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Idealizado a partir de 1996, e publicado em 1999, os Parâmetros Curriculares Nacionais visam estruturar e delimitar o que se espera do ensino básico, no que diz respeito aos conteúdos educacionais, em complemento a Lei de Diretrizes e Bases, publicada em 1995.

Partindo de princípios definidos na LDB, o Ministério da Educação, num trabalho conjunto com educadores de todo o País, chegou a um novo perfil para o currículo, apoiado em competências básicas para a inserção de nossos jovens

na vida adulta. Tínhamos um ensino descontextualizado, compartimentalizado e baseado no acúmulo de informações. Ao contrário disso, buscamos dar significado ao conhecimento escolar, mediante a contextualização; evitar a compartimentalização, mediante a interdisciplinaridade; e incentivar o raciocínio e a capacidade de aprender. (PCNEM, 1999, p.4)

Os PCNs são divididos em três grandes áreas: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias; Ciências Humanas e suas Tecnologias. Neste trabalho, interessa-nos a primeira das três áreas.

Publicado em 1999, os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM) foram expandidos em 2002, com a publicação do PCN+. Na versão de 1999, a única referência ao estudo da coesão está presente nas indicações de estudo para Língua Estrangeira Moderna, no que se refere ao uso eficaz de mecanismos de coesão para produção da língua. A versão de 2002 conserva a mesma indicação com relação ao estudo de Língua Estrangeira, mas, enfim, passa também a tratar da coesão no ensino de Língua Portuguesa.

Estruturado ao redor das competências que o aluno deve adquirir (interativa, textual e gramatical), o PCN se volta, majoritariamente, para a questão da produção de textos escritos e orais, deixando de lado, momentaneamente, questões como o mero reconhecimento e classificação de formas, tão comuns no ensino. A primeira menção à coesão se encontra nas páginas 60 e 61.

Ser falante e usuário de uma língua pressupõe:

• a utilização da linguagem na interação com pessoas e situações, envolvendo: – desenvolvimento da argumentação oral por meio de gêneros como o debate regrado;

– domínio progressivo das situações de interlocução; por exemplo, a partir do gênero entrevista;

• o conhecimento das articulações que regem o sistema lingüístico, em

atividades de textualização: – conexão;

– coesão nominal; – coesão verbal;

– mecanismos enunciativos.

• a leitura plena e produção de todos os significativos, implicando: – caracterização dos diversos gêneros e seus mecanismos de articulação; – leitura de imagens;

– percepção das seqüências e dos tipos no interior dos gêneros;

– paráfrase oral, com substituição de elementos coesivos, mantendo-se o sentido original do texto. [grifo nosso]

Nota-se, neste trecho, uma preocupação metalingüística: cabe ao aluno conhecer quais são os elementos coesivos, aqui separados em coesão nominal e coesão verbal. No mesmo trecho, ao tratar da habilidade de realização de paráfrases, novamente, é citada a necessidade dos elementos coesivos. Apesar da falta de uma nomenclatura mais específica, podemos afirmar que o trecho se reporta a coesão referencial, tanto quando menciona a coesão nominal e coesão verbal, quando elege a “substituição de elementos coesivos, mantendo-se o sentido original do texto”, isto é, perpassando pela questão da manutenção de referentes, apesar da substituição das formas referenciais. Por outro lado, podemos também afirmar que há menção à coesão seqüencial, presente no item “conexão”, sobre a articulação na atividade de textualização.

A segunda menção se volta para o uso dos mecanismos de coesão na produção textual. Nas páginas 80 e 81,

De acordo com as possibilidades de cada gênero, empregar:

• mecanismos de coesão referencial (retomada pronominal, repetição, substituição lexical, elipse);

• mecanismos de articulação frasal (encaixamento, subordinação, coordenação);

• recursos oferecidos pelo sistema verbal (emprego apropriado de tempos e modos verbais, formas pessoais e impessoais, emprego das formas condicionais, privilégio das formas simples em relação às perifrásicas);

• recursos próprios do padrão escrito na organização textual (paragrafação, periodização, pontuação sintagmática e expressiva, e outros sinais gráficos); • convenções para citação do discurso alheio (discurso direto, indireto e indireto livre): dois-pontos, travessão, aspas, verbos dicendi, tempo verbal, expressões introdutórias, paráfrase, contexto narrativo;

• ortografia oficial do Português, desconsiderando-se os casos idiossincráticos e as palavras de freqüência muito restrita;

• regras de concordância verbal e nominal, desconsiderando-se os chamados casos especiais. [grifo nosso].

Como é possível ver, neste ponto, o texto do PCN se utiliza da expressão “mecanismos de coesão referencial”, enumerando quatro itens: retomada pronominal, repetição, substituição lexical e elipse. O item posterior, “mecanismos de articulação frasal”, pode ser entendido como a coesão seqüencial, já que se volta para o relacionamento entre sentenças. Não há, ao longo do

texto, maiores explicações sobre de que se trata cada mecanismo de coesão mencionado, tanto referencial quanto seqüencial.

Nas páginas 82 e 83, novamente, a coesão é citada como peça fundamental para compreensão de texto:

Outros procedimentos relativos ao desenvolvimento da competência gramatical, dessa vez mais relacionados à competência textual, e particularmente às noções de coerência e coesão no processamento do texto, são:

• comparar textos de diferentes gêneros quanto ao tratamento temático e aos recursos formais utilizados pelo autor;

• estabelecer relações entre partes de um texto a partir de repetição e substituição de um termo;

• estabelecer relações entre partes de um texto a partir de mecanismos de concordância verbal e nominal;

• estabelecer relação entre a estratégia argumentativa do autor, bem como os recursos coesivos e os operadores argumentativos usados por ele;

• analisar as relações sintático-semânticas em segmentos do texto (gradação, disjunção, explicação ou estabelecimento de relação causal, conclusão, comparação, contraposição, exemplificação, retificação, explicitação).

A necessidade de “estabelecer relações entre partes de um texto a partir de repetição e substituição de um termo” é a questão central da coesão referencial, isto é, perceber o entrelaçamento das sentenças como um todo unificado a partir da rede de relacionamentos criada com referentes e formas referenciais. No mesmo trecho, pela primeira vez, há menção à motivação argumentativa na escolha de mecanismos de coesão, seguida de uma enumeração de relações, obtidas entre sentenças a partir da coesão seqüencial.

Em resumo, o PCN+ trata da questão da coesão como elemento fundamental para compreensão e produção textual, fazendo-se valer, timidamente, de uma terminologia específica para abordagem do tema. A distinção entre coesão referencial e seqüencial é explicitada brevemente, já que os dois tipos são agrupados sob o mesmo rótulo de coesão, mas somente o primeiro recebe uma nomenclatura, até mesmo para suas situações particulares. A proposta do PCN+ quanto à coesão parece clara: a identificação e o conhecimento sobre os mecanismos devem servir como ponto de partida para seu uso, e não se restringir a uma atividade metalingüística de rotulação.