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Percepções e opiniões dos Directores de Turma relativamente ao grupo étnico cigano e à sua

CAPÍTULO IV ETNICIDADE, ESCOLA E FAMÍLIA: REFLEXÕES A PARTIR DE UMA PESQUISA DE TERRENO

4.2 Análise das e reflexão sobre as entrevistas realizadas

4.2.3 O contexto educativo dos/as jovens ciganos/as

4.2.3.2 Percepções e opiniões dos Directores de Turma relativamente ao grupo étnico cigano e à sua

Relativamente ao grupo étnico cigano e à sua relação com a escola, dos oito professores entrevistados, apenas um referiu que se poderiam realizar algumas actividades que tivessem em

108 Excerto da entrevista realizada ao Director da Turma do Filipe. 109 Excerto da entrevista realizada à Directora da Turma do João.

atenção este grupo étnico, nomeadamente no momento de apresentação, no início do ano lectivo. O excerto que se segue revela que o Director de Turma considera que o facto de o jovem integrar o sistema escolar prevê que ele ―mude de cultura‖, assuma as normas da sociedade maioritária como suas, como se fosse possível deixar à porta da escola as experiência pessoais, familiares, que constituem a sua identidade étnica.

―É que nós temos ciganos, nós temos pessoas do Leste Europeu, nós temos Indianos, nós temos alunos dos quatro cantos do mundo de maneira que já se justificava colocar pelo menos um representante de cada um grupo a falar de si, da cultura que predomina no seu grupo, o que é que ele sentiu quando mudou de cultura, quando se integrou ou não integrou noutro grupo cultural. Trocar opiniões sobre eles, eu acho que devia ser muito bom para eles e para nós, porque iríamos aprender muito e estaríamos melhor preparados para saber como lidar com eles, tenho a certeza absoluta disso, acho que seria uma boa ideia mas até á data…‖110

Na opinião deste Director de Turma, seria importante alterar a atitude deste grupo étnico face à escola. Contudo, o mesmo refere que não é fácil mudar a cultura do grupo, e o tipo de vida que eles pretendem prosseguir que é ―com o mínimo de esforço que essa é uma ideia chave da vida dos ciganos da maioria deles é integrar-se na sociedade no que aos direitos diz respeito‖.111

Este discurso evidencia um ―desconhecimento cultural‖, que tem por base ―estereótipos e representações sociais negativos transmitidos de geração em geração e permanecendo no imaginário sócio-cultural da população portuguesa maioritária‖ (Casa-Nova, 2009:110). A autora acrescenta que estas representações negativas ―estão também na origem do auto-fechamento destas comunidades‖ (Id.Ibid.) em relação ao ―outro‖ da sociedade maioritária, perpetuando a existência de fronteiras entre culturas.

A Directora de Turma da Ana diz-nos que as jovens ciganas que frequentam a escola onde lecciona estão ―inseridas, elas fazem parte da escola. E… e estão bem acompanhadas porque são alunos com dificuldades e há preocupação de terem acompanhamento‖.112

Já a Directora de Turma do Miguel refere que a cultura cigana deve ter mais respeito pela escola enquanto instituição que não se rege pela mesmas regras sociais que eles.

―Se vão permitir que os filhos frequentem aquela instituição têm que aceitar que tem regras diferentes das suas. Se querem ser respeitados e se querem que as suas diferenças sejam respeitadas também, têm que perceber que não podem passar por cima daquilo que são as diferenças do outro lado. Nós podemos conviver e ceder entre aquilo que são sociedades maioritárias e sociedades minoritárias. Portanto é preciso que uma não se sobreponha a outra. E portanto para mim eles só têm que fazer aquilo que é básico e essencial para toda a gente que é a minha liberdade acaba onde começa a do outro. Portanto, a minha cultura não pode impor-se,

110 Excerto da entrevista realizada ao Director de Turma do Filipe. 111 Id.

sobrepor-se sobre a outra. Portanto se eu resolvo as coisas de uma determinada forma na minha

cultura, eu não posso querer que do outro lado resolvam exactamente da mesma forma‖.113

Este excerto evidencia uma perspectiva sobre integração enquanto estabelecimento de laços regularizados, mas mantendo um grau de autonomia e dependência, em simultâneo, entre as partes envolvidas, não se sobrepondo um cultura à outra, respeitando a liberdade de cada um (Cf. Giddens, 1979:57).

Esta professora acredita que a maioria das crianças e jovens de etnia cigana estão a estudar por causa do Rendimento Social de Inserção, mas também porque se trata de um investimento dos pais que ―querem que os filhos aprendam a ler, aprendam a escrever, a contar. Nem que seja para o negócio, para a gestão comercial‖114. A mesma acrescenta que se os pais querem que os seus filhos frequentem a escola, sejam quais forem as razões, devem respeitar as regras da escola. Esta professora, diz-nos ainda que

―Não tem nada a ver com a escola. A escola não deve incluir-se nas crenças, nos rituais. Não! Mas eles têm que perceber que há coisas mínimas que têm que aceitar. As regras básicas numa escola… se não, não ponham lá os filhos. Se querem ser aceites, se querem integrar-se então têm que respeitar. Têm que respeitar sobretudo‖.115

Esta Directora de Turma considera que é obrigação das crianças e jovens ciganos respeitarem aquelas que são as normas da sociedade maioritária, que estes podem não reconhecer como significativas. A este discurso parece estar subjacente o facto de ―Os conhecimentos que as crianças trazem da sua socialização primária não serem considerados como ponto de partida para a apropriação do conhecimento escolar, mas unicamente para justificar os baixos níveis de exigência académica (Casa-Nova, 2002:130). A autora refere que estamos perante dois sistemas culturais estruturalmente diferenciados. De um lado a escola, do outro o grupo étnico cigano.

O Director de Turma do Filipe também refere que não reconheceu o Filipe como cigano e considera que isso se deve ao facto de este estar bem integrado na turma. Neste sentido, para este

―Se calhar não é preciso mudar nada na escola, é sinal que as coisas estavam a correr muito bem. É verdade que há outros alunos que provavelmente não estavam tão bem integrados como o Filipe e daí eu valorizar tanto a atitude do Filipe. Eu acho que mais do que as qualidades da escola e da sua organização tinha mais a ver com as qualidades do Filipe, ou seja era ele próprio que agia de forma a ser muito bem aceite e acho que as pessoas entenderam isso, os seus colegas, os professores e sendo ele uma pessoa activa ligado à cultura, nomeadamente à música, que participava em grupos musicais, tudo isso ajudava‖.116

113 Excerto da entrevista realizada à Directora de Turma do Miguel. 114 Id.

115 Id.

O Director de Turma do Filipe revela um conjunto de estereótipos em relação ao grupo étnico cigano, considerando que o seu comportamento participativo e as suas acções não são aquelas que ele considera serem características do grupo étnico cigano.

De um modo geral, os Directores e Directoras de Turma dos jovens entrevistados consideram que é o grupo étnico cigano que deve adaptar-se à escola, às suas regras, assumindo que o desejo de integração e de obtenção de escolaridade parte da população cigana, portanto esta é que se deve adaptar ao sistema. Resultados idênticos são referidos no trabalho de investigação desenvolvido por Cortesão, Stoer, Casa-Nova & Trindade (2005:43).

―Em suma, na perspectiva das professoras inquiridas, as causas dos problemas com que a escola se depara no seu quotidiano pedagógico, devem ser procuradas maioritariamente fora do espaço escolar, não interrogando (também) as suas práticas pedagógicas e a organização e conteúdos curriculares como possíveis factores inibidores do bom decurso do processo de ensino- aprendizagem‖.

Alguns Directores de Turma revelam vários estereótipos relativos ao grupo étnico cigano, que consideramos indispensável desconstruir para que possa haver um entendimento mútuo e a integração nas práticas dos professores do respeito pelo grupo étnico cigano em toda a sua multidimensionalidade.

4.2.3.3 Percepções dos/as Directores/as de Turma sobre a participação dos pais na vida