• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 4: LIMITES E POSSIBILIDADES PARA A GESTÃO

4.6 Articulação Intersetorial das Políticas Sociais no Atendimento à

4.6.1 Percepção dos sujeitos da pesquisa quanto à articulação

44 Relembrando que, esse item, aborda especificamente a pessoa idosa com comprometimento para

as AVDs.

45 Conforme estabelece o Estatuto do Idoso, em seu artigo 9o, “é obrigação do Estado garantir à

pessoa idosa a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade” (BRASIL, 2003).

Nas entrevistas realizadas com as pessoas idosas, foi frequente a centralização dos relatos em dificuldades relacionadas aos serviços de saúde.

Com exceção (conforme já assinalado) da Usuária 6, que mencionou ter contatado o CRAS para solicitar internação provisória para o marido que está com comprometimento para as AVDs, em decorrência de um AVC; e do Usuário 1, que relatou ter sido atendido pelo CRAS, para requerer a carteira de transporte interestadual.

Exemplificando com os relatos dos usuários:

O maior problema são as informações desencontradas, por exemplo, faço acompanhamento no Ambulatório de Especialidades, e é difícil para conseguir marcar retorno [...] pedem para você ligar para ver se abriu a agenda, mas aí você liga e o telefone só dá ocupado, e quando atendem falam que é para voltar a ligar porque a agenda já foi liberada e que não têm mais vagas (Usuário 1, entrevista).

Segundo o Usuário 3: “[...] aqui no Posto de Saúde, a comunicação é falha, até para informar quando vai começar a marcar consulta”.

A falta de comunicação entre os serviços de saúde, também é criticada pelo Usuário 5:

Falta um entrelaçamento melhor, vou citar um caso recente: minha esposa precisava fazer um ultrassom com Doppler, e o atendente da Santa Casa que a colocou na fila de espera, disse que poderia demorar até 2 anos para ela ser chamada [...]. Aí a gente procurou o posto de saúde e conseguimos antes. Então, poderia ter um diálogo melhor, entre os serviços, porque não me disseram: ‘procura o posto do seu bairro, quem sabe não consegue antes’. Eu vim e conversei, trocaram o pedido e ela conseguiu fazer o exame. Então, quem não vai atrás, fica esperando a vida inteira (Usuário 5,

entrevista).

Sobre a participação em atividades relacionadas à cultura e ao lazer, nenhum dos usuários frequenta os Bosques de Leitura existentes na região, três entrevistados informaram que participam de atividades desenvolvidas pelos Centros Educacionais Unificados (CEUs) e pelos Clubes Escolas. Conforme o discurso da Usuária 4, “eu participo do Clube Escola de Pirituba, e eu acho ótimo!”.

No que tange às entrevistas realizadas com os técnicos, em todos os depoimentos foram apontadas as implicações que as lacunas da rede ocasionam

para a articulação entre as políticas sociais, e – consequentemente – para o atendimento à população idosa.

Inicialmente, questionamos os profissionais a respeito de suas percepções quanto ao modo pelo qual as políticas sociais da região estão organizadas, se compreendem que há articulação intersetorial.

Segundo a Técnica 8, do Bosque de Leitura:

No parque, não sei se por ser um ambiente de natureza aberta, acredito que essa problemática acaba não aparecendo muito [...]. Acredito que quem vem, acaba procurando o lazer mesmo. Os questionamentos são mais sobre coisas do tipo: ‘ah, tinha um jornal ou uma revista, que agora não tem mais, vou reclamar com o diretor do parque’. Nunca chegamos a fazer um trabalho articulado, ou uma integração com outros serviços ou políticas. Mas considero que isso seria importante (Técnica 8, do Bosque de Leitura, entrevista).

A Técnica 4, do CRAS A, relata que, em certas ocasiões, até ocorre ‘alguma’ articulação entre os serviços, mas apenas em casos pontuais.

Ou a necessidade é nossa, aqui no CRAS, e nós vamos buscar; ou a UBS está com uma necessidade, liga e fala: ‘vou encaminhar para vocês’. Mas nem sempre os profissionais entendem as nossas limitações, como, por exemplo: ‘ah, vou encaminhar um usuário para vocês, para que ele receba uma cesta básica’, quando nós respondemos que, neste momento, não temos como atendê-lo, por que ainda não recebemos a cesta básica, nem sempre esse profissional entende, e questiona coisas do tipo: ‘ah, como é possível vocês não terem cesta básica?’[...] Também naquelas situações de ILPI, em que não temos vaga, ou quando o idoso não é perfil, a impressão é que nós não queremos colaborar, mas não é por aí [...] (Técnica 4, do

CRAS A, entrevista. Grifos nossos).

A Técnica 6, do CREAS A, também exemplifica:

Quando a gente liga na UBS, para falar de algum caso que tem relação com a questão de saúde e perguntamos se tem o PSF? E a resposta é ‘nós não temos o programa’, aí a gente pede para falar com algum profissional que possa conversar a respeito de um caso de violência, porque é necessário que seja feita uma visita, enfim [...]. A resposta que vem do outro lado é: ‘nós estamos com poucos funcionários, não temos como deslocar um funcionário para ir fazer essa visita’. Então é complicado! Porque a UBS também tem que disponibilizar um profissional (Técnica 6, do CREAS A, entrevista. Grifos nossos).

A Técnica 2, da UBS B, aponta o posicionamento da área da saúde: “Não temos o Programa Saúde da Família; temos poucos profissionais para atender, e

não conseguimos deslocar um profissional para ir à casa do usuário que está acamado para orientar a família do jeito que ela precisava ser orientada”.

Assim, a precariedade dos serviços limita a atuação dos profissionais e prejudica a comunicação entre eles.

E mesmo quando há comunicação para o atendimento de casos específicos/“pontuais”, não ocorre mudança na condição vivenciada por aquela pessoa idosa em atendimento, devido às lacunas existentes na rede de serviços.

Conforme relatado pela Técnica 1, da UBS A: “Às vezes, a gente até consegue ter um diálogo, mas não consegue uma resolução por causa da falta de serviços, que vão refletir na realidade daquela pessoa idosa”.

No mesmo discurso:

Acredito que o problema não seja a falta de comunicação, porque ligo para o CREAS para falar de alguns casos, o CREAS também liga aqui, e como aqui tem o PSF, alguns casos nós conseguimos acompanhar mais de perto. Mas, por exemplo, aquele caso que falei anteriormente, que precisava de uma internação [...]. Não tem mais como permanecer com a família, é um caso de violência, e a gente simplesmente não avança, porque as ILPIs não recebem idoso com dependência. Mas acho que, mesmo que não tivesse esse critério, não teria vaga para atender a esse usuário. [...] o problema está na falta de respaldo por parte das políticas públicas, porque, como é que a gente vai articular, se não tem o mínimo de resposta para atendimento dos usuários? (Técnica 1, da UBS A, entrevista).

Dessa maneira, os entraves enfrentados no cotidiano de atuação pelos profissionais – e pelos usuários que buscam os atendimentos – dificultam a comunicação entre os serviços, e impossibilitam os mecanismos de articulação entre as políticas sociais.

Os relatos dos técnicos frequentemente direcionavam-se para as implicações da não existência do PSF: para o cotidiano dos atendimentos à população idosa, e para a articulação entre os profissionais e serviços da rede.

Foi unânime, entre os técnicos, a percepção de que o PSF é essencial para o atendimento às pessoas idosas, especialmente quando há comprometimento para as AVDs, por também representar um respaldo maior às famílias.

Conforme expõe a Técnica 1, da UBS A:

O PSF ajuda até para as orientações básicas, de risco de queda, da orientação sobre a medicação, porque alguns idosos se atrapalham um pouco com isso, os Agentes Comunitários e a Equipe de Enfermagem, orientam e ajudam a separar os medicamentos [...]. Acho importantíssimo o

trabalho do PSF, principalmente para o idoso acamado, porque acaba sendo, também, um alívio para o cuidador (Técnica 1, da UBS A, entrevista).

Uma vez que, em determinada área de abrangência, não tenha o atendimento pelo PSF, a população idosa com dependência, que viver naquele território, não receberá acompanhamento periódico no domicílio.

Assim, as famílias desses usuários terão que se preocupar com questões relacionadas com:

 Ida à unidade de saúde para aprender a desempenhar os principais procedimentos relacionados àquele cuidado;

 Transporte para que a pessoa idosa vá às consultas médicas, ou realize exames, dentre outras questões que representam maior sobrecarga para as famílias.

Com relação ao respaldo oferecido pelo poder público às famílias que desempenham cuidado a pessoas idosas com dependência, salientamos, conforme assinalado no capítulo 3, que – no que se refere à política de saúde – em 10 das 27 UBSs da STS de Pirituba/Perus, não há o atendimento pelo PSF46.

No que tange às equipes da UAD, há apenas três em funcionamento, e com dificuldades para o atendimento à população.

Conforme relata a Técnica 3, da UBS C:

[...] daria para fazer um programa bem legal, mas não temos os recursos, principalmente o número de funcionários necessários para atendimento do que é estipulado no papel. A apostila do Programa Melhor em Casa é maravilhosa, teria que ter até uma ambulância que ficaria à nossa disposição. Mas nós não temos nada disso. [...] por exemplo, aqui, quem faz os atendimentos da UAD são os funcionários da UBS, e, na verdade, teria que existir uma equipe que ficaria de segunda a sexta, em horário integral, só para fazer as visitas. Ou seja, fazemos o serviço da unidade e da UAD. [...] nos esforçamos bastante – também somos muito cobrados – mas o atendimento não dá para ser como está previsto na apostila do programa, porque não temos as condições necessárias para fazer (Técnica 3, da UBS C, entrevista. Grifos nossos).

46Dentre as 17 UBSs da STS de Pirituba/Perus, em que há o PSF, algumas são mistas: são parte de

Ação Programática e parte de PSF. Dependendo da área de abrangência das unidades mistas, mesmo estando entre essas 17 unidades de PSF, em determinados territórios, não há cobertura pelas equipes de saúde da família.

Assim, inclusive nas áreas em que há o atendimento pelo PSF, ou pela UAD (que, segundo as diretrizes do Programa Melhor em Casa, deve estar implantada em territórios em que não há o atendimento pelo PSF), os recursos humanos e materiais são insuficientes e o atendimento acaba sendo prejudicado.

Dessa maneira, evidencia-se, por um lado, que o atendimento às famílias que desempenham o cuidado a pessoas idosas com dependência, tem melhor atenção nos territórios cobertos pelo PSF ou pela UAD; e, por outro lado, que as equipes que atuam nesses serviços encontram dificuldades para atender às famílias, devido à insuficiência de recursos.

Retomando a análise quanto à percepção dos técnicos, se existe ou não articulação intersetorial entre as políticas sociais na região, o Técnico 5, do CRAS B, acredita que “não há articulação”, mas não pela falta de vontade dos profissionais. Segundo ele, o que ocorre é que as políticas sociais ainda são pensadas para atuar isoladamente. Em suas palavras:

Eu não penso, por exemplo, que as secretarias da saúde, da educação da assistência, tenham articulação intersetorial. Não tem! [...] Nós, aqui no atendimento direto, temos muito essa preocupação. Então, temos reuniões de rede, todos os meses. Agora, tivemos uma aproximação com a equipe do NASF [que é vinculada ao Programa Saúde da Família] [...] Temos conhecimento de que a construção da intersetorialidade não passa só por secretaria, a gente também tem o dever de buscar. Só que, se você não tem uma determinação de cada secretaria, fica a critério de cada instituição, de cada política. Então, aqui, percebo que as coisas vêm e voltam (Técnico 5,

do CRAS B, entrevista).

A Técnica 2, da UBS B, afirma que o trabalho em rede supera a participação em reuniões; a lacuna está na pouca (ou na não) oferta de serviços que possam atender à população:

Dependendo da situação, o próprio serviço já responde: ‘ah, isso não é comigo’. Eles já se recusam a dar uma continuidade e acolher aquele caso. Então, acredito que a articulação ocorra mais em um nível abstrato. Os profissionais até querem uma articulação, mas não conseguem concretizar, participam de reuniões, mas não avança, especialmente, devido à falta da estrutura necessária para que essa articulação ocorra [...]. Porque trabalhar em rede não é só você ir a uma reunião e pronto. Trabalhar em rede, é você poder acompanhar ou encaminhar um caso e ele ser efetivamente atendido

(Técnica 2, da UBS B, entrevista).

Acho que o que precisa ser registrado, é que nos territórios cobertos pelo PSF nós até conseguimos avançar um pouco mais. Conseguimos garantir um pouco mais de cuidado. [...] conseguimos articular com os agentes comunitários para eles terem um olhar um pouco mais atento. É a única coisa que a gente pode contar. Os demais, a gente não pode (Técnica 7, do CREAS B, entrevista).

A Técnica ainda complementa:

[...] o PSF é de extrema importância, porque, quando tem o programa, até conseguimos conversar e ter uma articulação melhor com as equipes, principalmente com o NASF. Agora, quando não tem, ficamos literalmente a pé (Técnica 7, do CREAS B, entrevista).

Os técnicos que atuam em CRAS também mencionam o NCI e o SASF, como facilitadores para a comunicação entre os profissionais, devido ao acompanhamento que é realizado no domicílio à população idosa.

Exemplificando com a fala da Técnica 4, do CRAS A: “o NCI atualmente tem essa possibilidade de acompanhamento da população idosa que recebe o BPC, não fica apenas restrito às atividades relacionadas a bailes, bingos, festas, passeios e viagens”.

No mesmo discurso, a Técnica aponta algumas dificuldades enfrentadas pelos funcionários do NCI, na ocasião das visitas domiciliares:

O complicado, desse tipo de visita, é que, indo na residência dos usuários, acontece da família criar uma série de expectativas com relação àquela visita. Já aparecem com várias solicitações concretas que estão pendentes de soluções. Mas os profissionais do NCI não conseguem dar essas respostas, são questões que envolvem necessidade de fraldas descartáveis, medicação de alto custo, fisioterapia, enfermagem, questões relacionadas à saúde, especialmente de enfermagem, que a nossa equipe não consegue atender [...]. E, na maioria das vezes, o pessoal do NCI tenta fazer contato com a UBS mais próxima, e tenta integrar um pouco com o pessoal do Programa Saúde da Família, quando existe o serviço na região, enfim. Mas é claro que a família [...] não sabe disso nessa hora, porque quando recebe a visita de um profissional, acaba criando a expectativa de resolver uma série de problemas que vivencia no dia a dia (Técnica 4, do

CRAS A, entrevista. Grifos nossos).

Novamente, menciona-se a possibilidade de um melhor contato com as UBSs que têm o PSF:

Com as equipes do NCI, do SASF e até mesmo do PSF, especialmente com as equipes do NASF até conseguimos ter contato e retorno de alguns casos, porque eles fazem um acompanhamento mais de perto no domicílio. Cada um com a sua particularidade, mas acabamos conseguindo trocar

informações. Mas, com relação a política de saúde, o problema é que não temos o PSF em todas as UBSs. E seria muito necessário para acompanhamento da população idosa que está acamada (Técnico 5, do

CRAS B, entrevista).

O atendimento pelo PSF representa uma possibilidade mais efetiva de acompanhamento da pessoa idosa acamada no domicílio, no entanto, a existência de um programa não significa a transformação da realidade vivida pela população naquele território, pois existe aquele programa, mas faltam outros.

Conforme conclui o Técnico 5, do CRAS B.

A gente até tenta as intervenções conjuntas com o NCI [que também não cobre todos os Distritos, tanto da Subprefeitura de Perus, quanto de Pirituba], com o SASF, com o CREAS, até com as equipes do NASF, nas unidades que têm o PSF, mas a gente percebe que acaba não mudando muita coisa, porque aquela pessoa idosa vai permanecer naquela situação

(Técnico 5, do CRAS B, entrevista. Grifos nossos).

Assim, a falta de condições para realizar um trabalho que repercuta positivamente na vida dos usuários, causa preocupação, angústia e desânimo entre os profissionais.

Isso, para nós [...] profissionais que estamos aqui lidando com essas questões cotidianas, é muito difícil. Porque como é que nós vamos dialogar com os usuários e com as famílias e falar: ‘ah, procura isso, procura aquilo’. Procurar o quê? Onde? E como? [...] Ficamos numa situação bem difícil [...]. E o que nós vamos tentando é no território mesmo [...]. Na maioria dos casos, vamos contando com o pouco que temos. E ajustando aqui e ali, procuramos soluções que, algumas vezes, sabemos que não é o ideal para aquele usuário. Mas é aquilo, trabalhamos todos os dias do necessário ao possível. Então, tem que ser sempre essa lógica, o necessário é isso, mas o possível infelizmente é isso (Técnica 7, do CREAS B, entrevista. Grifos

nossos).

Foi unânime entre os técnicos entrevistados o interesse pela gestão intersetorial das políticas sociais, salientaram que a articulação traria repercussão positiva para os atendimentos, acompanhamentos e encaminhamentos. Em suma, para as suas intervenções profissionais, e para a vida dos usuários que são atendidos nos serviços.

Essa coisa de dividir o ser humano em pedaços não dá certo. O ser humano tem as suas necessidades, que é de todas as áreas. Então, o usuário é atendido de uma forma na UBS, de outra no NCI, de outra no CRAS. E as ações estão desconectadas (Técnica 4, do CRAS A, entrevista).

No entanto, não existem os meios necessários para que ocorra essa articulação, pois, para se pensar em intersetorialidade, é necessária a estruturação de uma rede de serviços, que realmente atenda às necessidades das pessoas idosas (dependentes ou não).

Encerramos este item com o discurso da Técnica 7, do CREAS B: “seria necessário que tivesse um olhar para a população idosa, porque tenho a impressão de que ela ainda não é ‘vista’ pelas políticas sociais”.

A seguir, são apontadas as propostas apresentadas pelos sujeitos da pesquisa, acerca de suas percepções quanto às possibilidades para a articulação intersetorial das políticas sociais na região de Pirituba/Perus.

Documentos relacionados