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CAPÍTULO II CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE SOBRE:

2. PAULO FREIRE: ASPECTOS GERAIS DE SUA OBRA

2.2. EDUCAÇÃO, EMANCIPAÇÃO E CIDADANIA EM PAULO FREIRE

2.2.2 Paulo Freire e a Emancipação

A emancipação, na obra de Paulo Freire, em um primeiro momento constitui- se em uma busca pelo contraditório, uma vez que o autor analisa e compreende a sociedade, a partir da relação: opressor-oprimido. O primeiro oprime o segundo e, desta relação, advém a necessidade da busca pela emancipação, uma vez que indivíduo emancipado é aquele que se exime do poder ou da tutela do outro. É o que se torna independente, liberto. É porque os oprimidos vivem sob os ideais dos opressores. Por isso, eles sentem necessidade de buscar a libertação.

Somente os oprimidos podem libertar os seus opressores, libertando-se a si mesmos. [...] É, pois essencial que os oprimidos levem a termo um combate que resolva a contradição em que estão presos, e a contradição não será resolvida senão pela aparição de um “homem novo” e nem o opressor nem o oprimido, mas um homem em fase de libertação (FREIRE, 1987, p. 59).

Nota-se que o autor faz referência acentuada à luta pela emancipação, dizendo que ela perpassa necessariamente pela ação dos oprimidos à busca da superação e da contraditória relação opressor-oprimido. Ressalta, ainda, que tanto, há de se confiar no próprio homem e na sua capacidade de tornar-se um “homem novo”. Isto é, um homem livre e de relações iguais. Neste sentido, Freire (1979) lembra a necessidade de uma educação humanizante, potencializadora e libertadora. Só assim superará a alienação e alcançará a mudança social necessária ao fim da opressão de um homem sobre o outro.

A emancipação, sob esta ótica, consiste em um movimento de libertação que é capaz de fazer o ser humano sentir-se sujeito de si próprio e como sujeito de si sentir-se também sujeito social e, como tal, constituir-se ele próprio em instrumento da própria libertação. No entanto, conforme alerta Freire (1979), é preciso que antes o ser humano tome consciência de si e do mundo, para que daí parta em luta e construa sua liberdade e sua emancipação.

Nesta perspectiva, em consonância com Freire, Adorno lembra:

Emancipação é um movimento de libertação consciente e de superação das formas de alienação material e simbólica, coletiva e individual. A ação emancipatória é o meio pelo qual rompemos com a barbárie do padrão vigente de sociedade e de civilização, em um processo que parte do contexto societário em que nos movimentamos do “lugar” ocupado por cada sujeito, estabelecendo experiências formativas, escolares ou não, em que a reflexão crítica e a problematização, apoiadas numa ação

consciente e política, propiciam a construção de sua dinâmica (ADORNO, 2000, p.76).

A posição de Adorno em relação a emancipação aponta para a capacidade humana de optar por decisões conscientes e libertas, através de uma consciência verdadeira, articulada a superação da alienação e a uma concepção de sociedade em que a reflexão crítica e problematizada. A partir da consciência política, leva a ideia de uma sociedade que superando a alienação constitui-se como democrática. Observa-se, porém que, na sociedade moderna, cada vez mais a emancipação se parece com um sinônimo abstrato, precisando ser inserido nos modos de pensar e nas práticas educativas, uma vez que constitui-se como elemento fundamental no enfretamento à opressão e às ideologias dominantes.

O homem emancipado é um homem consciente. É aquele que possui racionalidade e clareza política suficiente para compreender o meio onde está inserido – a realidade - e para engajar-se na luta pela libertação. Porém, não se pode ignorar a advertência de Freire, eu afirma sobre a necessidade de problematizar o modo como se educa para a libertação. Do contrário não há emancipação nem conscientização. Argumenta que, a emancipação humana é fruto de uma luta ininterrupta, uma conquista da práxis humana, uma vez que a emancipação caracteriza-se pelo próprio processo de humanização tanto do oprimido, quanto do opressor (FREIRE, 1987).

Conforme se pode observar, a obra de Paulo Freire aponta, a partir de sua concepção de educação, uma busca pela humanização, libertação, conscientização e pela emancipação humana. Reconhece que o homem, por sua natureza, constitui- se como um ser histórico-social “predestinado” à liberdade e à busca contínua de possibilidades de vivência para sua emancipação – sua autonomia.

A emancipação consiste em ações cotidianas ao mesmo tempo desafiadoras e possibilitadoras de transformação. Porém, não se pode ignorar que tais ações não são, nem serão, propostas pela classe dominante, uma vez que esta não tem interesse na libertação. São ações propostas pelos oprimidos, pois estes sim são movidos pelo desejo de libertação, uma vez que, pode-se dizer, sonham com a liberdade, igualdade e a justiça social, já que a opressão não lhes permite “ser mais”.

Fato é, também, que a emancipação, assim como a libertação, constitui-se em processos sociais, e por ser processo, encontra-se sempre em construção. Na

concepção de Paulo Freire, isso se configura como uma vivência que o homem experiência cotidianamente e não como algo que está postergado deliberadamente ao futuro, o qual será ou poderá ser vivenciado por outros homens. Freire acredita que todo homem tem direito de viver sem ser explorado e, consequentemente, viver a liberdade com autonomia. Para que isso ocorra é necessário que se desenvolvam práticas emancipatórias.

Por outro lado, não se pode ignorar que a emancipação é algo que não se pode desejar e construir facilmente nem de forma simplificada. Isso é perceptível, exatamente, por envolver uma sociedade de classes em que os interesses são contraditórios, pois a relação opressor-oprimido não é uma relação de autonomia. E, ao concordar que envolve uma sociedade de classes, sem autonomia, concorda-se, também, que se está diante de uma sociedade capitalista, por valorizar, sobretudo, o capital. Não valorizar as relações humanas, a liberdade, os desejos individuas e coletivos e tão pouco, o próprio ser humano. Deste modo, não fica difícil ver que não se esta diante de uma sociedade humanizada, justa e democrática, mas sim, diante de uma sociedade contraditória, injusta, opressora e antidemocrática.

Desta forma, parece possível anotar que a emancipação, propriamente dita, somente seria possível de ser construída no contexto de uma sociedade democrática, uma vez que ela exige o exercício da liberdade e da autonomia de uma prática não alienada, bem como o exercício da igualdade e de uma participação política ativa na vida da sociedade, pois exercer a emancipação constitui-se no exercício efetivo dos direitos e dos deveres sociais e políticos, a um só tempo nos âmbitos individual e coletivo. Uma sociedade capitalista dificilmente possibilita isto, tendo em vista que exercer a emancipação envolve ainda e, sobretudo, os preceitos éticos que regem a liberdade, a justiça, a dignidade e a igualdade humana, que, evidentemente, não são práticas capitalistas. Contudo, ainda assim é possível construí-la se há busca pela superação às ideologias dominantes.

Neste ponto, como processo gradativo de amadurecimento, que ocorre a partir da capacidade que o homem possui de decisão, e ao mesmo tempo, de responder pelas consequências que uma determinada decisão pode causar o conceito de autonomia, por isso, constitui-se como indissociável ao conceito de emancipação. “O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros” (FREIRE, 1996, p.66).

A autonomia enquanto amadurecimento do ser para si,é processo, é vir a ser. Não ocorre em data marcada. É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em experiências respeitosas da liberdade (FREIRE, 1996, p. 121).

Outro elemento importante que Paulo Freire destaca quando fala de emancipação, diz respeito à alfabetização. O homem alfabetizado não aprende ou sabe ler a palavra apenas, mas lê o mundo, a realidade, ou seja, o meio ambiente onde está inserido. A alfabetização crítica, neste sentido, faz o indivíduo perceber as relações entre o econômico, o cultural, o político, o social e o pedagógico, instigando assim, seu desejo de conhecer e saber o mundo. Seu desejo de ser livre, isto é, seu desejo de emancipar-se, de ser autônomo.

A partir do destaque que se fez em relação aos conceitos de educação e emancipação em Paulo Freire, contando com a contribuição de outros autores, faz- se a seguir uma articulação destes dois conceitos com a concepção de cidadania de Paulo Freire. Contudo, é necessário refletir acerca da concepção de cidadania de Paulo Freire. Assim, inicia-se esta análise destacando que o autor lembra que, para chegar à cidadania é preciso alfabetizar-se primeiro. A alfabetização em Freire é, antes de tudo, um meio para chegar à cidadania, uma vez que, conforme já se mencionou acima, ao alfabetizar-se o homem não lê a palavra apenas, mas lê e vê o mundo. Freire (2011) defende a ideia de que a emancipação e a conscientização libertam e a educação possibilita viver a liberdade.