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Os princípios da proporcionalidade e razoabilidade

5 O DIREITO À SAÚDE E SUA JUDICIALIZAÇÃO

5.2 EXIGÊNCIAS E LIMITES À INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO NAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE

5.2.5 Os princípios da proporcionalidade e razoabilidade

O princípio da razoabilidade prescreve a escolha da solução mais acertada para o caso jurídico concreto, observando-se as circunstâncias sociais, econômicas, culturais e políticas que envolvem a discussão, sem se afastar dos ditames legais.

O princípio da razoabilidade nada mais é do que uma diretriz de senso comum, ou mais especificamente, de bom-senso, que se aplica ao Direito.

A razoabilidade é medida pela utilização do princípio da proporcionalidade, sendo que este último é definido como a procura do justo equilíbrio entre os meios usados e os fins que se quer alcançar.

Há doutrina, porém, que entende que razoabilidade e proporcionalidade não são princípios, e sim postulados, que funcionam diferentemente dos princípios e das regras.

A uma, porque não se situam no mesmo nível, uma vez que os postulados funcionam como normas que orientam a aplicação de outras.

A duas, porque os destinatários são distintos: os princípios e as regras são originalmente dirigidos ao Estado e aos cidadãos, enquanto que os postulados são diretamente dirigidos ao intérprete e ao aplicador da Lei.

Por último, porque os postulados não se interagem da mesma maneira com outras normas, ou seja, orientam a aplicabilidade dos princípios e das regras sem o conflito necessário com outras disposições normativas.251

Ademais, concorda-se que a proporcionalidade é um princípio constitucional implícito, derivado da Constituição.

Analisando a terminologia da palavra proporcionalidade, vê-se que a mesma significa proporção, adequação, medida justa à necessidade que exige o caso jurídico.

251

Para Ávila, a razoabilidade “[...] é utilizada como diretriz que exige a relação das normas gerais com as individualidades do caso concreto, quer mostrando sob qual perspectiva a norma deve ser aplicada, quer indicando em quais hipóteses o caso individual, em virtude de suas especificidades, deixa de se enquadrar na norma geral[..].” Por outro lado, o postulado da proporcionalidade se aplica “apenas a situações em que há uma relação de causalidade entre dois elementos empiricamente discerníveis, um meio e um fim, de tal sorte que se possa proceder aos três exames fundamentais: o da adequação [...], o da necessidade [...] e o da proporcionalidade em sentido estrito. [...] Sem um meio, um fim concreto e uma relação de causalidade entre eles não há aplicabilidade do postulado da proporcionalidade em seu caráter trifásico. (ÁVILA, Humberto. Op. cit. p.122-162).

Tal princípio tem como objetivo evitar resultados desproporcionais e injustos, com base em valores fundamentais em conflito.

Com a intervenção do Poder Judiciário nas políticas públicas e utilizando-se dos critérios principiológicos da proporcionalidade e da razoabilidade252, o magistrado deve emitir pronunciamento no sentido de saber se o administrador público ou qualquer responsável pelo ato sub judice conduziu-se de conformidade com os interesses supremos do cidadão ou de toda a coletividade, fixados no texto constitucional e na legislação infraconstitucional.

Essa intervenção estatal só poderá ocorrer nos casos que ficar provada a irrazoabilidade do ato questionado.

Sobre o tema, Ingo Sarlet afirma que o princípio da proporcionalidade apresenta-se como um dos pilares do Estado democrático de direito brasileiro e “desponta como instrumento metódico de controle dos atos – tanto comissivos quanto omissivos – dos poderes públicos, sem prejuízo de sua eventual aplicação a atos de sujeitos privados.”253

Nenhum ato escapa a esse controle, seja público ou particular, obrigando o Judiciário a intervir, tanto preventiva quanto repressivamente.254

João Batista Lopes leciona que pelo princípio da proporcionalidade, o juiz deve proceder a uma avaliação dos interesses em conflito e dar respaldo àquele que, conforme a ordem jurídica, demonstrar maior relevância e expressão. Não é que deve sacrificar um dos direitos em prol de outros, mas de verificar o que é razoável à luz dos valores proclamados no sistema jurídico.255

252 A título de informação, Luís Roberto Barroso leciona que “O princípio da razoabilidade ou da

proporcionalidade, no Brasil, tal como desenvolvido por parte da doutrina e, também, pela jurisprudência, inclusive no Supremo Tribunal Federal, é o produto da conjugação de ideias vindas de dois sistemas diversos: I) da doutrina do devido processo legal substantivo do direito norte-americano, onde a matéria foi pioneiramente tratada; e II) do princípio da proporcionalidade do direito alemão.” (BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 255).

253 SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit. p. 396.

254 É por tal razão, afirma Sarlet, que a doutrina brasileira e também a jurisprudência, em alguns casos, aceitam a

ideia de que o princípio da proporcionalidade apresenta-se como uma dupla face, agindo simultaneamente como critério para o controle da legitimidade constitucional de medidas restritivas do campo de proteção de direitos fundamentais, e também controlando a omissão ou atuação estatal insuficiente, no que diz respeito ao cumprimento de seus deveres protetivos. (SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit. p. 397).

255

Conforme Celso Antonio Bandeira de Mello, a censura do juiz não pode implicar invasão do mérito do ato administrativo256, quando se discute atividade discricionária.

Destarte, o juiz não apenas pode, como deve, ao analisar um caso concreto, ver se a opção feita pelo administrador público obedeceu aos ditames da lei.

O princípio da proporcionalidade, em sentido amplo, comporta três elementos (subcritérios ou subprincípios constitutivos, como prefere Gomes Canotilho257): a) princípio da conformidade ou adequação dos meios, induzindo que a medida seja adequada ao fim; b) princípio da exigibilidade ou da necessidade ou princípio da necessidade ou da menor ingerência possível, com a ideia de optar pelo meio restritivo menos oneroso para o cidadão e com menor afetação aos direitos fundamentais; c) princípio da proporcionalidade em sentido restrito, resultando no equilíbrio ou justa medida entre os meios utilizados e os fins colimados, o que denota a razoabilidade ou justa medida. Meios e fim são objeto de equação através de um juízo de ponderação (procedimento de sopesamento ou hierarquização de bens jurídicos), para se avaliar se o meio usado é ou não desproporcionado em relação ao fim.

A verificação acerca da proporcionalidade de uma medida limitativa de direitos fundamentais deve perpassar pela exposição do cumprimento desses três elementos ou requisitos, sob pena de ser visto como desproporcional e, portanto, invalidada.

O princípio da proporcionalidade não se confunde com o princípio da razoabilidade, tendo sentido e conteúdo distintos. Vê-se comumente a utilização indistinta e equivocada desses termos.

Em muitos casos, por não ser utilizada a análise trifásica supra exigida pela proporcionalidade, percebe-se que a ponderação dos bens ocorre principalmente no plano da “mera” razoabilidade, que, apesar de relevante elo em comum (razoabilidade e proporcionalidade em sentido restrito), são categorias jurídicas diferentes.258

Nessa linha de pensamento, Raquel Denize Stumm acrescenta que o princípio da proporcionalidade tem índole de princípio jurídico geral fundamental, que no ordenamento pátrio, apesar de não estar expresso, tem condições de ser aplicado em decorrência de sua

256 BANDEIRA DE MELO, Celso Antonio. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2001. p.

777.

257 CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Op. cit. p. 264-265. 258

natureza e de possuir duas funções: uma negativa, quando restringe a atuação do poder estatal e uma positiva, de obediência aos conteúdos constitucionais.259

Wilson Alves de Souza, também denominando o princípio da proporcionalidade de

princípio da proibição do excesso, associando-os à ideia de limitação ao poder estatal, afirma

acertadamente que toda a ação do Estado que redunde em restrições de direitos individuais ou da coletividade ou da liberdade individual, “deve se pautar pela prévia verificação da necessidade da medida e, sendo o caso, da sua aplicação adequada e proporcional (justa medida) em sentido estrito, para os fins de tal atuação.”260

A aplicação desses dois princípios, portanto, inclui qualquer matéria jurídica e obriga/vincula a todos os Poderes da República, no que tange ao controle das políticas públicas, servindo como instrumentos limitadores à intervenção judicial nesse controle.261