• Nenhum resultado encontrado

4.2 INTERAÇÃO COM OS GRUPOS E O CONSUMO

4.2.1 Similaridade São parecidos nos bens que possuem?

4.2.1.4 Percepção sobre a importância de manter a identidade

Além da necessidade de similaridade é importante observar que pode existir entre os Tweens a percepção de que cada criança precisa preservar o seu estilo próprio por meio dos bens que usam. Quando questionadas sobre escolherem suas coisas para ficarem diferentes (superioridade ou apenas distinção) ou parecidas (desejo de similaridade) das suas amigas:

algumas crianças interpretaram o “ter coisas parecidas” de foram negativa com lembranças em que elas tiveram bens iguais aos das amigas e houveram conflitos. Ter algo exatamente igual ao do amigo pode ser percebido por algumas crianças como algo negativo, no momento que alguém possui alguma coisa igual ou muito parecida pode a ver uma insatisfação por parte daquele que se sente imitado, pois ele deseja ser exclusivo e diferente dos demais para que possa s sentir superior. Como se pode perceber nos discursos a seguir:

É mais para não haver conflitos, como já aconteceu. (...) Eu prefiro ficar mais

diferente, porque uma vez eu comprei uma calça parecida (com a da amiga), a outra

(a amiga) ficava dizendo que eu estava imitando ela. Aí rolou conflito, mas depois a gente ficou amiga de novo. (Menina 17:11)

Praticamente a gente não gosta muito não (de ficar parecida), mas se alguém

aparecer com alguma coisa parecida a gente nem liga. (Menina_16:11)

(Escolho) Pra me achar mais baixa e elas se acharem também. Para se achar, elas entre a gente, pra achar ela mais superiores que a gente. (...) Pra não ter essa briga ou então ficar do mesmo jeito pra não ter confusão (de alguém se sentir melhor ou pior). [...] (Menina_15:11)

(Me inspiro em) A minha ex-amiga. Porque ela tem um estilo bem legal e o que ela usa eu acho bonito, mas eu tento não parecer igual ao dela, tipo, se ela compra

um laço rosa pro cabelo aí eu compro um vermelho. (Menina_16:11)

Para a Menina_15:11 é importante que não haja no meio do seu grupo de amigas, demonstração de superioridade por meio do que usam, existe a necessidade de que todas estejam no mesmo nível para que não incentivar a competição ou para que nenhuma delas se sinta inferior. Uma visível menção a existência de preocupação com o status que os bens podem conferir a quem os usa e do sentimento de competição que pode existir entre os Tweens.

Mesmo que elas admirem e usem coisas parecidas, como o laço citado pela Menina_16:11, elas preferem não deixar isso evidente, disfarçando para que a outra criança não perceba que admiram seu estilo. A ‘ex-amiga’ já foi amiga intima da Menina_16:11 e trabalha como modelo, sendo por isso admirada pelas demais e, portanto, é uma formadora de opinião no colégio. Admitir sua admiração seria admitir que a criança inspiradora fosse superior o que não seria desejável principalmente pelo desentendimento existente entre elas.

De acordo com a Menina_13:10 existe “também um pouquinho (preocupação em seguir as tendências dos amigos). As pessoas gostam mais que sejam diferentes, cada um

com seu estilo. Mas essas pulseiras, por exemplo, tem um monte de gente que quer que sejam iguais, mas não tem muito isso (a obrigação de ser igual)” somada ao seu discurso, ela

importante (para ela de forma bastante evidente), a necessidade individual de expressão da sua autoimagem. Tal constatação vai ao encontro do que diz Baudrillard (2009) sobre os bens serem importantes para o indivíduo não apenas pela necessidade de conformidade, e ainda com Dittmar (2008), que aponta que os bens podem servir para o individuo se diferenciar de outros.

Tem variedade de celular, não, tem variedades não, mas assim, tem galaxy, tem o Pocket que três meninas tem lá na sala, Talita, Malu e Lais, as outras têm Iphone, Ipad essas coisas. Eu tenho Galaxy Duos, mas assim, só eu tenho o Galaxy Duos e

eu gosto disso porque eu gosto de ser, eu não gosto de ser igual igual [ênfase] as outras pessoas, eu gosto de ser eu. Aí eu ia comprar o Pocket, mas eu gostei do da minha prima, o celular dela é igual ao meu e o da minha tia também, eu gostei

do dela e quis comprar, então foi uma influência. Eu gostei do dela. Também eu não

gosto dessas coisas miudinhas, eu ia ficar “o que? O que é isso na tela? Que tem

um jogos que eles já são bem pequenos, aí como a telinha era maior aí eu comprei

e era só um precinho bem pequenininho aí eu comprei. Também pra ver se chega perto do da minha mãe que é desse tamanho, é grandão. Os dos pais costumam ser sempre grandes, um pouco. O do meu pai é bem grandão também Mas nenhum deles tem tablet, só eu que tenho, mais pra baixar jogo mesmo que eu não ligo muito” (Menina_13:10)

A Menina_13:10 externa a sua necessidade de ser diferente, ter a sua própria identidade, não sendo igual às amigas do colégio, então ela escolheu um aparelho igual ao da prima e da tia porque gostou do modelo, do preço e da tela. Ela ia comprar o modelo Pocket que seria o mesmo das amigas do seu grupo, mas preferiu o outro por questões funcionais. Ela gosta de demonstrar que faz suas escolhas de forma consciente e aponta uma descrição de características funcionais do aparelho. Mas avisa que não quer ser igual às amigas e que para poder expressar o eu dela ela não quer ter o mesmo modelo de celular, mesmo que tenha tido alguma influência, ela quis deixar claro que não foi das amigas. Ela se mostra em uma posição defensiva, dizendo que não liga muito em ter um tablet, se justificando de algo, porque provavelmente acredita que se valorizar ter um tablet por razões além das funcionais seria futilidade.

Outra motivação da Menina_13:10 para escolha do celular foi ter um que fosse parecido com o da sua mãe, que, segundo a criança, é um modelo maior e melhor. Quando comenta do celular do pai e da mãe a criança demonstra vontade de usar algo que os adultos usam, pois no entendimento dela os bens que os pais possuem costumam ser melhores do que os dos filhos. Essa passagem corrobora a ideia de Cook e Kaiser (2004) e Cody e Lawlor (2011) de que as crianças no estado liminar, entre infância e adolescência, particularmente as meninas desejam produtos que lhes confiram independência e ter um bem que se aproxime dos produtos dos adultos causa essa sensação.

As crianças se preocupam em fazer suas escolhas não apenas para serem iguais ou parecidas com as amigas, embora essas possam lhes inspirar, como esclarecem as falas a seguir:

Não, eu sempre compro coisas que são minha cara. (Menina_11:12)

Vou sim, eu não deixo ela comprar nada pra mim só [sentido de sozinha], porque ela

não sabe as cores que eu gosto. (Menina_16:11)

Se todo mundo tá usando ela prefere não usar. Você pode comprar roupa com ela

e dizer: Menina_01:11 não ficou legal, “Ah, mais eu gostei” (representando a filha), pronto acabou-se, isso ninguém muda não, isso desde uns dois aninhos de idade. (Mãe 01)

As crianças também precisam ter sua própria identidade, não apenas porque não querem ser vistas como imitadoras, mas porque precisam afirmar e demonstrar que de fato têm sua própria identidade, que pode ser externada pelo que usam, confirmando a abordagem de Belk (1988) sobre a importância dos objetos como parte da identidade das pessoas.