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CAPÍTULO III – A CONSTRUÇÃO DE ESPAÇOS DE PLURALIDADE RELIGIOSA

ESPAÇO DE ABERTURA AO CRISTIANISMO REFORMADO

5. PARTIDO REPUBLICANO PORTUGUÊS: ESTRUTURAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO

A implementação do republicanismo e a consolidação de uma estrutura par- tidária alicerçada nesse ideário, partindo de uma base teórica, desenvolveram-se também através de momentos dinamizadores que funcionaram como motores de expansão do movimento.

92 Amadeu Carvalho Homem – A Ideia Republicana em Portugal: o contributo de Teófilo Braga. Coimbra:

Livraria Minerva, 1989, p. 199. Acrescenta-se ainda, ao longo da análise desse contributo, que, de acordo com Teófilo Braga, ao serviço dessa ofensiva teocrática, estavam duas armas essenciais: «A confissão auricular como devassa do mais íntimo reduto da consciência e como instrumento de fanatização e uma pedagogia sobrecarregada de erudição humanística e divorciada calculadamente do criticismo científico,[...]» (Amadeu Carvalho Homem – A Ideia Republicana em Portugal, p. 199). Note-se a aproximação destas críticas em relação a algumas das demarcações e críticas das comunidades evangélicas em relação ao catolicismo.

93 Maria Lúcia de Brito Moura – A Guerra Religiosa na Primeira República: crenças e mitos num tempo de

utopias. Lisboa: Editorial Notícias, 2004, p. 137.

Nas últimas décadas do século XIX, o diagnóstico da situação nacional era largamente ditado por aquilo que se transmitia nos meios de comunicação de massas, quer jornalísticos quer literários. No interior dessa análise a questão da nacionalidade e da identidade colectiva eram tomadas como fundamentais, tanto na descrição como na solução do problema, pelo que se procurou delinear uma metodologia capaz de responder a esses requisitos identitários.

A comemoração do tricentenário da morte de Camões, em 1880, foi parte integrante desses desideratos. As comemorações tiveram origem na iniciativa de uma comissão de imprensa composta por membros de diferentes campos ideoló- gicos, mas foram essencialmente programadas por Teófilo Braga e aproveitadas, em termos propagandísticos, pelo movimento republicano.

Nesse mesmo ano, recorde-se, fundava-se a Igreja Lusitana, cujas preocupações não estavam distantes desse reclamado reforço identitário do país94. Anos mais tarde, o tricentenário seria recordado, por membros da então fundada ILCAE, como uma celebração «[...] que congregou tantos e tão sinceros esforços do escol da Nação, no desejo de se sair da “apagada e vil tristeza” que o Épico lamentara, certamente os reorganizadores da Igreja Lusitana juntavam o seu entusiasmo cívico ao seu fervor religioso, naqueles dias em que convidavam todas as congregações evangélicas a unirem-se [...]»95. Nesse sentido, o esforço patriótico funcionava tam- bém como uma plataforma onde se congregavam apoios diversos, sendo que, entre eles, se destacavam posições substancialmente diferentes em termos das atribuições fornecidas ao universo do religioso nesse mesmo patriotismo.

Nesse processo, representou também um papel verdadeiramente essencial o

Memorandum inglês de 1890, uma nota diplomática interpretada e cristalizada

como como um verdadeiro Ultimato. No debate que se lhe seguiu, muito para além da questão específica integrada nessa nota e da respectiva resposta portu- guesa, discutia-se um problema com muito maior amplitude, relativo à denúncia da incompetência da dinastia e à situação colonial como um todo. Essa discussão foi eficazmente capitalizada pelo republicanismo que a utilizou como argumento fundamental naquilo que considerava ser a defesa dos interesses nacionais e da integridade territorial do reino português. A partir de então, o movimento repu- blicano centrou-se na luta pela demonstração de que a causa monárquica era

94 A ILCAE surgiu como uma resposta aos desideratos de alguns dos membros das comunidades reformadas

relacionados com a criação de uma igreja episcopal e nacional, com tendências regalistas e com planos de unificação da minoria protestante em Portugal, apresentando-se «[...] à pequena cristandade portuguesa dissidente de Roma como o meio mais inteligente, lícito e directo de união dos crentes cristãos, e o lídimo processo de restauração da Igreja nascida das missões primitivas, enviadas no século III ao extremo Ocidente da Europa» (Eduardo Moreira – Esboço da História da Igreja Lusitana, p. 7). Depositavam-se na ILCAE, verdadeiro projecto do protestantismo português, expectativas elevadas acerca da manutenção e desenvol- vimento do futuro do mesmo, na medida em que a igreja era perspectivada como um instrumento capaz de transformar verdadeiramente o papel dessa minoria no interior da sociedade portuguesa.

95 Eduardo Moreira – Esboço da história da Igreja Lusitana, 26.

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antónima da causa nacional, na medida em que a primeira não só não garantia a defesa da segunda como lhe era prejudicial96. Ao mesmo tempo, a «[...] questão

das possessões ultramarinas constituía um dos pontos em comum entre os interes- ses da Monarquia liberal e a Igreja Católica [...]»97, uma vez que ambas investiam no esforço missionário, designadamente através dos meios e benefícios integrados no sistema do Padroado. Desse modo, esta era também uma das vias de associação entre causa monárquica e catolicismo e de crítica conjunta em relação a ambas, potenciada tanto por núcleos políticos, designadamente os republicanos, como por núcleos religiosos, nomeadamente os protestantes.

O Memorandum inglês de 1890 e a reacção da Monarquia portuguesa perante esse episódio acabaram então por se constituir como um momento essencial na expansão do PRP, cujo desenvolvimento tinha sido algo fragmentado até então. É certo que, já em 1876, a constituição do Centro Republicano Democrático de Lisboa se desenvolvera como uma tentativa de unificação de elementos diversos. Essa foi um período fundamental de formação e, simultaneamente, de inovação, na medida em que o PRP procedeu à substituição da lógica vertical, tradicio- nalmente adoptada pelos partidos monárquicos, por uma lógica horizontal e de tendência federalista. Enquanto os partidos monárquicos eram partidos de notáveis, com definições subsequentes de redes, que acompanhavam geralmente a rede administrativa do país, e estruturação de um sistema claramente oligárquico e de caciquismo local, o Partido Republicano tendeu a desenvolver-se como um partido de massas, apoiado na criação de comités eleitorais, núcleos informais de republicanos, sociedades de pensamento, publicação de jornais e de revistas e criação de escolas. Deste modo, o próprio sistema organizativo do partido, e não apenas a sua base ideológica, proporcionou a recepção de elementos protestantes, até aí reservados a uma segregação, baseada numa postura legislativa punitiva e numa mentalidade católica discriminadora.

No entanto, o ambiente gerado em torno da problematização do Ultimatum, proporcionou também a discussão de elementos que, potencialmente, poderiam ter constituído barreiras à integração dos cristãos evangélicos naquele tipo de

96 Guerra Junqueiro afirmava em 1896: «O republicanismo não é aqui uma fórmula de direito público; é a

fórmula extrema de salvação pública. [...] Republicano e patriota tornaram-se sinónimos. Hoje quem diz pátria, diz república. Não uma república doutrinária, estupidamente jacobina, mas uma república larga, franca, nacional, onde caibam todos. Não dum partido, da nação.» (Guerra Junqueiro – Pátria [1ª edição 1896]. Porto: Lello e Irmão, [s.d.], p. 200).

97 António Matos Ferreira – Repercussões do Ultimatum no meio católico (Notas acerca do nacionalismo

católico). Lusitania Sacra. 6 (1994), p. 31. O autor esclarece ainda: «A Coroa procurava salvaguardar o mais possível as potencialidades que o Padroado lhe conferia para exercer uma soberania ou para intervir em territórios além-mar, que as vicissitudes da política das grandes potências tendiam a limitar. Por outro lado, a Igreja Portuguesa procurava destacar o valor da sua acção missionária e a necessidade de se aumentar e apoiar o pessoal missionário[...]» (António Matos Ferreira – Repercussões do Ultimatum no meio católico, p. 31).

movimentos políticos. A multiplicação de reacções antibritânicas98 que foi também parte integrante do debate sobre a nacionalidade, potenciou a acusação de alguns sectores do catolicismo romano em relação a uma eventual associação entre o protestantismo português e os desideratos dominadores britânicos, definindo as denominações evangélicas como forças desnacionalizadoras.

De facto, o ambiente criado em torno do conflito diplomático resultou na imposição de algumas limitações no que dizia respeito ao apoio britânico em relação às comunidades protestantes portuguesas. Situação em muito condicio- nada pelo facto dos próprios cidadãos britânicos perspectivarem a atmosfera como potencialmente perigosa. A 22 de Janeiro de 1890, a Legação Britânica em Lisboa apelava «[...] to the most serious attention of the Government of His Faithful Majesty to the risk to which the persons and property if British Subjects are at the present exposed in the city of Oporto [...]», testemunhando que «[...] placards were distributed yesterday and the previous day in thousands in the streets of Oporto [...] calling upon the Portuguese People “so soon as the English Fleet shall appear in the Tagus to rise in arms and slay every Englishman in the Kingdom” [...]»99 e concluindo com uma solicitação do envio de ordens para as autoridades

portuenses e um pedido explícito de protecção dos súbditos britânicos na cidade. De qualquer modo, a situação não se revelou tão perigosa quanto temida e, em relação à questão específica do suporte inglês da estruturação do protestantismo português, o mesmo conservou-se e continuou durante as décadas seguintes a desempenhar um papel essencial nesse campo. Alguns dos membros dessas comu- nidades assumiram inclusivamente a defesa da aliança luso-britânica e dos serviços que a mesma prestou a Portugal100.

Ao mesmo tempo, existiam também no interior do movimento republicano, posições que, rejeitando aquela postura anti-britânica, tendiam a aproximar-se precisamente dessa defesa da aliança. Bernardino Machado seria lembrado como

98 A título de exemplo refira-se o «Manifesto da Associação Comercial de Coimbra contra o Ultimato

Attentado Britannico», incluído em anexo na correspondência do MNE português e a Legação Portuguesa em Londres nesse início de ano de 1890, onde se afirmava: «É preciso dizer-se bem alto a todo o mundo; que o povo portuguez o saiba: a Inglaterra tem sido para Portugal um amigo hypocrita e desleal, um tutor criminoso, além de desnecessário, um alliado traiçoeiro [...] aproveitando a nossa fraqueza politica, illudindo a nossa boa fé, abusando talvez da nossa ingenuidade [...] para melhor poder justificar a sua odiosa e degra- dante tutela, a nossa ignominiosa vassalagem!» (Arquivo Histórico Diplomático – MNE – Documentação guardada no Depósito do Palácio Velho – Soberania de Portugal na Zambézia [1890]).

99 Arquivo Histórico Diplomático – MNE – Documentação guardada no Depósito do Palácio Velho –

Soberania de Portugal na Zambézia (1890).

100 Eduardo Moreira lembraria, anos mais tarde: «A suspeição nacionalista que tem registado com mórbida

insistência as ambições dos imperialistas ingleses, esquecendo ou apoucando os reais serviços que a aliança anglo-lusa nos prestou em variadas circunstâncias, teve a sua máxima crise quando a concepção colonial portuguesa de posse, fundada na tradição histórica do descobrimento, se chocou com a concepção britâ- nica, baseada na ocupação territorial permanente, até que o “ultimatum” de Lorde Salisbury, de 1890, viria manifestar manifestações populares de forte protesto» (Eduardo Moreira – Vidas Convergentes, 205).

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um republicano que, no início do século XX, quando a maioria dos dirigentes republicanos era marcadamenta anti-britânica, defendeu a aliança anglo-lusa como «[...] a ligação entre dois povos que tinham o Atlântico a uni-los e frontei- ras comuns nas províncias ultramarinas, povos que tantas emergências históricas havia aproximado e feito confraternizar, na paz como na guerra. Ela devia ligar sempre as duas nações, independentemente dos seus regimes»101. Também neste

campo se demonstrava que a heterogeneidade republicana criava as condições para que se multiplicassem os pontos de abertura e potencial convergência com as posições evangélicas.

Na verdade, tanto na metrópole como no Ultramar, não existiram sinais claros de que a tentativa de orientar o sentimento antibritânico contra o cris- tianismo reformado tenha tido concretizações práticas, como aliás se demonstra pela progressiva abertura dos sectores republicanos relativamente ao apoio dos protestantes.

Portanto, e recapitulando, na década de setenta desenrolou-se assim esse período essencial de formação, durante o qual o PRP se desenvolveu mais como uma frente política do que propriamente como um partido organizado. Durante a década de oitenta, motivado por acontecimentos como o tricentenário de Camões, «[...] que electrizou uma boa parte da Nação – a mais consciente e inquieta – e deus ensachas aos elementos liberais [...]»102, o PRP iniciava a estruturação de uma

rede alargada que acabaria por ser consolidada por ocasião do referido Memo-

randum, transformado num momento de solidificação da diversificada família

republicana em torno de um verdadeiro movimento nacional. O Partido Republi- cano Português acabou então por se constituir como o «[...] primeiro “partido de massas” existente em Portugal [mobilizando] um vasto universo social, unificado em grande parte pela dimensão ideológica»103. A cristalização desse ideário repu-

blicano materializou-se na redacção do Manifesto e Programa de 1891.

Elaborado pelo Directório, nascido do Centro Democrático Republicano de Lisboa, o programa definia o PRP como um partido nacional de vanguarda e de planificação científica. Contrapunha-se então ao obscurantismo monárquico e reaccionário, um progressismo idealizado na figura da República. Encetado com a definição da liberdade e da igualdade política, o Manifesto desdobrava-se num primeiro parágrafo dedicado à organização dos poderes do Estado, e num segundo parágrafo referente à clarificação das “liberdades essenciais”, “liberdades políticas” e “liberdades civis”. O conteúdo deste último parágrafo foi fundamental no encontro

101 Depoimento de Ângelo Vaz, 1950 citado por A. H. de Oliveira Marques e Fernando Marques da Costa –

Bernardino Machado. Lisboa: Montanha, 1978, p. 98.

102 Eduardo Moreira – Vidas Convergentes, p. 359.

103 Ernesto Castro Leal – Partidos e grupos políticos na I República. In História de Portugal dos tempos

pré-históricos aos nossos dias. Direcção de João Medina, vol. 10, Alfragide: Ediclube, 1998, p. 287.

entre o republicanismo e o protestantismo, uma vez que advogava princípios tão essenciais como os de: liberdade de consciência, e igualdade civil e política para todos os cultos; abolição do juramento religioso nos actos civis e políticos; registo civil obrigatório para os nascimentos, casamentos e óbitos; liberdade de imprensa, de discussão e de ensino; ensino elementar obrigatório, secular e gratuito; secu- larização dos cemitérios e criação de um Panteão nacional; e a harmonização e simplificação dos Códigos civil, criminal, administrativo, comercial e de processo com o espírito filosófico e resultados científicos modernos.

Esse encontro, fundamentalmente baseado em conteúdos doutrinais, foi também potenciado pelas semelhanças em termos de distribuição geográfica, na medida em que, tal como o protestantismo, o republicanismo também se desen- volveu como um fenómeno eminentemente urbano104, sendo que o seu desen- volvimento se caracterizou por um forte domínio da cidade de Lisboa e por uma abrangência restrita e pouco estável105. Assim sendo, apesar de existirem, de facto,

elementos consistentes que proporcionam um encontro baseado em princípios partilhados, importa também ter em conta, uma certa permeabilidade do movi- mento republicano, já que a irradiação do PRP à escala nacional, não correspondeu necessariamente a um esclarecimento geral acerca da ideologia sobre a qual o mesmo se estruturava, no sentido em que muitos republicanos jamais haviam lido «[...] o programa ou os manifestos do seu Partido. Sobre a futura República não tinha[m] ideias definidas. [...] ser republicano, por 1890, 1900 ou 1910, queria dizer ser contra a Monarquia, contra a Igreja e os Jesuítas, contra a corrupção política e os partidos monárquicos. Mas a favor de quê?»106. As respostas eram

diversas e significativamente subjectivas, no sentido em que cada um procurava nessa República já mitificada a resposta aos problemas que diagnosticava ao país. A diversidade de apoios que daí resultou, teve origem fundamentalmente nesse entendimento do republicanismo como uma forma de protesto, mais do que como uma ideologia positiva107.

104 A análise da distribuição geográfica dos centros republicanos nas décadas de oitenta e noventa do século

XIX traduz um domínio claro da cidade de Lisboa, seguida, com grande distância, do Porto, e complemen- tado com a pulverização de pequenos centros em Aveiro, Barcelos, Tomar, Santarém, Chamusca, Évora, Sines, Grândola, Faro, Olhão e Tavira.

105 Em 1896, Guerra Junqueiro descrevia o partido republicano como um movimento «[...] quase circuns-

crito a Lisboa, avolumando ou diminuindo segundo os erros da monarquia, hoje aparentemente forte e numeroso, amanhã exaurido e letárgico, - água na poça inerte, transbordando se há chuva, tumultuando se há vento, furiosa um instante, imóvel em seguida, e evaporada logo, em lhe batendo dois dias o sol ardente; um partido composto sobretudo de pequenos burgueses da capital, [...]» (Guerra Junqueiro – Pátria, p. 187).

106 A. H. de Oliveira Marques – História da Primeira República Portuguesa, p. 544.

107 Um dos mais importantes representantes do republicanismo em Portugal, reconhecia, ele próprio, nesse

movimento de finais do século XIX, «[...] um partido, enfim, de índole estreita, acanhadamente político- eleitoral, mais negativo que afirmativo, mais de demolição que de reconstrução [...]» (Guerra Junqueiro – Pátria, p. 188).

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Essa permeabilidade atraiu decerto parte do apoio de alguns sectores evan- gélicos, que valorizavam alguns aspectos do ideário republicano e partilhavam algumas das suas exigências. No entanto, os exemplos que se seguem não eram propriamente desconhecedores dos conteúdos da doutrina republicana, visto que a sua formação e sobretudo os seus escritos, tendem, como se verá, a indicar o contrário. Apesar de tudo, esse conhecimento de causa, não invalida que algumas dessas figuras do protestantismo português tenham acabado por se juntar ao grupo dos desiludidos da República, constatando, no processo de estruturação da I República que aquele regime não correspondia aos seus desideratos.

As quatro figuras em destaque: Eduardo Moreira, Pedro Castro da Silveira, Alfredo Henrique da Silva e Guilherme Dias da Cunha, plenamente integrados na comunidade protestante portuguesa, onde exerciam inclusivamente cargos de lide- rança, protagonizaram uma aproximação com o republicanismo que, alicerçada na definição teórica progressista do movimento, se completou com a consolidação prática do partido em finais do século XIX e início do século XX.

Nesse período integraram o Partido novos membros cuja acção se revelaria essencial na afirmação e representação política do mesmo. Em 1900, Afonso Costa foi eleito deputado pelo Porto e encetou a construção da sua reputação parlamen- tar e em 1903 Bernardino Machado aderiu ao partido. Ao mesmo tempo que o segundo trazia consigo o projecto de combate político baseado num programa sensato e próximo de um republicanismo académico, o primeiro e muitos dos que, consigo, dinamizaram esse período, desenvolveram o carácter subversivo dessa mesma organização e a eficácia conspirativa das suas acções. Alargando o espectro da pluralidade republicana, essa combinação potenciava a expansão do campo de acção e da área de influência do PRP. Em 1906, ano da chegada ao poder do governo ditatorial de João Franco, foram eleitos para a Assembleia quatro candi- datos republicanos: Afonso Costa, António José de Almeida, Alexandre Braga e João de Meneses. Nesse mesmo ano, Eduardo Moreira108 fez-se membro do Partido

Republicano Português109.

Essa filiação baseou-se, antes de mais, no entendimento do republicanismo como a via através da qual se chegaria à liberdade de cultos. Esse terá sido, muito

108 A esse propósito é caracterizado por Maria Albertina Viana como «um caso especial no mundo pro-

testante, ao nível do envolvimento de um personalidade no campo da acção religiosa e da acção política» (Maria Albertina Henriques Viana – Eduardo Moreira: um construtor da diferença. Porto: [s.n.], 1999, Texto policopiado, p. 263-264).

109 António Ventura afirma acerca desses anos que antecedem a instauração do regime republicano: «Sem

dúvida que os anos que decorrem entre a ditadura franquista e o 5 de Outubro de 1910 são fundamentais na divulgação do ideário republicano através da imprensa, do comício e da conferência, mas também se robusteceram as estruturas secretas nascidas na viragem do século e que então ganharam uma nova dinâ- mica, tendo na instabilidade política um clima favorável, e no descontentamento popular um campo fértil para o recrutamento e para a defesa da opção revolucionária». (António Ventura – Anarquistas, republicanos

e socialistas em Portugal: as convergências possíveis (1892-1910). Lisboa: Edições Cosmos, 2000, p. 11).

provavelmente, o principal fundamento das diversas aproximações entre protes- tantismo e republicanismo.

A ênfase dada aos princípios da liberdade e da igualdade, marcadamente presente desde a origem no ideário republicano, constituiu portanto um pólo de atracção fundamental para os sectores protestantes. Eduardo Moreira, como grande parte dos cristãos evangélicos, reivindicava a instituição de um ambiente