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3. A CONSTITUIÇÃO DO SABER ARQUIVÍSTICO NO BRASIL, p

3.2 Panorama brasileiro, p

Silva e Orrico (2011), ao apresentarem um mapeamento dos discursos explicativos sobre a trajetória de constituição do campo da Arquivologia no Brasil, remontam ao período da criação do Arquivo Nacional em 1838 e

[...] nas duas iniciativas da instituição, de 1911 e 1960, dos cursos de diplomática e depois de arquivo; no papel do DASP e da FGV na modernização do Estado; no movimento associativo da década de 1970; no projeto de modernização do Arquivo Nacional nos anos de 1980; e, na configuração do campo a partir de 1991 com os cursos universitários e as leis da profissão e dos arquivos. (SILVA; ORRICO, 2011, p. 1)

A institucionalização do campo arquivístico no Brasil que vem ocorrendo ao longo dos anos pode ser descrito em quatro grandes momentos: primeiro momento, com a criação e ação

de instituições arquivísticas, principalmente o Arquivo Nacional e do setor público, como a criação da DASP atuando nos arquivos na administração pública e a institucionalização da carreira no serviço público; em seguida, as mobilizações associativas, criação da Associação dos Arquivistas Brasileiros - AAB, que contribuíram na organização e divulgação das primeiras reflexões sobre o fazer arquivístico e na regulamentação da profissão por Lei Federal nº 6.546, de 4 de julho de 1978; terceiro momento, a institucionalização dos cursos universitários, iniciado em fins da década de 1970 e consolidado na década de 1990; e ultimo momento, e é o mais recente, de consolidação de uma associação específica ao debate sobre o ensino e pesquisa da Arquivologia e a criação do primeiro programa de pós-graduação na área (SILVA; ORRICO, 2011, passim).

Todo este processo relatado acima possibilita criar, como bem chamaram atenção Couture e Rousseau (1998) e Jardim (1999), um ambiente propício a criação e estabelecimento de um saber específico, pois dispõem de experiências, instrumentos e credibilidade social.

O entendimento de que a produção de conhecimento arquivístico contemporâneo está ligada principalmente, e quase exclusivamente, à academia não é unânime. Há os profissionais que defendem que ainda há, tanto no Brasil quanto internacionalmente, uma produção de conhecimento dentro dos arquivos extremamente relevante para a constituição da área. O objetivo dessa pesquisa não é o de procurar aquele campo mais ou menos ativo na produção de um conhecimento, pois se acredita que a Arquivologia possui como característica uma necessidade tanto teórica quanto prática, não sendo possível assim, dividir ou apagar uma importância em detrimento a outra, seja da academia seja dos arquivos. Pelo contrário, acredita-se que a atuação mútua e interligada desses dois campos é que verdadeiramente contribuirá para a constituição de um saber científico.

Cabe aqui delimitar então o foco principal dessa pesquisa, que é o de observar a institucionalização do campo arquivístico através das ações dos docentes dentro das universidades, tendo em vista o reconhecimento do espaço universitário como um importante lugar de formação da arquivística como disciplina científica (MARQUES, 2007).

Nesta perspectiva é que para Rodrigues e Marques (2005) o período mais importante da Arquivologia no Brasil foi a década de 1970 , quando foram criados os primeiros cursos de graduação na Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e na Universidade Federal Fluminense, ambas no Rio de Janeiro, assim como a criação da Associação dos Arquivistas Brasileira, que foi responsável pela aproximação dos profissionais e pela organização dos primeiros congressos nacionais.

Segundo as autoras, até a criação destes cursos de graduação, as reflexões originavam basicamente das instituições arquivísticas, sendo vinculadas a resoluções de problemas práticos e pontuais. É observada uma alteração do perfil nos congressos, a partir da participação de pesquisadores acadêmicos com suas pesquisas.

Maria Odila K. Fonseca (2005), também observou esta mudança de estrutura, chamando atenção a duas fases da produção de conhecimento arquivístico: a Arquivologia clássica, vinculada às práticas burocráticas e suas questões práticas; e um segundo momento, descrito como Arquivologia contemporânea, ligada à academia e envolvida na produção de conhecimento científico, apontando para uma mudança importante na estrutura da disciplina como área de conhecimento autônoma.

Para Thomassen (199728 apud FONSECA, 2005) esta mudança de paradigma é a passagem de uma arquivologia custodial, para uma arquivologia pós-custodial, também chamada de arquivologia pós-moderna.

Em relação a quantidade atual de cursos de Arquivologia no Brasil, pode ser observado no quadro abaixo a existência de dezesseis cursos reconhecidos e em funcionamento. Chama atenção o fato de que cada uma das cinco regiões do Brasil possui pelo menos um curso de Arquivologia.

Se a década de 1990 é entendida como o período de consolidação da universidade como espaço político e acadêmico importante na configuração do campo arquivístico, a partir da década de 2000, ocorre a expansão deste lócus de conhecimento, fato exemplificado pela criação dos primeiros cursos de Arquivologia na região norte, na UFAM (2008) e UFPA (2012) como observado na tabela abaixo.

28 THOMASSEN, Theo. The development of archival science and its European dimension. In: Seminar for anna

Tabela 1 - Cursos de Arquivologia reconhecidos no Brasil Ano de

fundação

Universidade UF Departamento/ Faculdade/Instituto/Centro Faculdade/ Instituto/ Centro

1976 UNIRIO RJ * Escola de Arquivologia/

Centro de Ciências Humanas

1976 UFSM RS * Escola de Arquivologia/

Centro de Ciências Humanas 1978 UFF RJ Departamento de Ciência e Informação Instituto de Arte e Comunicação

Social 1990 UnB DF Departamento de Ciência da Informação

1997 UEL PR Departamento de Ciência da Informação Centro de Educação, Comunicação e Artes

1997 UFBA BA * Instituto de Ciência da Informação

1999 UFRGS RS Departamento de Ciências da Informação Faculdade de Biblioteconomia e Documentação

1999 UFES ES Departamento de Arquivologia Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas

2002 UNESP Marilia

SP Departamento de Ciência da Informação Faculdade de Filosofia e Ciências 2006 UEPB PB Departamento de Ciência da Informação Centro de Ciências Biológicas e

Sociais Aplicadas

2008 FURG RS * Instituto de Ciências Humanas e da

Informação

2008 UFMG MG * Escola de Ciência da Informação

2008 UFAM AM Departamento de Arquivologia e Biblioteconomia

2008 UFPB PB Departamento de Ciência da Informação Centro de Ciências Sociais Aplicadas

2009 UFSC SC Departamento de Ciência da Informação Centro de Ciências da Educação

2012 UFPA PA * Faculdade de Biblioteconomia/

Instituto de Ciências Sociais Aplicadas

Fonte: elaboração própria, com base no site do MEC e nos sites das referidas universidades.

*Até a realização desta pesquisa (12/2012), esses cursos não estavam vinculados, a nenhum departamento.

** Foram contabilizados apenas os cursos em atividade, não sendo contabilizado o curso do Centro Universitário Assunção (SP), uma vez que mesmo com a autorização e a condição de "curso ativo” no site do MEC, observou-se que o curso em questão não é oferecido pela universidade.

Lógico que a consolidação a qual Fonseca se refere ocorre, não apenas pelo crescimento o aumento do numero de cursos de graduação no Brasil, mas também pela qualificação do corpo docente e aumento da contribuição de autores vinculados à universidades na produção científica da área.

Se em 1999 tanto para Jardim quanto para Fonseca a arquivística merecia duras críticas, devido à falta de uma produção de conhecimento mais apropriada a uma área que quer ser vista como autônoma. Atualmente a análise pode ser outra, como descreveu Marques, em tese defendida em 2011 (2011, p.30):

O amadurecimento da disciplina parece ter se traduzido na necessidade de criação dos cursos de graduação e, posteriormente, no desenvolvimento de pesquisas com temáticas arquivísticas nos cursos de pós-graduação stricto sensu. Dessa forma, no campo extradisciplinar, pudemos considerar que os vínculos institucionais da Arquivologia na universidade e a formação do quadro docente dos seus cursos de

graduação são aspectos que demonstram as interfaces das suas relações com outras disciplinas, influenciando na sua produção científica e propiciando a afirmação de sua identidade como disciplina científica.

Por fim é realçado o fato de que o próprio caráter prático do fazer arquivístico contribuiu para a expansão dos cursos de graduação, que por sua vez tem colaborar para uma “cultura de pesquisa”. Ou seja, está em transformação, de uma área técnica/prática, para uma disciplina científica.