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4.4 Os ataques terroristas de 11 de setembro e seus reflexos nos EUA

4.4.1 O Patriot Act

Três dias após os trágicos acontecimentos, o Governo dos EUA declarou Estado de Emergência através da Proclamation Nº 7463, 66 Fed. Reg. 48,199. Com esta medida o “...Congress authorized the president to use ‘all necessary force’

against those responsible. On September 20, the president vowed to meet this threat by using ‘every resource at our command,’ including ‘every necessary weapon of war.”314.

Ato contínuo foi concebido o Patriot Act: Patriot — Provide Appropriate

Tools Required to Intercept and Obstruct Terrorism, um pacote legislativo aprovado

sem consulta popular e cujo fundamento consistiu na manutenção da ordem e da segurança. Desde então a mitigação de Direitos Fundamentais nos EUA foi legalmente assegurada.

The final version of the PATRIOT Act that was passed into law was rewritten between midnight and 8 o'clock in the morning behind closed doors by a few unknown people, and it was presented to Congress for a one-hour debate and an up or down vote," U.S. Rep. Peter DeFazio, D-Ore,' said in a telephone interview from his Oregon office. "It was hundreds of pages long, and no member of Congress can tell you they knew what they were voting

       313

HEYMANN, Philip B; KAYYEM, Juliette N. Long-Term Legal Strategy Project for Preserving Security and Democratic Freedoms in the War on Terrorism. At Harvard University. 2004. Disponível em: <http://www.mipt.org/pdf/Long-Term-Legal-Strategy.pdf> Acesso em: 19/07/2008.

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MARGULIES, Joseph. Guantánamo and the abuse of Presidential Power. New York: Simon & Schuster, 2006, p. 20.

for in its entirety. It was time to be stampeded, and who wanted to be against the USA PATRIOT Act at a time like that315.

Tal ato contém uma série de provisões que ampliam os poderes de investigação do Estado, restringindo regras constitucionais de privacidade firmadas pelo histórico das decisões da suprema corte americana. O objetivo deste trabalho não é tanto identificar pontualmente quais as provisões e como estas estão a anular direitos e garantias fundamentais, mas demonstrar que tal diploma se tornou um mecanismo para contornar as limitações do Estado frente aos cidadãos. Perceba-se que tais limitações são, por sua vez, um dos elementos da própria essência do Estado de Direito, enquanto integram o Bill of Rights.

O Patriot Act ameaça a ordem constitucional americana. Perceba-se que se trata de um diploma editado de forma legal, aprovado com uma ampla margem no congresso. Não obstante, está a fundamentar uma série de práticas que vão de encontro à própria tradição constitucional americana, demonstrando claramente indícios de um estado de exceção inconstitucional.

John Yoo ao tratar do tema destaca, entretanto, uma possível análise retórica sobre o Patriot Act, segundo a qual muito se recrimina a lei, sem que se aprecie efetivamente os precedentes históricos da mesma. Apesar das críticas contumazes, há alterações legislativas subseqüentes que a coonestam. Na exata lição do professor de Berkeley: “It suggested the government might be poised to

abridge civil liberties under the sheep’s clothing of patriotism. Its eventual reenactment suggested that the most scathing criticisms were more rhetorical than real.”316

Para não incorrer no problema apontado, cumpre considerar o Foreign

Intelligence Surveillance Act of 1978 – FISA – ato concebido como maneira de

responder a ameaças nacionais que deveriam ser tratadas em segredo. Com esteio na inadequação do uso de procedimentos aplicáveis aos crimes comuns em caso de ameaças à segurança nacional e para fazer frente à espionagem, o FISA foi o

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PHILLIPS, Heather A. Libraries and National Security Law: An Examination of the USA Patriot Act. Progressive Librarian, Vol. 25, Summer 2005. Disponível em <http://ssrn.com/abstract=901266> Acesso em: 15/06/2008, p. 28.

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YOO, Jonh. War by Other Means. An Insider’s Account of the War on Terror. New York: Atlantic Monthly Press, 2006, p. 74-75.

“...primary tool to monitor and intercept the communications of national security threats, in the age of rotary phones, Ma Bell, and expensive air travel.”317

Ele permitia que a quarta Emenda não fosse aplicável na consecução de mandados. Desta forma, não havia necessidade de indicar “causa provável” do cometimento de um crime pelo indivíduo sob investigação, bastava tão somente uma possível ligação do indivíduo com redes internacionais de terrorismo.

Assim, práticas diferenciadas de investigação entre crimes comuns e células terroristas já existiam desde o FISA. O Patriot Act cuidaria apenas de uma forma de atualizar as medidas já existentes aos novos tempos de viagens rápidas, telefones celulares e Internet.318 Ademais teria ainda como proposta facilitar a comunicação e cooperação entre as agências norte-americanas: a CIA e o FBI. Mas este objetivo não foi alcançado.319

Não fosse apenas a velocidade da difusão das ameaças, há dificuldades adicionais nos interrogatórios de acusados de terrorismo. A al-Qaeda tem um manual de procedimentos e se utiliza do sigilo em suas operações. A identidade dos membros é resguardada, sobretudo, pela independência de cada célula. Quando o membro de uma célula é capturado, geralmente, recusa-se a falar. E mesmo que delate as atividades, só irá prejudicar o grupo do qual fazia parte, permitindo a continuidade das ações independentes.320 Eis alguns fatos que demonstram a necessidade de subterfúgios tecnológicos a auxiliarem as autoridades.

O raciocínio de que há desigualdades entre crimes comuns e os cometidos por redes terroristas é válido. A atuação preventiva pode ser o diferencial para evitar ataques terroristas e salvar inúmeras vidas. Porém, o debate acerca dos limites de atuação é igualmente relevante. Sem a verificação destes o Estado de Direito pode se tornar um Estado de exceção inconstitucional que mais ameaça do que assegura seus cidadãos.

O Patriot Act prevê um conceito elástico de terrorismo, englobando atividades que originem atos perigosos à vida humana, que pretendam intimidar ou coagir a população civil para influenciar a política do governo, ou que visem alterar a conduta do governo utilizando-se de destruição em massa, assassinatos ou        317 Ibidem, p. 71-72. 318 Ibidem, p. 71. 319

CRETELLA NETO, José. Terrorismo Internacional. Inimigo sem rosto – Combatente sem Pátria. São Paulo: Millennium, 2008, Cap. V e VIII.

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MARGULIES, Joseph. Guantánamo and the abuse of Presidential Power. New York: Simon & Schuster, p. 20.

seqüestro. A amplitude da definição de terrorismo permite que as disposições do

Patriot sejam vastamente utilizadas.

As disposições previstas em mais de 300 artigos permitem desde amplo acesso a dados de e-mails e ligações telefônicas sem autorização judicial individualizada à utilização da prisão como meio investigativo. Ademais, proíbe que os detidos tenham acesso particular ao advogado. O monitoramento de telefones e e-mails atinge mais a população civil que propriamente os envolvidos com terrorismo, sendo, por estes, crescente a utilização de walkie-talkies e comunicação por meios eletrônicos cifrados e enviados não pela internet, mas por mensageiros.

O malferimento ao Bill of Rights é enorme e o Patriot Act precisa ser revisto. Não obstante, a medida acabou por ser renovada e a permanência das medidas já se desvinculou há tempos do fato gerador inicial. Critica-se, assim, a prevalência dos meios de monitoramento sobre as previsões e garantias do Bill of Rights.