que ostentam as piores condições de trabalho no tocante a estabilidade, remuneração, proteção, dentre outras, são ocupados maciçamente pela parcela de mão-de-obra negra.

Assim, pode-se mencionar a agricultura – onde 60,3% dos ocupados são negros; a construção civil – 57,9%; os serviços domésticos – 59,1%. Em contrapartida, os postos com melhores condições de trabalho, em termos de estabilidade, remuneração, e demais benefícios, a parcela branca de mão-de-obra, representa 56,5% dos ocupados da indústria de transformação; 54,5% no comércio

435

BRASIL. Retrato das desigualdades, 2008, p. 13. 436

Ibid., p. 14-15. 437

e serviços não-financeiros, 62,5% nos serviços financeiros, 57,2% na administração pública, nos serviços sociais e de utilidade pública.438

Os negros também constituem maioria numérica no tocante às relações de trabalho mais precárias, representando 55% dos trabalhadores não-remunerados; 55,4% dos assalariados sem carteira; 59,1% dos trabalhadores domésticos. De outro lado, a população branca encontra-se sobre-representada nas posições mais estruturadas, constituindo 57,2% dos trabalhadores com carteira assinada e 71,7% dos empregadores.439

Ainda no que concerne às relações laborais, a parcela negra encontra-se principalmente em meio às ocupações classificadas como de nível baixo, àquelas ocupações em que se exigem pouca capacitação e que são caracterizadas notadamente pela subordinação dentro da instituição, representam 54,4% dos trabalhadores, bem como no tocante às ocupações militares – 51,1% são negros.440

De outra feita, a parcela branca tem maior representação nas posições mais estruturadas, ocupando 73,5% das posições de alto escalão, 72,3% dos cargos de nível superior, 60,3% dos cargos de nível médio e 62,1% das funções administrativas.441

Tendo em vista a disparidade em relação à inserção de negros e brancos no mercado de trabalho, o rendimento do grupo negro é bem inferior ao rendimento da parcela branca. Em média, os ocupados negros recebem R$ 578,24 por mês, valor que em relação ao rendimento médio dos brancos que é de R$ 1.087, 14 por mês, corresponde a apenas 53,2% do recebido pela parcela branca.442

Os ocupados negros correspondem a 60,4% dos trabalhadores que ganham até 1 (um) salário mínimo, e somente 21,7% dos que recebem mais de 10 salários mínimos. Por sua vez, entre os ocupados brancos, 39,0% percebem até 1 (um) salário mínimo e 76,2% dos que percebem mais de 10 salários mínimos.443

438

Cf. BRASIL. Estudo Desigualdades Raciais...,p. 13. 439 Ibid., p. 14. 440 Loc cit. 441 Ibid., p. 13. 442 Loc. cit. 443 Loc. cit.