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5 REGISTRO HISTÓRICO DA ESCOLA ITINERANTE CAMINHOS DO SABER

5.7 Participação da comunidade

A comunidade teve um papel importante na hora de escolher o local onde seria instalada a Escola Itinerante Caminhos do Saber, a preocupação das educadoras, educandos e das famílias em achar um lugar para construir a escola, se

tornou um problema de todo o acampamento, tanto que algumas famílias que possuíam um barraco maior, ofereciam para ser usado como sala de aula. Esse processo envolveu os acampados no debate, querendo saber como seria essa escola que funcionava em qualquer lugar, num barracão, embaixo de uma árvore, em barracos. A Escola depois de itinerar por vários locais dentro do acampamento Maila Sabrina, fez com que a comunidade, mobilizada em torno dela e preocupada com o ano letivo que estava começando, chegasse à conclusão de que seria preciso reformar o barracão da antiga oficina da fazenda ocupada e fazer as divisões para se construir as primeiras três salas de aulas. Maria Luíza (2007) conta que antes desse acampamento Maila Sabrina, na fazenda Brasileira, os sem terra sempre estiveram preocupados com a educação dos filhos, diz que quando estavam acampados numa fazenda no município de Faxinal, aventava-se inclusive a possibilidade de sair um assentamento para 120 famílias no município, porém com o despejo, o prefeito tirou toda a estrutura que fornecera à escola.

Posso dizer que tínhamos uma escola municipalizada funcionando, com carteira, quadro, giz, material didático, de limpeza, tinha tudo. Aí fomos despejados e tivemos de mudar para o município de Ortigueira. O prefeito tirou toda a estrutura, tudo, não deixou nada para nós acampados, mesmo sabendo de um assentamento que está saindo para 120 famílias no município. Da prefeitura de Ortigueira recebemos 40 carteiras e 10 caixas de giz. Como as aulas começaram em 12 de março de 2006, fizemos campanha porque a escola precisava de quadro, giz, material didático, as crianças não tinham lápis, borracha, caderno e fomos conseguindo as coisas com os outros. A merenda a comunidade tirou do pouco que tinha e dividiu com a Escola. Tudo que conseguimos foi com muita luta. A Escola Itinerante é uma escola diferente, porque ela é feita na luta, contando com a solidariedade das famílias acampadas, sem depender muito do governo, que promete muito, mas fazer mesmo, nada. (MARIA LUIZA, 2007).

Como não tinham carteiras suficientes para todas as crianças matriculadas, elas foram divididas em dois turnos com 03 turmas de manhã e 03 à tarde. “Para construir as salas na oficina, desmanchamos uma casa que estava caindo, da antiga colônia de café e fizemos as repartições da Escola Itinerante” (Idem). A fazenda de 11.800 hectares quando foi ocupada pelo MST, estava abandonada e tomada pelo mato, nela havia casas da antiga colônia de café caindo aos pedaços depois de 25, 30 anos de abandono, uma oficina e a casa sede imponente da fazenda. Os búfalos criados soltos se encontravam embrenhados na

mata, ariscos e em estado quase selvagem, bravios. Para obter carne de búfalo para consumo humano, só pelo abate através de tiro. Como diz Maria Luiza (2007): “você verá que o único lugar com assoalho é na Secretaria da Escola, porque já tinha. As salas são de piso de chão batido e ali se dão as aulas”.

Maria Luíza conta que participou de outra experiência de Escola Itinerante, coordenada pela Secretaria Municipal da cidade de Manoel Ribas, em que concomitantemente à construção das salas, iniciou-se o processo de formação de professores do acampamento. Diz também que quando tem ocupação numa determinada área, as famílias sem terra matriculam seus filhos nas escolas da cidade mais próxima, amparados no Estatuto da Criança e do Adolescente, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN – nº 9394/96 e, na Constituição Federal de 1988. Pressionam as autoridades municipais por vagas para seus filhos. No entanto, o que geralmente acontecia é que, os municípios muito pequenos, onde geralmente estão incrustados os latifúndios improdutivos, não têm estrutura para absorver aquela grande quantidade de crianças, batendo às portas das escolas municipais da região.

Na cidade de Manoel Ribas, segundo Maria Luíza, o prefeito se adiantou e acolheu bem os sem terra, estava construindo as salas de aulas próximas ao local da ocupação, começou um curso com os candidatos a educadores do próprio acampamento com Ensino Médio, devido à inexistência de profissionais com o Magistério, o curso foi oferecido pela Secretaria Municipal para capacitá-los. O processo foi interrompido bruscamente porque as famílias foram despejadas e ocuparam a fazenda Brasileira, passando a constituir o acampamento Maila Sabrina, onde iniciaram o processo de construção da Escola Itinerante Caminhos do Saber. Neste acampamento o trabalho está sendo diferente. Após a discussão realizada com a comunidade, as aulas começaram sem estrutura física, sendo ministradas nos mais variados locais do acampamento, até a construção das primeiras três salas na antiga oficina da fazenda, reformada pela comunidade para funcionar como sala de aula, como relatado.

As Escolas Itinerantes funcionam de forma precária e sofrem dos mesmos problemas estruturais e da falta de verba como todas as escolas públicas. Na Escola Itinerante o apoio estadual que é mínimo, são para pagar os salários dos educadores/as, oriundos de um convênio com o Estado, isso quando se estabelece convênio, que além de baixos, são utilizados para comprar cadernos, lápis e

borracha para as crianças da escola. Apesar das dificuldades, Maria Luiza diz que há grande diferença entre o antes e o depois da implantação da Escola Itinerante no acampamento.

A diferença é grande e vários fatores ajudaram na construção da Escola Itinerante aqui dentro. Uma, tínhamos crianças que iam para a cidade, matavam aula e ficavam bagunçando na rua. Hoje, com a Escola Itinerante não existe mais isso, ou ela vem pra escola ou fica em casa. Se ela não quer vir, não quer estudar, não pode ficar em casa, então os educadores visitam essa família para discutir o problema da criança faltosa. Uma outra questão vai de encontro à linha política do Movimento, essas crianças hoje, além de estar sendo alfabetizadas, aprendendo, sendo escolarizadas, elas têm uma formação política dentro da escola. (MARIA LUÍZA, 2007).

Como os trabalhadores rurais do acampamento Maila Sabrina se encontram em cima da terra de trabalho, onde se pretende, depois de desapropriada a área, instalar o assentamento, a construção física da Escola Caminhos do Saber não pára. No primeiro mutirão, em 2006, foram construídas as 03 primeiras salas da Escola Caminhos do Saber. No mutirão dos dias 01 e 02 de junho de 2007, foram construídas mais 04 salas de aula, que abrigam crianças da Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. Em 2008 ampliou-se o atendimento escolar, iniciando na Educação Infantil com crianças de 04 a 06 anos, que ficam com uma Pedagoga, passando pelo Ensino Fundamental que se estendeu de 5ª a 9ª série e 1º ano do Ensino Médio.

Quando se discute com a população acampada qual escola construir e ela se envolve no projeto, essa escola passa a ser de responsabilidade de todos os acampados e o coletivo precisa tomar conta dela. Mas como não se tem recurso nenhum, construir qualquer coisa nessas circunstâncias, dispende muita energia e disposição para se realizar as tarefas. Por exemplo: não tem professor, onde procurar? Entre os acampados, claro. Não tem escola? Vamos criá-la no acampamento. Não tem carteira? Vamos conseguir com a prefeitura, vamos construir bancos. Como diz Eldilvani: primeiro descobrimos a necessidade no meio do povo, depois arranjamos os meios para superá-las coletivamente. É através da necessidade que a gente vai lutando e melhorando as coisas na vida.

O sujeito do processo educativo é a comunidade acampada que se envolve no processo educativo e organizativo da Escola Itinerante,

compreendem-se crianças, jovens e adultos, que se envolvem na gestão, discussão e planejamento de diversas práticas educativas dela. (MST, 2006, p. 32).