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Os Relatórios de Identificação

2.2 Filosofia da Propriedade e Propriedade Coletiva

2.2.4 Os Relatórios de Identificação

A perícia antropológica pode ser judicial, como em circunstâncias atenuantes ou dirimentes em processos criminais300 (SAMPAIO SILVA, 1994, págs. 33-35). O Código Federal de Procedimentos Penais do México oferece a possibilidade de perícia sobre fatores culturais incidentes no delito301 (RIVERA, 1994, pág.

464). A perícia antropológica pode ser judicial ou administrativa, como nos relatórios de identificação étnica para demarcação de terras.

MEDAUAR, Odete & FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. Revista de Direito e Política ano IV, vol. 14, julho a setembro, Letras Jurídicas, IBAP, São Paulo: 2007, págs. 87-117.

298 GAZOTO, Luís Wanderley. Terras indígenas. Universitas JUS, n. 13, págs. 155-172,

jan./jun, Uniceub, Brasília: 2006.

299 ARAÚJO, Ubiracy. A presença indígena nas Unidades de Conservação. Advocacia Pública

n. 8, 1999.

300 SILVA SAMPAIO, Orlando. Circunstância Atenuante ou Dirimente. Compromisso Ético do

Antropológo In: SILVA, Orlando Sampaio & LUZ, Lídia & HELM, Cecília Maria (orgs.), UFSC, Florianópolis: 1994, págs. 33-35.

Para as terras de uso comum, relatam-se, na literatura antropológica, as terras de santo, as terras de preto e as terras de índio, não se devendo confundir estas com terras indígenas, pois havidas do regime de sesmarias, como os índios Gamela no Maranhão no séc. XVIII, habitadas por descendentes de indígenas, caboclos e caracterizada pelo direito costumeiro do trabalho familiar e uso comum dos palmerais, juçarais, cupuzais, buritizais, fontes, lagos, igarapés, reservas de palha, de madeira e de caça302 (ANDRADE, 1994, pág.

95), com áreas preteritamente cultivadas, as capoeiras, e áreas cultivadas, com cerca comum, a “roça de união, roça de junção, roça de sociedade”, podendo somente o quintal da moradia ser apropriado e vendido303 (ANDRADE, 1994, págs. 95-98). A perícia antropológica pode reconhecer a composse tradicional, a propriedade comum, o direito costumeiro e os terreiros de candomblé304

(PEREIRA, 1994, págs.77-78).

Os relatórios antropológicos de identificação étnica tem abordagem em Giovanna Bonilha Milano. A Portaria MJ 14/96, dispõe sobre normas para elaboração do relatório circunstanciado de identificação e o Decreto 1775/96 dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas. O art. 17305 do Decreto 4.887/2003 prescreve às comunidades

302 ANDRADE, Maristela de Paula. Uma experiência de elaboração de Laudo Antropológico

sobre uma situação de terra de índio no Maranhão. In: SILVA, Orlando Sampaio & LUZ, Lídia & HELM, Cecília Maria (orgs.), UFSC, Florianópolis: 1994, págs. 94-98.

303 ANDRADE, 1994, op. Cit. págs. 95-98

304 PEREIRA, João Baptista Borges. O Papel da Perícia Antropológica no Reconhecimento das

Terras de Ocupação Tradicional. In: SILVA, Orlando Sampaio & LUZ, Lídia & HELM, Cecília Maria (orgs.), UFSC, Florianópolis: 1994, págs. 77-78

305 “Art. 17. A titulação prevista neste Decreto será reconhecida e registrada mediante outorga

de título coletivo e pró-indiviso às comunidades a que se refere o art. 2o, caput, com obrigatória

inserção de cláusula de inalienabilidade, imprescritibilidade e de impenhorabilidade. Parágrafo único. As comunidades serão representadas por suas associações legalmente constituídas”, Decreto 4.887 de 20 de novembro de 2003.

quilombolas tituladas representarem-se por meio de associações civis306 (MILANO, 2009, pág. 2).

Refere as categorias “estabelecimento rural”, do IBGE, e “imóvel rural307”, do

INCRA (MILANO, 2009, pág. 4) e clama pelo reconhecimento de outros registros de memória, história, território e identidade, na abordagem jurídica dos direitos étnicos, uma vez implicada a reconstrução da história oral, expressando a possibilidade de aplicação analógica dos direitos indígenas aos demais grupos étnicos, “seringueiros, ciganos, ribeirinhos, cipozeiros,

faxinalenses, caiçaras, quebradeiras de coco babaçu, fundos de pasto, e tantas outras coletividades, em um rol não taxativo de sujeitos” 308 (MILANO, 2009, pág. 2). Relata conflito epistemológico entre a expectativa de objetividade e certificação da perícia judicial e administrativa e o exercício de construção da alteridade do grupo etnicamenente diferenciado (MILANO, 2009, pág. 6). Viveiros de Castro entede o trabalho do antropólogo pela “elucidação das

condições de autodeterminação ontológica do outro309” (CASTRO, 2008 apud DARELLA & DE MELLO, 2011, pág. 273).

Ao antropólogo cabe a descrição da área imemorial, das terras de uso e ocupação necessárias à reprodução cultural do grupo. As ações demarcatórias sofrem impugnações judiciais: mandados de segurança, reintegrações de

306 MILANO, Giovanna Bonilha. Ensaio sobre Direito e Antropologia nas demarcações étnico-

territoriais: memória, território e oficialidade. Trabalho proposto para apresentação no I ENADIR, Encontro Nacional de Antropologia do Direito da Universidade de São Paulo, 20 e 21 de agosto de 2009 Veja também: TESKE, Wolfgang. Cultura Quilombola na Lagoa da Pedra Arrais – TO, Ed. Senado Federal e MALIGHETTI, Roberto. O quilombo de Frechal. Ed. Senado Federal.

307 MILANO, Op. Cit. pág. 2 308 MILANO, Op. Cit. pág. 2

posse e ações indenizatórias, como ocorrido com os indígenas transferidos/deslocados pela FUNAI da Amazônia para o Cerrado, Vale do Guaporé310 (VALADÃO, 1994, págs. 36-41). Maria Hilda Paraíso ressalta a necessidade de teoria sobre história oral, para aferição de credibilidade a esta fonte de informação e a necessidade do uso da arqueologia311 (PARAÍSO, 1994, págs. 42-47).

Para Sylvia Caiubi Novaes, a produção do parecer/laudo antropológico consiste em ato político (NOVAES, 1994, pág. 68), considerando várias aldeias hoje constituírem cidades. “É necessário avaliar, junto com os índios, qual a atitude

a se tomar, se o objetivo é recuperar uma área perdida, reivindicar uma indenização pelas pelas perdas ou uma outra área em local diverso312 (...)”

(NOVAES, 1994, pág. 70).

Há casos de demarcação, como os dos Kaxixó, MG (CALDEIRA, 2006 apud apud DARELLA & DE MELLO, 2011, pág. 174), e Kaingang, RS, a envolver miscigenação313 (ALMEIDA, 2005 apud DARELLA & DE MELLO, 2011,

pág.177). Atualmente a FUNAI deve adotar o critério da autodeclaração étnica, a consciência de identidade tribal, conforme art. 1 da Convenção 169 da OIT.

310 VALADÃO, Vírginia. Perícias Judiciais e Relatórios de Identificação. In: SILVA, Orlando

Sampaio & LUZ, Lídia & HELM, Cecília Maria (orgs.), UFSC, Florianópolis: 1994, Págs. 36-41.

311 PARAISO, Maria Hilda B. Reflexões sobre fontes orais e escritas na elaboração de laudos

periciais. In: SILVA, Orlando Sampaio & LUZ, Lídia & HELM, Cecília Maria (orgs.), UFSC, Florianópolis: 1994, págs. 42-47.

312 NOVAES, Sylvia Caiuby. Laudos antropológicos: algumas questões e inquietações. In:

SILVA, Orlando Sampaio & LUZ, Lídia & HELM, Cecília Maria (orgs.), UFSC, Florianópolis: 1994, págs.67-70

A Corte interamericana de direitos humanos obrigou a adoção de medidas legislativas e administrativas para a titulação coletiva de terras tradicionais no caso Comunidade Moiwana, Suriname314 e considerou desproporcional a demora de edição de decreto de reconhecimento de personalidade jurídica, no caso Comunidade Indígena Yakye Axa, Paraguai315, considerando haver violação ao direito de propriedade, com menção aos artigos 62 a 65 da Constituição do Paraguai316, e no caso Comunidade Indígena Sawhoyamaxa,

Paraguai317.