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4.3 Dados obtidos com o Método de Rorschach

4.3.4 Análise dos conteúdos

4.3.4.3 Outros conteúdos

Quanto aos demais conteúdos, reunidos na tabela 45, eles revelaram temáticas dominantes em cada grupo: Anat, Obj e Pl no grupo com assiduidade regular, Anat e Pl no grupo com assiduidade irregular e conteúdos ligados à natureza no grupo sem assiduidade (Pl, Nat, Paisag).

Tabela 45 – Respostas relacionadas a outros conteúdos

Conteúdo Grupo com assiduidade

regular Grupo com assiduidade irregular assiduidade Grupo sem

Anat 10 11 3 Obj 9 1 3 Pl 7 5 2 Nat 1 1 4 Paisag 0 1 3 Frgm 3 1 3 Elem 2 2 0 Sg 1 0 0 Arte 2 1 0 (Arte) 1 2 0 Masc 0 2 3 Alim 0 1 0 Sexo 0 0 1 36 28 22

As respostas cotadas como Anat (anatomia humana) são evidenciadoras de angústias relacionadas ao corpo, expressando desde uma preocupação exacerbada com a saúde física (angústia hipocondríaca) até uma ansiedade disfarçada em torno da sexualidade, podendo constituir ainda a expressão de sentimentos de inadequação em torno de algum aspecto da subjetividade (Chabert, 2004). Conforme apontado anteriormente, trata-se de um conteúdo que integra o cálculo do índice de angústia patológica, juntamente com as representações humanas parciais, respostas ligadas a sexo e sangue (Hd+Sexo+Anat+Sg/R *100). De acordo com os padrões normativos, este índice não deve ultrapassar 12%.

No grupo com assiduidade regular, considerando a produtividade de todos os sujeitos, verificou-se que o índice de angústia patológica superou o valor normativo, alcançando um total de 17,7%, devido à quantidade elevada de respostas Anat. A análise individual dos protocolos demonstrou que sete sujeitos apresentaram um índice superior a 12%. De maneira geral, as representações Anat se caracterizaram por um movimento desvitalizante, por vezes assumindo uma valência agressiva, como resultado de agressão:

S30, pr. III: “Pode ser duas parte de osso? Tá parecendo dois braços assim, ó e a cabeça cortada.” Inquérito: Dois braços, cabeça cortada. Como chama isso daqui? Peito.” (a prancha favorece associações de conteúdos humanos, vivos. É brutal a necessidade de erradicar esta vitalidade por meio de uma abordagem formal rígida do estímulo, evitando um olhar integrador da mancha).

S22, pr. IV: “Parece um esquilo atropelado.” Inquérito: “Tá esparramado no chão. Aqui a cauda dele caída no chão.”

S12, pr. III: “Um rosto”. Inquérito: “Olho aqui, nariz aqui. A boca, assim. Não um rosto, não, rosto de alguma coisa. (você consegue identificar?) Tipo uma caveira, um negócio assim. Porque lembra, né, o olho separado, não tem nada em volta. Só o nariz.” (note-se que a resposta seria cotada como Hd, não fosse o movimento desvitalizante registrado na fase de inquérito)

Este processo desvitalizante também foi observado em duas respostas Obj, onde os sujeitos tangenciaram uma projeção mais próxima do humano (respostas K recalcadas):

S3, pr. VII: “Um boneco”. Inquérito: “O rosto, os braços e as pernas.”

S32, pr. VII: “Duas bonequinhas”. Inquérito: “Lembra aquele...tem um desenho com um bichinho cabeçudo. Os dois molequinho assim. (qual desenho?) Não lembro o nome, acho que é Dimi Neutro. Vai para o espaço, tem uns bichinho cabeçudo. (E as duas bonequinhas?) Tá mais pra boneca, também o rosto aqui assim.”

A prevalência e a característica das representações anatômicas e de objeto só reforçaram a aridez dos protocolos do grupo com assiduidade regular. Daí talvez a tentativa de contrabalançar a falta de vivacidade por meio de representações de planta, terceiro conteúdo mais frequente entre estes adolescentes. Dos seis protocolos contendo respostas anatômicas, quatro possuíam conteúdos Pl e um, Nat.

No grupo com assiduidade irregular, o índice de angústia patológica também superou o valor normativo, atingindo 15,5% (considerando a produtividade total dos sujeitos). Contudo, a análise individual dos protocolos demonstrou que somente três sujeitos apresentaram este percentual acima do padrão normativo, concentrando muitas respostas Anat e Hd, cuja frequência acabou elevando o percentual geral obtido pelo grupo. Quanto às especificidades das respostas Anat destes adolescentes, observou-se a tentativa de distanciamento dos afetos por meio de uma descrição objetiva do material: S21, pr. X: “Está mais parecido com o corpo humano.” Inquérito: “Intestino. Por causa desse negócio aqui, aí vai, desce, aí vai pra cá.”

No entanto, nem sempre este distanciamento foi eficiente na contenção da angústia, que algumas vezes transbordou em imagens violentas ou inibiu os processos mentais, comprometendo o esclarecimento do percepto:

S18: “Aqui também, deve ser parte do corpo humano por dentro, só que tá separado. Pescoço aqui, parece. Acho que é isso mesmo.” Inquérito: “Tá meio espalhado. Pescoço aqui. Sei lá o que vem, a parte de baixo, os bagulho tá tudo separado. (o que tem dentro?) Ah, sei lá, os rins Ah, sei lá. Às vezes ele foi atropelado por uma carreta. Sei lá.”

S35: “Sei o que é isso não. Difícil. Parece a coluna.” Inquérito: “Esses vermelho aqui. (só o vermelho?) Aqui parece o pescoço (aponta o preto) Porque ...parece...não sei explicar não.”

Os conteúdos anatômicos foram registrados na metade dos protocolos deste grupo, mas não estiveram associados à presença de respostas Pl. Estas, presentes em quatro protocolos, explicitaram a vivacidade e o dinamismo do mundo interno, evitados nas representações animais e humanas:

S10, pr. IV: “Parece uma árvore, uma tipo com um pé aqui.” Inquérito: “Aqui é o tronco, e aqui é as plantas. Parece uma árvore. Detectei a planta. Não pode ser árvore seca.”

S21, pr. IV: “Uma árvore.” Inquérito: “Porque aqui, ó, esse pé, vai subindo, vai subindo, em vez de ficar normal, ela se abre, fica maior estranho. Por isso falei em árvore.”

S33, pr. IX: “O que é isso? Não sei, não sei...ah, uma planta, sei lá.” Inquérito: “Aqui tem o formato dela e tá abrindo igual uma planta. (se fosse tudo preto?) Aí não parecia. Não ia parecer com nada. É uma flor se abrindo.”

No grupo sem assiduidade, o empobrecimento associativo gerou dois protocolos sem representações fora do conjunto de respostas humanas e animais, além de influenciar dois outros casos em que se verificou uma única resposta cotável como “outros conteúdos”. Entre as respostas existentes, os temas foram muito diversificados, distribuídos quase que equitativamente entre os vários tipos de conteúdo. Notou-se uma leve predominância de representações de natureza (Nat), ampliada com a somatória de conteúdos semelhantes (Paisag e Pl). Todas foram respostas bastante descritivas:

S8, pr. IV: “Uma árvore.” Inquérito: “Tronco, a árvore é só essa parte preta aqui, aqui os gramados, sem essa parte.”

S13, pr. VII: “Uma montanha, né?” Inquérito: “Aqui uma montanha, com um rio correndo aqui.”

S28, pr. X: “Parece uma paisagem isso daqui. Mais bonitinho, mais cor viva aqui. Só.” Inquérito: “Um rio no meio assim (azul). Tipo duas montanha. Uma árvore aqui. Tipo a luz do sol batendo. Duas rocha.”

S36, pr. X: “Montanha aqui”. Inquérito: “Pra mim, no meu olhar parece. Isso que eu vi.”

Nestas respostas, não se observou a mesma vitalidade de conteúdos semelhantes fornecidos pelo grupo com assiduidade irregular. Ao contrário, a abordagem descritiva utilizada por estes sujeitos trouxe como efeito a transformação da natureza em objeto, em associações quase estereotipadas. Destacaram-se as frequentes menções à montanha e ao elemento água.

Cabe salientar que o grupo sem assiduidade foi o único a apresentar um índice de angústia patológica inferior ao limite normativo, alcançando 6% no cômputo geral. Porém, na análise individual dos protocolos, metade dos sujeitos superou o valor normativo no cálculo deste índice. Como apresentaram poucas respostas Anat, Hd e Sexo (nenhuma Sg), a influência destes conteúdos foi diluída no cálculo geral do grupo. Quanto às banalidades, indicativas de uma capacidade perceptiva básica, observou-se que em todos os grupos a maioria dos sujeitos apresentou um número de respostas dentro dos valores normativos (2 a 4). Todavia, alguns adolescentes não conseguiram alcançar este número mínimo, especialmente no grupo com assiduidade regular, onde quatro jovens apresentaram somente uma resposta banal. Nos demais grupos, encontraram-se dois protocolos contendo somente uma banalidade.