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2 O contraditório e a ampla defesa no sistema constitucional vigente: estudo do tema a partir do direito positivo como

2.1 Teorias de eficácia das normas constitucionais.

2.1.2 Outras propostas classificatórias.

A contribuição de José Afonso da Silva na sistematização de uma teoria geral de eficácia das normas constitucionais é notória, como dissemos páginas atrás. O relevo de sua obra, no entanto, não inibiu a exímia doutrina brasileira de avançar, postulando classificações alternativas ou, o que é mais frequente, buscando incluir novos tijolos na edificação teórica apresentada pela obra aqui estudada.

Já tivemos a oportunidade de anunciar, à guisa de escusa, que a presente pesquisa se concentra nas lições de José Afonso da Silva, eleito por nós como o principal referencial teórico em direito constitucional positivo. Todavia, há espaço para alusão a outras teorias de autores importantes, com o devido cuidado para não deslocar o foco do estudo.

Maria Helena Diniz classifica as normas constitucionais em: a) normas de eficácia absoluta; b) normas de eficácia plena; c) normas com eficácia relativa restringível; e, d) normas com eficácia relativa complementável ou dependentes de complementação110. Nesta classificação, as normas de eficácia plena guardam absoluta correspondência às de igual denominação na classificação de José Afonso da Silva; as normas dotadas de eficácia relativa restringível corresponderiam às normas de eficácia contida; e, as normas com eficácia relativa complementável ou dependentes de complementação corresponderiam às normas de eficácia limitada.

Esta mesma classificação já havia sido adotada por Luiz Pinto Ferreira, embora sob o emprego de denominações sutilmente distintas, a saber: a) normas constitucionais de eficácia absoluta; b) normas constitucionais de eficácia plena; c) normas constitucionais de eficácia contida; e, d) normas constitucionais de eficácia limitada111.

A única inovação no modelo proposto por Maria Helena Diniz e Pinto Ferreira é a constatação da existência de normas de eficácia absoluta. Referidos autores denominam como de eficácia absoluta as normas constitucionais que são dotadas de eficácia plena e que, por força do disposto no artigo 60, § 4º, e 34, VII, “a” e “b”, da Constituição Federal de 1988, são

110 Norma constitucional e seus efeitos. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 113. 111 Verbete “eficácia”. In: Enciclopédia Saraiva de Direito. v. 30, 1979.

“intangíveis e invioláveis”112 enquanto a Constituição estiver em vigor, não

podendo ser objeto de proposta de emenda constitucional113.

Em Luís Roberto Barroso, o foco do direito constitucional deve ser a efetividade das normas da Constituição, na medida em que “o direito existe para realizar-se”. O problema a ser enfrentado, então, é a capacidade in concreto que a norma constitucional tem em criar direitos subjetivos aos cidadãos ou vincular os entes estatais. “Nesta nova perspectiva, torna-se relevante a determinação do conteúdo das normas constitucionais, para delas extrair a posição jurídica em que investem os jurisdicionados”. A partir desta premissa, Luís Roberto Barroso defende uma classificação muito útil, edificada sobre os efeitos materiais da norma constitucional: a) normas constitucionais de organização; c) normas constitucionais definidoras de direito; e, c) normas constitucionais programáticas114.

As normas constitucionais de organização, segundo Barroso, seriam aquelas que definem “a estrutura do Estado, cuidando, essencialmente, da repartição do poder político e da definição da competência dos órgãos públicos”. Embora não seja de sua essência, tais normas poderiam gerar um direito subjetivo ao cidadão, como é o caso, no exemplo dado pelo próprio autor em estudo, do de se opor judicialmente a uma ordem emanada por um órgão do Estado que não possui competência para a realização do ato115.

Ainda na lição de Luís Roberto Barroso, as normas constitucionais definidoras de direito teriam como característica principal o

112 Segundo Maria Helena Diniz, “há uma supereficácia paralisante, ou ab-rogante, das normas

constitucionais absolutas, pois, sendo aplicáveis imediatamente, sendo intangíveis e invioláveis, não poderão ser alteradas pelo poder constituinte derivado, sobrevivendo enquanto a Constituição for vigente” (Norma Constitucional e seus efeitos. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 115).

113 Esta classificação não escapa à crítica de José Afonso da Silva, para quem ela se baseia no

critério de modificabilidade do preceito constitucional e não em sua aplicabilidade ou eficácia, que é plena (Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 87, nota de rodapé).

114 Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional

transformadora. 7ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 260-261.

poder de investir o cidadão em um direito subjetivo, permitindo-lhe exigir de outros destinatários da norma uma ação omissiva ou comissiva tendente a assegurar a fruição do bem jurídico protegido na norma116. A esta questão voltaremos mais adiante, quando tratarmos do destinatário das normas constitucionais.

Por fim, Barroso afirma que as normas constitucionais programáticas seriam aquelas que “veiculam princípios, desde logo observáveis, ou traçam fins sociais a serem alcançados pela atuação futura dos poderes públicos”. Com tal característica, não outorgariam ao cidadão o direito de exigir dos órgãos do Estado uma prestação positiva, isto é, a prática de um ato ou a concessão de uma vantagem; no entanto, investiriam o jurisdicionado no direito de exigir dos órgãos estatais a abstenção de uma determinada conduta que venha a colidir com tais normas. “Vale dizer: não geram direitos subjetivos em sua versão positiva, mas geram-nos em sua versão negativa”. Como exemplo de normas constitucionais programáticas, o autor cita as disposições que tratam da redução das desigualdades regionais sociais (artigo 170, VII), o apoio à cultura (artigo 215), a função social da propriedade (artigo 170, III), dentre outras117.

Jorge Miranda reúne as normas constitucionais em um esquema composto por três categorias, correspondentes aos diferentes graus de eficácia das normas constitucionais. Neste esquema, haveria: a) normas perceptivas exequíveis por si mesmas; b) normas preceptivas não exequíveis por si mesmas; e, c) normas programáticas118.

O próprio Jorge Miranda faz o confronto de sua proposta classificatória coma classificação igualmente tricotômica de José Afonso da Silva. Como consequência de seu trabalho de identificação das características

116 Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional

transformadora. 7ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 262.

117 Idem.

peculiares de cada espécie de norma, Jorge Miranda afirma que as normas preceptivas exequíveis por si mesmas correspondem às normas de eficácia plena e às normas de eficácia contida nominadas na classificação de José Afonso da Silva. Da mesma forma, as chamadas normas preceptivas não exequíveis por si mesmas se identificariam com as normas definidoras de princípio institutivo ou organizativo e as normas programáticas com as normas definidoras de princípio programático119. Como se observa, a proposta classificatória de Jorge Miranda não difere, salvo em nomenclatura de classes, da classificação de José Afonso da Silva.

2.2 A Constituição como norma jurídica capaz de gerar, por si,