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Percursos e perspetivas de investigação em Portugal

CAPÍTULO 2 – OS ARQUIVOS PESSOAIS NA LITERATURA ARQUIVÍSTICA

2.2. Percursos e perspetivas de investigação em Portugal

Em Portugal tem-se assistido, nas últimas décadas, a um crescente interesse pelo estudo dos arquivos pessoais à semelhança do movimento internacional registado nesta área, de que são exemplos alguns dos países anteriormente mencionados. Os arquivos pessoais foram suscitando interesse de forma gradual, inicialmente acompanhando o desenvolvimento de investigações multidisciplinares sobre os fenómenos sociais recorrendo aos arquivos em geral, aportadas pela História e por outras disciplinas das Ciências Sociais e Humanas, da Linguística à Sociologia, e um movimento generalizado de valorização do património cultural, assistindo-se também ao esboço de algumas medidas legislativas neste âmbito. Sob esta influência, registou-se, principalmente a partir dos anos de 1980-1990, um investimento na salvaguarda de arquivos privados, através da sua incorporação em instituições públicas, e, por outro lado, desenvolveu-se e reforçou-se uma componente técnica da Arquivística, centrada na disponibilização da informação por meio da produção de diversificados instrumentos de descrição.

Os arquivos pessoais têm paulatinamente se configurado como objeto de estudo específico, quer por via da dinamização do debate promovido pela multiplicação de encontros, seminários e colóquios onde os arquivos familiares e pessoais assumiram lugar de destaque, quer sobretudo por via do investimento, que se tem vindo a registar, a nível do ensino superior, numa formação de cariz mais científico, na área emergente da Ciência da Informação.

Um dos primeiros impulsos para a chamada de atenção para o valor cultural e social dos arquivos pessoais, e para a importância da sua preservação, pode ser exemplificado com a ação desenvolvida pela Biblioteca Nacional, onde, nos inícios da década de 1980, sob a direção de João Palma Ferreira, se criou a então designada “Área de Espólios”, um projeto inovador, à época, com vista a promover a salvaguarda e investigação de documentos sobre a história portuguesa contemporânea. Ali se acomodaram um conjunto de fundos documentais de figuras da cultura nacional, que o Estado português tinha vindo a adquirir a partir de meados dos anos de 1970, e de outros que progressivamente foram recolhendo à Biblioteca Nacional,

149 Um panorama geral sobre a evolução do ensino universitário em Arquivística no Brasil, e as influências

por via de doação ou depósito. A esta coube também zelar, a partir de 1981, pelo arquivo do antigo governante português do período do Estado Novo, António de Oliveira Salazar, ali se procedendo à sua organização e descrição até à sua transferência, em 1992, para o então inaugurado edifício onde se instalou a Torre do Tombo.

O tratamento de arquivos pessoais, com uma incidência primordial nos de escritores e figuras da cultura portuguesa contemporânea, decorrido ao longo da década de 1980, na referida “Área de Espólios”, acompanhado de ações de catalogação e de divulgação através de

exposições e outras iniciativas editorais que então decorreram,150 motivou os investigadores

que ali trabalhavam a propor abordagens teóricas e orientações metodológicas, no que designaram como uma área específica nos arquivos, a “Arquivística Literária”, que teve como um dos seus principais teóricos António Braz de Oliveira, membro da equipa então formada na BNP.

Braz de Oliveira apresentou a Arquivística Literária, em 1992, como “uma arte «híbrida» que procura descobrir a génese e a textura literárias de uma ou mais obras através dos despojos do seu Autor, no quadro do percurso biográfico próprio, socorrendo-se ora de técnicas arquivísticas, ora de técnicas biblioteconómicas, conforme se trate de reconhecer o todo ou cada uma das suas partes” (Oliveira, A. B., 1992, 109), procurando articular alguns conceitos e princípios que orientavam o trabalho de análise e organização.

Inspirando-se nos princípios de ordenação e inventariação como os do Arquivo da Literatura Alemã e da Associação Alemã para a Investigação, e favorecendo a interdisciplinaridade com a

Filologia e, em particular, com a crítica genética,151 a arquivística batizada de “literária” orientou

o seu enfoque para o estudo do processo de génese textual, priorizando a relação dos autores com os seus textos, e os estádios de construção dos vários tipos de obras. Assim, deu primazia ao “princípio da autoria” como “princípio estruturante fundamental” (Oliveira, A. B., 1992, 109).

Outros princípios presentes na tradição arquivística, como o do respeito pelos fundos ou da ordem original, aparentam ter sido considerados menos adequados, na linha então delineada, possivelmente pelas dificuldades em: por um lado, conciliar o conceito arquivístico de fundo com os designados “despojos” dos vários autores que foram sendo incorporados no acervo da BNP, os quais oscilavam, segundo Braz de Oliveira, entre as três realidades do “arquivo completo, tal como ficou pela morte do autor; a de parte ou fração desses espólio, que pode ou não completar-se […]; a de coleção recolhida por terceiro(s) […]”, todos eles “desfocado[s]

150 Uma síntese dos trabalhos desenvolvidos na Biblioteca Nacional neste período pode ser encontrada

no texto de António Braz de Oliveira, “A «escrita» do ACPC, recortes de memória recente”, na obra As

mãos da escrita: 25.º aniversário do Arquivo de Cultura Contemporânea (BNP, 2007), também disponível

em versão digital em <URL: http://purl.pt/13858/1/index.html> [consult. 20-01-2017].

151 Veja-se o que, a este propósito, é mencionado no artigo de Braz de Oliveira mencionado na nota

pelas vicissitudes do tempo e lugar onde permaneceu até chegar às nossas mães”; e por outro lado, face à “proverbial desordem dos papéis do escritor”, que levam aquele autor a afirmar que “em 90 por cento dos casos, o espólio/arquivo que temos de inventariar não está completo e não apresenta qualquer ordem reconhecível ou respeitável” (Oliveira, A. B., 1992, 109).

Braz de Oliveira reconheceu a importância de se identificarem os percursos da “vida do escritor vazada em letras”, de considerar o “percurso genético das obras” e a “sedimentação biográfica” na organização dos arquivos (Oliveira, A. B., 1992, 111), e referiu-se designadamente ao princípio da proveniência como correlativo à “organicidade”, afirmando ainda que o que chegou ao arquivista de determinado autor tem “uma proveniência determinada que não cabe iludir” (Oliveira, A. B., 1992, 108, 110). Porém, no campo específico da metodologia para a inventariação, e na atribuição do lugar dos documentos em relação com o todo da unidade do arquivo em que se inserem, a proposta da arquivística literária concretiza-se por meio da aplicação de um quadro de classificação comum. Na estrutura deste quadro é determinante a importância colocada no autor e nos seus escritos, seguindo uma organização de acordo com o género literário, e relegando, por exemplo, para uma ambígua série designada de “documentos anexos” o vasto leque de documentação que não é considerada texto “literário”, entre a qual aquela que ilustra outras facetas do percurso biográfico, incluindo documentos

familiares e profissionais.152

Embora não isenta de críticas teórico-metodológicas por parte de outros autores, a arquivística literária fez o seu percurso em Portugal, contribuindo para impulsionar estudos e reflexões sobre os arquivos dos escritores, e influenciou outros investigadores que nela se têm filiado, em maior ou menor grau. O trabalho levado a cabo na Biblioteca Nacional imprimiu também um dinamismo à publicação de instrumentos de descrição e de obras na área da edição de textos e fontes. Espelhando essa dinâmica, a “Área de Espólios” deu origem, em 1992, ao “Arquivo de Literatura Portuguesa Contemporânea”, ao qual sucedeu, em 1997, o “Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea” (ACPC), numa mudança de designação com vista a lhe ser reconhecida e conferida uma natureza mais ampla e consentânea com a diversidade de arquivos que continuaram a dar entrada, a ritmo constante, na BNP.

Dando largas ao interesse suscitado pelos arquivos de escritores, coube-lhe ainda promover a realização, em junho de 1999, do I Encontro Internacional de Arquivística Literária e Crítica Textual, com as comunicações proferidas pelos participantes de vários países a serem

152 O modelo de classificação adotado no ACPC para organizar a documentação dos diversos arquivos,

estrutura a distribuição dos documentos nos inventários em seis séries: manuscritos do autor, correspondência do autor, documentos anexos do autor, manuscritos de terceiros, correspondência de terceiros e documentos anexos de terceiros. Este modelo inspirou outras instituições, que o replicaram, com maiores ou menores adaptações, na classificação de outros arquivos, como é o caso do Museu do Neo-Realismo.

publicadas na revista Leituras da Biblioteca Nacional.153 Ali se debateram questões relacionadas com o processo de criação literária, se explanaram dilemas de ordem ética, se discutiram problemas metodológicos e do âmbito terminológico, e abordaram perspetivas de valorização, designadamente a partir da publicação de edições críticas de textos. Neste encontro foram também divulgados, em primeira mão, os resultados de um inquérito nacional, conduzido pela BNP, que visou identificar arquivos da área da literatura à guarda de outras entidades detentoras (BNP, 1999, 2000).

Em 2007, a Biblioteca Nacional assinalou os 25 anos da história do Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea, com uma exposição acompanhada da publicação de uma obra sob organização de Luiz Fagundes Duarte e Braz de Oliveira, sistematizando o trabalho ali desenvolvido, onde se evidencia a continuidade de uma linha de pensamento que advoga uma especialização da Arquivística derivada das especificidades dos arquivos pessoais que tocam a área da Literatura (BNP, 2007).

Encontramos outros exemplos da aplicação da abordagem da Arquivística Literária, no trabalho de Hélder Godinho e Ana Isabel Turíbio (2007) a propósito da sua análise do arquivo do

escritor Vergílio Ferreira (1916-1996),154 bem como na dissertação de mestrado de António

Ramalho (2011), apresentada na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, no âmbito do Mestrado em Ciências da Documentação e Informação, que incidiu na gestão de arquivos literários, a partir dos exemplos concretos das práticas do ACPC e do Museu do Neo-Realismo (Município de Vila Franca de Xira). Ramalho optou por proceder a uma análise que incidiu sobre o valor social e patrimonial dos arquivos de âmbito “literário”, à guarda das duas instituições, abordando também aspetos relacionados com a adequada conservação e a organização dos locais destinados à guarda e consulta, e questões inerentes aos processos de aquisição. Os designados “espólios” literários são, para este autor, como o foram para Braz de Oliveira, o fulcro da “Arquivística literária”, que tem por objeto o manuscrito literário, visto como um “tesouro”, cujo valor não é aferido apenas pelo seu carácter inédito, mas como testemunho

do percurso da atividade criativa (Ramalho, 2011, 15).155

153 As comunicações foram publicadas no n.º 5 (série 3) da revista Leituras, de outubro de 1999-abril

2000.

154 Além de apontarem as vicissitudes da história do arquivo, dividido entre a Biblioteca Municipal de

Gouveia (biblioteca pessoal) e a Biblioteca Nacional de Portugal (manuscritos), os autores analisaram problemas da compreensão da genética da produção literária do autor subjacentes à sua inventariação, com o fim de justificar opções inerentes à edição de alguns inéditos de Vergílio Ferreira (Godinho; Turíbio, 2007).

155 O autor não aborda a questão da organização e classificação dos arquivos. Refira-se, todavia, que se

ambas partilham de uma orientação geral cujo enfoque são os textos literários e o seu autor, a estrutura dos quadros de classificação em uso não é inteiramente coincidente entre si. Em nota acima mencionou- se a estrutura geral das séries que orienta os quadros de classificação utilizados no ACPC. No decurso da investigação ora realizada, tivemos oportunidade de verificar o modelo em uso no Museu do Neo- Realismo. Sofrendo embora adaptações de arquivo para arquivo, o quadro de classificação está organizado em catorze classes, das quais as primeiras quatro dizem respeito aos textos de tipo literário

Além da Biblioteca Nacional e da abordagem específica da arquivística sob influência dos estudos da área literária, ao longo da década de 1990, outros investigadores e instituições portuguesas começaram a prestar maior atenção à salvaguarda de arquivos privados, designadamente de familiares e pessoais, e aos aspetos relacionados com o tratamento técnico. Não pode deixar de ser referido o contributo inicial dado por Pedro Abreu Peixoto para uma reflexão em torno das problemáticas da representação da informação, através de uma proposta de organização e descrição de arquivos de família, no âmbito de um trabalho

desenvolvido no antigo Instituto Português de Arquivos (Peixoto,1991).156

O autor colocou em destaque a importância da produção de instrumentos de descrição que possibilitassem o acesso aos arquivos, como um dos elementos fundamentais para a sua valorização. Especificamente preocupado com os arquivos de família, Pedro Abreu Peixoto propôs um modelo de quadro de classificação comum, tomando como base de exemplo a documentação das famílias de Antigo Regime.

No âmbito do seu estudo, o autor sugeriu também a progressiva substituição destes arquivos, no período contemporâneo, pelos arquivos pessoais, afirmando que “ao entrarmos no séc. XX e mesmo em grande parte do séc. XIX, os arquivos de família vão rareando cada vez em detrimento do cada vez maior número de arquivos pessoais”, por razões que estão “por um lado numa nova forma de encarar a família e por outro nas novas relações económicas em que os elementos de uma família se vão separando do conjunto no que respeita às atividades pessoais” (Peixoto, 1991, 20). Ainda que não tenha proposto qualquer quadro de classificação específico para os arquivos pessoais, a fórmula sugerida para os familiares supõe a sua possível transposição para aqueles, aplicando-se à documentação própria de cada indivíduo

um critério de tipo funcional, tendo por base áreas de interesse e atuação.157

As propostas de Peixoto foram depois adaptadas numa outra publicação, por este subscrita em conjunto com Manuel Gonçalves e Paulo Mesquita Guimarães, que se configura como um

produzidos pelo autor: 1. Poesia; 2. Ficção Narrativa; 3. Teatro, Cinema, Rádio e Televisão; 4. Ensaio; 5. História pessoal do autor (onde se incluem autobiografias, entrevistas, currículos, e textos memorialísticos); 6. Correspondência; 7. Vária (integrando-se, sob esta designação generalista, a documentação relacionada com outras atividades do autor que não a literária, bem como toda a sorte de documentos de identificação pessoal, desde bilhetes de identidade a diplomas e certificados); 8. Fotografias; 9. Impressos; 10. Documentos de outros (agrupando todos os documentos de terceiros que no quadro de classificação do ACPC se organiza em três séries distintas); 11. Artes plásticas, decorativas e outras (uma classe que deriva da própria função museológica da instituição e do facto de esta incorporar vários arquivos de escritores que também tiveram numerosa produção artística); 12. Objetos; 13. Monografias e publicações periódicas; 14. Documentos pós-morten.

156 O Instituto Português de Arquivos foi uma instituição criada em 1988, com o objetivo de estabelecer

um sistema nacional de arquivos e coordenar uma política integrada para o setor arquivístico português

157 No que respeita aos indivíduos membros de cada família, o autor propôs a classificação da

documentação de cada uma numa secção individual, dividida em três subsecções: documentos pessoais, de função pública e de função privada. Na primeira incluiu documentos de identificação, certidões académicas e militares, memórias, diários, livros de notas pessoais; a segunda considerou os documentos produzidos no desempenho de cargos públicos; e a terceira os relativos a atividades privadas (Peixoto, 1991, 22).

manual de orientação para a organização e descrição de arquivos de família. Nesta obra, os autores esforçaram-se por tentar definir o conceito de arquivo de família, procurando uma distinção face aos arquivos pessoais. Reconheceram, porém, dificuldades, pleiteando ser necessária uma reflexão teórica mais aprofundada (Gonçalves; Guimarães; Peixoto, 1996, 9), pelo que o pendor da proposta dos autores se orientou, assim, essencialmente, para o âmbito técnico do tratamento arquivístico.

Uma abordagem essencialmente tecnicista, focada nas tarefas da descrição e da elaboração de instrumentos que providenciassem o acesso à informação, estava então na ordem do dia dos profissionais dos arquivos e bibliotecas portuguesas que trabalhavam com arquivos familiares e pessoais, tendo justificado a criação, em 1994, de um grupo de trabalho específico pela Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas (BAD). O seu objetivo inicial foi, efetivamente, o de intervir neste sentido, junto das entidades detentoras de arquivos. Porém, poucos anos depois, reconhecendo as dificuldades na prossecução de uma atuação diretamente neste campo, Pedro Abreu Peixoto, que esteve também na coordenação do referido grupo de trabalho, sugeriu que as associações profissionais como a BAD deviam reorientar a sua intervenção, no campo dos arquivos familiares e pessoais, para a discussão de temáticas comuns, entre as quais os problemas da legislação tendentes à sua salvaguarda e acesso, a aplicação dos princípios arquivísticos e a normalização descritiva, bem como preferirem uma atuação no domínio do aconselhamento técnico, no acompanhamento da evolução da situação dos arquivos privados no país e no lançamento de bases para uma política nacional reguladora (Peixoto, 1999, 92-93).

Sinal da atenção redobrada que estes arquivos passaram a ter, ao longo da década de 1990, no seio da profissão, foi também a realização, em 1997, em Vila Real, do “Seminário sobre Arquivos de Família e Pessoais”, organizado pelo referido grupo de trabalho criado pela BAD. Foi precisamente neste seminário que Armando Malheiro da Silva apresentou um dos seus primeiros contributos para a reflexão teórica dos arquivos pessoais no âmbito de uma nova visão para Arquivística, ao tecer argumentos em prol de uma abordagem de âmbito científico, sustentada em novas bases teórico-metodológicas, distintas dos pressupostos essencialmente

tecnicistas até então predominantes.158 Com críticas à orientação e aparato conceptual da

designada “arquivística literária”, e fazendo também reparos ao enfoque excessivamente tecnicista, contido nas propostas de Pedro Abreu Peixoto e seus colegas, para a ordenação e classificação dos arquivos de família, Malheiro da Silva ofereceu, naquele Seminário, novas perspetivas para a construção de uma base teórica para análise e compreensão geral dos

158 As comunicações apresentadas a este Seminário seriam publicadas apenas em 2000, tendo então o

artigo de Armando Malheiro da Silva (2000a) sido atualizado para incorporar uma síntese dos enunciados teóricos que vinha elaborando, em conjunto com uma equipa de outros investigadores, no sentido de integrar a Arquivística no novo campo científico em construção da Ciência da Informação (Silva; Ribeiro; Ramos; Real, 1999).

arquivos familiares e pessoais, através de um esforço de reformulação do quadro conceptual e metodológico da Arquivística (Silva, A. M., 2000a).

Malheiro da Silva integra um grupo de outros autores, direta ou indiretamente ligados à Faculdade de Letras da Universidade do Porto, que contribuíram para que se desenrolasse, em Portugal, a partir de finais da década de 1990 e nos primeiros anos do novo milénio, uma nova forma de encarar a Arquivística, concebida como uma das disciplinas de aplicação do quadro

epistemológico da Ciência da Informação.159 Entre os seus principais teóricos encontram-se,

além Armando Malheiro da Silva (2000a, 2004, 2006, 2009, 2013), autores como Fernanda Ribeiro (1998, 2002, 2004, 2005), sendo de realçar o esforço com que procuraram estabelecer as bases de fundamentação do novo olhar sobre a Arquivística, que pretenderam dotar de

cientificidade.160

Para estes autores existem dois modos opostos de abordagem da Arquivística: um, o tradicional, a que chamam de “custodial”, incidindo numa área do saber considerada essencialmente empírica, patrimonialista, historicista e meramente técnica, em que o objeto

são os documentos na sua dimensão estática;161 e outro, considerado “científico” (Ribeiro, F.,

1998, vol. I, 48, 50-5), definido através de um paradigma que se assume como “pós-custodial”, em que se recorre ao conceito de Informação, considerado dinâmico, no qual o documento é apenas o suporte comunicacional. O objeto de análise é, para estes teóricos, a informação social entendida como “conjunto estruturado de representações mentais codificadas (símbolos, significantes) socialmente contextualizadas e passíveis de serem registadas num qualquer

159 Veja-se especialmente Silva et al. (1999) e Silva e Ribeiro (2002).

160 Fernanda Ribeiro, apesar dos seus contributos para a formulação dos pressupostos científicos da

Ciência da Informação, apenas se debruçou de forma genérica sobre os arquivos pessoais, na sua dissertação de doutoramento, apontando a larga influência de um paradigma historicista, que conduziu, em sua perspetiva, à a integração destes arquivos em instituições especializadas, sob o argumento da