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6 AS MACROVARIÁVEIS DE OAKERSON APLICADAS À REALIDADE DAS

6.2 ARRANJOS PARA TOMADA DE DECISÃO (OU REGRAS DE INTERAÇÃO)

6.3.1 Segmentos econômicos

6.3.1.1 Os segmentos econômicos e a gestão dos recursos hídricos

A imprescindibilidade dos recursos hídricos para o desenvolvimento do território às múltiplas finalidades já está amplamente destacada no corpo desta tese, cuja ênfase é dada a esses na condição de um bem comum, de direito coletivo e elemento essencial ao equilíbrio ecossistêmico. Tal premissa é reportada nesta seção ao setor econômico, sendo apresentado o grau de conhecimento de três atores atuantes na bacia abrangidos na pesquisa, identificados como E1, E2 e E3, sobre a temática. São abordados diversos aspectos, como o modelo de gestão hídrica adotado no território, os espaços de tomadas de decisão acerca do uso da água, ou seja, quem decide ou não as formas de apropriação da água, dentre outros.

Ao falar sobre o processo em questão, E1 afirma desconhecer a quem cabe o papel de definição dos usos dos recursos hídricos: “Sinceramente, eu não sei. A gente sabe que hoje tem a Casan, que cuida da distribuição da água. Coleta a água, é feito um determinado tratamento para consumo humano. Que o custo dessa água está muito caro para a população em geral”. E2 faz um relato similar: “[...] sinceramente, a gestão da água para mim à nível municipal quem monitora é a Samae, né, em termos de fornecimento de água e tal. Mas eu não sei se existe alguma gestão assim. Ela operacionaliza né, então eu não sei também se estou um pouco por fora, estou longe agora da questão da gestão pública”. Por outro lado, citando seu município, E2 afirma que os interesses econômicos costumam se sobrepor em questões de interesse coletivo, inclusive sobre a água.

E3, por sua vez, reconhece a água como um bem comum e está ciente do histórico passivo ambiental da região carbonífera, mas também se mostra desconhecedor da situação hídrica atual na bacia: “Nós aqui na região, apesar de toda a poluição, Criciúma tem uma reserva grande que é a barragem do rio São Bento. Ao menos a gente acredita nisso. A gente acredita nisso porque tem a barragem lá. A gente tem a situação um pouco resolvida, pela informação que a gente tem. Mas tem outras regiões com problemas sérios na questão de água”. Essa percepção de E3 foi reforçada durante o ano de 2018, quando este disse ter visto

um vídeo institucional da Prefeitura de Criciúma no qual era divulgado que a região possui água em abundância.

E1, E2 e E3 têm alguma familiaridade com os comitês de bacia, dos quais já ouviram falar, no entanto, demonstrando conter informações limitadas sobre o seu papel, que seria o de conduzir a parte política do processo de gestão hídrica no território abrangido pela bacia, conforme já relatado anteriormente no trabalho. E1, por exemplo, procurou se aproximar do conceito, expressando-se de modo genérico nas colocações:

O que eu conheço é que, a participação deste comitê, a regulamentação, no sentido também da participação de todos os usuários de água, da conscientização, de que o uso desta água precisa ser melhor tratado no sentido de ser melhor distribuída. Os usuários de água têm que ter conhecimento de que no futuro, se nós não tomarmos providências, vamos ficar sem água. Este comitê está preocupado com isso. Está buscando preservar todas as nascentes (que eu saiba), fazendo projetos, e conscientizando principalmente a população e os usuários diretos de que esta água poderá desaparecer.

Sobre as condições hídricas da região, os três entrevistados demonstraram estar cientes dos problemas relacionados ao passivo ambiental da região carbonífera, que afetam diretamente os rios das três bacias hidrográficas, incluindo a do Urussanga. E1 destaca a dificuldade de se saber se há água disponível para que o setor econômico possa prospectar a vinda de novas empresas para a região, sem entrar em detalhes na origem do problema, em grande parte relacionado à mineração de carvão, com associação de outras fontes contaminantes. Já E3 admitiu o problema do manejo inadequado do meio ambiente pelo setor econômico: “Na nossa região o setor econômico meio que se autodenominou dono dos recursos naturais e nós estamos até hoje, há anos e anos, colhendo o fruto disso. Os rios todos poluídos que nós temos aqui”.

Ainda em relação ao mesmo tema, E2 destacou que há apenas dois mananciais hídricos que abastecem a população de Urussanga, observando que comunidades já estão sem água no município. Segundo o mesmo entrevistado, a população deu as costas para o rio, não adotando ações cuidadosas ao fazerem uso do solo e dos recursos hídricos, atribuindo a responsabilidade pela poluição também a outras atividades, além da carbonífera. Residente em localidade em que o abastecimento de água é municipalizado, E2 disse que pouco se utiliza do serviço, porque capta água de nascentes na sua propriedade: “Eu tenho as fontes tratadas, eu tenho as fontes naturais que na época em que o meu pai implantou os parreirais

ele implantou umas caixas grandes, assim de contenção dessas águas da fonte. Mas tu vês, se há um desmatamento, já posso perder essas fontes”.

As falas de E1, E2 e E3 contribuem à compreensão de que, não obstante às suas possíveis limitações, a PNRH é algo ainda muito distante da sociedade. Sobretudo, levando-se em conta o caráter descentralizador de poder, tendo nos comitês de bacia hidrográfica instâncias à definição de políticas para os usos racionais e democráticos dos recursos hídricos. Embora a água seja um dos elementos principais no desenvolvimento do território, seu manejo parece ocorrer aleatório a quaisquer processos de gestão, sendo igualmente algo fora do domínio de conhecimento e interesse dos representantes dos segmentos econômicos, o que fica evidenciado no seu discurso. Esses, cuja atuação na arena de ações dá-se estreitamente com os segmentos políticos, que são objeto de discussão na seção subsequente.